Figura 01: N. Sra das Graças, vista frontal;
Figura 02: Vista posterior
Fotos: Moema Nascimento Queiroz, e, Alice Almeida Gontijo, Bárbara Mesquita dos Santos Gomes, Camila Ayla Oliveira dos Anjos, Flávia Alves de Alcântara, Florence Lodo Costa, João Antônio Freitas Ribeiro, Otávio Augusto Borges Rodrigues, Tatiane Aparecida Damião From e Valdeci da Silva Cunha; bolsistas do Projeto Acervo Artístico UFMG, 2010
N. SRA DAS GRAÇAS,
VALE DO JEQUITINHONHA, MG
Escultura: N. Sra. da Graças
Autoria/atribuição: Não identificada
Técnica: cerâmica (barro cozido) sem policromia
Dimensão aproximada:20,0 x 8,5 x 9,5 cm (A x L x P.)
Origem: Vale do Jequitinhonha, Minas Gerais
Procedência: Museu de História Natural e
Jardim Botânico da UFMG (MHNJB-UFMG)
Época: Década de 70 do século XX
Nossa Senhora das Graças, este é o título dado a obra, classificada no Levantamento Artístico do Acervo da UFMG (2010), como título provisório. Peça modelada em barro, originária do polo ceramista do Vale do Jequitinhonha, Nordeste de Minas Gerais, sem identificação autoral, com representação iconográfica mariana delineada pela posição dos braços e mãos e também pela vestimenta (túnica e manto), e com ausência de policromia.
A produção ceramista do Vale do Jequitinhonha caracteriza-se pela modelagem de peças decorativas e utilitárias, e apesar da religiosidade ser um componente muito forte e presente nas comunidades produtoras, encontram-se pouquíssimas peças que reproduzem santos. Em geral a religiosidade se faz presente em representação de peças que traduzem cenas do cotidiano (casamentos, batizados, procissões, missas, etc), mas, a região não é marcada por uma produção santeira em barro.
A singularidade desta peça, de cunho religioso produzida na década de 70 do século XX, está relacionada ao tipo de material utilizado, o barro, que não tem muita expressividade no cenário ceramista mineiro, em que a madeira é o material mais abundante na produção santeira. Também se caracteriza pelo cunho popular, resultado das tradições herdadas dos povos indígenas e negros, primitivos habitantes do Vale do Jequitinhonha, em que não há uma preocupação com a definição harmônica e purista das feições da virgem, pelo contrário, há uma certa rusticidade na modelagem da peça. Nota-se que a face da imagem apresenta olhos marcados por perfuração, nariz levemente modelado e não apresenta a definição de lábios e boca. Há uma simplificação na região frontal do manto, que remete a curvas quase abstratas, da mesma forma há uma singular volumetria no alto da cabeça, o que ao primeiro olhar, cria-se uma outra imagem como se o manto estivesse convertido em longas madeixas. Ressaltando que as peças produzidas em barro no Vale do Jequitinhonha são modeladas pelas mãos, não utilizando para tanto fôrmas ou moldes. É uma fatura completamente popular. (Figuras 01 e 02)
Outra questão bastante singular é a ausência de policromia. As peças cerâmicas do Vale do Jequitinhonha apresentam sempre uma policromia, com uma paleta de cores reduzida. Para a formação dessa policromia, utilizam-se a água extraída do barro, chamada de oleio, e aplicada na peça antes de ser queimada. Com a queima, realizada sempre em fornos artesanais, o oleio funde-se ao suporte (barro), resultando assim no objeto denominado cerâmica policromada. A limitação de cores da policromia ocorre uma vez que os barreiros da região não produzem uma diversidade de cores, limitado sempre a uma gama que compreende o branco, creme, laranja, rosa, vermelho e o cinza. Portanto, raramente se encontrará uma peça produzida no Vale do Jequitinhonha em cor natural do suporte (barro) característica em outras regiões ceramista do país, como é o caso dos estados da região do nordeste brasileiro (Pernambuco, Alagoas, Ceará e Bahia).
O barro utilizado na confecção da imagem apresenta-se com uma coloração clara, no entanto, no verso da peça há áreas com deposição de cor azul, na região do manto da santa. Claramente trata-se de uma intervenção realizada posterior a queima, uma vez que no Vale do Jequitinhonha não se encontra nenhum barro que reproduz a cor azul.
Esta peça foi acometida pelo incêndio ocorrido em junho/2020 na reserva técnica do MHNJB-UFMG, e hoje encontra-se com fraturas em três partes, sem perda de material cerâmico, e coberta por fuligem gerada pelo incêndio.
Agesilau Neiva Almada,
Santa Luzia, Minas Gerais, 02 de maio de 2021.
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Referências Recomendadas:
DALGLISH, Lalada. Noivas da seca: cerâmica popular do Vale do Jequitinhonha. São Paulo: Editora UNESP, Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2008. 216 p.
FROTA, Lélia Coelho. Pequeno dicionário de arte do povo brasileiro, século XX. Rio de Janeiro: Aeroplano, 2005. 440 p.
INSTITUTO ESTADUAL DO PATRIMÔNIO HISTÓRICO E ARTÍSTICO DE MINAS GERAIS. Governo do Estado de Minas Gerais. Dossiê para registro do Artesanato em Barro do Vale do Jequitinhonha: saberes, ofício e expressão artísticas em Minas Gerais. Belo Horizonte: IEPHA-MG, 2018. 397 p. Disponível em: <http://www.iepha.mg.gov.br/index.php/programas-e-acoes/patrimonio-cultural-protegido/bens-registrados/details/2/8/bens-registrados-artesanato-em-barro-do-vale-do-jequitinhonha-saberes,-of%C3%ADcio-e-express%C3%B5es-art%C3%ADsticas>. Acesso em: 04 mar. 2021.
MASCELANI, Angela. Caminhos da arte popular: O Vale do Jequitinhonha. Rio de Janeiro: Museu Casa do Pontal, 2008. 180 p.
MATTOS, Sônia Missagia. Artefatos de gênero na arte do barro: Jequitinhonha. Vitória: Edufes, 2001. 304 p.
MOSTRA DO REDESCOBRIMENTO BRASIL 500 É MAIS. Arte Popular. Nelson Aguilar (org.) / Fundação Bienal de São Paulo. São Paulo: Associação Brasil 500 anos/Artes Visuais, 2000. 320 p. Catálogo de Exposição, 24 abr. – 10 set. 2000, Parque do Ibirapuera, São Paulo.
Autor(a):
Agesilau Neiva Almada
https://orcid.org/0000-0002-9408-1854
http://lattes.cnpq.br/0381490727174184
Data de recebimento: 02/05/2021
Data de aprovação: 13/05/2021