A BUSCA
“O dia amanheceu iluminado
Mas eu sabia que assim não se manteria por muito tempo.
Era chegada a hora
Nada poderia ser feito.”
O Corredor
Já eram quase seis da manhã quando, erguendo a cabeça, pude finalmente confirmar minha condição. Aquele homem de preto que outrora traria salvação, hoje, me condena com palavras, e ajuda a selar meu destino.
Depois de fechada a porta da vida, era aberta a porta da morte, e a cada passo que eu dava, sentia toda a frieza a que o mundo havia se condicionado. Eu passeava pelo corredor, e estava no final da jornada.
A Neblina
Estou andando numa estrada
É noite
Uma neblina começa a se formar ao longe
Ela me fascina e me assusta
Não sei até que ponto do caminho se prolongará
Tenho medo de tropeçar e cair
Tenho medo de cair e não levantar
Ela não permite que eu veja o que tenho pela frente
Envolto em seu véu não há orientação
Não há pra onde olhar nem ninguém pra chamar
Me disseram que você estaria aqui
Mas acho que tudo era uma grande piada...
(*) lembranças
2º ATO
Abrirás os olhos sem que vejas sombras?
- Tentarás se esconder em vultos de luz -
Compreenderás um dia a razão da existência?
Saberás que não existem caminhos suficientemente insanos?
Verás em si mesmo quanto mede o infinito?
Conhecerás a eternidade?
Entenderás então um dia quão eterna é a poesia
Ou quem sabe então
Quão irracional
É a razão?
O que não podemos definir é interessante
Como interessante é a incerteza do que conhecemos
O mistério da verdade é interessante
Tal como a mentira da verdade concebida
A resistência à existência não me interessa mas sim a existência de resistência
Vida e morte me interessam
Bem como sua natureza antagônica
Bem como o mal do bem surgido
Mal como o bem que faz mal
Me interessa a alegria estampada e a dor reprimida
A felicidade dos que sofrem...
Interessantes certas coisas que parecem não interessar
O que se ergue e o que cai
O que cai e se levanta
Interessante o que ainda não nasceu
Interessante o que já morreu
Uma concreta manifestação do tudo e do nada
Uma obra eternizada
Sem começo nem fim
“O tempo acabou
Peguem suas armas
Ninguém conseguirá se esconder
A moral foi defraudada
E de que valores poderemos falar?
Nossas mentes não mais nos pertencem
Quando teus princípios viram leis
Ninguém perguntou nossa opinião...
Eu acordei entre quatro paredes
Onde era negado o direito à luz
E fui condenado a ficar acordado
Num mundo que eu não reconhecia”
“Quando tudo estiver terminado
Seremos nós apenas mártires em nossos sonhos insanos?
E, mergulhados em êxtase
Fecharemos nossos olhos
Para em seguida ingressar nesse paraíso da loucura?
...Conseguiríamos um dia realmente enlouquecer?”
“Algumas coisas podem ser reais
Outras, verdadeiras só pra você
A compreensão é virtude perdida
Quando sentimentos se confundem na razão
Razão que justifica a inocência
De atitudes e sentimentos irreais”
“Ele disse o que não podia ser dito
E fez o que não podia ser feito
Profanou o sagrado
Tornou sacra sua mente
...Encontrou-se com Deus
E o matou...”
3º ATO
“Hei, você ganhou! Deverás partir...
Não é o que você queria?
Meus parabéns! Você ganhou!
Pegue seu prêmio!
Não dá mais pra desistir
Deverás partir...
Hei, você ganhou!
Ou será que alguém se enganou?...”
“Sinto saudades de um tempo em que não vivi
Pessoas que não conheci
Saudades de mim mesmo
E de sorrisos nunca vistos
Memórias de fatos inéditos
Delírios de lembranças esquecidas
De uma felicidade jamais vivida
Compartilhada comigo
Por quem não conheci”
(...)“É difícil deixar uma mensagem de vida
Quando se caminha para a morte.”
4º ATO - Despedida
“Sob o sangue derramado
Cresceram rosas vermelhas
Enquanto seguíamos os conselhos
De nossos monstros sagrados
Sentíamo-nos sós em meio a grandes contingentes
Marchávamos rumo à luz
Ferimos nossos irmãos
Atingíamos nossos próprios reflexos
Espelhados em nossas desilusões...
Passavam-se os dias
E as rosas cresciam
Exalando o perfume da juventude perdida
Não havia muito a se fazer
Caminhávamos rumo ao norte
E não acreditávamos na morte
Tão belo era o pôr-do-sol
Nos apaixonávamos em sonhos...
Somos grandes agora
Dormiremos para sempre
As rosas foram arrancadas e sangraram
Onde novas rosas crescerão...”
(Onde novas rosas crescerão? - Priscila)
“Quando vi o sol nascer
Achei que fosse para sempre
Estava quente
Eu vi a vida brotar
Aconteceu que de repente
O sol estava cansado
De lá em cima ficar
E foi embora... pra não mais voltar
Agora estava escuro e frio
E só pra mim o céu sorriu
Eu via estrelas a brilhar
Mas a vida estava acabando
Sem cor, sem luz, sem lar
E as estrelas me pediram
Para eu com elas ficar
Adeus irmãos
Eu realmente vos amei
Mas vou embora
Pra nunca mais voltar”
“Sentado em meio a cegos
Onde o tempo não pode parar
Vejo crianças correndo
Flores nascendo
Sol e Lua
Vejo a solidão das estrelas
Vejo luzes acendendo
Luzes se apagando
Crianças brincando
Vejo a alegria dos que vencem...
Vejo flores murchando
O dia morrendo
Homens andando
Pássaros voando
E crianças crescendo
Vejo portas se fechando
E cortinas se abrindo
Pessoas entrando
E pessoas saindo
Vejo crianças dormindo
Homens trabalhando
Vejo pessoas chorando
Vejo pessoas sorrindo...
(...)
Vejo a chuva caindo
O fogo ardendo
O vento soprando
A água correndo (da terra nascendo)
Vejo pessoas morrendo...
Vejo a tristeza dos que tudo tem
E a felicidade dos que nada tem
Rostos bonitos
Vejo ao longe o pensamento
Corações partidos
Vejo pessoas doentes...
Vejo a construção da vida
E a destruição dos sonhos
Vejo pessoas distantes
Uma procura desesperada
Vejo muito mais do que poderia descrever
Vejo o tempo passando
Vejo a vida e a morte
Também vejo a mim mesmo
...As crianças cresceram e agora dizem:
‘Guardem os brinquedos
Eu não quero mais brincar...’ “
PAULO A. C. B. Jr
Comentários ao 1º Ato: A condenação do homem no corredor da morte metataforicamente sugeriria a condenação do seu pensamento, aprisionado às ideologias do seu dia-a-dia, representadas pelos interesses particulares que na maioria das vezes a conduzem. Procura dar uma noção da condição da personagem, que não se reconhecia na sociedade que a cercava, mas que era obrigado a se adaptar a ela para sobreviver. Tenta mostrar uma sociedade que destrói as perspectivas racionais e o bom senso em nome da sobrevivência. O cidadão comum que nunca teve tempo sequer de saber que estava vivo, hoje é morto, matando-se suas perspectivas e ideais, com a nossa conivência.
2º Ato: A Dor da Realidade - A busca pela consciência e o desejo de estar louco
5º Ato – O conceito do ser eterno (a semente germina)
Coletânea de textos escritos nos anos de 1996/97, no caderno de aula (primeiros anos de faculdade).