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 “O cansaço do mundo é “a obsolescência do homem”. (“O Mapa e o Território”, Michel Houellebecq - 2012).

A ideia de progresso parece já não fazer sentido, ninguém acredita no velho dogma Iluminista do século XVIII. É sempre o mesmo, onde já ouvimos isto: “o futuro há de ser melhor”, esta é a narração das grandes filosofias historicistas. A história trabalha para realizar a liberdade e a felicidade do ser humano. (G. W. Friedrich Hegel,  1788-1793).

“O homem, a acreditar em Hegel, apenas será completamente livre “quando se fizer rodear de um mundo inteiramente criado por ele”.  ão foi isso que precisamente ele fez, e nunca esteve tão acorrentado, tão escravo, como agora.” (“Do Inconveniente de ter nascido”, Emil Cioran – 1973)

A ideia de um futuro melhor colapsou, os sistemas progressistas e o desencantamento ideológico falharam, bem como os próprios sistemas democráticos. Em 1979, Margaret Thatcher (1925-2013) foi eleita primeira-ministra da Grã-Bretanha e em 1980, foi a vez de Ronald Reagan (1911-2004) ser eleito presidente dos Estados Unidos da América. A partir do final do século XX, ambos os países começaram a implementar as políticas de "mercado livre", de domínio económico e de exploração das populações. Foi na Universidade de Chicago sob o controlo de Milton Friedman (1912-2006), que se produziu o modelo económico neoconservador e neoliberal dominante. Milton Friedman defendia que o tratamento de choque era a única via para criar sociedades livres, argumentou que a sua tese de mercado desregulado andava de mão dada com a liberdade e a democracia. A partir de Thatcher e Reagan inaugurou-se no ocidente um projecto reaccionário, já amplamente testado na América do Sul a partir de ditaduras militares. Agora perante a fadiga das democracias ocidentais assistimos ao ressurgimento do fascismo. Estamos perante estados pós-democráticos e observamos o emergir de um retrocesso civilizacional, no qual o resultado é a constituição progressiva de um poder centralizado. Este processo de erosão e declínio significa um falhanço das alternativas ao capitalismo e a total ausência de alternativa económica. O triunfo desta pós-modernidade retrógrada é sinónimo do mal-estar social, político e cultural. A ideia de progresso civilizacional como uma conquista foi uma utopia, bem como a ilusão do “fim da história”. Sem nos apercebermos vivemos uma regressão civilizacional e estamos cada vez mais acondicionados a um sistema totalitário. As ideologias totalitárias de outrora estão de volta, metamorfosearam-se e disfarçaram-se de cordeiro, já não tem posse de lobo.  No passado tentaram impor-se à força, agora impõem-se docilmente e por mais incrível que pareça, e este é o supra-sumo do cinismo, impõem-se perante a “total” liberdade e passividade do individuo actual. É esta dimensão que comporta a regressão.

“O Mundo tornou-se inumano, estão todos conectados, cegamente inarticulados. Obcecados por dinheiro, nas suas carreiras de conteúdo estúpido e arrogante. É impossível conversar com eles, acabamos por lutar contra eles, até queremos destruí-los. Almejamos interacção, mas é impossível. Eles usam dispositivos para qualquer coisa, para reforçarem as suas noções diminutas. Para decidirem onde vão comprar, o que vão comer, que filmes vão ver, cada coisa que ingerem. Não resta nada mais”.

“É como se isto tudo fosse um jogo no qual não me disseram as regras, ou pior, se tivessem dito, não as conseguiria seguir. Tudo o que faço é provocar, fiquei pior do que eles, tornei-me rancorosa. Odeio-me por isso. Eu sou solitária, porque é que este mundo é tão superficial, tão insensível? Por que é tão egoísta? Eu não pertenço a este mundo!” (“Anesthesia”, Tim Blake Nelson - 2015)

O entusiasmo da emancipação dos indivíduos terminou, já ninguém sonha com a liberdade. O hedonismo de celebração, é estéril, agora o ambiente progressista triunfal transformou-se em ansiedade e depressão, a ideologia da saúde é agora o foco. A globalização canibal é o espírito do tempo, está entranhada nos corpos dançantes. A sociedade global multiplica as experiências decepcionantes. O aumento do materialismo que supunha a felicidade eterna, tende ainda mais a aumentar o descontentamento dos homens. A pós-democracia só promove a justiça e o bem-estar, unicamente para quem tem poses. O sucesso escolar e a selecção das elites continuam determinadas pelo meio social de origem, um bom emprego advém dos seus contactos e não do profissionalismo. O trabalho precário e o desregulamento liberal produz a infelicidade e é acompanhado pela angústia, medo e revolta. Aos jovens o futuro é andarem anos a fio de estágio em estágio, aos adultos de meia-idade é a perspectiva do desemprego permanente. A tristeza e a inactividade fazem sentir o homem desperdiçado, inútil para um mundo, indiferente a si. Ao tentar desbravar o seu caminho para a felicidade, o homem só encontra as amarguras do quotidiano tão familiar. Perante as expectativas defraudadas, resta o desencantamento e a fadiga. Na sociedade amargurada a própria cultura é sinónimo de decepção.

“Estamos perante uma situação inédita: nas sociedades tradicionais a oferta era repetitiva e os gostos culturais uniformes e adaptados a elas. Presentemente, o mercado multiplica a paleta de oferta ao mesmo tempo, os gostos se diversificam, se heterogeneizam, se singularizam: por isso, a decepção ligada ao consumo cultural é crónica, inevitável.” ( “A Sociedade da Decepção”, Gilles Lipovetsky- 2006)

Existimos numa cultura de ansiedade e frustração. A felicidade tornou-se impossível, o desejo e a existência são um infinito fado. O tédio, o rancor, a frustração, a desilusão, a vida desperdiçada na futilidade. Vivemos na época da “fadiga de si mesmo”, as depressões e os ansiolíticos fazem-nos sobreviver na amargura da vida.

Em “À rebours ” (1884) de Joris-Karl Huysmans (1848-1907), a personagem principal, des Esseintes, herdeiro de uma família nobre e heróica, após terminar a sua educação religiosa, inicia uma vida de prazeres. Desfrutando tudo o que a sociedade tem para oferecer, até aperceber-se da decadência do mundo que o rodeia. Decide afastar-se e inicia o projecto de criar uma casa-museu com tudo o que admira, a casa de Fontenay:

"Imerso na solidão, ele sonharia ou leria até a noite. Através da contemplação prolongada dos mesmos pensamentos, a sua mente cresceu, as suas ideias vagas e subdesenvolvidas assumiram a forma.”

 "Já estava a sonhar com uma solitude refinada, um deserto confortável, uma arca imóvel para se refugiar do dilúvio interminável da estupidez humana".

“... ele encolheu cada vez mais das realidades da vida e, sobretudo, da sociedade do seu tempo que ele considerava um horror cada vez maior, …”

"Ele morava dentro de si mesmo, alimentado por sua própria substância, como uma criatura torpe que hiberna nas cavernas.”

“Além disso, ele tirou um prazer peculiar de estar num quarto bem iluminado quando todas as casas circundantes estavam envolvidas no sono e na escuridão, uma espécie de prazer em que a vaidade pode ter desempenhado uma pequena parte, um sentimento de satisfação muito especial familiar para aqueles que às vezes trabalham tarde da noite e retiram as cortinas para descobrir que, ao seu redor, o mundo é escuro, silencioso e morto"

“Solitários na vida, nós perguntámo-nos se a solidão da agonia não é o próprio símbolo da existência humana. Lamentável fraqueza de querer viver e morrer em sociedade.” (“Nos Cumes do Desespero”, Emil Cioran – 1934)

* * *

A cada cinco segundos alguém nasce e a cada oito segundos, alguém morre e em cada segundo entre o nascimento e a morte de alguém, nós estamos aqui. Dizem que o tempo está perdido na memória, não podemos tocar, ver ou controlar. Todos estamos presos nesta quarta dimensão e um dia, iremos embora do mundo. A verdade é que não estamos aqui por muito tempo e para a maioria de nós só existe uma oportunidade. Faria melhor nunca termos nascido, é melhor não viver, do que viver a sofrer. Pior ainda é propagar e sujeitar a nossa descendência num mundo sinistro.

“No tempo em que a humanidade, acabada de surgir, fazia as suas primeiras experiências com a infelicidade, ninguém teria acreditado que ela seria um dia capaz de a produzir em série.” (“Silogismos da Amargura”, Emil Cioran – 1934)

EN

        "The weariness of the world is" the obsolescence of man.” ("The Map and the Territory", Michel Houellebecq - 2012).

The idea of progress seems no longer make sense, no one believes in the old Illuminist dogma of the eighteenth century. It is always the same, we have already heard this: "the future will be better," this is the narration of the great historicist philosophies. History works to realize the freedom and happiness of the human being. (G. W. Friedrich Hegel, 1788-1793).

"Man, to believe in Hegel, will only be completely free" when he is surrounded by a world entirely created by him. “But that was not precisely what he did, and he was never as chained, as slave as he is now.” ("The Trouble With Being Born”, Emil Cioran, 1973)

The idea of a better future has collapsed; progressive systems and ideological disenchantment have failed, as democratic systems themselves. In 1979 Margaret Thatcher (1925-2013) was elected Prime Minister of Great Britain and in 1980, it was Ronald Reagan's turn (1911-2004) to be elected President of the United States of America. From the end of the twentieth century, both countries began to implement policies of "free market", economic domination and exploitation of populations. It was at the University of Chicago under the control of Milton Friedman (1912-2006) that the neoconservative and neoliberal dominant economic model was produced. Milton Friedman argued that shock treatment was the only way to create free societies, argued that his unregulated market thesis went hand in hand with freedom and democracy. Since Thatcher and Reagan a reactionary project was inaugurated in the West, already widely tested in South America in military dictatorships. Now in the face of the fatigue of western democracies we see the resurgence of fascism. We are faced with post-democratic states and the emergence of a civilizational regression, in which the result is the progressive constitution of a centralized power. This process of erosion and decline means a failure of the alternatives to capitalism and the complete absence of an economic alternative. The triumph of this post-modernity regression is synonymous of social, political and cultural malaise. The idea of civilizational progress as an achievement was a utopia, as well as the illusion of the "end of history." Without realizing it, we live a civilizational regression and we are increasingly conditioned to a fascist system. The fascist ideologies of the past are back, metamorphosed and disguised as lamb, no longer with the posse of a wolf. In the past they have tried to impose themselves by force, now they impose themselves docilely and as incredible it may seem, this is the pinnacle of cynicism, imposing themselves towards the "total" freedom and passivity of the present individual. It is this dimension that involves regression.

"The World has become inhuman; they are all connected, blindly inarticulate. Obsessed with money in their careers of stupid and arrogant content. It is impossible to talk to them, we end up fighting them, even we want to destroy them. We want interaction, but it is impossible. They use devices for anything to reinforce their diminish notions. To decide where they are going to buy, what they will eat, what movies they will see, what they eat. There is nothing left. "

"It's as if this was all a game in which they did not tell me the rules, or worse, if they had said it, I would not be able to follow them. All I do is provoke, I get worse than them, I became spiteful. I hate myself for it. I'm lonely, why is this world so shallow, so insensitive? Why are you so selfish? I do not belong to this world! "(“Anesthesia", Tim Blake Nelson - 2015)

The enthusiasm of the emancipation of individuals is over, no one dreams of freedom anymore. The hedonism of celebration is sterile, now the triumphal progressive environment has turned into anxiety and depression, health ideology is now the focus. Cannibalistic globalization is the spirit of time; it is embedded in the dancing bodies. Global society multiplies disappointing experiences. The increase in materialism which presupposed eternal happiness tends to further increase the discontent of men. Post-democracy only promotes justice and well-being, only for those who have poses. School success and the selection of elites are still determined by the social environment of origin, a good job comes from their contacts and not from professionalism. Precarious work and liberal deregulation produce unhappiness and are accompanied by anguish, fear, and revolt. For young people the future is to walk for years as a probationary stage, middle-aged adults are the prospect of permanent unemployment. Sadness and inactivity make the man feel wasted, useless for a world, indifferent to himself. In trying to break his path to happiness, man finds only the sorrows so familiar of everyday life. Faced with disappointed expectations, there remains disenchantment and fatigue. In a bitter society, culture itself is synonymous with deception.

"We are faced with an unprecedented situation: in traditional societies the supply was repetitive and the cultural tastes uniform and adapted to them. At present, the market multiplies the palette of supply at the same time the tastes are diversified, heterogenized, singled out: therefore, the deception linked to cultural consumption is chronic, inevitable." (“The Deception Society”, Gilles Lipovetsky 2006)

We exist in a culture of anxiety and frustration. Happiness has become impossible; desire and existence are an infinite fate. The boredom, the rancor, the frustration, the disappointment, the life wasted in futility. We live in the age of "self-fatigue," depressions and anxiolytics make us surreptitious in the bitterness of life.

In "À rebours" (1884) by Joris-Karl Huysmans (1848-1907), the main character, des Esseintes, heritor to a noble and heroic family, after finishing his religious education, begins a life of pleasures, enjoying everything that society has to offer, until it realizes the decadence of the world that surrounds it. He decides to depart and begins the project of creating a house-museum with everything he admires, the house of Fontenay:

"Immersed in solitude, he would dream or read until the night. Through prolonged contemplation of the same thoughts, his mind grew; his vague and underdeveloped ideas took shape."

 "I was already dreaming of a refined solitude, a comfortable desert, a motionless ark to escape the endless deluge of human stupidity."

"... he shrank more and more from the realities of life and, above all, from the society of his time which he considered an ever greater horror ..."

"He lived within himself, fed by his own substance, like a clumsy creature hibernating in the caves."

"In addition, he took a peculiar pleasure of being in a well-lit room when all the surrounding houses were enveloped in sleep and darkness, a kind of pleasure in which vanity may have played a small part, a very special feeling of satisfaction familiar to those who sometimes work late at night and draw the curtains to discover that around them the world is dark, silent and dead.”

"Lonely in life, we wonder if the loneliness of agony is not the very symbol of human existence. Regrettable weakness of wanting to live and die in society." ("On the Heights of Despair", Emil Cioran - 1934)

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Every five seconds someone is born and every eight seconds someone dies and every second between the birth and the death of someone, we are here. They say that time is lost in memory; we cannot touch, see or control. We are all trapped in this fourth dimension and one day we will leave the world. The truth is that we are not here for very long and for most of us there is only one opportunity. It would be better if we had never been born, it is better not to live, than to live in suffer. Worse still is to propagate and subjugate our offspring in a sinister world.

"At a time when humanity, having just emerged, made its first experiences of unhappiness, no one would have believed that it would someday be able to produce it in series." ("All Gall Is Divided", Emil Cioran - 1934)