Paisagem

Paisagem

A paisagem que observamos ao percorrer o Concelho de Porto de Mós resulta de um conjunto de fenómenos naturais conjugados com a ação do homem ao longo da história.

A sua orografia particular com cumes arredondados, vales suspensos, escarpas rochosas, cascalheiras, lapiaz, e algares, moldada ao longo de milhões de anos, contrasta com os vales seccionados por muros de pedra, com pequenas parcelas cultivadas, e manchas de carvalhal, que, a par do azinhal dominou as antigas florestas neste território.

Á utilização do fogo, o pastoreio e a desflorestação desde os primórdios da colonização deste território, junta-se, no presente, às crateras abertas pelas pedreiras, que, sendo o motor atual da economia local não deixa de ser uma ferida na paisagem e a delapidação de um património natural para as gerações futuras.

A flora vascular e a vegetação presente no Concelho de Porto de Mós é rica e diversa mas também frágil e ameaçada. Regista-se hoje, para este concelho, cerca de 570 espécies incluindo relíquias paleoclimáticas, endemismos lusitanos ou ibéricos, raridades e, espécies incluídas na Lista Vermelha da Flora Vascular de Portugal Continental, protegidas por diretivas europeias e legislação nacional.

Para melhor compreender a presente paisagem deste território é fundamental conhecer um conjunto de fenómenos de carácter natural e antrópico que estão na sua origem e, consequentemente, na forma como moldaram o território do Concelho de Porto de Mós.

- Os últimos 500 milhões de anos - das Florestas Tropicais às Florestas Marcescentes e Esclerófilas Mediterrânicas.

510-363 Ma BP (*) Ma BP - Milhões de anos antes do presente

O Ordovico (510-439 Ma BP*) é o período referenciado para o aparecimento das primeiras plantas terrestres (semelhantes aos musgos de hoje) que terão invadido o nosso continente, dando inicio à colonização, a que se seguiria, as primeiras plantas vasculares (439-409Ma BP), antecedentes das primeiras árvores e florestas (período Devónico 409-363 Ma BP).

363-245 Ma BP

As florestas do final do Paleozoico (períodos Carbonífero, 363­–290 Ma BP, e Pérmico, 290–245 Ma BP) produziram enormes quantidades de biomassa que deu origem aos atuais depósitos de carvão, fonte de exploração na região de Porto de Mós num passado recente, como testemunham as minas da Bezerra na Freguesia de Serro Ventoso.


legenda- foto Minas de Carvão em Bezerra (Serro Ventoso) . Entre 1740 e 1876, as minas da Bezerra com uma exploração muito inconstante retiraram o carvão, aproveitando níveis linhitosos do Jurássico Superior nesta localidade da Freguesia de Serro Ventoso. Entre 1885 e 1888 deu-se o período de maior expansão da atividade desta mina. O carvão utilizado na indústria, alimentando a Central Termoelétrica de Porto de Mós (que abastecia Porto de Mós e Batalha) e as Empresas Cimenteiras de Maceira, foi transportado pela única Linha de Caminhos de Ferro Mineira de Alta Montanha (1928), existente em Portugal.

o Feto-dos-carvalhos Davallia canariensis (L.) Sm. , feto da família Davalliaceae , é um testemunho vivo de uma espécie que ocorreu durante ao paleozoico. Espécie presente nos dias de hoje nas Freguesias de São Bento e União de Freguesias de Arrimal e Mendiga.

200 a 145 Ma BP

O período Jurássico, é um período de grandes transformações e acontecimentos. O clima quente e húmido por influência de acontecimentos tectónicos como a divisão dos continentes (que permitiu que a humidade do mar chegasse a novas regiões do globo) foi determinante para a proliferação e diversidade das plantas. Tal como nos dias de hoje o fator humidade e disponibilidade de água é fundamental ao sucesso de sobrevivência e colonização por parte das plantas, que se sobrepõe, no limite, ao tipo de solo mais favorável.

O território que é hoje Porto de Mós apresentava nesse período, uma paisagem bem diferente de hoje, com um mar interior de águas calmas e pouco profundas e temperaturas amenas como testemunham os vestígios na praia jurássica de S.Bento.

- Praia Jurássica de S. Bento – ripple marks, marcas de correntes marítimas preservadas na rocha, indicadores incontestáveis do ambiente de há 168 a 170 milhões de anos, quando um mar interior de águas pouco profundas, inundava este território, consequência de um processo de separação da Península Ibérica e continente europeu relativamente à América do Norte.

144 - 65 Ma BP

No Cretácio, último período da era Mesozoica, as plantas com flor passam a controlar o “caminho evolutivo” dos ecossistemas terrestres.

No Juncal (freguesia do Concelho de Porto de Mós), foi identificada e descrita pela primeira vez na Europa uma flor da família Lardizabalaceae (ordem Ranunculales) , à qual foi atribuído o nome Kajanthus lusitanicus Mendes,Crimm, Pais & Friis,

Este vegetal fóssil, terá ocorrido na região durante o período Barremiano superior - Aptiano inferior ( cerca de 125 Ma BP), esta espécie apresenta um conjunto de caracteres que indicia uma relação estreita com as pertencentes à ordem das Laurales da Flora atual como o loureiro (Laurus nobilis L.).

23,8 – 5,3Ma BP

No início da época Miocénica, cobriam a Península Ibérica vastas florestas tropicais e subtropicais, destacando-se as florestas laurifólias, dominadas por espécies de folhas grandes, largas, por norma inteiras, persistentes, sem pelos, rijas, lisas e brilhantes, como podemos encontrar ainda nos dias de hoje em Portugal nos arquipélagos dos Açores e Madeira .

A partir do Miocénico médio, a flora e a vegetação ibéricas foram profundamente marcadas por uma sucessão de convulsões geológicas e macroclimáticas entre as quais a perda de comunicação entre o Oceano Atlântico e o Mar Mediterrânico , o que permitiu a penetração (por um processo natural chamado migração) de plantas africanas como a Erica arbórea L. (urze‑branca), relíquia paleoclimática presente, (entre outras), no Concelho de Porto de Mós.

A urze-branca (Erica arbórea) é uma das plantas que migraram de África para a Europa permitida pela ligação terrestre entre a Península Ibérica e África no final do Miocénico

A continuidade terrestre entre o Norte de Africa e a Península Ibérica ocorrida no final do Miocénico por consequência das alterações alpinas da configuração dos continentes, e a dessecação do Mar Mediterrâneo (3/4 da água do mediterrâneo evaporou-se originando uma grande salina) levam a uma instabilidade climática, a um o progressivo arrefecimento, com uma maior diferença entre as temperaturas e precipitação médias de Verão e de Inverno, provocando uma regressão da área de distribuição ou a extinção das espécies características dos bosques tropicais e subtropicais terciários.

5,3 – 2,0Ma BP

É no final do Terciário que com a abertura do Estreito de Gibraltar, e a consequente entrada de água Atlântica, se isolam as plantas africanas e europeias e, se diversificam os géneros tipicamente mediterrânicos da flora atual da Bacia Mediterrânica, como são exemplo as estevas, os zambujeiros, os pilriteiros e as aroeiras bem presentes nesta região.

É também neste período que surgem pela primeira vez os tipos de comunidades vegetais mais importantes da vegetação mediterrânica atual da Península Ibérica, bem representados no território de Porto de Mós com os bosques de folha persistente os matos‑ altos com espécies de folhas rijas, largas e lustrosas, os estevais, e, possivelmente, as comunidades de plantas aromáticas de calcários, como os tomilhos, rosmaninho e alecrim.


2,0 – 0,01Ma BP

O Plistocénio é um período de continuidade nos movimentos tectónicos Alpinos, pelas Glaciações com alternância de época fria (glaciar) com a quente (interglaciar), e, a consequente alternância no domínio das espécies alpinas ou árticas. Como resultado, dessas transições climáticas rápidas, os organismos com ciclo de vida mais longo foram muito afetados na migração atempada para refúgios adequados e extinguiram-se

As espécies sobreviventes desta flora persistiram em locais quentes e de baixa altitude próximos do litoral, em vales profundos, em escarpas expostas, ou em solos particulares como calcários e rochas ultrabásicas. Entre os descendentes destas relíquias arbóreas ou arbustivas, dos bosques tropicais e subtropicais terciários, destaque para plantas como o zambujeiro, loureiro, medronheiro ou folhado, entre outos, bem presentes no território de Porto de Mós

11.500 anos BP

No início do Holocénico, o aquecimento climático e o aumento da pluviosidade impulsionaram novamente o alargamento da área dos ecossistemas florestais ,e, a substituição das estepes de zimbros e pinheiros por mosaicos de vegetação, pura ou mista de carvalhais, azinhais, sobreirais, bosques de bidoeiros , pinheiros e zimbros.

(foto legenda carvalho-cerquinho (Quercus faginea) em bosque húmido (Figueirinhas – Serro Ventoso)

Holocénico - do último período pós-glaciar ao presente

A precipitação e a temperatura, os dois elementos do clima de maior influência na vegetação, oscilaram, a várias escalas temporais, ao longo do Holocénico.


1.2 Acção Antrópica

Ao longo do tempo as comunidades vegetais alteram-se naturalmente, em ciclos mais ou menos longos num fenómeno designado de sucessão ecológica (Honrado et al 2000). No entanto, nada se compara ao impacto da ação do homem, no tempo e no espaço, e ao consequente desequilíbrio dos ecossistemas, e à fragmentação dos habitats e das comunidades vegetais.

A utilização do fogo pelo homem no mediterrânico recua aos 500.000 BP pela colonização da Europa por grupos de Homo ergaster (Homo erectus) . Supõe-se, que as espécies de plantas e animais europeus evoluíram assim sob uma pressão de seleção liderada por hominídeos inteligentes contribuindo para a extinção da macro fauna plistocénica.

11650- 8326a BP

No Mesolítico as populações de humanos concentraram­‑se ao longo de cursos de água.

As florestas deste período integravam um mosaico dinâmico de vegetação arbustiva e herbácea fruto de perturbações naturais de pequena escala como o fogo, pastoreio de grandes herbívoros selvagens, enxurradas e outros fenómenos naturais ,

Pelo final deste período (estima-se 8500 BP) há já um impacto marcante da ação humana com desflorestações através do fogo para incrementar a área de pasto dos herbívoros com interesse cinegético, facilitar a observação de animais e/ou de grupos humanos rivais ou ainda de promover a expansão das espécies arbustivas e herbáceas para recoleção de frutos, bagas e raízes

7500 BP.

Em Portugal, a transição para o Neolítico iniciou‑se com a chegada, de embarcações com pequenos grupos agropastoris da região mediterrânica oriental. Estes colonizadores, que viveram lado a lado com os últimos caçadores‑recolectores ibéricos, praticavam entre outras tecnologias uma agricultura itinerante e pastoreavam ovinos, caprinos e bovinos.

Com a fixação das populações pela agricultura e pastorícia com recurso ao fogo, dá-se inicio a uma espiral progressiva de necessidades e a uma devastação do coberto florestal e, consequentemente, erosão e empobrecimento em nutrientes no solo. Estas práticas tiveram como consequência a conversão das florestas de carvalhos e de outras folhosas em matos baixos de estevas, urzes ou tomilhos e a clareiras povoadas maioritariamente por plantas anuais de ciclo muito curto e baixa produtividade.

foto legenda: a ação do homem tem como consequência a conversão de florestas em áreas de matos (Serra dos Candeeiros)

4800 BP

No território sudoeste da Península Ibérica na transição entre a idade do cobre e a idade do bronze a população atingiu seu pico tendo como consequência um aumento abrupto da aridez ambiental. O contingente populacional da região entrou em colapso.

4000 – 3200 BP

Enquanto que na Idade do Bronze se assiste‑se a uma nova estratégia na implantação de povoados em zonas mais baixas, e, em aumentar fertilidade dos solos com os estrumes dos animais domésticos, com a Idade do Ferro, surge uma nova vaga de desflorestação acelerada com as necessidades de lenha para a fundição de metal (um circulo com 1,5 km de raio de desflorestação correspondia a uma tonelada de ferro fundido).

I século a.C – I século d.C. (Ocupação Romana)

De acordo com as descrições dos autores clássicos, as mesetas e os planaltos e cumes das montanhas ibéricas encontravam‑se intensamente desflorestados, fruto de uma continua mineração de ouro.

As referências de Estrabão (Géográfico Grego séc. I dC), a “um coberto contínuo de árvores dos Alpes a Gibraltar” ou, referindo-se aos habitantes “a dieta dos habitantes da Lusitânia consiste principalmente em carne de cabra" e que "os habitantes das montanhas vivem durante dois terços do ano de bolotas que secam e trituram e depois moem para fazer pão que conservam muito tempo”

Se por um lado os comentários de Estrabão indicam a existência de extensas florestas neste período, as suas referências â importância da cabra na dieta humana, (em uma época em que a maioria dos povos que habitavam o território português dependia da criação de animais, complementada pela agricultura, caça e recoleção), está em linha com uma paisagem de montanhas profundamente alteradas pelo homem (Aguiar, C., Pinto 2007)

Séc. V - VIII

No período que durou os três séculos de ocupação germânica, as populações do território foram fustigadas por numerosas pestes e fomes, a par de um arrefecimento climático. Com uma redução e/ou uma redistribuição que teve por consequência uma recuperação da área de floresta.

Com a conquista dos exércitos muçulmanos na Península Ibérica entre 711 e 716. no Centro e Sul do território português, verificou-se um crescimento da desflorestação estimulada pela construção de frotas navais, continuada, mais tarde, pela reconquista e a fundação de novos povoados, que levaram ao crescimento dos solos agrícolas e uma regressão da área florestal, caracterizada por uma desarborização quase completa e pela dominância absoluta de vegetação arbustiva baixa

No final do Séc. XII

a região de Porto de Mós gozava de uma estabilidade territorial com a proteção dos Hospitalários que ofereciam segurança aos viajantes . Na aldeia de Juncal e suas satélites, multiplicavam-se as azenhas, as noras, os lagares e adegas indicando a relevância da produção de cereais, vinho e frutas. Também na zona serrana de Alcaria, Mendiga, Arrimal, Serro Ventoso e Alqueidão da Serra, alguns vales com agricultura de sequeiro, )e um coberto florestal que disponibilizava caça miúda e grossa. Nos terrenos de encostas declivosas, a criação agropecuária, a que se associava, o olival e uma vocação natural para a produção de azeite.. (Gomes S.A. 2006)

Séc. XIII - XV

No Séc. XIII um máximo populacional tem por consequência um pico de pressão sobre os recursos florestais.

D. Dinis que reinou de 1279-1325 ordenou a fiscalização no corte de madeiras e replantar na zona do Pinhal de Leiria que se encontrava então sobre explorado. Note-se que de acordo com análises polínicas o género Pinus (pinheiro bravo e manso) tinha colonizado espontaneamente parte da faixa arenosa do litoral ocidental antes do Neolítico e diversos investigadores não encontram qualquer fundamento documental sobre a plantação do “pinhal - d’el - rey” – o pinhal de Leiria («Pinhal de Leiria», in Dic. Hist. Port. Vol III, p. 386; C. Baeta Neves, Academia Portuguesa de História , sessão do 9/03/1984). De facto, a primeira evidência do pinheiro bravo, com base apenas na análise de carvões arqueológicos, está registada para a região da Estremadura/Rio Maior, datada de há cerca de 33000 anos BP.(ALVES P. ; MACEDO J. A. Flora e Vegetação Vasculares da Ribeira de S. Pedro de Moel)

O alargamento da agricultura a solos marginais e o aumento da recorrência aos fogos nas montanhas agravaram os fenómenos erosivos e carregaram os grandes rios de sedimentos.

O Convento de Santa Ana de Coimbra das Eremitas Descalças, situava-se na margem esquerda do rio Mondego, arredores de Coimbra. Conhecido por “Celas da Ponte” tem como data da fundação o ano de 1174, e a conclusão em 1184. A continua degradação das instalações com inundações dado ao assoreamento do rio Mondego fruto da erosão das serras a montante, levaram ao abandono deste convento em 1561 e a transferência das freiras para uma quinta em São Martinho (Coimbra).

Baldios - De acordo com Serrão (!981) , na carta de foral dada por D. Manuel I às vilas de Alcanede e Pernes, em 22 de Dezembro de 1514, consta que os maninhos serão doados pelo sesmeiro da Ordem de Avis, pelo que, a origem dos baldios desta região poderá remontar a esta época

Meados Séc. XV - XVII

Durante a Idade Moderna assistiu-se a um progressivo aumento da área cultivada com a redução da área florestal e de pântanos que se drenaram, secaram (Paletto et al., 2008), contribuindo para uma maior erosão dos solos.

O consumo de madeira foi acelerado pela construção naval servindo diferentes propósitos desde os descobrimentos às trocas comerciais da defesa, à pirataria, da pesca do bacalhau e do atum, à indústria do vidro e refinação do açúcar implicando um consumo insustentável da floresta. A madeira preferencial para a construção de navios provinha de carvalhos, sobreiros e de pinheiros, sendo a madeira destes últimos preferencialmente utilizada nos mastros e vergas.

Séc. XVIII

Acontecimentos naturais como o terramoto de 1755 e a reconstrução de Lisboa bem como a série de anos frios e secos e os maus anos agrícolas da viragem do século (Devy-Vareta e Alves, 2007) contribuíram para o agravar da desflorestação, que atinge neste século o seu ponto mais alto de acordo com as conclusões do Relatório subscrito por Ribeiro Delgado (1868) a pedido do Ministro das Obras Publicas, Comercio e Industria.

O baldio assumia um papel de relevo na agricultura de nível local, pois proporcionava o pasto e o mato para a cama do gado, que juntamente com o estrume constituía o fertilizante acessível ao camponês. Também acontecia serem utilizados para cultivo de centeio, recorrendo-se ao sistema de afolhamento após o arroteamento ou a queimadas. Era nestes terrenos comuns, que se obtinha lenha, madeira, carvão e mel (v. Brouwer 1995). No final do século XVIII, o destino dos baldios e maninhos ainda alimentava as «tensões interclassistas» entre povos dos concelhos contra as aristocracias das câmaras.

Séc. XIX

No inicio do Séc. XIX em todas as províncias as serras estava nuas de arvoredo, os cumes eram “desertos” e os locais menos elevados eram cobertos de urzes, carquejas, estevas, sargaços, tojos, silvas, fetos e outras plantas arbustivas e herbáceas. Esta situação volta hoje a ser muito comum.

É com Andrada e Silva (1763-1838), que a intervenção na floresta passará a ser fundamentada e apoiada em medidas técnicas e científicas. e em 1805 iniciam-se os primeiros trabalhos de sistematização de fixação de dunas, com a implementação de pinhais de proteção, trabalhos coordenados pelo Cabo de Guardas do Pinhal de Leiria, sob orientação de Andrada e Silva, autor de “Memória sobre a necessidade e utilidade do plantio de novos bosques em Portugal”. Um livro dedicado a um tema da silvicultura, relacionado com a arborização dos areais costeiros, descreve uma floresta portuguesa destroçada, e em acelerado retrocesso, apesar das muitas Ordenações e Regimentos para a realização de sementeiras e plantações, e para a defesa e conservação da floresta e seus usos.

De acordo com Vila Nova Portugal , (1790-422), este esforço estende-se à região de Porto de Mós onde se sugere o aumento de arvoredo para abundância de lenhas para fornecer as fábricas de Tomar e Torres Novas, destacando também a importância do comércio de madeiras.

Por outro lado e enquanto se se assistia a levantamentos de compartes contra a apropriação dos baldios (v. Peixoto 1990, 337), principalmente no norte do país, onde a organização comunitária era mais vincada (Abel 1988, 314). , na zona de Porto de Mós , apesar de haver baldios, não existem rebanhos comuns, nem vestígios de vida comunal. Cada um podia pastar e apanhar lenha nos baldios, mas nada mais.» (Dias 1984, 16-17) Contudo, a indefinição jurídica dos baldios na época liberal proporcionava situações em que alguns tribunais os consideravam passíveis de aquisição privada por usucapião, enquanto outros os associavam aos bens do domínio público (Bica 2003, 11).

A construção da ferrovia que se iniciou em meados do séc. XIX é mais um duro golpe no destroçado coberto florestal em Portugal. O Relatório do Conselho Nacional do Ambiente e do Desenvolvimento Sustentável (CNADS) intitulado “Reflexão sobre a sustentabilidade da política florestal Nacional” a propósito da desflorestação refere o seguinte: “com a expansão do caminho de ferro e o início da industrialização, nos fins do séc. XIX e início do séc. XX, dá-se nova destruição do que restava de carvalhais de carvalho-negral como matéria prima para as travessas

Séc. XX

Portugal é o país da Europa em que a transição entre a desarborização e a reflorestação foi mais rápida - a área de floresta, que era de 4 a 7% em 1870, passou, num século, para mais de 30% do território continental (Pereira et al., 2009). Mas a que preço?

A reversão do estado da floresta portuguesa, teve um grande impacto para a economia nacional, mas também para a sociedade e, de uma forma irreversível para a biodiversidade.

A rearborização realizada pelos Serviços Florestais entre 1930 e 1960 é um marco notório na história da floresta em Portugal e fruto das mais diversas abordagens, “Quando os lobos uivam” de Aquilino Ribeiro, uma obra incontornável na análise socioeconómica e no impacto da florestação com pinheiro bravo (Pinus pinaster) dos baldios das áreas serranas do Norte e Centro de Portugal neste período.

em 1948, seria publicado pela Direção Geral dos Serviços Florestais e Aquícolas [DGSFA], o Plano de Arborização da Serra d’Aire, da autoria de Bernardino Barros Gomes em que se previa a «Arborização dos terrenos pertencentes a municípios ou particulares» e defendia a aquisição gradual dos terrenos das câmaras pelo governo, enquanto que por outro lado eram concedidas, além das serventias indispensáveis, a permissão para apascentar gados, roçar matos conforme as necessidades locais, sem prejuízo dos trabalhos de arborização, aproveitar águas e lenhas até seis milímetros de diâmetro e a prospeção de minérios em consonância com a legislação. Mas não a possibilidade de extrair lenha.

O termo "arrancar lenha" traduzia uma realidade. Sem aceso às árvores (só lenhas até 6mm de diâmetro) dos baldios os habitantes arrancavam os matos tornando os baldios em áreas depauperadas.

Com este plano a propriedade comum era convertida em propriedade pública enquanto a proliferação dos ‘pinhos’ chocava com outras formas de explorar os recursos naturais, pondo em causa a segurança alimentar e económica das comunidades». (Freire 2004, 204)

Ao mesmo tempo a população encontrava nas áreas de baldio mais pedregosas e consequentemente menos adaptada a povoamentos de pinhal uma estratégia já descrita para os finais do século XVIII na região de Coimbra (v. Baptista 1789, 281) com a prática de propagação de oliveiras e limitação de parcelas à volta dessas oliveiras dispersas pelos baldios que se vieram a tornar em propriedade privadas (Gomes 1948 14-15). Este procedimento foi uma pratica extensível a todo o Concelho de Porto de Mós.

Glebas e colónias agrícolas

Gleba - solo ou terra apropriada para cultivar

Em 1949 que H. de Barros e posteriormente E. Castro Caldas vêm afirmar a necessidade de ensaiar "outros tipos de empresas no aproveitamento agroflorestal das regiões de montanha", criando um ambiente favorável à colonização dos baldios, e, contrariando o movimento pró industria da época.

Em 1953 surge o projeto-lei "Baldios, Maninhos E Exploração Silvo-Pastoril em Comum", numa tentativa de reconhecimento da propriedade comunitária das pequenas povoações serranas.

Em Porto de Mós dá-se a divisão de uma área de baldio total de 754ha em 285 glebas (áreas apropriadas para cultivar) beneficiando 233 famílias. Esta politica colonizadora não irá passar de boas intenções, em 1960 mutos dos colonos tinham partido enquanto os que ficavam se tinham apossado das áreas dos casais desocupados . O projeto das colónias agrícolas resulta num fracasso apesar do mérito nos esforços e nos estudos realizados (Estevão A.J 1983 pag 1237-1240)


A redução drástica das práticas de exploração territorial , sobretudo o pastoreio, a compactação das áreas arborizadas com essências resinosas (com estrema sensibilidade à propagação dos fogos) e o aceleramento do despovoamento nas serras pela falta de recursos locais foram algumas das consequências da aplicação do regime florestal imposto pelo Estado Novo, continuado após os anos 60 com a expansão do eucalipto e, consequentemente, o êxodo rural para as áreas urbanas do litoral diminuindo drasticamente o aproveitamento dos recursos nos baldios e nos usos das terras.



Pós 25 de Abril de 1974

foto a legenda com o abandono e envelhecimento das populações os matagais densos espinhosos ocupam agora os vales com solos mais profundos outrora utilizados para a produção agrícola

Nas florestas a eliminação da figura Guarda Florestal e Guarda Rios retira do combate o conhecimento e os recursos que poderiam fazer frente ao período critico de incêndios florestais que caracteriza o inicio do séc. XXI.

Figuras como Correia da Cunha ou Ribeiro Telles alertaram em tempo útil dos impactos demográficos e no ordenamento das políticas seguidas, infelizmente não foram ouvidos pelos decisores (ante e pós 25 de Abril).

o decreto-lei 39/76, de 19 de Janeiro que definia os baldios como «os terrenos comunitariamente usados e fruídos por moradores de determinada freguesia, ou freguesias, ou parte delas» bastando para a devolução a força direta da lei, com uma reunião da assembleia de compartes que a solicitasse para a tornar efetiva. Segundo Brouwer (1995), após a publicação desta lei, foram criadas 637 assembleias de compartes que reivindicaram os seus baldios aos Serviços Florestais e às autarquias.

A 4 de Maio de 1979 é criado o Parque Natural das Serras de Aire e Candeeiros que têm como objetivo a defesa do património Natural e arquitetónico de uma área de 39000 ha no qual se insere parte do Concelho de Porto de Mós.

em 1995, apenas 132 dessas assembleias de compartes se mantinham operacionais e apenas um terço dos baldios, representando cerca de 141 mil hectares, eram administrados pelas comunidades locais (Brouwer 1995, Mayers e Bass 2004).

Paradoxalmente, como nota Rodrigues (1999, 7): «Os baldios são devolvidos aos povos, mas os povos já não são os mesmos». Com a emigração e o êxodo rural, romperam-se as funções dos baldios e foram-se extinguindo as práticas tradicionais comunitárias que tinham nos montes e baldios um complemento indissociável da actividade agro-pecuária (Rodrigues 1999, Devy-Vareta 2003, Lopes 2007). Diluíram-se «as relações ancestrais dos usos e terras comunitários» (Devy-Vareta 2003, 452) e evidencia-se «uma dupla desarticulação entre a sociedade e a propriedade comunitária e entre a ocupação do baldio e o sistema de utilização da terra» (Rodrigues 1999, 7)

Entre 1988 e 2000 arderam 5843 ha de floresta no território de Porto de Mós o equivalente a 22,31% da área do Concelho. Entre 2001 e 2005 o fogo consumiu 16,67% e entre 2006 e 2010 13,5% da área deste Concelho.

O Sec XXI traz algumas alterações no panorama nacional, mas nem por isso menos preocupações.

O eucalipto passou a a ser a espécie de principal ocupação do espaço florestal em Portugal com um aumento de 13% passando para 812 mil ha, à custa da conversão de áreas ocupadas por pinheiro bravo, matos e culturas agrícolas .

Em 2015 é constituída a Rede Nacional de Áreas Protegidas (RNAP), pelas Áreas Classificadas que integram a Rede Natura 2000 e pelas demais Áreas classificadas ao abrigo de compromissos internacionais assumidos pelo Estado Português, rede esta, onde se integra parte do território do Concelho de Porto de Mós na área integrada no PNSAC

2016 - No âmbito de processo de inspeção realizado ao PNSAC pela Inspeção Geral da Agricultura do Mar do Ambiente e do Ordenamento do Território ,constata-se a inexistência de um plano estratégico crucial para fundamentar as tomadas de decisão, uma situação pouco clara que não acompanhando o novo regime jurídico em vigor.

2018 - Porto de Mós segue a tendência nacional e o eucalipto é espécie de principal ocupação do espaço florestal mais do que todas as outras espécies juntas (pinheiros, carvalhos, sobreiro, azinheira e outras) de acordo com a Carta de Ocupação do Solo (COS 2018). Atualmente, continua a aumentar, com a ocupação de áreas em vales com solos mais profundos outrora ocupados por culturas temporárias e ou pastagens e em áreas de planalto em pleno Parque Natural das Serras de Aire e Candeeiros

2020 - É anunciada a descoberta de uma nova planta para a flora vascular em Portugal no Concelho de Porto de Mós, por António Flor, técnico do corpo de vigilantes da Natureza do ICNF, no mesmo ano em que um fogo consumiu 2000 hectares de matos e floresta nas freguesias de São Bento, Serro e Ventoso e União das Freguesias de Mendiga e Arrimal