Literatura Brasileira



História da Literatura Brasileira em versos


Para a elaboração desta síntese, Ivaldo Nóbrega, em 1988, utilizou a sextilha como forma poética, modalidade composta de seis versos heptassílabos, rimando os versos pares entre si, sendo bastante usada pelos poetas populares, tanto na cantoria oral quanto nos folhetos de cordel.

São cento e quarenta e nove sextilhas, nas quais poderá encontrar informações valiosas, que o ajudarão a conhecer as manifestações literárias brasileiras.

Tarefa proposta: dividir o texto em partes a fim de, em grupos de trabalho, elaborar uma tábua cronológica da Literatura Brasileira e apresentar à turma.

Ao aluno que estuda

E se dedica à leitura

Que se preocupa e pesquisa

Os aspectos da cultura,

Trago em versos um resumo

De nossa literatura.

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Tábua cronológica da Literatura Brasileira

1. A literatura no período colonial

1.1. Primeiras visões do Brasil.

A revelação do Novo Mundo / a literatura de viagens:

  • Carta ao Rei dom Manuel, de Pero Vaz de Caminha;

  • o Tratado da Terra do Brasil e a História da Província de Santa Cruz a Que Vulgarmente Chamamos Brasil, de Pero Magalhães Gândavo;

  • o Tratado Descritivo do Brasil, de Gabriel Soares de Sousa.

A literatura de catequese:

  • o Diálogo sobre a Conversão dos Gentios, composto entre 1556 e 1558 pelo padre Manoel da Nóbrega;

  • o teatro e os poemas do padre José de Anchieta.

1.2. Barroco

  • Pe António Vieira: o engenhoso pregador português.

  • Bento Teixeira, Prosopopéia, de 1601, marco inicial do Barroco no Brasil.

  • Gregório de Mattos: o primeiro grande poeta brasileiro.

1.3. Arcadismo (Neoclassicismo)

Dois momentos: o poético e o ideológico.

  • Cláudio Manuel da Costa: os sonetos amorosos marcam o início do Arcadismo no Brasil.

  • Tomás Antônio Gonzaga: o pastor apaixonado.

  • Basílio da Gama, Uraguai (poema épico de louvor a Marquês de Pombal e sobre o heroísmo indígena).

  • Silva Alvarenga: a sátira política em o Desertor.

  • Alvarenga Peixoto e o nativismo sentimental.

  • Santa Rita Durão, Caramuru - Poema Épico do Descobrimento da Bahia.


2. Romantismo

2.1. Primeira geração: literatura e nacionalidade.

A poesia indianista da primeira geração:

  • Gonçalves de Magalhães, introdutor do Romantismo com Suspiros Poéticos e Saudades.

  • Gonçalves Dias: os índios, a pátria e o amor.

2.2. Segunda geração: idealização, paixão e morte, uma poesia arrebatada.

  • Casimiro de Abreu: versos doces e meigos.

  • Álvares de Azevedo: ironia, amor e morte.

  • Fagundes Varela: uma poesia de transição.

2.3. Terceira geração: a poesia social.

O Condoreirismo: a poesia clama por liberdade.

  • Castro Alves, um poeta de causas: uma, social e moral, a da abolição da escravatura; outra, a república, aspiração política dos liberais mais exaltados.

  • Sousândrade: a identidade americana.

2.4. O romance urbano: retrato da vida na corte.

  • O amor segundo Joaquim Manuel de Macedo.

  • José de Alencar: um crítico dos costumes.

  • Manuel Antônio de Almeida: a estética da malandragem.

2.5. O romance indianista.

  • A prosa indianista de José de Alencar.

2.6. O romance regionalista. O teatro romântico.

  • Alencar e os heróis dos sertões brasileiros.

  • Visconde de Taunay e o patriarcado do interior.

  • Franklin Távora: cantor do Norte.

  • Bernardo Guimarães: o folhetim regionalista.

  • O teatro romântico: Martins Pena e a comédia de costumes.


3. Realismo e Naturalismo.

3.1. Realismo: a sociedade no centro da obra literária.

  • Machado de Assis: um céptico analisa a sociedade de um Brasil em crise.

3.2. Naturalismo: a aproximação entre literatura e ciência.

  • Aluísio Azevedo: o autor das “massas”.

  • Raul Pompeia: um caso particular de estilo híbrido.


4. As estéticas de fim de século.

4.1. Parnasianismo: a “disciplina do bom gosto”.

  • Olavo Bilac, o poeta das estrelas.

  • Raimundo Correia: as imagens mais sugestivas.

  • Alberto de Oliveira: pujança da natureza fluminense e os encantos da mulher brasileira.

4.2. Simbolismo: o desconhecido supera o real.

  • Cruz e Sousa: a transfiguração da condição humana.

  • Alphonsus de Guimaraens: o místico mineiro.


5. O Modernismo

5.1. Pré-modernismo: autores em busca de um país.

O Brasil republicano: conflitos e contrastes.

  • Euclides da Cunha: narrador da guerra do fim do mundo.

  • Lima Barreto: a vida nos subúrbios cariocas.

  • Monteiro Lobato: a decadência do café.

  • Augusto dos Anjos: poeta de muitas faces.

5.2. Primeira geração modernista: ousadia e inovação (poesia do quotidiano).

Semana de Arte Moderna: três noites que fizeram história.

  • Oswald de Andrade: irreverência e crítica.

  • Mário de Andrade: a descoberta do Brasil brasileiro.

  • Manuel Bandeira: olhar terno para o quotidiano.

  • Alcântara Machado: os italianos em São Paulo.

  • Outros autores: Cassiano Ricardo (Martim Cererê); Guilherme de Almeida (A flor que foi um homem); Menotti del Picchia (Juca Mulato); Plínio Salgado (O cavaleiro de Itararé); Raul Bopp (Cobra Morato)

5.3. Segunda geração modernista: misticismo e consciência social (eu e o mundo)

A consolidação de uma estética.

  • Carlos Drummond de Andrade: poeta do finito e da matéria

  • Cecília Meireles: a vida efémera e transitória.

  • Vinícius de Moraes: o cantor do amor maior.

  • Murilo Mendes: o católico visionário.

  • Jorge de Lima: o católico engajado.

5.4. O romance de 1930: a consciência do subdesenvolvimento brasileiro.

A retomada de um olhar realista.

  • Graciliano Ramos: mestre das palavras secas.

  • José Lins do rego: lembranças de um menino de engenho.

  • Rachel de Queiroz: um olhar feminino para o sertão.

  • Jorge Amado: retrato da diversidade económica e cultural.

  • Erico Veríssimo: o intérprete dos gaúchos.

  • Dionélio Machado: as angústias do homem comum.


6. O pós-modernismo

6.1. A poesia participante da geração de 1945 e o Concretismo.

  • A poesia em busca de um caminho: a poesia “equilibrada e séria” de Lêdo Ivo, Péricles Eugênio da Silva Ramos, Geir Campos e Darcy Damasceno.

  • A “máquina” do poema: João Cabral de Melo Neto.

  • Poesia Concreta: Haroldo de Campos, Décio Pignatari e Augusto de Campos.

  • Poesia participante: Ferreira Gullar.

  • Poesia praxis: Mário Chamie.

6.2. A prosa pós-moderna: a reinvenção da narrativa.

  • Guimarães Rosa: o descobridor do sertão universal.

  • Clarice Lispector: a busca incansável da identidade.

6.3. A escrita contemporânea

Décadas de 60 e 70:

  • Os romances-reportagens: José Louzeiro.

  • Os romances que retratam a realidade do país: António Callado, Inácio Loyola Brandão e Ivan Ângelo.

  • Romances com linguagem apurada e força poética: Raduan Nassar.

  • Contos e romances de grande penetração psicológica: Lígia Fagundes Telles.

  • Do grotesco ao banal nos contos de Dalton Trevisan.

  • O romance memorialista de Pedro Nava (painel da cultura brasileira no século XX com os costumes familiares e sua cultura popular).

  • Geração mimeógrafo (final dos anos 70), uma poesia anárquica, satírica e coloquial: Ana Cristina César e Cacaso.

A partir das décadas de 80 e 90:

  • Romance inspirado nos aspectos políticos e sociais da vida nordestina e brasileira: João Ubaldo Ribeiro e J.C. Dantas.

  • Romance intimista: Milton Hatoum.

  • Rubem Fonseca disseca a motivação das suas personagens urbanas em histórias realistas e violentas.

  • Em João Gilberto Noll a sexualidade vem acompanhada de um clima pesado de delírio.

  • A nível da poesia há grande influência do concretismo em Paulo Leminski e Arnaldo Antunes e até mesmo em compositores da MPB como Caetano Veloso.

  • Poesia ligada à região do Pantanal: Manoel de Barros.

  • Outros poetas realizam trabalhos muito pessoais, como José Paulo Paes, Hilda Hilst, Nelson Ascher e Adélia Prado.

Adaptado de: História Concisa da Literatura Brasileira, Alfredo Bosi; Literatura Brasileira – tempos, leitores e leituras, Mª Luiza M. Abaurre e Marcela Pontara; Wikipédia, a enciclopédia livre; http://www.leremcd.hpg.ig.com.br/historia.htm

A condição colonial da Literatura Brasileira


O problema das origens da literatura brasileira não pode formular-se em termos de Europa, onde foi a maturação das grandes nações modernas que condicionou toda a história cultural, mas nos mesmos termos das outras literaturas americanas, isto é, a partir da afirmação de um complexo colonial de vida e de pensamento.

A colônia é, de início, o objeto de uma cultura, o “outro” em relação à metrópole: em nosso caso, foi a terra a ser ocupada, o pau-brasil a ser explorado, a cana-de-açúcar a ser cultivada, o ouro a ser extraído; numa palavra, a matéria-prima a ser carreada para o mercado externo. A colônia só deixa de o ser quando passa a sujeito da sua história. Mas essa passagem fez-se no Brasil por um lento processo de aculturação do português e do negro à terra e às raças nativas; e fez-se com naturais crises e desequilíbrios. Acompanhar este processo na esfera de nossa consciência histórica é pontilhar o direito e o avesso do fenômeno nativista, complemento necessário de todo complexo colonial.

Importa conhecer alguns dados desse complexo, pois foram ricos de conseqüências econômicas e culturais que transcenderam os limites cronológicos da fase colonial.

Nos primeiros séculos, os ciclos de ocupação e de exploração formaram ilhas sociais (Bahia, Pernambuco, Minas, Rio de Janeiro, São Paulo), que deram à Colônia a fisionomia de um arquipélago cultural. E não só no facies geográfico: as ilhas devem ser vistas também na dimensão temporal, momentos sucessivos que foram do nosso passado desde o século XVI até a Independência.

Assim, de um lado houve a dispersão do país em subsistemas regionais, até hoje relevantes para a história literária; de outro, a seqüência de influxos da Europa, responsável pelo paralelo que se estabeleceu entre os momentos de além-Atlântico e as esparsas manifestações literárias e artísticas do Brasil-Colônia: Barroco, Arcádia, Ilustração, Pré-Romantismo…

Acresce que o paralelismo não podia ser rigoroso pela óbvia razão de estarem fora os centros primeiros de irradiação mental. De onde, certos descompassos que causariam espécie a um estudioso habituado às constelações da cultura européia: coexistem, por exemplo, com o barroco do ouro das igrejas mineiras e baianas a poesia arcádica e a ideologia dos ilustrados que dá cor doutrinária às revoltas nativistas do século XVIII. Códigos literários europeus mais mensagens ou conteúdos já coloniais conferem aos três primeiros séculos de nossa vida espiritual um caráter híbrido, de tal sorte que parece uma solução aceitável de compromisso chamá-lo luso-brasileiro, como o fez Antônio Soares Amora na História da Literatura Brasileira.

Convém lembrar, por outro lado, que Portugal, perdendo a autonomia política entre 1580 e 1640, e decaindo verticalmente nos séculos XVII e XVIII, também passou para a categoria de nação periférica no contexto europeu; e a sua literatura, depois do climax da épica quinhentista, entrou a girar em torno de outras culturas: a Espanha do Barroco, a Itália da Arcádia, a França do Iluminismo. A situação afetou em cheio as incipientes letras coloniais que, já no limiar do século XVII, refletiriam correntes de gosto recebidas “de segunda mão”, O Brasil reduzia-se à condição de subcolônia.

A rigor, só laivos de nativismo, pitoresco no século XVII e já reivindicatório no século seguinte, podem considerar-se o divisor de águas entre um gongórico português e o baiano Botelho de Oliveira, ou entre um árcade coimbrão e um lírico mineiro. E é sempre necessário distinguir um nativismo estático, que se exaure na menção da paisagem, de um nativismo dinâmico, que integra o ambiente e o homem na fantasia poética (Basílio da Gama, Silva-Alvarenga, Sousa Caldas).

O limite da consciência nativista é a ideologia dos inconfidentes de Minas, do Rio de Janeiro, da Bahia e do Recife. Mas, ainda nessas pontas-de-lança da dialética entre Metrópole e Colônia, a última pediu de empréstimo à França as formas de pensar burguesas e liberais para interpretar a sua própria realidade. De qualquer modo, a busca de fontes ideológicas não-portuguesas ou não-ibéricas, em geral, já era uma ruptura consciente com o passado e um caminho para modos de assimilação mais dinâmicos, e propriamente brasileiros, da cultura européia, como se deu no período romântico.

Resta, porém, o dado preliminar de um processo colonial, que se desenvolveu nos três primeiros séculos da vida brasileira e condicionou, como nenhum outro, a totalidade de nossas reações de ordem intelectual: e se se prescindir da sua análise, creio que não poderá ser compreendido na sua inteira dinâmica nem o próprio fenômeno da mestiçagem, núcleo do nosso mais fecundo ensaísmo social de Sílvio Romero a Euclides, de Oliveira Viana a Gilberto Freyre.

Textos de informação

Os primeiros escritos da nossa vida documentam precisamente a instauração do processo: são informações que viajantes e missionários europeus colheram sobre a natureza e o homem brasileiro. Enquanto informação, não pertencem à categoria do literário, mas à pura crônica histórica e, por isso, há quem as omita por escrúpulo estético (José Veríssimo, por exemplo, na sua História da Literatura Brasileira). No entanto, a pré-história das nossas letras interessa como reflexo da visão do mundo e da linguagem que nos legaram os primeiros observadores do país. É graças a essas tomadas diretas da paisagem, do índio e dos grupos sociais nascentes, que captamos as condições primitivas de uma cultura que só mais tarde poderia contar com o fenômeno da palavra-arte.

E não é só como testemunhos do tempo que valem tais documentos: também como sugestões temáticas e formais. Em mais de um momento a inteligência brasileira, reagindo contra certos processos agudos de europeização, procurou nas raízes da terra e do nativo imagens para se afirmar em face do estrangeiro: então, os cronistas voltaram a ser lidos, e até glosados, tanto por um Alencar romântico e saudosista como por um Mário de Andrade ou um Oswald de Andrade modernistas. Daí o interesse obliquamente estético da “literatura” de informação.

A carta de Caminha

Dos textos de origem portuguesa merece destaque a Carta de Pero Vaz de Caminha a el-rei D. Manuel, referindo o descobrimento de uma nova terra e as primeiras impressões da natureza e do aborígene.

O que para a nossa história significou uma autêntica certidão de nascimento, a Carta de Caminha a D. Manuel, dando notícia da terra achada, insere-se em um gênero copiosamente representado durante o século XV em Portugal e Espanha: a literatura de viagens. Espírito observador, ingenuidade (no sentido de um realismo sem pregas) e uma transparente ideologia mercantilista batizada pelo zelo missionário de uma cristandade ainda medieval: eis os caracteres que saltam à primeira leitura da Carta e dão sua medida como documento histórico. Descrevendo os índios:

A feição deles é serem pardos maneiras d’avermelhados de bons rostros e bons narizes bem feitos. Andam nus sem nenhuma cobertura, nem estimam nenhuma cousa cobrir nem mostrar suas vergonhas e estão acerca disso com tanta inocência como têm de mostra o rosto.

Em relevo, a postura solene de Cabral:

O capitão quando eles vieram estava assentado em uma cadeira e uma alcatifa aos pés por estrado e bem vestido com um colar d’ouro mui grande ao pescoço.

Atenuando a impressão de selvajaria que certas descrições poderiam dar:

Eles porém contudo andam muito bem curados e muito limpos e naquilo me parece ainda mais que são como aves ou alimárias monteses que lhes faz o ar melhor pena e melhor cabelo que as mansas, porque os corpos seus são tão limpos e tão gordos e tão fremosos que não pode mais ser.

A conclusão é edificante:

De ponta a ponta é toda praia… muito chã e muito fremosa. […] Nela até agora não pudemos saber que haja ouro nem prata… porém a terra em si é de muito bons ares assim frios e temperados como os de Entre Doiro-e-Minho. Águas são muitas e infindas. E em tal maneira é graciosa que querendo-a aproveitar, dar-se-á nela tudo por bem das águas que tem, porém o melhor fruto que nela se pode fazer me parece que será salvar esta gente e esta deve ser a principal semente que vossa alteza em ela deve lançar.

Adaptado de: História Concisa da Literatura Brasileira, Alfredo Bosi, São Paulo, Editora Cultrix, 1995.

A Carta de Achamento do Brasil, de Pero Vaz de Caminha - leitura metódica


TEXTO

Senhor:

Posto que o capitão desta vossa frota, e assim os outros capitães escrevam a Vossa Alteza a nova do achamento desta vossa terra nova, que nesta navegação agora se achou, não deixarei também de dar minha conta disso a Vossa Alteza, o melhor que eu puder, ainda que — para o bem contar e falar— o saiba fazer pior que todos.

Tome Vossa Alteza, porém, minha ignorância por boa vontade, e creia bem por certo que, para alindar nem afear, não porei aqui mais do que aquilo que vi e me pareceu.

Da marinhagem[1] e singraduras[2] do caminho não darei aqui conta a Vossa Alteza, porque o não saberei fazer, e os pilotos devem ter esse cuidado. Portanto, Senhor, do que hei-de falar começo e digo:

A partida de Belém, como Vossa Alteza sabe, foi, segunda-feira, 9 de Março. Sábado, 14 do dito mês, entre as oito e as nove horas, nos achámos entre as Canárias, mais perto da Grã-Canária, onde andámos todo aquele dia em calma, à vista delas, obra de três a quatro léguas. E domingo, 22 do dito mês, às dez horas, pouco mais ou menos, houvemos vista das ilhas de Cabo verde, ou melhor, da Ilha de São Nicolau, segundo o dito Pêro Escobar, piloto.

Na noite seguinte, segunda-feira, ao amanhecer, se perdeu da frota Vasco Ataíde com sua nau, sem haver tempo forte nem contrário para que tal acontecesse. Fez o capitão suas diligências para o achar, a uma e outra parte, mas não apareceu mais! E assim seguimos nosso caminho, por este mar, de longo[3], até que, terça-feira das Oitavas de Páscoa[4], que foram 21 dias de Abril, estando da dita ilha obra de seiscentas e sessenta ou seiscentas e setenta léguas, segundo os pilotos diziam, topámos alguns sinais de terra, os quais eram muita quantidade de ervas compridas, a que os mareantes chamam botelho[5], assim como outras a que dão o nome de rabo-de-asno[6]. E, quarta-feira seguinte, pela manhã topámos aves e que chamam fura-buxos[7].

Neste dia, a horas de véspera[8], houvemos vista de terra! Primeiramente dum grande monte, mui alto e redondo; e doutras serras mais baixas a sul dele; e de terra chã, com grandes arvoredos: ao monte alto o capitão pôs nome — o MONTE PASCOAL — e à terra — a TERRA DA VERA CRUZ.

Mandou lançar a prumo. Acharam vinte e cinco braças[9], e, ao sol-posto, obra de seis léguas de terra, surgimos âncoras[10], em dezanove braças — ancoragem limpa. Ali permanecemos toda aquela noite. E à quinta-feira, pela manhã, fizemos vela e seguimos direitos à terra, indo os navios pequenos diante, por dezassete, dezasseis, quinze, catorze, treze, doze, dez e nove braças, até meia légua da terra, onde todos lançámos âncoras em frente à boca de um rio. E chegaríamos a esta ancoragem às dez horas pouco mais ou menos.

Dali avistámos homens que andavam pela praia, obra de sete ou oito, segundo disseram os navios pequenos por chegarem primeiro.

Então lançámos fora os batéis e esquifes[11]; e vieram logo todos os capitães das naus a esta nau do capitão-mor, onde falaram entre si. E o capitão-mor mandou em terra no batel a Nicolau Coelho para ver aquele rio. E tanto que[12] ele começou de ir para lá, acudiram pela praia homens, quando aos dois, quando aos três, de maneira que, ao chegar o batel, à boca do rio, já ali havia dezoito ou vinte homens.

Eram pardos[13], todos nus, sem coisa alguma que lhes cobrisse suas vergonhas[14]. Nas mãos traziam arcos com suas setas. Vinham todos rijamente[15] sobre o batel; e Nicolau Coelho lhes fez sinal que pousassem os arcos. E eles os pousaram.

Ali não pôde deles haver fala. nem entendimento de proveito, por o mar quebrar na costa. Deu-lhes somente um barrete vermelho e uma carapuça[16] de linho que levava na cabeça e um sombreiro[17] preto. Um deles deu-lhe um sombreiro de penas de ave compridas, com uma copazinha pequena de penas vermelhas e pardas como de papagaio; e outro deu-lhe um ramal[18] grande de continhas brancas, miúdas, que querem parecer de aljaveira[19]. as quais peças creio que o capitão manda a Vossa Alteza, e com isto se volveu às naus por ser tarde e não poder haver deles mais fala, por causa do mar.

Na noite seguinte ventou tanto sueste com chuvaceiros que fez caçar[20] as naus, e especialmente a capitânia. E sexta pela manhã, às oito horas, pouco mais ou menos nos, por conselho dos pilotos, mandou o capitão levantar as âncoras e fazer vela; e fomos ao longo da costa, com os batéis e esquifes amarrados à popa na direcção do norte, para ver se achávamos alguma abrigada[21] e bom pouso, onde nos demorássemos, para tomar água e lenha. Não que nos minguasse, mas por aqui nos acertarmos[22]

Quando fizemos vela, estariam já na praia assentados perto do rio obra de sessenta ou setenta homens que se haviam juntado aos poucos e poucos. Fomos de longo[23], e mandou o capitão aos navios pequenos que seguissem mais chegados à terra e, se achassem pouso seguro para as naus, que amainassem.

E, velejando nós pela costa, acharam os ditos navios pequenos, obra de dez léguas do sítio donde tínhamos levantado ferro, um recife[24] com um porto dentro, muito bom e muito seguro, com uma mui larga entrada. E meteram-se dentro e amainaram[25]. As naus arribaram sobre eles; e um pouco antes do sol-posto amainaram também, obra de uma légua do recife, e ancoraram em onze braças.

E estando Afonso Lopes, nosso piloto, em um daqueles navios pequenos, por mandado do capitão, por ser homem vivo e destro para isso, meteu-se logo no esquife a sondar o porto dentro; e tomou dois daqueles homens da terra, mancebos e de bons corpos, que estavam numa almadia[26]. Um deles trazia um arco e seis ou sete setas; e na praia andavam muitos com seus arcos e setas; mas de nada lhes serviram. Trouxe-os logo, já de noite, ao capitão, em cuja nau foram recebidos com muito prazer e festa.

A feição deles é serem pardos, maneira de avermelhados, de bons rostos e bons narizes, bem feitos. Andavam nus, sem cobertura alguma[27]. Não fazem o menor caso de encobrir ou de mostrar suas vergonhas; e nisso têm tanta inocência como em mostrar o rosto. Ambos traziam os beiços de baixo furados e metidos neles seus ossos brancos[28] e verdadeiros, do comprimento duma mão travessa, da grossura dum fuso de algodão, agudos na ponta como furador. Metem-nos pela parte de dentro do beiço; e a parte que lhes fica entre os beiços e os dentes é feita como roque de xadrez[29], ali encaixado de tal sorte que não os molesta, nem os estorva no falar, no comer ou no beber.

Os seus cabelos são corredios[30]. E andavam tosquiados, de tosquia alta, mais que de sobrepente, de boa grandura e rapados até por cima das orelhas. E um deles trazia par baixo da solapa[31], de fonte a fonte para detrás, uma espécie de cabeleira de penas de ave amarelas, que seria do comprimento de um coto, mui basta e mui cerrada, que lhe cobria o toutiço e as orelhas. E andava pegada aos cabelos, pena e pena, com uma confeição branda como cera[32] (mas não o era), de maneira que a cabeleira ficava mui redonda e mui basta, e mui igual, e não fazia míngua mais lavagem para a levantar.

O capitão, quando eles vieram, estava sentado em uma cadeira, bem vestido, com um colar de ouro mui grande ao pescoço, e aos pés uma alcatifa por estrado. Sancho Tovar, Simão de Miranda, Nicolau Coelho, Aires Correia, e nós outros que aqui na nau com ele vamos, sentados no chão, pela alcatifa. Acenderam-se tochas. Entraram. Mas não fizeram sinal de cortesia, nem de falar ao capitão nem a ninguém. Porém um deles pôs olho no colar do capitão, e começou a acenar com a mão para terra e depois para o colar, como que nos dizendo que ali havia ouro[33]. Também olhou para um castiçal de prata e assim mesmo acenava para terra e novamente para o castiçal como se lá também houvesse prata.

Mostraram-lhe um papagaio pardo que o capitão traz consigo; tomaram-no na mão e acenaram para terra, como quem diz que os havia ali. Mostraram-lhes um carneiro: Não fizeram caso. Mostraram-lhes uma galinha; quase tiveram medo dela: não lhe queriam pôr a mão; e depois a tomaram como que espantados.

Deram-lhes ali de comer: pão e peixe cozido, fartéis[34], mel e figos passados. Não quiseram comer quase nada daquilo; e se alguma coisa provavam, logo a lançavam fora. Trouxeram-lhes vinho numa taça; mal lhe puseram a boca; não gostaram nada, nem quiseram mais. Trouxeram-lhes água em uma albarrada[35]. Não beberam. Mal a tomaram na boca, que lavaram, e logo a lançaram fora.

Viu um deles umas contas de rosário, brancas; acenou que lhas dessem, folgou muito com elas, e lançou-as ao pescoço. Depois tirou-as e enrolou-as no braço e acenava para a terra e de novo para as contas e para o colar do capitão, como dizendo que dariam ouro por aquilo.

Isto tomávamos nós assim por assim o desejarmos. Mas ele queria dizer que levaria as contas e mais o colar, isto não o queríamos nós entender, porque não lho havíamos de dar. E depois tornou as contas a quem lhas dera.

Então, estiraram-se de costas na alcatifa, a dormir [...].

Excerto da Carta de Pero Vaz de Caminha a El-Rei D. Manuel, sobre o achamento do Brasil

Mem-Martins, Europa-América, s. d., pp. 59-68.


VOCABULÁRIO:

[1] Marinhagem — Arte de navegar; faina de bordo.

[2] Singraduras — Navegação diária (24 horas) realizada por navio à vela, e geralmente contada entre o meio-dia de dois dias seguidos.

[3] De longo — Movimento progressivo e rectilíneo em relação a um ponto determinado. (Jaime Cortesão, A Carta de Pêro Vaz de Caminha).

[4] Oitavas de Páscoa —Oito dias depois da Festa da Páscoa, que terminam no chamado Domingo de Pascoela.

[5] Botelho -— Espécie de alga, também chamada «sargaço».

[6] Rabo-de-asno — Supõe-se que seja uma planta medicinal usada para bloquear a hemorragia nasal.

[7] Fura-buxos — Aves aquáticas de família dos Procelarídeos, conhecidas também, no século XVI, pelos nomes de «chiretas» e «estapagados», típicas da costa portuguesa e do mar dos Açores. (Manuel Simões, A Literatura de Viagens nos Séculos XVI e XVII, Editorial Comunicação, Lisboa, 1985.)

[8] Horas de véspera — Hora canónica em que se rezava a oração da tarde, entre as 15 horas e o pôr do Sol.

[9] Braça — Medida equivalente a cerca de 2,20 m.

[10]Surgimos âncoras — Lançámos as âncoras.

[11] Esquifes — Pequenas embarcações transportadas nas naus, utilizadas para salvamento em caso de naufrágio ou como transporte para terra.

[12] Tanto que – Assim que.

[13] Pardos — Cor entre o branco e o preto.

[14] Vergonhas — De emprego habitual nos séculos XV e XVI para denominar as partes pudendas [sic].

[15] Rijamente — Decididamente.

[16] Barretes, carapuças — Idênticos aos que se vêem nos painéis de Nuno Gonçalves.

[17] Sombreiro— Chapéu de abas largas.

[18] Ramal — Colar.

[19] Continhas [...] aljaveira — De significado ainda não muito bem esclarecido. Supõe-se serem semente deste tipo de planta (aljaveira), ou como quer Jaime Cortesão (op. cit.), moluscos dos mares tropicais que, na Europa, se encontravam em colares, cuja matéria servi a para marchetar objectos de indústria sumptuária.

[20] Caçar – Sair a nau do seu rumo por acção do vento, maré ou qualquer outro imprevisto da natureza.

[21] Abrigada — Sítio abrigado das intempéries.

[22] Nos acertarmos – Nos orientarmos.

[23] Fomos de longo – Navegámos ao longo de.

[24] Recife – Rochedo, que corresponde ao actual topónimo Coroa Vermelha. (Manuel Simões., Op. cit.).

[25] Amainaram – Recolheram as velas e pararam o barco.

[26] Almadia — Embarcação comprida e estreita usada pelos indígenas.

[27] Bons rostos […] sem cobertura alguma — Esta perfeição física dos indígenas teria impressionado bastante quem com eles lidou nestes primeiros contactos. Assim, a sua nudez demonstraria a sua inocência [...]. (M. Viegas Guerreiro, Carta a El-rei D.Manuel sobre o achamento do Brasil)

[28] Ossos brancos – Adorno de ponta fina que se prolongava para fora dos lábios e com uma base larga a segurar, «[…] ainda hoje o usam os índios do Brasil, que, por isso, se designam Botocudos. Outras populações do globo se enfeitam com ele, como os Macondes de Moçambique e de Tanganhica, mas estes introduzem-no no lábio superior.» (M. Viegas Guerreiro, op. cit.)

[29] Roque de xadrez — Nome dado às quatro torres do xadrez.

[30] Corredios – lisos.

[31] Solapa – Modo de os indígenas usarem os cabelos, parte caindo sobre a testa e parte sobre o resto do crânio, que era rapado.

[32] Segundo Jaime Cortesão (op cit.) «esta cera era almácega, ou seja, a resina da pistácia lentisco... Como essa goma era branda e a cabeleira de penas muito basta e unida, podia facilmente levantar-se, ou separar-se dos cabelos, sem lavagem».

[33] Ali havia ouro — Pelo menos foi o que os portugueses quiseram entender pelos gestos dos índios: «Isto tomávamos nós por assim o desejarmos.»

[34] Fartéis — Bolos de açúcar e amêndoas em capa de farinha de trigo.

[35] Albarrada — Vasilha própria para beber água e vinho.

TAREFAS

1. Procure explorar através da escrita a sua reação emocional perante a riqueza informativa e a frescura descritiva do texto que leu.


2. Orientação da leitura do excerto da Carta de Pero Vaz de Caminha:

A — Informação e análise histórica

• quem foi Pêro Vaz de Caminha; sua função na armada;

• breve confronto entre o propósito deste autor e o de Fernão Lopes na Crónica de D. João I.

B — leitura etnográfica e antropológica

• projeção da visão europeísta na nova civilização.

C — Valor literário da Carta

• marcas do género epistolar e diarístico;

• progressão do relacionamento entre marinheiros e indígenas;

• tom directo e espontâneo da narração;

• poder de observação e visualismo nas descrições;

• frase longa, sintaxe linear (SVO) e a variedade corrente da linguagem;

• imagem do descobridor português face ao nativo (afabilidade?, arrogância?, respeito?, indiscrição?, etc.).


3. Elabore um comentário global, tendo em conta os tópicos de aplicação que se seguem.

  • Introdução: contexto literal, histórico, cultural; resumo por partes lógicas.

  • Desenvolvimento: explicação, comentário e fundamentação (marcas distintivas, retratos, comunicação, chefes, códigos).

  • Conclusão: coerência; contexto; ilações.


EXEMPLO DE COMENTÁRIO DE TEXTO

O alvoroço do «Descobrimento da Terra Nova que fez Pedro Alvarez» é a tónica dominante da Carta do Achamento de Pero Vaz de Caminha. Narrativa em espiral, centrada sobre um refluxo contínuo à volta de dados e reacções análogos, este documento precioso da Literatura quinhentista de Viagens e da Expansão é um misto de relato, descrição e comentário, formas de discurso que combinam com simplicidade e formosura estilísticas a espontaneidade dos sentimentos humanos ante a frescura de uma novidade e a fidelidade objectiva ao que é testemunhado. Texto antropológico por excelência, como primeiro registo português da visão do ameríndio, a Carta é hoje um notável documento histórico de uma descoberta e de uma época, através do qual perpassa uma complexa rede de vivências humanas que nos permitem inscrevê-lo no domínio do texto literário.

O excerto transcrito, extraído do início do relato, reporta-se, segundo um critério cronológico habitual, aos primeiros três dias dos dez que envolvem a totalidade do texto, de 22 a 24 de Abril de 1500.

Após uma breve introdução, na qual se procede à justificação da iniciativa da Carta, dirigida ao rei D. Manuel I, segundo os tópicos retóricos da modéstia e da objectividade do discurso cronístico, o relato alude à partida de Belém e à passagem das Canárias e Cabo Verde, para se ocupar, logo de seguida, da descoberta da terra de Vera Cruz, ou do Brasil, após a identificação dos chamados «sinais de terra».

A cor, a nudez, os arcos e as setas são as marcas distintivas do grupo étnico descoberto: «Eram pardos, todos nus, sem coisa alguma que lhes cobrisse suas vergonhas. Nas mãos traziam arcos com suas setas».

Na recepção a dois mancebos, outras marcas importantes, de grande pormenor descritivo, referem os traços fisionómicos, os cabelos, e os objectos decorativos: «A feição deles é serem pardos, maneira de avermelhados, de bons rostos e bons narizes, bem feitos.[…]. Ambos trazem os beiços de baixo furados e metidos neles seus ossos brancos e verdadeiros, do comprimento duma mão travessa, de grossura dum fuso de algodão, agudos na ponta como furador […]. Os seus cabelos são corredios. E andavam tosquiados. de tosquia alta, mais de sobre-pente, de boa grandura e rapados até cima das orelhas».

A troca de presentes é o primeiro sinal de amistosa comunicação, baixados os símbolos da bandeira defensiva e ofensiva, e os arcos e setas: «Deu-lhe [e não ‘dou-lhes’ — um erro de transcrição que corrigimos no texto] somente um barrete vermelho e uma carapuça de linho que levava na cabeça e um sombreiro preto. Um deles deu-lhe um sombreiro de penas de ave compridas, com uma copazinha pequena de penas vermelhas e pardas como de papagaio; e outro deu-lhe um ramal grande de continhas brancas, miúdas. que querem parecer aljaveira».

Mas, em contraste com o reconhecimento da figura hierárquica do seu chefe, patente na «espécie de cabeleira de penas», não é difícil aos nativos identificar os sinais do estatuto do cristão europeu: «O capitão, quando eles vieram, estava sentado em uma cadeira, bem vestido, com um colar de ouro mui grande ao pescoço, e aos pés uma alcatifa por estrado [...]. Entraram. Mas não fizeram sinal de cortesia, nem de falar ao capitão nem a ninguém».

A preferência comunicativa, expressa pelo código visual, vai para a verificação das principais semelhanças e diferenças culturais entre os dois povos, agora em situação dialógica— os metais [«um deles pôs olho no colar do capitão»], os animais [«Mostraram-lhes um papagaio pardo que o capitão traz consigo; tomaram-no na mão e acenaram para terra»], os alimentos [«não quiseram comer quase nada daquilo»], as contas do rosário [«acenou que lhas dessem»].

Em contraste, ainda, com a atitude contrária, como adiantará o texto, os indígenas repousam de noite junto dos interlocutores estrangeiros: «Então estiraram-se de costas na alcatifa, a dormir».

E a Carta, continuando a revelação cultural do povo descoberto, vai apostar na predisposição do ameríndio para colher o cristianismo como a principal semente de civilização europeia, cuja frutificação se espera rápida e copiosa.

Assim, este texto, documento fundamental da revelação contrastiva de um Outro, permite-nos uma reflexão sobre a singularidade cultural do que é ser português e europeu. Esta consciência da diferença que tipo de reacção provoca nos jovens de hoje: racismo, racialismo, xenofobia ou, simplesmente, abertura aos valores do Outro, na base do respeito mútuo, sem a rejeição da identidade própria?

(Adaptado de: Ler Para Ser, A. Moniz e O. Paz, Lisboa, Ed. Presença, 1994)

A busca de nacionalização da literatura: o caso do romantismo brasileiro


Segundo a interpretação de Karl Mannheim, o Romantismo expressa os sentimentos dos descontentes com as novas estruturas: a nobreza, que já caiu, e a pequena burguesia que ainda não subiu: de onde, as atitudes saudosistas ou reivindicatórias que pontuam todo o movimento.

O Brasil, egresso do puro colonialismo, mantém as colunas do poder agrário: o latifúndio, o escravismo, a economia de exportação. E segue a rota da monarquia conservadora após um breve surto de erupções republicanas, amiudadas durante a Regência.

Carente do binômio urbano indústria-operário durante quase todo o século XIX, a sociedade brasileira contou, para a formação da sua inteligência, com os filhos de famílas abastadas do campo, que iam receber instrução jurídica (raramente, médica) em São Paulo, Recife e Rio (Macedo, Alencar, Álvares de Azevedo, Fagundes Varela, Bernardo de Guimarães, Frânklin Távora, Pedro Luís), ou com filhos de comerciantes luso-brasileiros e de profissionais liberais, que definiam, grosso modo, a alta classe média do país (Pereira da Silva, Gonçalves Dias, Joaquim Norberto, Casemiro de Abreu, Castro Alves, Sílvio Romero). Raros os casos de extração humilde na fase romântica, como Teixeira e Sousa e Manuel Antônio de Almeida, o primeiro narrador de folhetim, o segundo, picaresco; ou do trovador semipopular Laurindo Rabelo.

Nesse esquema, do qual afasto qualquer traço de determinismo cego, ressalte-se o caráter seletivo da educação no Brasil-Império e, o que mais importa, a absorção pelos melhores talentos de padrões culturais europeus refletidos na Corte e nas capitais provincianas.

Como os seus ídolos europeus, os nossos românticos exibem fundos traços de defesa e evasão, que os leva a posições regressivas: no plano da relação com o mundo (retorno à mãe-natureza, refúgio no passado, reinvenção do bom selvagem, exotismo) e no das relações com o próprio eu (abandono à solidão, ao sonho, ao devaneio, às demasias da imaginação e dos sentidos).

Assim, apesar das diferenças de situação material, pode-se dizer que se formaram em nossos homens de letras configurações mentais paralelas às respostas que a inteligência européia dava a seus conflitos ideológicos.

Os exemplos mais persuasivos vêm dos melhores escritores. O romance colonial de Alencar e a poesia indianista de Gonçalves Dias nascem da aspiração de fundar em um passado mítico a nobreza recente do país, assim como — mutatis mutandis — as ficções de W. Scott e de Chateaubriand rastreavam na Idade Média feudal e cavaleiresca os brasões contrastados por uma burguesia em ascensão. De resto, Alencar, ainda fazendo “romance urbano”, contrapunha a moral do homem antigo à grosseria dos novos-ricos; e fazendo romance regionalista, a coragem do sertanejo às vilezas do citadino.

História Concisa da Literatura Brasileira, Alfredo Bosi, São Paulo, Editora Cultrix, 1995



***


«O Brasil, que sentiu a necessidade de adotar instituições diferentes das que lhe havia imposto a Europa, o Brasil experimenta já a necessidade de ir beber inspirações poéticas a uma fonte que verdadeiramente lhe pertença […] Nessas belas paragens tão favorecidas pela natureza, o pensamento deve alargar-se como o espetáculo que se lhe oferece […] deve permanecer independente, não procurando outro guia que a observação.»

Ferdinand Denis, Resumo da História Literária do Brasil, 1826 (cf. edição de 1978, p. 36).


***


Que importância têm as ideias de Ferdinand Denis na teoria e prática do Romantismo brasileiro? Quais as linhas essenciais desse movimento literário?

Na Literatura Brasileira do século XIX, predominou o movimento Romântico. A independência em 1822, estimulou o sentimento nacionalista, fazendo com que a elite intelectual (donde se destaca Ferdinand Denis) buscasse um perfil cultural próprio. Além do mais, manter os laços com a ex-metrópole poderia ser sinónimo de atraso, porque o referencial cultural e social provinha, então, de França.

A valorização dos elementos da terra, que timidamente tinha início no Arcadismo brasileiro, é tema central na prosa e poesia do século XIX. O índio é idealizado como herói nacional, principalmente na poesia de Gonçalves Dias e nos romances de José de Alencar (Iracema, O Guarani, Ubrirajara).

Os temas sociais também fazem parte da literatura da época, principalmente na luta contra a escravidão, exemplo claro é o poeta baiano Castro Alves, com Navio Negreiro e Vozes d’África.

A poesia indianista da primeira geração romântica.


  • Os poetas da primeira geração romântica elegeram o índio como símbolo nacional para divulgar valores e princípios.

  • Além de símbolo nacional, os românticos idealizavam o índio como homem livre e ainda intocado pelos males da civilização e da vida em sociedade. A definição de “bom selvagem”, dada pelo filósofo francês Jean-Jacques Rousseau, influenciou fortemente essa idealização do indígena. Segundo Rousseau, o homem nasce bom e é a sociedade que o corrompe. O índio, de acordo com essa visão, viveria ainda em estágio anterior à corrupção das sociedades modernas.

  • Formalmente, os versos indianistas são marcados pelo controle da métrica e pela escolha das rimas. Um recurso formal usado nessa poesia para aproximar o leitor dos costumes indígenas é fazer com que o ritmo do poema se assemelhe ao toque ritual dos tambores, usados nas cerimônias desses povos.

  • Outro recurso de linguagem usado pelos poetas é uma delicada caracterização da natureza brasileira, espaço no qual se desenvolvem os acontecimentos narrados nos poemas indianistas.

Literatura-Moderna-Plus-(suplemento de revisão), Maria Luiza Marques Abaurre, Marcela Regina Nogueira Pontara. São Paulo, Editora Moderna, 2010.



Gonçalves Dias


  • Filho de um comerciante português e de uma cafuza (mestiça de negro e índio), nasceu a 10 de agosto de 1823, em Caxias, no Estado do Maranhão.

  • Estudou direito na Universidade de Coimbra, em Portugal, onde leu os textos românticos de Almeida Garrett e de Alexandre Herculano. Essas influências literárias foram importantes para o seu desenvolvimento como poeta romântico.

  • Na obra de Gonçalves Dias aparecem os grandes temas românticos: natureza, pátria e religião.

  • Suas principais obras são: Primeiros cantos (1846), Segundos cantos (1848), As sextilhas do frei Antão (1848) e Últimos cantos (1851). Escreveu também algumas peças de teatro, sendo Leonor de Mendonça (1847) a mais conhecida.

  • Os versos indianistas são a parte mais importante da obra de Gonçalves Dias. Neles é construída uma imagem heroica e nobre do índio brasileiro. Destacam-se os poemas “Os timbiras”, “Canto do piaga”, “Deprecação” e “I-Juca Pirama”. O domínio do ritmo nesses poemas contribuiu para a popularidade da poesia indianista, o que ajudou no empenho dos poetas da primeira geração em divulgar a versão romântica dos símbolos nacionais.

  • Nos poemas indianistas, as características dos indígenas são sempre positivas e enaltecedoras: bravura, honra, lealdade.


Literatura-Moderna-Plus-(suplemento de revisão), Maria Luiza Marques Abaurre, Marcela Regina Nogueira Pontara. São Paulo, Editora Moderna, 2010.


Observe, nos versos a seguir, a caracterização positiva do índio, própria da poesia indianista da primeira geração romântica.

CANÇÃO DO EXÍLIO

Minha terra tem palmeiras,

Onde canta o sabiá;

As aves, que aqui gorjeiam,

Não gorjeiam como lá.

Nosso céu tem mais estrelas,

Nossas várzeas têm mais flores,

Nossos bosques têm mais vida,

Nossa vida mais amores.


Em cismar, sozinho, à noite,

Mais prazer encontro eu lá;

Minha terra tem palmeiras,

Onde canta o Sabiá.


Minha terra tem primores,

Que tais não encontro eu cá;

Em cismar — sozinho, à noite —

Mais prazer encontro eu lá;

Minha terra tem palmeiras,

Onde canta o Sabiá.


Não permita Deus que eu morra,

Sem que eu volte para lá;

Sem que eu desfrute os primores

Que não encontro por cá;

Sem qu'inda aviste as palmeiras,

Onde canta o Sabiá.

Gonçalves Dias

1. Para responder à questão, analise as afirmações que seguem, sobre o texto.


I. Através do texto, o poeta realiza uma viagem introspetiva à sua terra natal - ideia reforçada pelo emprego do verbo "cismar" (v.14).

II. A exaltação à pátria perdida dá-se pela referência a elementos culturais.

III. "Cá" e "lá" expressam o local do exílio e o Brasil, respetivamente.

IV. O pessimismo do poeta, característica determinante do Romantismo, expressa-se pela saudade da sua terra.

Pela análise das afirmações, conclui-se que estão corretas:

(A) a I e a II, apenas;

(B) a I e a III, apenas;

(C) a II e a IV, apenas;

(D) a III e a IV, apenas;

(E) a I, a II, a III e a IV.

2. Os versos da “Canção do exílio” são construídos nos moldes da redondilha maior, com predominância dos acentos de intensidade nas terceiras e sétimas sílabas métricas. Um verso que não segue esse padrão de tonicidade é:

(A) Minha terra tem palmeiras;

(B) As aves, que aqui gorjeiam,

(C) Nosso céu tem mais estrelas.

(D) Em cismar, sozinho, à noite.

(E) Onde canta o Sabiá.

3. Sobre o poema, escrito em Coimbra, é correto afirmar (escolha a alternativa acertada):

(A) O poema retrata o sofrimento do eu lírico em função da distância da mulher amada. O termo "Sabiá", recorrente nos versos, refere-se figurativamente ao amor feminino.

(B) A utilização dos termos “cá” e “lá” atém-se principalmente à necessidade de criar rimas, mais do que ao desejo do poeta de estabelecer o contraste entre espaços distintos.

(C) Para o eu lírico, estar exilado não significa necessariamente estar longe da terra, mas das suas referências de infância, fator que acentua a expressão saudosista do poema.

(D) Nesse poema, é possível reconhecer uma dialética amorosa trabalhada entre o desejo sexual pela mulher e sua idealização. O desejo se configura pelo verso "Mais prazer encontro eu lá" e a idealização, pelos versos "Não permita Deus que eu morra/Sem que eu volte para lá".

(E) A ênfase na exuberância da paisagem é estruturada a partir do jogo de contrastes entre a natureza tropical e a natureza europeia. Os versos da segunda estrofe reiteram a grandiosidade paisagística brasileira, além de enfatizarem a identidade do eu lírico.

***

CANÇÃO DO TAMOIO

I

Não chores, meu filho;

Não chores, que a vida

É luta renhida:

Viver é lutar.

A vida é combate,

Que os fracos abate,

Que os fortes, os bravos

Só pode exaltar.

II

Um dia vivemos!

O homem que é forte

Não teme da morte;

Só teme fugir;

No arco que entesa

Tem certa uma presa,

Quer seja tapuia,

Condor ou tapir.

III

O forte, o cobarde

Seus feitos inveja

De o ver na peleja

Garboso e feroz;

E os tímidos velhos

Nos graves conselhos,

Curvadas as frontes,

Escutam-lhe a voz!

IV

Domina, se vive;

Dos seus na lembrança,

Na voz do porvir.

Não cures da vida!

Sê bravo, sê forte!

Não fujas da morte,

Que a morte há de vir!

V

E, pois que és meu filho,

Meus brios reveste;

Tamoio nasceste,

Valente serás.

Sê duro guerreiro,

Robusto, fragueiro,

Brasão dos tamoios

Na guerra e na paz.

DIAS, Gonçalves. Poesias completas. v. II. Rio de Janeiro: Científica, 1965. p. 139-142.

Vocabulário:Renhida: disputada; sangrenta.Tapir: anta.Porvir: futuro.Não cures da vida: não te ocupes (não cuides) da vida.Fragueiro: impetuoso; incansável.


***

MARABÁ


Eu vivo sozinha, ninguém me procura!

Acaso feitura

Não sou de Tupá!

Se algum dentre os homens de mim não se esconde:

– "Tu és", me responde,

"Tu és Marabá!"


Meus olhos são garços, são cor das safiras,

Têm luz das estrelas, têm meigo brilhar;

Imitam as nuvens de um céu anilado,

As cores imitam das vagas do mar!


Se algum dos guerreiros não foge a meus passos:

– "Teus olhos são garços",

Responde anojado, "mas és Marabá:

"Quero antes uns olhos bem pretos, luzentes,

"Uns olhos fulgentes,

"Bem pretos, retintos, não cor d'anajá!"


É alvo meu rosto da alvura dos lírios,

Da cor das areias batidas do mar;

As aves mais brancas, as conchas mais puras

Não têm mais alvura, não têm mais brilhar.


Se ainda me escuta meus agros delírios:

– "És alva de lírios",

Sorrindo responde, "mas és Marabá:

"Quero antes um rosto de jambo corado,

"Um rosto crestado

"Do sol do deserto, não flor de cajá."


Meu colo de leve se encurva engraçado,

Como hástea pendente do cáctus em flor;

Mimosa, indolente, resvalo no prado,

Como um soluçado suspiro de amor!


– "Eu amo a estatura flexível, ligeira,

Qual duma palmeira",

Então me respondem: "tu és Marabá:

"Quero antes o colo da ema orgulhosa,

Que pisa vaidosa,

"Que as flóreas campinas governa, onde está."


Meus loiros cabelos em ondas se anelam,

O oiro mais puro não tem seu fulgor;

As brisas nos bosques de os ver se enamoram

De os ver tão formosos como um beija-flor!


Mas eles respondem: "– Teus longos cabelos,

"São loiros, são belos,

"Mas são anelados; tu és Marabá:

"Quero antes cabelos, bem lisos, corridos,

"Cabelos compridos,

"Não cor d'oiro fino, nem cor d'anajá,"


E as doces palavras que eu tinha cá dentro

A quem nas direi?

O ramo d'acácia na fronte de um homem

Jamais cingirei:


Jamais um guerreiro da minha arazóia

Me desprenderá:

Eu vivo sozinha, chorando mesquinha,

Que sou Marabá!

Gonçalves Dias

Vocabulário:Anajá: tipo de palmeira.Anojado: entristecido.Arazóia: araçóia (regionalismoda Amazónia); saiote, feito de penas, usado por mulheres indígenas.Engraçado: gracioso.Fulgentes: brilhantes.Garços: de cor azul-esverdeada.Indolente: insensível à dor; preguiçoso.Jambo: cor que lembra a do jambo (tipo de árvore); bem moreno ou cuja tez é da cor de um mulato ou mulataMarabá: mistura de índio e branco (francês).Tupá: Tupã. Na mitologia dos indígenas de língua tupi, o trovão, venerado como divindade suprema.

Questionário:

1. Quais são as características físicas de Marabá?

1.1. A que ideal de beleza essas características correspondem?

2. Para apresentar as características de Marabá, são usadas comparações e metáforas. A que elementos ela é comparada?

3. Desprezada por seu povo, Marabá reproduz as falas dos homens da tribo que fogem do contacto com ela. Explique, com base nessas falas, por que a índia é desprezada.

3.1. Que elementos, presentes nessas falas, comprovam esse desprezo?

4. Esse poema, embora relacionado ao indianismo, apresenta um tom mais lírico e confessional. Que sentimento domina o eu lírico? Justifique com elementos do poema.

5. O poema mostra um conflito entre duas formas de beleza feminina. Quais são elas e de que maneira cada uma é apresentada?

5.1. Percebe-se, no poema, a valorização de um certo padrão de beleza em função do contexto cultural em que é ambientado. Explique.

6. Após leitura, análise e interpretação do poema “Marabá”, algumas afirmações como as seguintes podem ser feitas, com excepção de uma. Indique-a.

(A) O poema se inicia com uma pergunta de ordem religiosa e termina com uma consideração de aspecto sensual.

(B) O poema é um profundo lamento construído com base na estrutura dialéctica, apresentando-se argumentação e contra argumentação.

(C) Ocorre interlocução registada em discurso directo, estrutura que enfatiza assim o desprezo preconceituoso dado à Marabá.

(D) A ocorrência de figuras de linguagem e o emprego da primeira pessoa marcam, respectivamente, as funções da linguagem poética e emotiva.

(E) Marabá é um poema representante da primeira fase que cultiva o aspecto físico da mulher.

7. A unidade dramática vivenciada pelo eu lírico no poema “Marabá” concentra-se em

(A) Tristeza e compreensão.

(B) Aflição e frustração.

(C) Amargura e comedimento.

(D) Indignação e passividade.

(E) Decepção e aceitação.

8. Sobre a poesia de Gonçalves Dias é correcto afirmar que

(A) Cantou a natureza brasileira como cenário das correrias e aventuras do indígena bravo e leal.

(B) Elogiou a dissipação e os excessos do vinho em orgias nocturnas marcadas pela devassidão e crueldade.

(C) Denunciou a iniquidade (crime; injustiça grave; perversidade) da escravidão em poemas altissonantes e repletos de metáforas aladas.

(D) Elogiou os esforços do colonizador português em suas campanhas militares.

(E) Cantou a bondade da mãe e da irmã, sustentáculos femininos do núcleo familiar patriarcal.

Maturidade e originalidade da literatura novecentista brasileira


O processo da modernidade

O PRÉ-MODERNISMO (1900-1922)

O que se convencionou chamar de pré-Modernismo no Brasil não constitui uma escola literária. Pré-Modernismo é, na verdade, um termo genérico que designa toda uma vasta produção literária, que caracteriza os primeiros vinte anos deste século. Nele é que se encontram as mais variadas tendências e estilos literários - desde os poetas parnasianos e simbolistas, que continuavam a produzir, até os escritores que começavam a desenvolver um novo regionalismo, alguns preocupados com uma literatura política, e outros com propostas realmente inovadoras. É grande a lista dos autores que pertenceram ao pré-Modernismo, mas, indiscutivelmente, merecem destaque: Euclides da Cunha, Lima Barreto, Graça Aranha, Monteiro Lobato e Augusto dos Anjos.


Assim, pode-se dizer que essa escola começou em 1902, com a publicação de dois livros: "Os sertões", de Euclides da Cunha, e "Canaã", de Graça Aranha, e se estende até o ano de 1922, com a realização da Semana de Arte Moderna.


Apesar de o pré-Modernismo não constituir uma escola literária, apresentando individualidades muito fortes, com estilos às vezes antagónicos - como é o caso, por exemplo, de Euclides da Cunha e Lima Barreto - percebe-se alguns pontos comuns entre as principais obras pré-modernistas:

a) eram obras inovadoras, que apresentavam ruptura com o passado, com o academismo;

b) primavam pela denúncia da realidade brasileira, negando o Brasil literário, herdado do Romantismo e do Parnasianismo. O grande tema do pré-Modernismo é o Brasil não-oficial do sertão nordestino, dos caboclos interioranos, dos subúrbios;

c) acentuavam o regionalismo, com o qual os autores acabam montando um vasto painel brasileiro: o Norte e o Nordeste nas obras de Eucli-des da Cunha, o Vale do Rio Paraíba e o interior paulista nos textos de Monteiro Lobato, o Espírito Santo, retratado por Graça Aranha, ou o subúrbio carioca, temática quase que invariável na obra de Lima Barreto;

d) difundiram os tipos humanos marginalizados, que tiveram ampliado o seu perfil, até então desconhecido, ou desprezado, quando conhecido - o sertanejo nordestino, o caipira, os funcionários públicos, o mulato;

e) traçaram uma ligação entre os fatos políticos, económicos e sociais contemporâneos, aproximando a ficção da realidade.

Esses escritores acabaram produzindo uma redescoberta do Brasil, mais próxima da realidade, e pavimentaram o caminho para o período literário seguinte, o Modernismo, iniciado em 1922, que acentuou de vez a ruptura com o que até então se conhecia como literatura brasileira.


A SEMANA DE ARTE MODERNA (1922)

O Modernismo, como tendência literária, ou estilo de época, teve seu prenúncio com a realização da Semana de Arte Moderna no Teatro Municipal de São Paulo, nos dias 13, 15 e 17 de Fevereiro de 1922. Idealizada por um grupo de artistas, a Semana pretendia colocar a cultura brasileira a par das correntes de vanguarda do pensamento europeu, ao mesmo tempo que pregava a tomada de consciência da realidade brasileira.

O Movimento não deve ser visto apenas do ponto de vista artístico, como recomendam os historiadores e críticos especializados em história da literatura brasileira, mas também como um movimento político e social. O país estava dividido entre o rural e o urbano. Mas o bloco urbano não era homogéneo. As principais cidades brasileiras, em particular São Paulo, conheciam uma rápida transformação como consequência do processo industrial. A primeira Guerra Mundial foi a responsável pelo primeiro surto de industrialização e consequente urbanização. O Brasil contava com 3.358 indústrias em 1907. Em 1920, esse número pulou para 13.336. Isso significou o surgimento de uma burguesia industrial cada dia mais forte, mas marginalizada pela política económica do governo federal, voltada para a produção e exportação do café.

Imigrantes - Ao lado disso, o número de imigrantes europeus crescia consideravelmente, especialmente os italianos, distribuindo-se entre as zonas produtoras de café e as zonas urbanas, onde estavam as indústrias. De 1903 a 1914, o Brasil recebeu nada menos que 1,5 milhão de imigrantes. Nos centros urbanos criou-se uma faixa considerável de população espremida pelos barões do café e pela alta burguesia, de um lado, e pelo operariado, de outro. Surge a pequena burguesia, formada por funcionários públicos, comerciantes, profissionais liberais e militares, entre outros, criando uma massa politicamente "barulhenta" e reivindicatória.

A falta de homogeneidade no bloco urbano tem origem em alguns aspectos do comportamento do operariado. Os imigrantes de origem europeia trazem suas experiências de luta de classes. Em geral esses trabalhadores eram anarquistas e suas acções resultavam, quase sempre, em greves e tensões sociais de toda sorte, entre 1905 e 1917. Um ano depois, quando ocorreu a Revolução Russa, os artigos na imprensa a esse respeito tornaram-se cada vez mais comuns. O Partido Comunista seria fundado em 1922. Desde então, ocorreria o declínio da influência anarquista no movimento operário.

Desta forma, circulavam pela cidade de São Paulo, numa mesma calçada, um barão do café, um operário anarquista, um padre, um burguês, um nordestino, um professor, um negro, um comerciante, um advogado, um militar, etc., formando, de fato, uma "paulicéia desvairada" (título de célebre obra de Mário de Andrade). Esse desfile inusitado e variado de tipos humanos serviu de palco ideal para a realização de um evento que mostrasse uma arte inovadora a romper com as velhas estruturas literárias vigentes no país.


O Modernismo é o movimento literário que compreende um grupo variado de correntes estéticas de vanguarda, como o Dadaísmo, o Surrealismo e o Futurismo. É uma tendência dinâmica, indicando a necessidade de renovação e a crença de que é possível uma superação constante, baseada na ideia da modernidade contra a tradição e do antigo. O séc. XX tem-se caracterizado como uma época de mudanças radicais, com a preocupação de substituir os valores antigos e levar a pesquisa ao campo de todas as actividades humanas. No campo literário, a atitude moderna da época presente em oposição às antigas coloca acima de tudo o particular, o local, a circunstância, o pessoal, o subjectivo, o relativo e a diversidade. Assim configurada a atitude moderna, a literatura contemporânea atingiu um estágio em que as constantes estruturais e ideológicas obedecem a esse teor.

CARACTERÍSTICAS GERAIS DO MODERNISMO

LIBERDADE DE EXPRESSÃO

A importância maior das vanguardas residiu no triunfo de uma concepção inteiramente libertária da criação artística. O pintor, o escritor ou o músico não precisam se guiar por outras leis que não as de sua própria interioridade e seu próprio arbítrio. A liberdade só poderá ser cerceada por regimes autoritários que proíbem a circulação dos objectos artísticos. Caso contrário, todas as normas foram abolidas.

INCORPORAÇÃO DO QUOTIDIANO

Uma das maiores conquistas do modernismo, a valorização da vida quotidiana traz para uma abertura temática sem precedentes pois, até então, apenas assuntos "sublimes" tinham direito indiscutível ao mundo literário. Agora, o prosaico, o diário, o grosseiro, o vulgar, o resíduo, o lixo, a velocidade e a máquina tornam-se os motivos centrais da estética modernista. A aventura do quotidiano leva o artista a romper com os esquemas de vida burguesa. Acima de tudo, o artista está consciente de que todos os objectos podem tornar-se literários.

LINGUAGEM COLOQUIAL

Este anticonvencionalismo temático, esta dessacralização dos conteúdos encontra correspondência na linguagem. Além das inovações técnicas, a linguagem torna-se coloquial, espontânea, mesclando expressões da língua culta com termos populares. Liberto da escrita "nobre", o artista volta-se para um estilo prosaico, que admite "erros" gramaticais e palavras comuns.

INOVAÇÕES TÉCNICAS

O rompimento com os padrões culturais do século XIX implicaria no surgimento de novas técnicas de escrita, tanto no domínio da poesia, quanto no da ficção. As principais conquistas foram:

- O verso livre: o verso já não está sujeito ao rigor métrico e as formas fixas de versificação, como o soneto, por exemplo. Também a rima torna-se desnecessária.

- A destruição dos nexos: os chamados nexos sintácticos, preposições, conjunções, etc. São eliminados da poesia moderna, que se torna mais solta, mais descontínua e fragmentária e, fundamentalmente, mais sintética. No plano da prosa, essas elipses geraram o estilo telegráfico: frases curtas e sincopadas.

- A enumeração caótica: consiste no acúmulo de palavras que designam objectos, seres, sensações, vinculados a uma ideia ou várias ideias básicas, sem ligação evidente entre si.

- O fluxo de consciência: técnica narrativa estabelecida por Edouard Dujardin e sacramentada por James Joyce. Trata-se de um monólogo interior levado para o texto de ficção sem qualquer obediência à normalidade gramatical, à lógica e mesmo à coerência. É a mente da personagem revelada por ela própria, sem nenhum tipo de barreira racional.

- A colagem e montagem cinematográfica: ainda no campo da narrativa, valoriza-se a fragmentação do texto, sua montagem em blocos, a "colagem" de notícias de jornais, cartazes, telegramas, etc. No corpo dos romance, como o fez Jonh dos Pasos na trilogia U.S.A. Ou ainda a utilização de várias vozes narrativas (1ª, 2ª, 3ª pessoas no mesmo livro) nas experiências de Faulkner (Enquanto agonizo, O som e a fúria).

- A eliminação dos sinais de pontuação: os sinais tornam-se facultativos, com o escritor subordinado ao uso de pontos, vírgulas, travessões, etc. A uma disposição estilístico-psicológica e não a regras gramaticais. Sua eliminação frequente visa dar ao texto um aspecto de caótico ou febril.

AMBIGUIDADE

O discurso literário perde o sentido "fechado" que geralmente possuía no século XIX. Ou seja, ele oferecia ao leitor apenas um sentido, uma interpretação. Agora, ele tem um carácter variado e polissémico. Uma rede de significações, que permite múltiplos níveis de leitura. É a chamada obra aberta, obra que não apresenta univocidade.

PARÓDIA / DIALOGISMO / INTERTEXTUALIDADE

Os modernistas realizam um releitura de textos famosos do passado, reescrevendo-os em forma de paródia. Um dos livros de crítica literária de Mário de Andrade chama-se A escrava que não é Isaura, numa evidente alusão ao conhecido relato de Bernardo Guimarães.

http://br.geocities.com/esquinadaliteratura/escolas/moder09.html (adaptado)


O MODERNISMO – PRIMEIRA FASE (1922-1930): OUSADIA E INOVAÇÃO

O período de 1922 a 1930 é o mais radical do movimento modernista, justamente em consequência da necessidade de definições e do rompimento de todas as estruturas do passado. Daí o carácter anárquico desta primeira fase modernista e seu forte sentido destruidor.

Ao mesmo tempo em que se procura o moderno, o original e o polémico, o nacionalismo se manifesta em suas múltiplas facetas: uma volta às origens, à pesquisa das fontes quinhentistas, à procura de uma língua brasileira (a língua falada pelo povo nas ruas), às paródias, numa tentativa de repensar a história e a literatura brasileiras, e à valorização do índio verdadeiramente brasileiro. É o tempo dos manifestos nacionalistas do "Pau-Brasil" (o Manifesto do Pau-Brasil, escrito por Oswald de Andrade em 1924, propõe uma literatura extremamente vinculada à realidade brasileira) e da "Antropofagia"[1] dentro da linha comandada por Oswald de Andrade. Mas havia também os manifestos do Verde-Amarelismo e o do Grupo da Anta, que trazem a semente do nacionalismo fascista comandado por Plínio Salgado.

No final da década de 20, a postura nacionalista apresenta duas vertentes distintas: de um lado, um nacionalismo crítico, consciente, de denúncia da realidade brasileira e identificado politicamente com as esquerdas; de outro, o nacionalismo ufanista, utópico, exagerado, identificado com as correntes políticas de extrema direita.

Entre os principais nomes dessa primeira fase do Modernismo, que continuariam a produzir nas décadas seguintes, destacam-se Mário de Andrade, Oswald de Andrade, Manuel Bandeira, António de Alcântara Machado, além de Menotti del Picchia, Cassiano Ricardo, Guilherme de Almeida e Plínio Salgado.


[1] "Revista de Antropofagia", publicação semanal que reunia o grupo mais nacionalista da primeira fase do Modernismo. Teve 26 números, publicados entre Maio de 1928 e Agosto de 1929.


O MODERNISMO – SEGUNDA FASE (1930-1945): MISTICISMO E CONSCIÊNCIA SOCIAL

O período de 1930 a 1945 registrou a estreia de alguns dos nomes mais significativos do romance brasileiro. Reflectindo o mesmo momento histórico[1] e apresen-tando as mesmas preocupações dos poetas da década de 30 (Murilo Mendes, Jorge de Lima, Carlos Drummond de Andrade, Cecília Meireles e Vinicius de Moraes), a segunda fase do Modernismo apresenta autores como José Lins do Rego, Graciliano Ramos, Rachel de Queiroz, Jorge Amado e Érico Veríssimo, que produzem uma literatura de carácter mais construtivo, de maturidade, aproveitando as conquistas da geração de 1922 e sua prosa inovadora.

Efeitos da crise - Na década de 30, o país passava por grandes transformações, fortemente marcadas pela revolução de 30 e pelo questionamento das oligarquias tradicionais. Não havia como não sentir os efeitos da crise económica mundial, os choques ideológicos que levavam a posições mais definidas e engajadas. Tudo isso, formou um campo propício ao desenvolvimento de um romance caracterizado pela denúncia social, verdadeiro documento da realidade brasileira, atingindo um elevado grau de tensão nas relações do indivíduo com o mundo.

Nessa busca do homem brasileiro "espalhado nos mais distantes recantos de nossa terra", no dizer de José Lins do Rego, o regionalismo ganha uma importância até então não alcançada na literatura brasileira, levando ao extremo as relações do personagem com o meio natural e social. Destaque especial merecem os escritores nordestinos que vivenciam a passagem de um Nordeste medieval para uma nova realidade capitalista e imperialista. E nesse aspecto, o baiano Jorge Amado é um dos melhores representantes do romance brasileiro, quando retrata o drama da economia cacaueira, desde a conquista e uso da terra até a passagem de seus produtos para as mãos dos exportadores. Mas também não se pode esquecer de José Lins do Rego, com as suas regiões de cana, os banguês e os engenhos sendo devorados pelas modernas fábricas.

O primeiro romance representativo do regionalismo nordestino, que teve seu ponto de partida no Manifesto Regionalista de 1926 (este manifesto, elaborado pelo Centro Regionalista do Nordeste, procura desenvolver o sentimento de unidade do Nordeste dentro dos novos valores modernistas. Propõe trabalhar em prol dos interesses da região nos seus aspectos diversos - sociais, económicos e Culturais) foi "A bagaceira", de José Américo de Almeida, publicado em 1928. Verdadeiro marco na história literária do Brasil, sua importância deve-se mais à temática (a seca, os retirantes, o engenho), e ao carácter social do romance, do que aos valores estéticos.

[1] Queda da Bolsa de Nova Iorque, colapso no sistema financeiro internacional, a Grande Depressão - paralisação de fábricas, ruptura nas relações comerciais, falências bancárias, altíssimo índice de desemprego, fome e miséria generalizadas - gerando a intervenção do Estado na organização económica, com agravamento das questões sociais.


PÓS-MODERNISMO (1945-1960): A POESIA PARTICIPANTE E A REINVENÇÃO DA NARRATIVA

O Pós-Modernismo se insere no contexto dos extraordinários fenómenos sociais e políticos de 1945. Foi o ano que assistiu o fim da Segunda Guerra Mundial e o início da Era Atómica com as explosões de Hiroshima e Nagasaki. O mundo passa a acreditar numa paz duradoura. Cria-se a Organização das Nações Unidas (ONU) e, em seguida, publica-se a Declaração dos Direitos do Homem. Mas, logo depois, inicia-se a Guerra Fria.

Paralelamente a tudo isso, o Brasil vive o fim da ditadura de Getúlio Vargas. O país inicia um processo de redemocratização. Convoca-se uma eleição geral e os partidos são legalizados. Apesar disso, abre-se um novo tempo de perseguições políticas, ilegalidades e exílios.

A literatura brasileira também passa por profundas alterações, com algumas manifestações representando muitos passos adiante; outras, um retrocesso. O jornal "O Tempo", excelente crítico literário, encarrega-se de fazer a selecção.

Intimismo - A prosa, tanto nos romances como nos contos, aprofunda a tendência já trilhada por alguns autores da década de 30 em busca de uma literatura intimista, de sondagem psicológica, introspectiva, com destaque para Clarice Lispector.

Ao mesmo tempo, o regionalismo adquire uma nova dimensão com a produção fantástica de João Guimarães Rosa e sua recriação dos costumes e da fala sertaneja, penetrando fundo na psicologia do jagunço do Brasil Central.

Na poesia, ganha corpo, a partir de 1945, uma geração de poetas que se opõe às conquistas e inovações dos modernistas de 1922. A nova proposta foi defendida, inicialmente, pela revista "Orfeu", cujo primeiro número é lançado na "Primavera de 1947" e que afirma, entre outras coisas, que "uma geração só começa a existir no dia em que não acredita nos que a precederam, e só existe realmente no dia em que deixam de acreditar nela."

Essa geração de escritores negou a liberdade formal, as ironias, as sátiras e outras "brincadeiras" modernistas. Os poetas de 45 partem para uma poesia mais equilibrada e séria, distante do que eles chamavam de "primarismo desabonador" de Mário de Andrade e Oswald de Andrade. A preocupação primordial era quanto ao restabelecimento da forma artística e bela; os modelos voltam a ser os mestres do Parnasianismo e do Simbolismo.

Esse grupo, chamado de Geração de 45, era formado, entre outros poetas, por Lêdo Ivo, Péricles Eugénio da Silva Ramos, Geir Campos e Darcy Damasceno. O final dos anos 40, no entanto, revelou um dos mais importantes poetas da nossa literatura, não filiado esteticamente a qualquer grupo e aprofundador das experiências modernistas anteriores: ninguém menos que João Cabral de Melo Neto. Contemporâneos a ele, e com alguns pontos de contacto com sua obra, destacam-se Ferreira Gullar e Mauro Mota.


A PRODUÇÃO CONTEMPORÂNEA

Produção contemporânea deve ser entendida como as obras e movimentos literários surgidos nas décadas de 1960 e 1970 e que reflectiram um momento histórico caracterizado inicialmente pelo autoritarismo, por uma rígida censura e enraizada autocensura. Seu período mais crítico ocorreu entre os anos de 1968 e 1978, durante a vigência do Ato Institucional nº 5 (AI-5). Tanto que, logo após a extinção do ato, verificou-se uma progressiva normalização no país.

As adversidades políticas, no entanto, não mergulharam o país numa calmaria cultural. Ao contrário, as décadas de 60 e 70 assistiram a uma produção cultural bastante intensa em todos os sectores.

Na poesia, percebe-se a preocupação em manter uma temática social, um texto participante, com a permanência de nomes consagrados como Carlos Drummond de Andrade, João Cabral de Melo Neto e Ferreira Gullar, ao lado de outros poetas que ainda aparavam as arestas em suas produções.

Visual - O início da década de 1960 apresentou alguns grupos em luta contra o que chamaram "esquemas analítico-discursivos da sintaxe tradicional". Ao mesmo tempo, esses grupos buscavam soluções no aproveitamento visual da página em branco, na sonoridade das palavras e nos recursos gráficos. O sintoma mais importante desse movimento foi o surgimento da Poesia Concreta e da Poesia Práxis. Paralelamente, surgia a poesia "marginal", que se desenvolve fora dos grandes esquemas industriais e comerciais de produção de livros.

No romance, ao lado da última produção de Jorge Amado e Érico Veríssimo, e das obras "lacriminosas" de José Mauro de Vasconcelos ("Meu pé de Laranja-Lima", "Barro Blanco"), de muito sucesso junto ao grande público, tem se mantido o regionalismo de Mário Palmério, Bernardo Élis, António Callado, Josué Montello e José Cândido de Carvalho. Entre os intimistas, destacam-se Osman Lins, Autran Dourado e Lygia Fagundes Telles,

Na prosa, as duas décadas citadas assistiram à consagração das narrativas curtas (crónica e conto). O desenvolvimento da crónica está intimamente ligado ao espaço aberto a esse género na grande imprensa. Hoje, por exemplo, não há um grande jornal que não inclua em suas páginas crónicas de Rubem Braga, Fernando Sabino, Carlos Heitor Cony, Paulo Mendes Campos, Luís Fernando Veríssimo e Lourenço Diaféria, entre outros. Deve-se fazer uma menção especial a Stanislaw Ponte Preta (Sérgio Porto), que, com suas bem humoradas e cortantes sátiras político-sociais, escritas na década de 60, tem servido de mestre a muitos cronistas.

O conto, por outro lado, analisado no conjunto das produções contemporâneas, situa-se em posição privilegiada tanto em qualidade quanto em quantidade. Entre os contistas mais significativos, destacam-se Dalton Trevisan, Moacyr Scliar, Samuel Rawet, Rubem Fonseca, Domingos Pellegrini Jr. e João António. (www.vestibular1.com.br)

A partir das décadas de 1980 e 1990 não há movimentos literários organizados, mas é possível distinguir talentos individuais. No romance, João Ubaldo Ribeiro continua sua obra inspirada no Nordeste. Nessa linha surge também J.C. Dantas. No romance intimista distingue-se a obra de estreia de Milton Hatoum (Relato de um Certo Oriente). Rubem Fonseca disseca a motivação de seus personagens urbanos em histórias realistas e violentas. Em João Gilberto Noll a sexualidade vem acompanhada de um clima pesado de delírio. Na poesia há grande influência do concretismo nas obras de Paulo Leminski e Arnaldo Antunes e até mesmo de compositores da MPB como Caetano Veloso. Outros poetas realizam trabalhos muito pessoais, como José Paulo Paes, Hilda Hilst, Nelson Ascher e Adélia Prado. Nessa época se torna mais conhecida a obra Manoel de Barros, com sua poesia ligada à região do Pantanal. (http://www.leremcd.hpg.ig.com.br/historia.htm)

A revolução modernista: pluralidade de experiências poéticas.

Modernismo-no-Brasil-segunda-geração_Abaurre&Pontara_2010.pdf
Literatura-Moderna-Plus-(suplemento de revisão), Maria Luiza Marques Abaurre, Marcela Regina Nogueira Pontara. São Paulo, Editora Moderna, 2010

Tópicos, Temas, Palavras-Chave – Criação; eu poético marginal, desintegrado; evasão, inconformismo e angústia existencial; tempo-prisão e vida-morte; figura do amor-salvação/Pátria-Brasil.

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Tópicos, Temas, Palavras-Chave – Consciência: homem-templo/criação mão-pão-tijolo e obra; silêncio e submissão; palavra/poder e acção; Deus-piedade; Pátria-exílio; Mulher-garça e aurora.

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O romance brasileiro depois de 1930

Os retratos da infância; os heróis sertanejos itinerantes e complexos; os microcosmos regionais.

O-romance-de-1930_Abaurre&Pontara_2010.pdf

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A-prosa-pos-moderna_Abaurre&Pontara_2010.pdf
Literatura-Moderna-Plus-(suplemento de revisão), Maria Luiza Marques Abaurre, Marcela Regina Nogueira Pontara. São Paulo, Editora Moderna, 2010

Divertida parábola sobre os limites entre a verdade e o mito, narrada por um historiador de província que busca reconstituir os factos trinta anos depois de ocorridos.

Tópicos, Temas, Palavras-Chave – Heroísmo e anticonvenção; alcunha-marca-miséria; álcool-alegria-libertação; companheirismo popular; humor; exaltação da liberdade: o sonho e a fantasia.

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A descoberta do sertão universal; a inovação da ficção (Sagarana).

Tópicos, Temas, Palavras-Chave – Universo sertanejo/universo da escrita; ruralismo e ação: fazendeiro/vaqueiro, gado/arraial; fantástico, crenças; recriação da linguagem/código nordestino.

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LUSOFONIA - PLATAFORMA DE APOIO AO ESTUDO A LÍNGUA PORTUGUESA NO MUNDO, JOSÉ CARREIRO.1.ª edição: http://lusofonia.com.sapo.pt/LB.htm, 2008.2.ª edição: http://lusofonia.x10.mx/LB.htm, 2016.3.ª edição, https://sites.google.com/site/ciberlusofonia/Literatura-Brasileira, 2020.