Salve, Mamutinhes! Aqui é a Rebeca e hoje vamos passear pela ciência dos materiais, em especial as cerâmicas! Tá achando que aqui vamos falar de vasos e pisos? Não! Tem muito mais do que isso! Tem muita história, química e física no meio da sua caneca! Depois desse episódio você vai ter outra noção do que são cerâmicas!
Antes de falar sobre cerâmicas e sua importância, a gente pode se perguntar, por que estudamos materiais? Parece muito leviano e simples, mas físiques, químiques e engenheires, sejam elus mecâniques, civis, químiques ou elétriques, em algum momento terão que considerar as propriedades dos materiais para desenvolver novos dispositivos. Seja uma engrenagem de transmissão, a superestrutura de um prédio, um componente de refinaria de petróleo ou um chip de circuito integrado.
Quando não levamos em conta essas propriedades e particularidades dos materiais, estamos sujeitos a falhas catastróficas que podem ser fatais! Vou citar apenas três exemplos importantes:
O acidente da Challenger: ocorreu em 28 de janeiro de 1986, envolvendo o ônibus espacial Challenger, da NASA. A Challenger estava prestes a fazer seu décimo lançamento, mas, apenas 73 segundos após a decolagem, a nave explodiu no ar, resultando na morte de todos os sete tripulantes a bordo. A causa do acidente foi atribuída a uma falha no conjunto de juntas da união entre os segmentos dos propulsores de foguete sólidos. Temperaturas extremamente baixas naquele dia enfraqueceram essas juntas de borracha, conhecidas como O-rings, comprometendo sua capacidade de vedação. O-ring é um termo em inglês que se refere a um tipo de vedação ou junta em formato de anel, geralmente feito de polímeros, como borracha de nitrilo ou silicone. Essa junta em forma de anel é projetada para ser colocada em ranhuras ou sulcos, onde atua como um elemento de vedação. Durante o lançamento, os gases quentes escaparam pela falha nas juntas, causando o colapso estrutural do foguete. O material do O-ring não suportou a variação de temperatura interna e externa!
Colapso da ponte de Tacoma: conhecida como Ponte Narrows, foi uma ponte de suspensão localizada em Tacoma, Washington, nos Estados Unidos. Ela ganhou notoriedade mundial devido a um colapso catastrófico ocorrido em 7 de novembro de 1940, apenas alguns meses após sua inauguração. O desastre ocorreu devido a uma combinação de fatores, incluindo ventos fortes e uma oscilação estrutural conhecida como "ressonância mecânica". Os ventos exerceram uma força cíclica na ponte, que acabou sincronizando com a frequência natural de oscilação da estrutura. O fenômeno de ressonância é caracterizado pelo aumento da amplitude de oscilação quando a frequência externa (vento) é muito próxima da frequência do material da ponte. A amplificação progressiva das oscilações foi tão grande, que levou a uma falha estrutural e à subsequente queda da ponte.
O Desastre de Hindenburg: ocorreu em 6 de maio de 1937, quando o dirigível LZ 129 Hindenburg saiu de Frankfurt na Alemanha com destino a Lakehurst, Nova Jersey, nos Estados Unidos. A causa exata do incêndio ainda é objeto de debate por motivos de espionagem (um disse que me disse). Mas, a teoria mais aceita é que uma grande quantidade de cargas tenham se acumulado na superfície do dirigível, e uma descarga elétrica tenha causado uma faísca que inflamou o gás hidrogênio usado para encher o envelope do dirigível. Como esse gás é altamente inflamável, as chamas rapidamente se espalharam, levando à destruição do Hindenburg em questão de minutos.
Enquanto esses acidentes não têm necessariamente a ver com cerâmicas, eles ocorreram justamente por não estudarmos suficientemente as propriedades dos materiais utilizados!
Claro que quando eu falo a palavra cerâmica, talvez ainda evoque no seu cérebro outras associações, como pratos, pisos, vasos e canecas. E tá tudo bem! Além das cerâmicas terem as propriedades interessantes que vamos falar, elas estão também entrelaçadas com a história da humanidade, já que são uma das tecnologias mais antigas, que remontam a milhares de anos. Uma vez que os humanos descobriram que a argila poderia ser encontrada em abundância e transformada em objetos, primeiro misturando-a com água e depois queimando, nasceu a olaria. Olaria é o nome em português para a fabricação de materiais a base de argila e cerâmica, o nome vem de "ola", termo antigo para "panela de barro".
Mas a palavra cerâmica vem do grego antigo: κεραμικός (keramikós), que significa "de ou para argila" (de κέραμος (kéramos) 'argila queimada'). A menção mais antiga conhecida da raiz ceram- é do grego micênico ke-ra-me-we, significando trabalhadores da cerâmica na escrita silábica Linear B, uma das escritas mais antigas (pra vocês terem ideia, a Linear B é derivada da escrita Linear A, que até hoje não conseguimos decifrar completamente).
O artefato mais antigo de cerâmica conhecido é datado de meados de 28000 AEC (AEC = Antes da Era Comum, a Era Comum começa no ano 1), durante o final do período paleolítico. É uma estatueta de uma mulher, chamada Vênus de Dolní Věstonice, de um pequeno assentamento pré-histórico perto de Brno, na Chéquia (ou República Tcheca). Nesse local, centenas de estatuetas de argila representando animais da Idade do Gelo também foram descobertas perto dos restos de um forno em forma de ferradura. Como vocês puderam perceber, as primeiras cerâmicas feitas pelo homem eram objetos como potes, vasilhas, vasos ou estatuetas feitas de argila, sozinhas ou misturadas com outros materiais como sílica (areia), endurecidas no fogo.
Figura 1: A Vênus de Dolní Věstonice (tcheco: Věstonická venuše) é uma estatueta de cerâmica de uma figura feminina nua datada de 29.000–25.000 AEC. Foi encontrada no sítio paleolítico Dolní Věstonice na bacia da Morávia, ao sul de Brno, na base da montanha Děvín no que é hoje a Chéquia/República Tcheca. Ela tem cerca de 10 cm de altura e 43 mm de espessura em média. Esta estatueta e algumas outras de locais próximos são os mais antigos artigos de cerâmica conhecidos no mundo.
Uma maior quantidade de evidências arqueológicas de cerâmica, datadas de vários milhares de anos depois, foi encontrada na Ásia Oriental. Na caverna de Xianren (仙人洞), na China, foram encontrados fragmentos de potes datados de 18.000 a 17.000 AEC. Esse sítio também tem evidências das primeiras plantações de arroz da região. Acredita-se que da China o uso da cerâmica se espalhou sucessivamente para o Japão e a região do Extremo Oriente da Rússia, onde os arqueólogos encontraram fragmentos de artefatos de cerâmica datados de 14000 AEC.
O uso das peças de cerâmica aumentou dramaticamente durante o período neolítico, com o estabelecimento de comunidades assentadas com o advento da agricultura. Começando aproximadamente em 9.000 AEC, a cerâmica à base de argila tornou-se popular como material para a confecção de recipientes para água e comida, objetos de arte, telhas e tijolos, e seu uso continuou a se espalhar por toda a Ásia, o Oriente Médio e Europa.
Os primeiros objetos eram apenas secos ao sol ou queimados a baixa temperatura (abaixo de 1000 °C) em fornos rudimentares escavados no solo. A cerâmica era monocromática ou decorada com pintura de motivos lineares ou geométricos simples. Existem evidências que, em torno de 4500 AEC, a roda do oleiro, um instrumento que facilitou a velocidade de produção de peças de argila, foi inventada na região do Crescente Fértil. Em torno de 3000 AEC, os chineses também adotaram o uso da roda do oleiro, aumentando drasticamente a quantidade de produção desses artefatos. E, por volta do ano 600, a porcelana chinesa tradicional que conhecemos começou a ser fabricada.
Figura 2: Fotos do uso experimental do tournette. Veja que a roda é operada por um assistente e não pelo próprio oleiro. À direita, o disco inferior inserido em um bastão de madeira fixado no solo e argila espalhada entre os dois discos como um lubrificante.
Se fala muito da argila, pois ela é o material cerâmico mais antigo que processamos! A argila é um material natural composto principalmente por partículas minerais finas e granulares. Essas partículas se formam a partir da desintegração de rochas ao longo de milhões de anos devido à ação de intemperismo físico, químico e biológico. Os minerais são, em geral, aluminossilicatos com outros elementos intercalados, que mudam principalmente a cor e morfologia das argilas e, dependem da região que são formadas na crosta terrestre (presença de outros elementos). O mais interessante desse material é ser muito maleável quando adicionamos água, mudando drasticamente suas propriedades depois de queimada, ficando rígida e quebradiça.
As etapas para o processo de fabricação cerâmica a partir da argila são:
Preparação da argila: A argila é extraída de depósitos naturais e passa por processos de purificação e preparação. Isso inclui a remoção de impurezas, como pedras, raízes e materiais orgânicos, e a moagem da argila em partículas finas e homogêneas.
Moldagem: A argila preparada é moldada na forma desejada. Existem várias técnicas de moldagem, incluindo moldagem manual por exemplo, como a rolagem de corda. A rolagem de corda era utilizada antes da invenção da roda. Se faz rolos de argila e se vai moldando a argila para formar às peças. A moldagem em molde (usando moldes de gesso ou metal), como os tijolos, por exemplo. Ou, moldagem por prensagem, em que se comprime a argila em matrizes para obter formas específicas.
Secagem: Após a moldagem, as peças são submetidas ao processo de secagem. Isso envolve a remoção gradual da umidade da argila para evitar rachaduras e deformações. A secagem pode ser realizada naturalmente ao ar livre ou em ambientes controlados, como estufas, dependendo do tamanho e complexidade das peças.
Queima (ou sinterização): A queima é um estágio crítico na fabricação de cerâmica. As peças secas são aquecidas a altas temperaturas em fornos especiais chamados de fornos de queima. A sinterização é um processo no qual as peças ou a cerâmica em pó, são submetidas a temperaturas elevadas, ligeiramente menores do que a sua temperatura de fusão. Durante esse processo, ocorrem mudanças químicas e físicas na argila. A temperatura e o tempo de queima variam dependendo do tipo de cerâmica. Em geral, o produto final é uma cerâmica porosa. A queima pode ocorrer em diferentes fases, como um processo de queima inicial a uma temperatura mais baixa (queima de bisque) e a queima final (a uma temperatura mais alta).
Acabamento e esmaltação: Após a queima, as peças de cerâmica podem passar por processos adicionais, como polimento, lixamento ou aplicação de esmaltes cerâmicos. Os esmaltes são revestimentos que proporcionam cor, brilho e proteção às peças. Os esmaltes podem ser aplicados por imersão, pincelamento ou pulverização. As peças são então submetidas a uma segunda queima, conhecida como queima de esmalte, para fundir o esmalte e obter o acabamento final.
Figura 3: Tigela de cerâmica chinesa esmaltada do século XIX.
É importante ter em mente que o processo de transformação da argila em cerâmica pode variar dependendo do tipo de argila, das técnicas específicas de fabricação e propósitos desejados. Cada etapa do processo requer habilidades técnicas e conhecimento para obter os resultados desejados em termos de forma, resistência, textura e aparência das peças de cerâmica!
Tá mas cientificamente, o que são cerâmicas?
Os materiais são divididos em classes correspondentes às suas propriedades principais. Temos metais, polímeros (plásticos), cerâmicas e compósitos (materiais produzidos a partir das misturas das demais classes, por exemplo o cimento Portland). Então, as cerâmicas são materiais inorgânicos, não metálicos, compostos tipicamente por uma combinação de elementos metálicos e não metálicos, como óxidos! O alumínio, por exemplo, é um metal, mas o óxido de alumínio, chamado de alumina, é uma cerâmica! Os materiais cerâmicos podem ser classificados em várias categorias com base em sua composição e estrutura.
Figura 4: Classificação de materiais cerâmicos e suas bases de aplicação.
Entre as cerâmicas temos: as tradicionais (que já comentei anteriormente), os vidros e vitrocerâmicas, as refratárias, as abrasivas, os cimentos e as cerâmicas avançadas, que falaremos mais adiante. A composição mais comum inclui óxidos (por exemplo, alumina), nitretos (por exemplo, nitreto de silício), carbetos (por exemplo, carbeto de silício) e silicatos (por exemplo, porcelana). Cada tipo de cerâmica possui seu próprio conjunto único de propriedades, tornando-o adequado para diferentes aplicações. Então, vamos lá para as tais propriedades!
Suas propriedades mais famosas incluem pontos de fusão elevados, alta estabilidade térmica, alta dureza, fragilidade e excelente resistência ao calor, desgaste e corrosão. Tá, mas dureza e fragilidade, o que essas grandezas significam? Como quantificamos se um material é frágil ou duro? Essas propriedades mecânicas referem-se ao comportamento e resposta desses materiais quando submetidos a forças ou cargas mecânicas. Essas propriedades descrevem como os materiais se deformam, resistem a essas deformações e se comportam quando submetidos a tensões, compressões, torções, flexões ou outras formas de carga.
A dureza é uma propriedade mecânica que mede a resistência de um material a deformações permanentes causadas por forças de compressão, penetração, fricção ou impacto. É a capacidade de um material resistir à penetração ou riscagem por outro material mais duro. E claro, escolhemos pontas de prova específicas para as diferentes classes de materiais. Para as cerâmicas, escolhemos por exemplo uma pirâmide de diamante (calma, ela é milímétrica!) e apertamos essa pirâmide no material, caracterizamos a dureza a partir da penetração dessa pirâmide na superfície da amostra (que é preparada especialmente para esse teste). O resultado do experimento é geralmente expresso em termos de uma escala de dureza específica, como a escala de dureza Vickers (HV) (essa do diamante que descrevi), a escala de dureza Brinell (HB) ou a escala de dureza Rockwell (HRC). Todas essas escalas têm tabelas de correlação e suas metodologias são tabeladas em normas internacionais como a ASTM (American Society for Testing and Materials, ou Sociedade Americana de Testes e Materiais).
Mas, a dureza de um material está relacionada à sua estrutura cristalina, ou seja, como os átomos desse material estão organizados, à presença de impurezas, ao grau de ligação entre átomos ou moléculas, à presença de fases microestruturais, e outras propriedades mecânicas, como resistência, ductilidade e tenacidade. A estrutura atômica das cerâmicas é caracterizada por uma rede tridimensional de átomos ou íons mantidos juntos por ligações iônicas ou covalentes fortes.
Figura 5: Teste de dureza Vickers. As cerâmicas são mais duras, ou seja, a ponta de diamante penetra menos do que nos metais (aço, na direita).
A ligação iônica envolve a atração eletrostática entre íons de cargas opostas ou entre dois átomos com eletronegatividades bem diferentes, como o Alumínio e o Oxigênio, por exemplo, eletronegatividade é a tendência de um átomo de atrair elétrons. O composto iônico mais famoso é o sal de cozinha, NaCl. Compostos iônicos são formados por ânions (negativos) e cátions (positivos), mas são neutros e sua estrutura atômica é extremamente regular, de forma a minimizar a energia de rede. Numa aproximação meio rude, poderíamos considerar os ânions e os cátions como esferas com cargas superficiais, então sua organização seria dada pelo empacotamento dessas esferas, claro, dependendo de cada tipo de estrutura que os compostos formam. Por causa desse tipo de ligação, as redes cristalinas iônicas são muito fortes. Esse tipo de ligação também resulta em uma condução eletrônica muito baixa ou nula no estado sólido, é como se as cargas desses íons estivessem “ocupadas” em mantê-los na forma sólida, não sobrando cargas para que haja condução.
A fusão de um composto iônico requer muita energia para romper todos os vínculos iônicos no cristal. Por exemplo, o cloreto de sódio tem uma temperatura de fusão de cerca de 800 °C, a água, um composto molecular, funde a 0 °C. O ponto de fusão vai depender da carga dos íons, quanto maiores forem as cargas, maiores serão as forças de coesão e, consequentemente, mais elevado será o ponto de fusão. Eles também tendem a ser solúveis em água; quanto mais fortes forem as forças de coesão, menor será a solubilidade.
Exemplos de cerâmicas de compostos iônicos:
Óxido de Alumínio (Al2O3): bem conhecido como alumina, é um material de alta resistência ao calor, à abrasão e à corrosão. É utilizado em aplicações como revestimentos cerâmicos, isolantes elétricos, componentes de fornos de alta temperatura e substratos eletrônicos. A alumina é um isolante térmico e elétrico, utilizado também como catalisador para algumas reações químicas industriais, como a produção de amônia. Seu ponto de fusão é de 2050 °C.
Óxido de Zircônio (ZrO2): também conhecido como zirconia (não confundir com zircão, esse é outro mineral). Provavelmente você já deve ter ouvido falar que a zircônia cúbica é uma imitação de diamante… e nem é só na aparência. É um material com altíssima estabilidade térmica e dureza, usado em aplicações como implantes dentários, componentes de próteses ortopédicas, facas cerâmicas e lâminas de turbinas. É uma das cerâmicas mais utilizadas, dopadas com outros óxidos para obter outras propriedades, como a condutividade iônica para aplicação em células combustíveis de óxido sólido (outro dia conto mais como sei desse assunto). Tem ponto de fusão de 2715 °C.
Nitreto de Alumínio (AlN): possui alta condutividade térmica e dielétrica, o que o torna ideal para aplicações em eletrônica, como substratos de circuitos integrados, isolantes térmicos e componentes de dissipação de calor. Uma de suas fases cristalinas tem potencial de aplicação em optoeletrônica operando em frequências do ultravioleta profundo. Em altas pressões, esse material passa por uma transição supercondutora e seus filmes finos têm propriedades piezoelétricas. Piezoeletricidade é uma resposta elétrica a uma tensão mecânica (e vice-versa), esse material tem essa característica devido à sua estrutura eletrônica. Tem ponto de fusão de 2500 °C.
Já a ligação covalente é aquela em que os átomos compartilham elétrons ou pares de elétrons, e esse compartilhamento é tal que preenche as camadas de valência entre esses átomos, fazendo com que haja uma estabilidade eletrônica desses compostos. Um exemplo é a molécula do gás hidrogênio (H2). Um composto covalente não precisa ter seus átomos iguais, bastando apenas que suas eletronegatividades sejam similares. Essa estabilidade na formação do composto garante a alta dureza das cerâmicas formadas por compostos covalentes. E por ter a valência completa, a maioria delas geralmente não possuem a capacidade de conduzir eletricidade e calor de forma eficiente. Em geral, a condução eletrônica e a condução térmica são mediadas pelos elétrons livres, por isso os metais seguem na frente na comparação dessas grandezas, embora algumas cerâmicas apresentem comportamento semicondutor ou supercondutor em condições MUITO específicas, como o cuprato de ítrio e cobre (YBa2Cu3O7−x), que tem uma transição supercondutora abaixo de -195 °C (N2 líquido). .
Exemplos de cerâmicas de compostos covalentes:
Dióxido de Silício (SiO2): chamado também de sílica ou quartzo, o dióxido de silício é uma cerâmica covalente cheia de aplicações (só lembrando que o Si é um dos elementos mais abundantes na crosta terrestre!). Pode ser encontrada em formas cristalinas, como o mineral quartzo e a cristobalita, e também em formas amorfas, como o vidro. É um isolante elétrico muito importante para a indústria dos chips integrados, como substrato, e para a produção de concreto (concreto de cimento Portland). Tem ponto de fusão de 1713 °C, sendo usado na fundição de metais como o ferro e cobre. Usamos muito a sílica amorfa como vidro, mas ela também pode ser nanoestruturada e carreadora de drogas ou antígenos.
Nitreto de Boro (BN): é um material com propriedades semelhantes às do diamante. É refratário termicamente e quimicamente resistente. Existe em várias formas cristalinas diferentes. A forma hexagonal, similar a do grafite, é a mais estável e macia entre os polimorfos do BN, sendo utilizada como lubrificante e aditivo em produtos cosméticos. A estrutura cúbica (também conhecida como esfalerita) é análoga ao diamante, mas com menor dureza. Em contrapartida, a sua estabilidade térmica e química é superior. É utilizada em aplicações de alta temperatura, como revestimentos protetores, isolantes elétricos e substratos para eletrônica. Tem ponto de fusão de 2973 °C.
Carbeto de Silício (SiC): é um composto cerâmico extremamente duro e resistente, com excelentes propriedades mecânicas e térmicas. Pode ser tanto um sólido amorfo quanto cristalino. É utilizado em aplicações de alta temperatura, como componentes de motores de combustão interna, refratários, peças de desgaste e abrasivos. Também é utilizado em coletes balísticos e estruturas automotivas. Os primeiros LEDs foram fabricados com SiC, pois é um semicondutor! LEDs amarelos foram produzidos na União Soviética nos anos 70! Seu ponto de fusão é de 2830 °C.
Claro que as ligações iônica e covalente são modelos que usamos para descrever a física e a química de como alguns sólidos se formam. Assim, não existem compostos cujas ligações sejam 100% iônicas ou 100% covalentes. Tudo depende de quais átomos compõem os sólidos e as cargas envolvidas. O SiC tem cerca de 12% de caráter iônico, por exemplo.
E, por causa dessas propriedades eletrônicas e estruturais, as cerâmicas têm baixa ductilidade. É uma palavra diferentona da ciência de materiais para dizer que elas não sofrem ou sofrem pouquíssima deformação. Materiais dúcteis podem sofrer grandes deformações antes de quebrar, enquanto materiais frágeis falham sem deformação plástica significativa. Em um material dúctil, como o cobre, podemos fazer fios de vários diâmetros diferentes sem que os fios se rompam. Já as cerâmicas são duras, mas frágeis e, ao se romper, não se deformam. No caso de cerâmicas iônicas, por exemplo, é necessária uma grande quantidade de força mecânica, como bater em um cristal com um martelo, para forçar uma camada de íons a se deslocar em relação ao seu vizinho. Mas, quando isso acontece, aproxima os íons de mesma carga, então as forças repulsivas entre os íons de carga semelhante fazem com que o cristal se estilhace. Quando um cristal iônico se quebra, ele tende a fazê-lo ao longo de planos suaves devido ao arranjo regular dos íons. Então, se você pegar um pedaço de plástico, consegue deformá-lo bastante antes de rompê-lo, no caso da sua caneca caindo no chão, já era. Ela vai quebrar em vários pedacinhos!
Fazemos um teste bem famoso em ciência dos materiais chamado teste (ou ensaio) de tração mecânica. É um dos testes mais comuns realizados em materiais metálicos, poliméricos e cerâmicos. Fornece informações importantes sobre a capacidade do material de resistir à aplicação de forças de tração. Para fazer esse ensaio aplicamos uma força gradual e controlada em uma amostra de material. A amostra, na forma de um corpo de prova com uma geometria padronizada, é fixada a uma máquina de teste, conhecida como máquina de ensaio universal. A máquina aplica uma força de tração gradualmente crescente à amostra, enquanto mede a deformação resultante.
Durante o teste, são registradas duas grandezas principais: a carga aplicada (força/área, medida em geral em MPa ou GPa) e a deformação resultante (alongamento ou variação no comprimento da amostra). Esses dados são usados para calcular várias propriedades mecânicas, como a tensão de tração, a deformação ou elongação percentual, a resistência à tração e o módulo de elasticidade. O resultado do ensaio de tração é uma curva chamada de curva de tensão-deformação, que fornece informações importantes sobre o comportamento do material sob tensão. Ele revela a capacidade do material de resistir à deformação plástica, sua resistência máxima antes da fratura, a dureza ou fragilidade do material e sua capacidade de absorver energia antes de se romper. Além disso, o teste de tração pode ser usado para comparar diferentes materiais, avaliar a qualidade, verificar a conformidade com padrões e especificações técnicas e auxiliar no projeto de componentes e estruturas, determinando a capacidade de carga e a segurança do material.
Figura 6: Teste de tração mecânica. É aplicada uma tensão (força/área) em ambas extremidades do corpo de prova. O Gráfico tem 3 regiões principais: a parte linear define o Módulo de Young ou a rigidez do material. A segunda parte determina a deformação plástica, ou seja, a deformação irreversível do corpo de prova. Já, o final da curva indica a tração total antes da fratura, chamada de tenacidade.
Figura 7: Curva mostrando a diferença entre materiais quebradiços (curva vermelha), materiais dúcteis (curva preta), e materiais plásticos (curva azul). As cerâmicas tem características da primeira curva, suportam uma carga muito alta, mas não sofrem deformação plástica, fraturam direto.
Figura 8: Comparação de dureza Vickers (ponta de diamante) entre várias cerâmicas e o aço inoxidável (metal).
Figura 9: Tenacidade entre cerâmicas e o aço inoxidável (metal). Tenacidade é a capacidade de um material absorver energia e se deformar permanentemente (plasticamente) sem fraturar, é um equilíbrio entre resistência e ductibilidade. O aço é mais dúctil, ou seja, é menos tenaz do que as cerâmicas, mas pode se deformar ao invés de romper bruscamente.
As cerâmicas possuem uma ampla gama de aplicações avançadas devido às suas propriedades únicas e desempenho excepcional em diversas condições. Falei de algumas, quando dei exemplos de cerâmicas iônicas e covalentes, mas tem MUITO MAIS! Algumas das aplicações avançadas de cerâmicas são:
Componentes Eletrônicos: alumina e nitreto de silício são amplamente utilizados na fabricação de substratos, capacitores, isolantes e componentes para eletrônicos. Suas propriedades dielétricas, isolantes e térmicas os tornam ideais para aplicações em eletrônica de alta/baixa potência, semicondutores, sensores e dispositivos de comunicação. Filmes finos cerâmicos são importantes para dispositivos de memória e até computação quântica!
Revestimentos Protetores: a alumina e o carbeto de silício são usados como revestimentos protetores em várias indústrias. Esses revestimentos oferecem resistência ao desgaste, corrosão, altas temperaturas e ambientes agressivos. São aplicados em componentes de motores, turbinas, equipamentos químicos e biomédicos.
Biocerâmicas: cerâmicas como a hidroxiapatita e o vidro bioativo são usadas em implantes médicos e odontológicos. Esses materiais são biocompatíveis, não provocam reações adversas no corpo humano e são capazes de se ligar ao osso, promovendo a regeneração óssea. São utilizados em próteses, implantes dentários, revestimentos de superfícies e sistemas de liberação controlada de medicamentos.
Energia Renovável: além da sílica, materiais como o nitreto de silício são usados em células solares de alta eficiência. Além disso, cerâmicas piezoelétricas, como o titanato de bário, são utilizadas em dispositivos de colheita de energia eólica, transformando a energia mecânica em eletricidade.
Isolantes Térmicos: a alumina policristalina (PCA) e o nitreto de boro possuem excelentes propriedades isolantes térmicas. São utilizados como isolantes térmicos em aplicações de alta temperatura, proteção de equipamentos de aquecimento, sistemas de isolamento refratários para fornos.
Materiais Cerâmicos Avançados: Cerâmicas especiais, como o nitreto de boro cúbico (c-BN) e o diamante policristalino (PCD), possuem propriedades excepcionais de dureza, condutividade térmica e resistência à abrasão. Esses materiais são utilizados em ferramentas de corte, brocas, revestimentos de desgaste, componentes de alta precisão e aplicações industriais de alta exigência.
Essas são apenas algumas das muitas aplicações avançadas de cerâmicas. Com a contínua pesquisa e desenvolvimento, novos materiais cerâmicos e aplicações emergem, expandindo ainda mais o campo das cerâmicas de alta tecnologia. E aí, gostou de saber mais sobre esse assunto? Topariam um episódio sobre metais? Polímeros? Que tal?
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Pra aprender:
Um aplicativo de navegador MUITO MELHOR que o chatGPT! É o Consensus, infelizmente somente em inglês, mas sensacional para pesquisa! Você escreve uma pergunta científica e ele mostra pequenas citações dos artigos, colocando em primeiro lugar, os artigos mais citados. È excelente para pesquisa bibliográfica. Acabei de descobrir e ajudou muito na escrita dessa pauta!
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