Link do episódio: #S01E03 Tudo bem não estar bem!
Olá Mamutinhes, aqui é a Gabi e hoje eu serei a locutora de vocês. E participando comigo desse episódio sobre setembro amarelo estão comigo a minha xará Gabriele Carvalho e a Victoria, ambas da produção do Mamucast!
Elisana: "Oi galera! Boa tarde, é um prazer poder estar aqui com vocês. Meu nome é Elisana, sou psicóloga clínica, formada pela Unisal, sou especialista em terapia cognitiva comportamental e atua na cidade de Lorena e na cidade de Guaratinguetá."
1 - Abertura do episódio (Gabi W)
Para começar este episódio, devemos entender a origem do setembro amarelo e como ele conseguiu movimentar uma comunidade inteira integrando várias pessoas de diferentes nacionalidades. Isso nos leva de volta à década 90, mais precisamente ao ano 1994 e à trágica história de Mike Emme. Ele era um jovem amoroso e aficionado por carros e mecânica. Seu xodó era um mustang 68 amarelo que ele mesmo restaurara. Contudo, sem ao menos completar 18 anos, Mike tirou a própria vida em seu mustang amarelo chocando todos à sua volta, que não faziam a menor ideia de que ele estava com problemas e precisava desesperadamente de ajuda. Em seu funeral, amigos e familiares distribuíram cartões com fitas amarelas e mensagens de apoio para pessoas que estivessem porventura enfrentando o mesmo desespero que Mike. A mensagem cresceu e, eventualmente coloriu o mundo de amarelo.
Suicídio, do latim suicidium, em que sui corresponde a si próprio e caedere, a matar, é o ato deliberato de tirar a própria vida. De acordo com dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) de 2016, cerca de 800.000 pessoas tiram a própria vida a cada ano. Em outras palavras, uma pessoa se mata a cada 40 segundos. Trata-se de uma das 20 causas mais comuns de morte, superando em números absolutos as mortes ocasionadas pela malária, câncer de mama, guerras e até mesmo homicídios. Em particular, é a segunda maior causa de mortes entre jovens de 15 a 29 anos, sendo superada apenas por acidentes de trânsito. Ainda de acordo com a OMS, no Brasil, 13.467 pessoas morreram por suiícidio em 2016. Comparando com os dados do estudo anterior de 2010, houve um aumento de quase 100%.
O suicídio não é um grave problema de saúde pública apenas dos países de alta renda. Trata-se de um fenômeno global, posto que 79% dos suicídios ocorrem em países de baixa e média renda de acordos com dados da OMS de 2016. Contudo, diversos estudos apontam que suicídios podem ser evitados com intervenções de baixo custo, desde que ocorram em momentos oportunos.
Muito embora a relação entre o suicídio e os disturbios mentais, como ansiedade, depressão e o abuso de substâncias, esteja bem estabelecida em países de alta renda, muitos suicídios ocorrem de forma impulsiva em momentos de crise devido a uma perda momentânea da capacidade de se lidar com os estresses da vida, tais como problemas financeiros, términos de relacionamento e doenças crônicas. Adicionalmente, as taxas de suicídio são extremamente elevadas em populações vulneráveis, como a LGBTQIA+, que sofrem paulatinamente com a discriminação e o isolamento social.
Neste episódio, abordaremos a saúde mental em três contextos não necessariamente disjuntos. Primeiro, falaremos sobre como a discriminação, o preconceito e a violência que acometem cronicamente a população LGBTQIA+ são fatores importantes para o elevado risco de suicídio que essa população enfrenta. A seguir, discutiremos como a ansiedade e a depressão, tão comuns no meio acadêmico, podem levar a ideações suicidas e eventualmente a tentativas de suicídio. Num ambiente em que ainda é tabu falar sobre saúde mental, vemos es alunes cada vez mais doentes e ainda incapazes para lidar adequadamente com tais desafios. Finalmente, conversaremos sobre como isolamento social decorrente das medidas de contenção da pandemia da COVID-19 catalisaram esses problemas.
2 - LGBTQI (Gabi W)
É muito difícil apontar uma causa direta e única para um suicídio. Uma vez que ele é a consequência de uma somatória de eventos ao longo de nossas histórias, cuja interferência destrutiva vai gradativamente minando a nossa saúde mental. Os fatores são diversos e incluem, mas não se restrigem, a fatores ambientais, biológicos, culturais e psicológicos. Geralmente, o que denominamos de causa, trata-se apenas do último evento dessa cadeia desastrosa.
É um fato, já muito bem estabelecido na literatura, que as taxas de suicídio e de ideação suícida na população LGBTQIA+ são significativamente mais elevadas do que na população geral. Essa discrepância é ainda mais notável quando nos restringimos à juventude LGBTQIA+, que corresponde à parcela da população com as maiores taxas de tentativa de suicídio.
Desde o começo da década de 1990, as pesquisas populacionais nos Estados Unidos da América incluem questões sobre a orientação sexual dos participantes. Com isso, foi constatado que as taxas de tentativas de suicídio de jovens LGB são de 2 a 7 vezes mais altas do que de jovens que se declaram heterossexuais. Tais tentativas, embora estatisticamente concentradas durante a adolescência, não se restringem a esse período da vida. De acordo com alguns estudos, essa correlação seria devido ao fato de que é durante a adolescência que predominantemente exploramos e descobrimos a nossa sexualidade. De forma que, as tentativas de suicídio estariam muito mais ligadas aos fenômenos de descoberta e revelação de nossa não-heterossexualidade do que com a idade cronológica propriamente dita.
Diversos estudos constataram uma relação entre o elevado número de tentativas de suicídio dentre a juventude LGB e taxas alarmantes de transtornos de ansiedade e de humor, de depressão e de abuso de substâncias nessa subpopulação. Em particular, o resultado combinado de 25 estudos internacionais, abarcando tanto jovens quanto adultos, revelou que tais transtornos são pelo menos 1,5 vezes mais comuns em indivíduos LGB do que em suas contrapartes heterossexuais. Assim, ao longo das últimas décadas acumulou-se evidência suficiente para afirmar que tais elevadas taxas de tentativa de suicídio e de transtornos mentais na população LGBBTQIA+ estariam diretamente relacionadas com o estigma social, o preconceito e a discriminação associados com orientações sexuais minoritárias.
A discriminação, seja na forma de rejeição pessoal, hostilidade, assédio moral e sexual e violência física, faz parte da experiência diária de pessoas LGBTQIA+ e afeta profundamente a saúde mental dessa subpopulação. Uma forma particularmente cruel de agressão à juventude LGBTQIA+ corresponde à rejeição que sofremos dos pais e demais familiares. Não à toa, diversos estudos correlacionaram a rejeição parental devido à orientação sexual com o risco de tentativas de suicídio entre jovens LGB. Em particular, um estudo envolvendo jovens adultos LGB com idades entre 21 e 25 anos constatou que aqueles que sofreram algum tipo de rejeição dos pais ou responsáveis tinham uma probabilidade pelo menos 8 vezes maior de reportarem uma tentativa de suicídio do que aqueles que foram devidamente acolhidos pelos pais ou responsáveis.
A discriminação fora do ambiente doméstico também tem um importante papel no declínio da saúde mental da população LGBTQIA+. Seja no ambiente escolar, onde diversos estudos correlacionaram o comportamento suicida de jovens LGBTQIA+ com assédio e violência que sofrem devido a sua sexualidade ou expressão de gênero divergentes. Seja na esfera pública, em que leis e políticas públicas podem promover a desigualdade de gênero e sexualidade ou falhar em proteger o indivíduo contra a discriminação baseada em gênero ou sexualidade.
Os Estados Unidos da América, devido à sua organização política que confere grande autonomia política aos estados, constitui um campo interessante para estudos comparativos sobre o impacto das políticas públicas na saúde mental da população LGBTQIA+. Um estudo usando dados do NESARC (National Survey on Alcohol and Related Conditions) revelou que adultos LGB vivendo em um dos 19 estados que não tinham legislação específica para a proteção da população LGBTQIA+ contra discriminação e crimes de ódio apresentavam uma maior prevalência de transtornos de ansiendade e de humor, bem como de abuso de substâncias do que a parcela cishetero da população de tais estados ou de pessoas LGBTQIA+ que moravam em estados com uma legislação adequada.
Um estudo subsequente comparou dados de duas edições consecutivas da NESARC para examinar o impacto na população LGB da proibição do casamento homoafetivo em diversos estados dos EUA. Usando os dados provenientes dos 16 estados que baniram o casamento homoafetivo entre 2004 e 2005, constatou-se um aumento significativo de transtornos mentais dentre os respondentes LGB desses estados entre as edições de 2001-2002 e de 2004-2005 da NESARC. Em particular, transtornos de humor aumentaram de 23% para 31%, transtornos de ansiedade de 3% para 9% e abuso de substâncias de 22% para 31% na população LGB desses 16 estados. Por outro lado, nenhum aumento significativo nos transtornos mentais foi observado na contraparte heterossexual da população desses estados.
Os pesquisadores atribuíram esse declínio pronunciado da saúde mental da população LGB à hostilidade promovida pelas campanhas políticas e discursos públicos que precederam a passagem de tais legislações, pronunciando ainda mais o estigma social e a marginalização legal da população LGB. Um cenário de terror semelhante ao que emergiu em nosso próprio país decorrente do discurso de ódio propagado no contexto eleitoral de 2018. Conforme pesquisa realizada pela ANTRA (Associação Nacional de Travestis e Transexuais do Brasil) no primeiro semestre de 2019 com cerca de 1350 participantes, 99% dos respondentes LGBTQIA+ não se sentem seguros no país.
P: Elisana, essa sensação generalizada de insegurança que a população LGBTQIA+ enfrenta pode ser a causa de diversos transtornos psicológicos. Que tipo de hábitos podemos cultivar para mitigar o seu impacto em nossa saúde mental?
Bem gente. Não é de hoje que a população LGBTQIA+ vem sofrendo preconceito, então a falta de aceitação social desse público também, pode sim, provocar vários transtornos psicológico e o mais comuns entre esse grupo específico são: a ansiedade, a depressão e o risco de suicídio.
Eles sofrem tanto que passam a imaginar e algumas vezes a desejar o suicídio como uma possibildades, como uma melhora, como se qualquer outra coisa não adiantasse, isso é muito complicado. Eles sofrem mentalmente por conta desse preconceito e por mais que a gente fale que aceita, que está tudo bem, que somos tolerantes com tudo e com todos, não somos na verdade, ainda precisamos melhorar muito nessa questão da tolerância, nós não entendemos o que é diferente, nós não entendemos a subjetividade das pessoas, nós dizemos que entendemos, mas não, precisamos melhorar.
Para amenizar tudo isso, nós podemos de certa maneira fazer um acolhimento desse público, uma escuta, prestar atenção na necessidade desse público, acolher de verdade, potencializar também a resiliência dessas pessoas com a conversa, com carinho, com atenção. Eles precisam ser muito resilientes para poder enfrentar toda essa situação ainda, apesar de ter melhorado um pouco, não é o suficiente, fortalecer a rede de apoio dessas pessoas, com familiares, com amigos. Oferecer ajuda, se informar mais também sobre tudo se é possível indicar um profissional caso necessário, vai ajudar muito essa pessoa a enfrentar essas situações do mundo.
Além de todos os mecanismos de opressão que as minorias sexuais sofrem, a população trans ainda tem que lidar com uma série de fatores particulares. Notadamente, lidar com a disforia de gênero e o desrespeito generalizado à nossa identidade de gênero nas mais diversas esferas da vida afeta profundamente a nossa saúde mental. Enquanto o primeiro é um fator inerente ao indivíduo, relacionado com a angústia gerada por uma dissonância entre o nosso gênero verdadeiro e aquele que nos foi forçadamente imposto ao nascermos, o segundo surge como uma reação cruel e desproporcional à nossa existência por parte da sociedade cisheteronormativa em que vivemos. Aos olhos dessa sociedade, somos potencialmente disruptivas uma vez que simultaneamente desafiamos todos os pilares sobre o qual ela se sustenta: binarismo de gênero, falsas associações entre genitália sexualidade e identidade de gênero e sexismo tradicional e oposicional.
O resultado é que a população trans sofre muito mais abandono, assédio, discriminação e violência do que a população LGB cis. A saber, a idade média com que travestis e mulheres trans são expulsas de casa pelos pais é de 13 anos. Por outro lado, com mais de 129 assassinatos de pessoas trans nos 8 primeiros meses de 2020, um aumento de 70% em relação ao mesmo período do ano passado, o Brasil ocupa a inglória posição de país que mais mata pessoas trans no mundo. Consequentemente, é de se esperar que tal população apresente uma pior saúde mental e maiores taxas de suicídio. De fato, pessoas trans são duas vezes mais propensas a ideações suicidas do que pessoas cis LGB. Estima-se que aproximadamente metade da população trans tenta ao menos uma vez tirar a própria vida.
Apesar de a transgeneridade ter sido removida em maio de 2019 da Classificação Internacional de Doenças pela OMS, o estigma de transtorno mental ainda persiste e permeia a medicina e a psicologia. Isso torna ainda mais traumático o acesso ao processo de transição de gênero, pois além das pessoa trans terem que lidar com todas as incertezas inerentes à terapia hormonal e às cirurgias, elas precisam lidar com profissionais completamente despreparados. Muitos dos quais ainda erroneamente insistem na já banida terapia de conversão. Não obstante, há uma diminuição drástica das ideações suicidas com a transição. Notadamente, de acordo com um estudo de 2014, 67% das pessoas trans têm ideações suicidas pré-transição, enquanto que apenas 3% apresentam tais pensamentos pós-transição.
P: Elisana, como podemos lidar com esse cenário de profissionais de saúde mental ainda muito mal preparados para lidar com as questões da saúde mental da população LGBTQIA+?
Nessa questão, realmente as políticas públicas ainda deixam a desejar, em relação a população LGBTQIA+ muitos ainda relatam ter sofrido preconceitos, tanto em consultório médico, odontológicos, inclusive psicológicos dá até vergonha na gente aqui, posso dizer por mim, isso não deveria acontecer. Então muitos dos direitos básicos, que a gente diz que tem, na verdade não tem, está tudo bem escrito, mas na hora da prática não é bem assim que é realizado, já vi vários relatos tristes de pessoas que foram maltratados somente por sua sexualidade que cada um tem o direito de ter a sua, nós temos uma vida, podemos viver da forma que acharmos melhor, é complicado a pessoa procurar um apoio e encontrar uma porta fechada, encontrar um preconceito, um ódio, muito chato isso, as pessoas não deviam passar por isso. Sim! Falta muita humanidade ainda nas pessoas, nos profissionais da área da saúde e de qualquer área, mas em contrapartida, nós temos alguns programas já funcionando, temos alguns psicólogos se preparando e preparados também para atuar com esse público, de certa forma todos nós temos que lutar por políticas públicas melhores, que visam tratamentos de todos de forma igualitária, temos que buscar conhecimentos teóricos sobre essa população, tentar entender melhor. Se possível, participar desses grupos também, a prática é muito boa. Você lê, você estuda, mas e a prática, as vivências que você pode ter com essas pessoas, elas também são válidas para a gente entender a dor do outro, a gente precisa estar próximo desse outro, desse grupo no caso, para entender melhor quais são as necessidades deles, isso é de extrema importância.
Uma forma de compreender o processo que leva minorias, como a população LGBTQIA+, ao suicídio é através do modelo de Estresse de Minorias. Ele se sustenta sobre a premissa de que a homofobia e a transfobia criam um ambiente hostil que causa estresse e aumenta o risco de transtornos mentais. Essa racionalização conversa diretamente com a dimensão de "pertencimento frustrado" da Teoria Interpessoal-Psicológica do Suicídio (TIPS), no sentido de que a falta de apoio social aumenta a sensação de que os outros não nos aceitam ou simplesmente não se importam conosco. Consequentemente, propiciando o surgimentos de sensação de que não passamos de um estorvo para as pessoas ao nosso redor, o que corresponde a dimensão de "fardo percebido" da TIPS. Finalmente, esse tipo de experiência contribui para comportamentos depressivos, abuso de substâncias e sexo inseguro que, por sua vez, estão correlacionados com tentativas de suicídio. Finalmente, tentativas anteriores, além de serem de acordo com a OMS o fator de risco mais importante para o suicídio na população geral, coincide no arcabouço da TIPS com a dimensão de "capacidade adquirida para o suicídio".
3 - Estresse e depressão entre universitários (Gabi C)
A vida universitária exige muita maturidade emocional para lidar com os novos desafios que essa nova etapa da vida traz, desde o ingresso na instituição até a aproximação da entrada para o mercado de trabalho.
Tantas expectativas sobre o seu futuro, tanto profissional quanto pessoal, muitas vezes levam a transtornos psicológicos, que muitas vezes não são reconhecidos ou não são levados a sério. O desconhecimento desses problemas leva à desconsideração dos sintomas e a tratamentos equivocados. Muitos casos de depressão e ansiedade são tardiamente ou erroneamente diagnosticados e muitos comportamentos, como má alimentação, inatividade física, uso de drogas lícitas ou ilícitas, são levados como maus hábitos de saúde, mas, muitas vezes, não associados com problemas psicológicos.
Diversos estudos apontam que os números para ansiedade e depressão entre estudantes universitários chegam a ser mais altos do que os do resto da população em geral, e que as mulheres são mais afetadas.
P: Elisana, por que as mulheres universitárias são mais propensas a apresentarem síntomas de depressão e ansiedade?
No caso da pergunta com mulheres universitárias, a gente sofre pressão para escolher o curso, para ir embora para fazer o curso em outra cidade, somos mulheres, corremos riscos, podemos ser assaltadas, violentadas, machucadas, o pai não quer isso, a mãe não quer aquilo, começamos uma briga para poder sair de casa para estudar. Começa a estudar, o pai e a mãe começam a brigar porque você tem que terminar logo esse estudo, você começa a se culpar porque pegou um DP, começa a se culpar porque não conseguiu estudar o suficiente, deixou um trabalho para trás e você está com pressa porque tem que terminar o curso logo, porque você precisa devolver o investimento para os seus pais ou até mesmo porque você quer a tão sonhada liberdade financeira onde você não precisa de mais nada, você é autossuficiente e você faz tudo, inclusive as coisas não são bem assim, porém desejamos que seja assim. Por conta de tudo isso é que estamos nessa situação que estamos vivenciando hoje: muitas pessoas deprimidas e ansiosas.
De acordo com o artigo "Vulnerabilidade e bem-estar psicológicos do estudante universitário", alguns fatores que podem desencadear isso são:
O estresse do ambiente acadêmico. Segundo o artigo, a causa de aproximadamente 60% dos casos de depressão é a ocorrência de fatores estressantes.
A falta de desenvolvimento da socialização e comunicação com colegas, professores e sociedade, que fazem os efeitos negativos do estresse aparecerem.
A mudança de cidade, que tira do jovem o conforto e segurança do seu círculo familiar e traz como desafios novas adaptações com lugares e pessoas.
O ano acadêmico. Os novos estudantes têm taxas maiores de sintomas de depressão e ansiedade. Um estudo da Associação Americana de Psicologia, mostrou que um terço dos calouros sofrem de distúrbios psicológicos. Esse estudo ouviu 14 mil estudante de 19 instituições em 9 países.
A V Pesquisa Nacional de Perfil Socioeconômico e Cultural dos Graduandos das IFES de 2018, feita pela Associação dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes) e que ouviu mais de 420 mil estudantes, revela que mais de 6% dos estudantes já tiveram ideias de morte, 4% já tiveram pensamentos suicidas e que 8 em cada 10 estudantes já tiveram problemas como ansiedade, tristeza e desesperança.
Gabi, você como foi para você se adaptar a vida de estudante universitária e aprender a lidar com todas essas questões?
A minha adaptação com a faculdade foi bem difícil e ser bem ansiosa ajudou as coisas ficarem complicadas. No começo foi muito difícil me acostumar com a cidade e as coisas. Sentia muita falta de casa e do meu cachorro. Eu chorei praticamente a primeira semana toda e só fui ficar mais calma depois que as aulas começaram e eu comecei a focar em outras coisas e conhecer o pessoal da minha turma.
Depois disso eu fiquei mais calma, mas qualquer coisa que acontecia e me deixava triste já era um grande motivo para eu ficar pensando “quero ir embora!!!!!”. Como eu vim do outro lado do estado de São Paulo é bem difícil voltar para passar o fim de semana, então quando chegava qualquer tempo que dava para voltar eu já ficava bem ansiosa.
Com o passar do tempo eu me acostumei bem com tudo e fiquei bem mais confortável em Lorena. Porém, outra coisa começou a acontecer: eu ficava muito nervosa nas provas das matérias que o pessoal tem mais medo e comecei a ir mal nelas, na hora da prova eu ficava muito nervosa e não conseguia pensar, eu só queria que o tempo acabasse logo para eu poder ir embora, porque toda a situação me deixava muito mal, comecei a ter gastrite nervosa, falta de apetite, e vários outros sintomas de estresse. Depois quando eu ia refazer as questões eu sabia fazer e eu ficava muito brava.
Acabei ficando de recuperação e foi aí que tudo ficou pior, eu não conseguia estudar e eu só queria ir embora porque não tinha quase ninguém na república. Eu ficava o dia todo na cama vendo vídeo no youtube nos dias das antes da prova e só queria curtir as férias. Foi aí que eu comecei a passar muito mal, inclusive eu fui para a prova desse jeito.
No final, acabei passando porque foi a prova que eu fui melhor porque eu estava “carregando menos peso sobre ela” e eu nem estudei nada para ir fazer. Nesse dia eu fui para casa.
O segundo semestre foi bem mais de boa. E esse ano era para ser O ano, mas não foi possível também.
4 - Pandemia (Victoria)
Para começar a falar da situação atual que estamos vivendo, devemos primeiramente explicitar o que é pandemia. Pois bem, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), uma pandemia consiste na disseminação mundial de uma doença que, primeiramente em escala epidêmica ocorre um surto e após isso, se espalha por todas as regiões do mundo. Isso é possível quando o vírus consegue se replicar, espalhar mais rapidamente entre as pessoas e sua taxa de mortalidade não é tão alta.
Em 2009, a OMS decretou a gripe causada pelo vírus H1N1 como pandêmica e, após 14 meses, em agosto de 2010, foi decretada como contida. Isso foi possível pois houve ação política, houve parceria entre governos e os cientistas, pouca propagação de fake news, e a vacina foi desenvolvida rapidamente pois já havia conhecimento de base do vírus. Quando a vacina foi lançada no mercado, a curva já tinha se achatado bastante. Infelizmente, 11 anos depois,no Brasil, não conseguimos ter uma política pública unificada de combate à epidemia inicial do SARS-CoV-2, há muitas fake news circulando na boca do povo, não há um plano de ação decretado, não houve uma parceria entre governadores e pesquisadores, é um cabo de guerra entre o misticismo e a ciência, e as redes sociais como whatsapp são os principais meios de propagação de informações falsas. Há vários países que conseguiram combater esses males, e a maioria desses países são liderados por mulheres como a Nova Zelândia. Nos principais casos analisados, percebe-se o distanciamentos social rígido, testes em massa para o mapeamento da proliferação do vírus, restrições duras de higienização. Mas para todos os decretos serem cumpridos devidamente, as governadoras ficaram do lado da ciência, desmistificaram as fake news, foram bastante transparentes com o povo, houve um plano de ação e cada país avaliou a melhor maneira para achatar a curva com o mínimo de prejuízo.
Nessa viagem pelo mundo, paramos no Brasil. Vamos começar essa história direito, todos sabem que tem coisas da vida que são divididas entre o antes e depois, são coisas marcantes que depois da situação ficamos desestabilizados, no Brasil podemos citar o Carnaval, uma festividade que marca o novo ano do povo. Sabíamos que tinha um vírus se espalhando pelos cantos do mundo, não sabíamos o que era, mas sabíamos que estava fazendo muito mal. Vários governos estavam agindo, mas mesmo com toda uma corrida desenfreada, ele conseguia derrubar até as pessoas mais fortes (histórico de atleta não ajuda gente, fiquem espertos), era uma questão de tempo até nos atingir, era um limbo, entre acreditar que nunca chegaria aqui e: ‘’impossível… se já tomei banho químico sou resistente a qualquer vírus.’’
Mas o baque chegou algumas semanas depois: os primeiros casos, a suspeita, corrida para sequenciamento do vírus, parcerias, histeria na internet. Lembro que isso estava acontecendo e eu estava dentro de uma sala de aula. Rumores se iriam decretar a quarentena, pois a universidade é composta de uma sociedade nômades, não sabia se voltava agora ou não, pensávamos em nosso familiares. Como serão as coisas em casa? Já não sabemos se somos visitantes ou moradores. Não se sabia de nada, acredito que não sabemos ainda de nada, planejamentos iniciais para a virada da década jogados no lixo.
Estamos vivendo em fases. Começamos com a da negação e depois da aceitação. Cito esses sentimentos, pois inicialmente negamos a situação atual: "como assim estamos numa pandemia". Passamos para a aceitação: "puts...precisamos nos cuidar". Com isso, começamos a acompanhar avidamente os noticiários científicos, cada dia era uma informação nova, um novo cuidado de higiene ou saúde para evitar se contaminar ou contaminar as pessoas ao nosso redor. Quando achávamos que estava para acabar, o Estado decretou quarentena por 2 semanas. Pensávamos ‘tudo bem...é algo que passará rápido’, conseguimos botar as séries em dias, curtir umas lives com os amigos online, matávamos a saudade com abraços virtuais. Pegamos aquele livro que começou criar pó na estante para nos entreter. Tínhamos tempos de sobra para fazer as coisas que precisamos, nos reconectar com as pessoas que amamos. No entanto quando queríamos desligar o cérebro por um tempo, não conseguíamos. Começou a cobrança por ser produtivo toda hora, uma corrida invisível para saber quem conseguia fazer mais cursos, ler mais livros, ficar feliz por mais tempo. E quando não conseguíamos, nossa mente era inundada por sentimentos negativos e de insatisfação. Nosso corpo quebrava. Estávamos tristes. Estávamos com raiva.
E com a raiva, vieram a ansiedade e a depressão. Nosso corpo começou a reclamar dessa sobrecarga emocional: problemas na garganta, tensão muscular, reações do fígado, baço ativado, reação da pele. Sabe aquela coceira involuntária, fique de olho, é seu corpo lhe avisando que não está bem. Esse quadro pode agravar ainda mais se não procurarmos ajuda. Contudo, pedir ajuda para lidar com a ansiedade e depressão ainda é tabu em nossa sociedade de aparências.
P: Elisana, como podemos nos aproximar de alguém que apresenta sinais de depressão ou ansiedade? Como lidar com temas tão delicados?
“Para você que tem um amigo/amiga com sinais de depressão e ansiedade, para se aproximar dessa pessoa, pratique a escuta, ela é mais necessária do que a própria fala. Essa pessoa precisa ser ouvida e acolhida, vá sem preconceitos e escute, pergunte se você pode ajudar e como você pode ajudar. Nesses casos, por exemplo, têm pessoas que vão pedir um abraço, têm pessoas que vão pedir para falar, têm pessoas que vão querer simplesmente que você se sente ao lado dela e à faça companhia em alguns momentos, então pergunte e permita que essa pessoa te diga o que ela precisa naquele momento, fique por perto, você pode participar e elogiar é muito bom também. Tentar não ridicularizar, menosprezar ou diminuir aquela dor, falar por exemplo: “Isso passa, é bobagem, não liga não, vamos fazer uma coisa legal, esquece isso”. Esse tipo de coisa é melhor a gente não dizer nesses momentos. Fale com a família caso sinta necessário, e você também pode estar procurando uma ajuda profissional e inclusive acompanhando esse amigo/amiga para essa ajuda caso ele/ela permita. Vá de acompanhante e apoie, isso já vai ser excelente.”
Por isso, deve-se ressaltar que o dia tem somente 24 horas, mesmo que a gente queira transformá-las em 36h para poder dar cabo de tudo o que achamos que temos que fazer. Ainda por cima, as redes sociais ficam fazendo propaganda de produtividade incessante e positividade. Faça cursos! Cozinhe receitas novas! Esse livro tornará você mais produtivo! Quanto mais coisas fizermos, mais felizes seremos. Queremos fazer de tudo, inspirados nas artificialidades que consumimos nas redes sociais. Afinal, se aquela pessoa pode fazer, então eu também posso. Realmente, podemos fazer, somos capazes e ninguém deve nunca nos diminuir. Mas até onde é necessário ser produtivo toda hora do dia? Devemos fazer quantos cursos para mostrar que somos suficientes? Quantos livros devemos ler para mostrar quão inteligente somos? Há uma ilusão de que por estarmos em casa, podemos organizar tudo direitinho para caber nessa nova agenda pandêmica.Esse positivismo e produtividade tóxicos fazem com que não respeitemos o nosso tempo. Estamos cada vez mais buscando ser a pessoa perfeita que consegue fazer tudo. Mas não é bem assim. Todos nós temos nossos problemas, nossos surtos, nossas ansiedade. Podemos chorar, podemos nos desesperar. E está tudo bem. É importante aprender que está tudo bem em não estar bem.
P: Elisana, nessa quarentena, apesar de muitas vezes não enxergarmos, foi nos imposta uma pressão para sermos produtivos e felizes. O quanto essa produtividade e positivismos tóxicos nos afeta sem percebermos?
“Essa quarentena está “fogo”. Atrapalhou todo mundo, ou com o excesso de produtividade ou até mesmo com a ausência total de produtividade. Tudo em excesso é ruim, se você beber, fumar, comer, dormir, trabalhar ou até mesmo produzir em excesso não vai ser bom, a vida não é fazer em excesso, é buscar um equilíbrio entre todas atividades que a gente pratica. Outro ponto importante, é que a gente não pode ficar copiando o que o outro está dizendo que está fazendo, principalmente se ele está dizendo nas redes sociais que está fazendo exercício, que está trabalhando, que a vida é maravilhosa, que está tudo ótimo. Você tem que seguir o seu ritmo, cada um tem o seu ritmo, o seu jeito de praticar e realizar as atividades. Agora um ponto importante em tudo isso, não se esqueça de comemorar aquilo que você está fazendo, por menor que seja. A comemoração gera gratidão, se você comemora o que você faz você passa a não se preocupar tanto com o que o outro está fazendo, você passa a se preocupar com o que você está fazendo, automaticamente passa a respeitar o ritmo das coisas que você está fazendo, passa a entender que não é necessário correr tanto nem produzir tanto e aí sim você consegue buscar esse equilíbrio que eu estou comentando. Eu sei que a pandemia não está fácil para ninguém, ela trouxe à tona os nossos maiores fantasmas, o da produtividade ou da improdutividade, a raiva, as brigas, enfim, vivemos em sociedade e tiraram todas as coisas legais, estamos em casa, mas vamos tentar fazer alguma coisa para melhorar. Tenham em mente que a pandemia teve um começo, um meio e também vai ter um fim. Enquanto isso tenta praticar o autoconhecimento, então, segue uma perguntinha para deixar vocês refletindo um pouco sobre tudo isso: O que vocês realmente estão aprendendo com tudo isso e onde vocês querem estar quando acabar tudo isso?“
5 - Finalização (Gabi W)
Infelizmente, em pleno século 21, falar sobre suicídio ou transtornos mentais ainda é tabu em diversas sociedades. Não abordar abertamente um dos maiores problemas da saúde pública contemporânea tem suas nefastas consequências. Em particular, muitas pessoas que estão pensando em tirar a própria vida ou que já tentaram suicídio deixam de procurar a ajuda que tanto precisam. Logo, não recebem o apoio e ao acolhimento que poderia salvar suas vidas. Até o momento, apenas alguns países incluíram a prevenção ao suicídio dentre suas prioridades para a saúde e apenas 38 países possuem alguma stratégia nacional para esse fim.
Fundado em 1962, o Centro de Valorização da Vida (CVV) é uma associação civil sem fins lucrativos e filantrópica que presta serviço voluntário e gratuito de apoio emocional e prevenção do suicídio para todas as pessoas que querem e precisam conversar. O atendimento é gratuito e feito sob total sigilo. Ele está disponível em todo o Brasil 24 horas por dia seja através do telefone 188, por e-mail ou chat.
Não se esqueça, a sua vida é muito valiosa! Com certeza, você já sorriu. Talvez você não tenha se dado conta, mas também já fez muitas pessoas sorrirem. Sua vida vale à pena! Sua vida é importante! Se sentir que precisa, busque ajuda! Você não está só!
[1] Suicide in the world - Global Health Estimates - World Health Organization 2019
[2] Yellow Ribbon - Suicide Prevention Program - Who We Are
[3] Haas et al., J Homosex. 2011;58(1):10-51
[4] Ream, J Adolesc Health. 2019;64(5):602-607
[5] Haas et al., J of Homosexuality, 58:1, 10-51
[6] Bailey et al., Mental Health Review Journal. 2014;19(4), 209–220
[7] Irwin et al., J Homosex. 2014;61(8):1172-1191
[8] McNeil et al., Psychology of Sexual Orientation and Gender Diversity, 2017;4(3), 341-353
[9] Cassorla, Do Suicídio: Estudos Brasileiros. Campinas – SP: Papirus, 1991.
[10] BOLETIM Nº 04/2020 - 01 de janeiro a 31 de agosto de 2020 ASSASSINATOS CONTRA TRAVESTIS E TRANSEXUAIS BRASILEIRAS EM 2020
[11] Dossiê dos assassinatos e da violência contra travestis e transexuais brasileiras em 2019 / Bruna G. Benevides, Sayonara Naider Bonfim Nogueira (Orgs). – São Paulo: Expressão Popular, ANTRA, IBTE, 2020
http://revistagalileu.globo.com/Galileu/0,6993,ECT545744-1716-1,00.html
https://www.medley.com.br/podecontar/quero-ajudar/por-fora-por-dentro
https://jornal.usp.br/atualidades/brasil-e-o-pais-mais-ansioso-do-mundo/
http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1808-56872014000100002
https://www.unicesumar.edu.br/nai/indice-de-ansiedade-entre-universitarios-e-preocupante/
Pra aprender:
2 vídeos do canal da drag Bianca DellaFancy @biancadellafancy:
Pra descontrair: desligue-se das redes sociais, computador e celulares por períodos de tempo!
Produção: Divertidamente (Disney) e A Lenda de Korra
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