CELAC: encontros e desencontros na América Latina


Autora: Natália Salan Marpica

29 setembro 2021

Presidentes latinoamericanos durante a VI Cúpula da Celac, no México (18/09/2021)

Os últimos dias foram intensos em termos de encontros internacionais. 

Enquanto Bolsonaro aproveitava o respeito que o Brasil conquistou, sendo o país que  sempre faz o discurso de abertura da ONU, para anunciar que estamos em liquidação, Lopez Obrador recepcionava os presidentes latino-americanos na cúpula da CELAC - Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos - do qual o Brasil não participa mais. 

As duas reuniões internacionais parecem não resolver os grandes problemas da humanidade, que não são poucos neste momento, mas são espaços importantes de encontros. Na América Latina, um conjunto de blocos de integração regional  se sobrepõem e formam um caldeirão em que não se sabe ao certo qual a diferença entre eles. Sempre  anunciam a inspiração na desgastada União Europeia, mas tratam-se de mecanismos frágeis, dependentes da boa vontade dos instáveis governos nacionais. Porém, a Celac tem algo de especial: foi a primeira organização formalizada, com todos os presidentes Latinoamericanos, sem a presença dos Estados Unidos ou do Canadá. 

Na ONU, Bolsonaro e sua comitiva imensa, com cerca de 50 pessoas, não fez nada além de vender o Brasil e disseminar o coronavírus por Nova York. Quanto a CELAC, em 2020, o Brasil a abandonou oficialmente, mas Temer já não havia aparecido na cúpula de 2017, quando o bloco acabou perdendo seu vigor, com o tumulto latino-americano do período.  

Não é fácil ser latino-americano. Em 2019, a Bolívia passava por um golpe, com o apoio da OEA. Neste período, por puro azar, a presidência da CELAC estava sob o comando da Bolívia. Assim, a golpista Jeanine Áñez esteve a frente do grupo de integração, embora não tivesse nenhum interesse na organização anti-imperialista. Quando o México assumiu a presidência pro-tempore do bloco, no início de 2020, ele mesmo organizou sua cerimônia de posse, deixando a golpista Áñez irritada por não ter sido consultada sobre o evento que era de sua responsabilidade viabilizar. Realismo fantástico…

Sob a presidência do México, a coalizão voltou a se reunir a ganhar protagonismo. Iniciada em 18 de setembro de 2021, a VI Cúpula reuniu representantes de 31 países e 12 presidentes. Diante do cenário critico dos últimos anos, foi uma vitória conseguir realizar o encontro. A substituição da OEA pela CELAC foi o tema de abertura da fala de AMLO, embora pouco se tenha avançado em termos de operacionalização disso.  O bloco latino-americano e caribenho anunciou apoio formal à Argentina no que tange às Malvinas, além disso houve avanço no tema da saúde, com fundos e um plano, a ser desenvolvido pela Cepal, para autossuficiência da região em termos de medicamento e vacinas.

Fofocas e confusões fazem parte do cenário. Os presidentes paraguaio e uruguaio, capachos dos Estados Unidos, não falaram nada sobre si ou sobre o desenvolvimento regional, mas tentaram ofender a Venezuela, Cuba e a Nicarágua, que responderam com firmeza, como sempre. Alberto Fernandez, de ultima hora não conseguiu ir, pois a Argentina estava no furacão de uma crise política. Sugerido para ser o próximo país a assumir a presidência da CELAC, a Argentina recebeu críticas da Nicarágua, que afirma que embora Fernandez tenha uma fachada de esquerda, é um instrumento de apoio dos Estados Unidos contra a Nicarágua. Cabe lembrar que até Lula, num raro momento de "capachismo", fez um gesto para Biden criticando Daniel Ortega. Quanto a Fernandez, nós, brasileiros, percebemos sua submissão quando nos chamou de selvagens e se autodeclarou europeu diante do primeiro ministro espanhol. 

Por fim, a triste ausência do Brasil é a síntese do paradoxo deste momento para a América Latina: sem o Brasil é inviável derrubar a OEA, mas a sua negativa em participar mostra a urgência da região em se fortalecer. A crise internacional dos Estados Unidos, que se enfraqueceu diante do Afeganistão, desponta como uma oportunidade para enfrentar velhas estruturas imperialistas. 



Para saber mais:  



Informações sobre blocos de integração regional na América Latina: Clique aqui 

Programa Veias Abertas - Avanços e atritos na Cúpula da CELAC: https://www.youtube.com/watch?v=mKOOjiPP_Wk.

Página da CELAC no Twitter: https://twitter.com/PPT_CELAC?s=20.

CELAC, OEA y los caminos posibles para la integración: https://www.alainet.org/es/articulo/213939.