Uma Mudança no Regime?

Análise da situação

Jorge Manuel Lourenço Gonçalves
31 de Agosto de 2022

INTRODUÇÃO

Desde a primeira presidência de Manuel de Arriaga que o regime republicano português demonstra uma notável capacidade de sobrevivência, apesar do fracasso do parlamentarismo da 1ª República, da natureza ditatorial do presidencialismo do Estado Novo e da ruptura política e social resultante do movimento militar de 25 de Abril de 1974 e do processo revolucionário que se seguiu.

Para evitar os erros do passado e eventualmente influenciados pela cultura social e política de autoridade ainda dominante, os constituintes de 1976 adoptaram uma solução intermédia entre o parlamentarismo e o presidencialismo a que, mesmo havendo especialistas que prefeririam outras designações, se convencionou chamar de regime semi-presidencialista. Na prática, trata-se de uma presidência com legitimidade forte consagrada pelo sufrágio universal e directo, mas com poderes limitados, enxertada numa democracia parlamentar, igualmente legitimada pelo voto popular.

A adopção do regime semi-presidencialista por Portugal não foi imitada pelas transições democráticas do Sul da Europa, designadamente pela Espanha e pela Grécia, mas, com o fim da Guerra Fria, acabou por o ser por diversos países da Europa Central e de Leste, assim como por vários países africanos, nomeadamente lusófonos, e pela República de Timor-Leste. Infelizmente alguns desses regimes não se confirmaram como democráticos, evoluindo antes para novas formas de regimes autoritários dominados por presidentes.

Em Portugal, o regime semi-presidencialista cujos princípios foram consolidados na revisão constitucional de 1982, sendo muito flexível, tem resistido a crises políticas profundas e a diferentes interpretações do papel do Presidente da República, oscilando entre as mais discretas e as mais exuberantes actuações de quem ocupou o cargo.

Com a reeleição de Marcelo Rebelo de Sousa, muito bem preparada e melhor recebida por grande parte da classe jornalística, verificou-se um novo fenómeno: o elevado nível de popularidade do presidente e a sua perícia na utilização dos media parece ter ampliado a sua capacidade de definir a agenda política e de influenciar a actuação do governo, eventualmente para além do quadro de poderes presidenciais definidos na Constituição da República Portuguesa.

É a avaliação desta nova realidade e da possibilidade de estarmos a assistir a uma mudança significativa do regime semi-presidencialista português que procuraremos fazer nesta reflexão. 

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