Populismo

O Espírito do Tempo

Jorge Manuel Gonçalves, Jorge Martins Bettencourt, Luís Costa correia
18 de Novembro de 2022

RESUMO

Cas Mudde, um dos cientistas políticos que mais tem publicado sobre populismo e autor do conhecido artigo cujo título partilhamos, caracterizou o tempo político que vivemos como uma “normalidade patológica” dominada pela direita radical populista. Nem sempre foi assim e nem sempre será assim, mas actualmente são os valores da direita antidemocrática e autoritária que estão na base da expansão dos movimentos populistas na Europa e nas Américas do Norte e do Sul.

Sendo o populismo um fenómeno complexo e de difícil definição, é consensual entre os cientistas políticos considerar que é construído com base na dicotomia do “nós” versus “eles”, do “povo puro” versus “a elite poderosa e corrupta”. Muitos também concordam que o populismo é um estilo de comunicação política – maioritariamente através dos media e das redes sociais – concebido para atrair as “vítimas”, os “desencantados” e os “deixados para trás”.

As democracias dispõem de mecanismos de contenção do populismo sendo os mais relevantes, naturalmente, a boa governação e o respeito pelas regras do Estado de direito democrático, complementados com a promoção da literacia política e da educação para a cidadania. Sem estes mecanismos, é um erro pensar que o populismo pode ser contido no terreno onde se sente confortável − os espaços mediáticos − e usando os instrumentos que melhor domina – o imediatismo oportunista e demagógico, o desrespeito pela lei e a falta de rigor na análise dos problemas.

É por isso que os principais responsáveis políticos, em particular os eleitos para os cargos cimeiros do Estado de direito democrático consagrado na Constituição da República Portuguesa, devem ter muito cuidado para não caírem na tentação das derivas populistas como as que já se observam em Portugal e noutros países, algumas validadas pelo voto popular.  O recente episódio de chamada de atenção pública à ministra da Coesão Territorial, Ana Abrunhosa, que, independentemente da justiça da reprimenda e das reacções político-partidárias que suscitou, afigura-se como mais uma violação dos limites que a Constituição estabelece para o Presidente da República e uma cedência ao espírito populista do tempo.

Aos responsáveis políticos e, em especial, ao Presidente da República, compete fazer tudo o que estiver ao seu alcance, no rigoroso respeito pela Constituição e pelas leis da República Portuguesa, para melhorar o funcionamento das instituições do Estado de Direito democrático. Mas qualquer cedência a condutas populistas, mesmo que esse seja o espírito do tempo em que vivemos, contribuirá para a degradação do sistema político democrático e fortalecerá os actores políticos populistas e as suas soluções antidemocráticas e autoritárias.

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