Artigo 41.º – Responsabilidade das transportadoras

1 — A transportadora que proceda ao transporte para território português, por via aérea, marítima ou terrestre, de cidadão estrangeiro que não reúna as condições de entrada fica obrigada a promover o seu retorno, no mais curto espaço de tempo possível, para o ponto onde começou a utilizar o meio de transporte, ou, em caso de impossibilidade, para o país onde foi emitido o respetivo documento de viagem ou para qualquer outro local onde a sua admissão seja garantida.

2 — Enquanto não se efetuar o reembarque, o passageiro fica a cargo da transportadora, sendo da sua responsabilidade o pagamento da taxa correspondente à estada do passageiro no centro de instalação temporária ou espaço equiparado.

3 — Sempre que tal se justifique, o cidadão estrangeiro que não reúna as condições de entrada é afastado do território português sob escolta, a qual é assegurada pelo SEF pela força de segurança competente, no âmbito das respetivas atribuições.

4 — São da responsabilidade da transportadora as despesas a que a utilização da escolta der lugar, incluindo o pagamento da respetiva taxa.

5 — O disposto nos números anteriores é igualmente aplicável no caso de recusa de entrada de um cidadão estrangeiro em trânsito quando:

a) A transportadora que o deveria encaminhar para o país de destino se recusar a embarcá-lo;

b) As autoridades do Estado de destino lhe tiverem recusado a entrada e o tiverem reencaminhado para território português.


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Comentários


1 — Com o progressivo aumento da circulação de pessoas que tem sido acompanhado do avolumar dos riscos de imigração ilegal, a lei tem vindo a tor­nar-se mais exigente em relação às transportadoras.

Nos termos do art. 12.º do DL n.º 59/93, de 3 de Março, a empresa de transportes marítimos ou aéreos que transportasse para o território nacional passageiro ou tripulante cuja entrada fosse recusada, era obrigada a promover o seu retorno imediato para o ponto onde começou a utilizar o meio de transporte dessa empresa, ou, em caso de impossibilidade, para o Estado onde foi emitido o documento de viagem com o qual viajou ou para qualquer outro local no qual pudesse ser admitido.

Esta norma correspondia no essencial ao disposto no art. 26.º, n.º 1, al. a), da Convenção de Aplicação que, na al. b) da mesma disposição, impunha também ao transportador a adopção das medidas necessárias para se assegurar de que o passageiro transportado se encontrava na posse dos documentos de via­gem exigidos para a entrada nos territórios das Partes Contratantes.

O art. 21.º do DL n.º 244/98, de 8 de Agosto, para além de prever a mesma obrigação para as transportadoras, colocou a seu cargo as despesas com os passageiros enquanto o seu embarque não pudesse ser efectuado, competindo-lhe ainda satisfazer os encargos com a eventual realização de escoltas, a efectuar pelo SEF.

Entretanto, a Directiva 2001/51/CE, de 28 de Junho de 2001, para além de alargar o âmbito de aplicação do art. 26.º, n.º 1, al. a), da Convenção de Aplicação, veio ainda estipular mínimos para as sanções aplicáveis às transportadoras. Esta directiva foi transposta com as alterações introduzidas no DL n.º 244/98, pelo DL n.º 34/2003, de 25 de Fevereiro. Ao art. 21.º foi acrescentado o n.º 5, impondo às transportadoras os mesmos encargos no caso de recusa de entrada de um cida­dão estrangeiro em trânsito, havendo recusa do seu embarque por parte do trans­portador que o deveria conduzir ao país de destino ou recusa de entrada pelas auto­ridades do Estado de destino, com reenvio para território português.

O regime agora previsto relativo à responsabilidade das transportadoras pode afigurar-se, “prima facie”,excessivamente oneroso. A questão que se poderia colocar é a de saber se esta responsabilidade dos transportadores não deveria ser restrita às situações de omissão culposa do dever de verificação das condições de entrada relativamente a cada passageiro. Estariam neste caso, nomeada­mente, verificações de titularidade de documento de viagem, titularidade de visto quando necessário, autorização para viagem de menores, etc. (art. 26.º, n.º 1, aI. b), da Convenção de Aplicação). Já assim não seria em relação às outras condições de entrada, como a disponibilidade de meios para a estada ou fina­lidade da deslocação, já que tal verificação estaria para além das possibilidades de escrutínio das transportadoras bem como das suas obrigações.

Neste sentido apontam diversas normas de direito internacional, como a norma 3.37 do anexo 9 da Convenção de Chicago, de acordo com a qual “Os operadores tomarão as necessárias precauções no local de embarque, a fim de que os passageiros sejam portadores dos documentos de controlo exigidos pelos Estados contratantes”. E a norma 3.37.1 estabelece que “Os Estados contratantes não aplicarão multas aos operadores quando um passageiro não seja admitido, excepto havendo provas que indiquem que o transportador foi negligente na tomada de medidas para que o passageiro tivesse os documen­tos exigidos para entrar no Estado de destino”.

No entanto o art. 26.º da Convenção da Aplicação do acordo de Schengen alarga o âmbito desta obrigação.

De facto, o desonerar das transportadoras em relação às obrigações de repatriamento, levaria a que as responsabilidades fossem transferidas para o Estado, completamente alheio à vinda do passageiro. Deve pois esta responsabilidade do transportador ser encarada como um ónus que acompanha a Indústria dos transportes, que é obviamente contemplado na sua política de fixação de preços.

Todavia, a responsabilidade das transportadoras não pode ir além dos encargos com a manutenção e retorno dos passageiros. A responsabilidade contra-ordenacional só pode existir no caso de comportamento culposo na vio­lação das normas previstas na Convenção de Chicago, das leis comunitárias e leis nacionais, aplicáveis aos transportes aéreo, marítimo ou terrestre. De facto, sendo razoável que a transportadora deva verificar se o passageiro é portador dos necessários documentos, já lhe não é exigível, nem tal lhe poderá ser per­mitido ou imposto, que verifique se está inscrito para efeitos de não admissão, se detém meios para a estada, etc; Nestes casos, subsistindo a obrigação de pro­videnciar o retorno, não lhe poderá ser aplicada qualquer sanção, por impossi­bilidade de imputação de qualquer conduta ilícita a título doloso ou negligente (cfr. art. 8.º do DL n.º 433/82, de 27 de Outubro). Por isso mesmo, as sanções previstas nos arts. 194.º e 195.º restringe-se aos casos de transporte, para o território português, de cidadão estrangeiro que não possua documento de via­gem ou visto válidos.


2 — Nos casos de recusa de entrada o ideal é promover o retomo imediato do passageiro, se possível no voo ou viagem de regresso da mesma aeronave ou navio, se for o caso. Caso tal não seja possível, o retorno deve efectuar-se na oportunidade imediata, consoante as disponibilidades da transportadora, que para tal poderá utilizar meios próprios ou de outra companhia.

O normal será o retorno para o local onde o passageiro iniciou a viagem. Todavia, caso isso não seja possível, deverá ser transportado até local onde o passageiro seja admitido.


3 — Nos termos do n.º 2, até à realização do embarque o passageiro fica a cargo da transportadora, competindo-lhe o pagamento da taxa correspondente à sua estada no centro de instalação temporária ou espaço equiparado.

Os centros de instalação temporária são locais destinados ao acolhimento de estrangeiros, por razões humanitárias ou de segurança, cujo regime foi criado pela Lei n.º 34/94, de 14 de Setembro, mas cuja estrutura e organização ainda aguarda definição legal. Dado porém o elevado número de pessoas objecto de recusa de entrada e a necessidade de criação de condições para poderem aguar­dar a oportunidade de retorno aos locais de origem ou de readmissão, pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 76/97, de 14 de Maio, foram as enti­dades responsáveis pela gestão dos aeroportos incumbidas da criação de espa­ços apropriados à estada desses passageiros. Esses espaços foram, pelo artigo único, n.º 1, do DL n.º 85/2000, de 12 de Maio, equiparados a centros de ins­talação temporária de passageiros chegados por via aérea [cuja definição passou a constar da Lei com as alterações introduzidas ao artigo 3.º pela Lei n.º 29/2012].

Atente-se que só relativamente a esses passageiros (chegados por via aérea e objecto de recusa de entrada ou aguardando apreciação de pedido de asilo) existe a dita equiparação, e não para quaisquer outros estrangeiros. A coloca­ção nos centros criados nos aeroportos de outros estrangeiros em situação ile­gal, enquanto aguardam a conclusão de processo de expulsão, não tem apoio legal e acarreta o risco de inviabilizar a sua manutenção por subverter totalmente as finalidades da sua criação.

As despesas da instalação competem às transportadoras, embora a gestão das instalações seja incumbência do SEF, como entidade responsável pelo con­trolo da fronteira (artigo único, n.º 3, do DL n.º 85/2000).


4 — O conceito de escolta é dado pelo art. 180.º, n.º 1, que no essencial reproduz a definição constante do art. 1.º, al. d), da Directiva 2003/110/CE: “…entende-se por escolta, as pessoas do Estado membro requerente que acompanham o nacional de um Estado terceiro durante o trânsito aeropor­tuário em território nacional, incluindo as pessoas encarregadas da presta­ção de cuidados médicos e os intérpretes”.

A necessidade de escolta deve ser aferida em função de critérios diversos, entre os quais os fixados no art. 180.º, n.º 3, para justificar a possibilidade de reacção. Assim, será razoável o recurso a escolta quando haja de fundado receio de fuga, de ofensas para o próprio ou terceiro, de produção de danos mate­riais, sempre que haja necessidade de prestação de cuidados especiais, etc.


5 — A competência para a realização de escoltas é do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras. Os encargos com a sua realização competem naturalmente à trans­portadora. Isso decorre desde logo do facto de as transportadoras estarem obri­gadas a efectivar o retorno do passageiro, sendo que a escolta é uma medida de apoio à execução dessa obrigação. As despesas, para além da respectiva taxa incluem ajudas de custo, seguros, eventuais despesas de alojamento, transportes e quaisquer outras que sejam motivadas pela realização da diligência (v. art. 7.º, n.º 2, do Decreto Regulamentar n.º 84/2007, de 5 de Novembro).

Sobre as taxas devidas v. a Portaria n.º 727/2007, de 6 de Setem­bro, do Ministério da Administração Interna [entretanto alterada pela Portaria n.º 1334-E/2010, de 31 de Dezembro e pela Portaria n.º 204/2020, de 24 de agosto].


6 — As obrigações das seguradoras [transportadoras] relativamente aos passageiros a quem tenha sido recusada a entrada em Portugal, existem também relativamente a pas­sageiros em trânsito, que não consigam embarcar para o país de destino, por recusa de embarque da transportadora, ou que tenham regressado a Portugal por lhes ter sido recusada a entrada no país de destino.

Não existe qualquer particularidade destes casos em relação ao que já vimos nas situações anteriores, verificando-se a responsabilidade das transportadoras, exactamente nos mesmos temos.


7 — O transporte para o território português de cidadãos estrangeiros que não possuam documentos de viagem ou vistos válidos, bem como o transporte desses mesmos cidadãos para porto ou aeroporto, sem visto de escala, quando dele careçam, constituem contra-ordenações, puníveis de acordo com os arts. 194.º e 195.º


Origem do texto        


Direito comunitário                               

Dá cumprimento ao disposto na norma do n.º 1, alínea a) do artigo 26.º da Convenção de Aplicação do Acordo de Schengen, de 14 de Junho de 1985, reforçada pela Directiva n.º 2001/51/CE, do Conselho, de 28 de Junho, que completa as disposições do artigo 26.º da Convenção de Aplicação do Acordo de Schengen, de 14 de Junho de 1985.



Direito nacional                                    

Na última redacção do diploma anterior a matéria era regulada no artigo 21.º

O preceituado no n.º 1 da norma tem origem no artigo 70.º do Decreto-Lei 264-B/81, de 3 de Setembro, bem como no artigo 12.º do Decreto-Lei 59/93, de 3 de Março. As normas dos n.º 2, 3 e 4 do artigo remontam à redacção original do artigo 21.º do Decreto-Lei 244/98, de 8 de Agosto. Os n.º 1, 3 e 5 reproduzem na íntegra a redacção introduzida pela alteração efectuada pelo Decreto-Lei 34/2003, de 25 de Fevereiro, aos n.º 1, 3 e 5 do artigo 21.º do Decreto-lei 244/98, de 8 de Agosto. O n.º 2 reproduz parcialmente a redacção do n.º 2 do artigo 21.º do Decreto-lei 244/98, de 8 de Agosto, na alteração efectuada pelo Decreto-Lei 4/2001, de 10 de Janeiro. O n.º 4 reproduz na íntegra a redacção original do n.º 4 do artigo 21.º do Decreto-lei 244/98, de 8 de Agosto.


Procedimento legislativo


Proposta de Lei 93/X do Governo (2006)

Artigo 41.º - Responsabilidade das transportadoras

1 - A transportadora que proceda ao transporte para território português, por via aérea, marítima ou terrestre, de cidadão estrangeiro que não reúna as condições de entrada fica obrigada a promover o seu retorno, no mais curto espaço de tempo possível, para o ponto onde começou a utilizar o meio de transporte, ou, em caso de impossibilidade, para o país onde foi emitido o respectivo documento de viagem ou para qualquer outro local onde a sua admissão seja garantida.

2 - Enquanto não se efectuar o reembarque, o passageiro fica a cargo da transportadora, sendo da sua responsabilidade o pagamento da taxa correspondente à estada do passageiro no centro de instalação temporária ou espaço equiparado.

3 - Sempre que tal se justifique, o cidadão estrangeiro que não reúna as condições de entrada é afastado do território português sob escolta, a qual é assegurada pelo SEF.

4 - São da responsabilidade da transportadora as despesas a que a utilização da escolta der lugar, incluindo o pagamento da respectiva taxa.

5 - O disposto nos números anteriores é igualmente aplicável no caso de recusa de entrada de um cidadão estrangeiro em trânsito quando:

a) A transportadora que o deveria encaminhar para o país de destino se recusar a embarcá-lo;

b) As autoridades do Estado de destino lhe tiverem recusado a entrada e o tiverem reencaminhado para território português.

Discussão e votação indiciária: artigo 41.º da proposta de lei n.º 93/X — aprovado, com votos a favor do PS e PSD, votos contra do PCP e a abstenção do CDS-PP e BE.




A atual redação foi introduzida pelo Decreto-Lei n.º 41/2023, de 2 de junho, que procedeu à criação da Agência para a Integração, Migrações e Asilo, I. P.  Reproduz-se a redação anterior:

Artigo 41.º – Responsabilidade das transportadoras

1 — A transportadora que proceda ao transporte para território português, por via aérea, marítima ou terrestre, de cidadão estrangeiro que não reúna as condições de entrada fica obrigada a promover o seu retorno, no mais curto espaço de tempo possível, para o ponto onde começou a utilizar o meio de transporte, ou, em caso de impossibilidade, para o país onde foi emitido o respetivo documento de viagem ou para qualquer outro local onde a sua admissão seja garantida.

2 — Enquanto não se efetuar o reembarque, o passageiro fica a cargo da transportadora, sendo da sua responsabilidade o pagamento da taxa correspondente à estada do passageiro no centro de instalação temporária ou espaço equiparado.

3 — Sempre que tal se justifique, o cidadão estrangeiro que não reúna as condições de entrada é afastado do território português sob escolta, a qual é assegurada pelo SEF.

4 — São da responsabilidade da transportadora as despesas a que a utilização da escolta der lugar, incluindo o pagamento da respetiva taxa.

5 — O disposto nos números anteriores é igualmente aplicável no caso de recusa de entrada de um cidadão estrangeiro em trânsito quando:

a) A transportadora que o deveria encaminhar para o país de destino se recusar a embarcá-lo;

b) As autoridades do Estado de destino lhe tiverem recusado a entrada e o tiverem reencaminhado para território português.