Espiritualidade Genuína

ESPIRITUALIDADE GENUÍNA

 

Ao falar sobre o grande desafio de se escrever sobre espiritualidade, tenho citado muitas vezes a expressão "espiritualidade genuína" para contrapor com aquilo que não é verdadeiramente "espiritual".

A desconstrução é uma etapa fundamental para a aprendizagem de um novo processo, sem a desconstrução não é possível a aprendizagem de algo "absolutamente novo", pois mesmo se deparando com algo "novo" ou "transcendente" a "velha mente", formada por hábitos, condicionamentos, tradições, percepções, valores estabelecidos e limitações, interpretará a novidade com os seus "velhos olhos" o que, naturalmente, irá deturpar a mensagem por de trás do "transcendente".

Descrever para uma mente comum o que é espiritualidade é como descrever para um cego de nascença o que são cores; da mesma forma que não é fácil explicar para aquele que enxerga, que a cor tal como vista por nós, não existe da forma com que vemos; as cores são um resultado directo de uma percepção de estímulos, provocados pela acção de um feixe de fotões sobre as células especializadas da retina e que transmitem a informação pré-processada pelo nervo óptico para o sistema nervoso, ou seja, nós enxergamos na verdade a forma com que o cérebro organiza e processa informações com o intuito de compreender o ambiente em que vive e diferenciar um objecto do outro e não como os objectos realmente são.

E justamente quando falamos ou escrevemos sobre espiritualidade, estamos utilizando signos que estão baseados na descrição de nossas percepções tais como observamos, sentimos e experimentamos o universo físico a nossa volta que não tem nada de espiritual, ou seja, utilizamos daquilo que nos é visível e tangível (o símbolo), para descrever aquilo que nos é invisível e intangível (o espiritual).  

Portanto ao falar, ler ou escrever sobre espiritualidade é fundamental estar ciente de que "doutrinas", livros, estudos, etc., são apenas setas, indicativos, sugestões, métodos, que tem por objectivo nos direccionar rumo à realização, à experimentação, à transformação, que possa nos possibilitar o contacto com o espiritual.

A espiritualidade genuína nada tem a ver com este mundo em que "acreditamos" viver.

O mundo espiritual reflecte somente a lei divina, que é perfeita e imutável tão como é o criador, quando Jesus nos diz "o meu reino não é deste mundo" ele também nos quer dizer que as leis através das quais ele realiza o seu propósito não são regidas por este mundo, cujas leis são regidas pelo caos, mas sim pelas directrizes do plano espiritual.

Nenhum valor espiritual é parcial. O amor espiritual não é o amor humano (especial e limitado a uma parte do todo), o amor espiritual é pleno, completo e inteiro, abrange todo o plano da criação, Deus e a nós mesmos.  A riqueza espiritual não é tal como a riqueza humana, frágil, sujeita a intempéries, mudanças de condições e dependente conservação do corpo (um multimilionário deste mundo, torna-se um pobre miserável diante de uma "doença fatal" dita incurável), diante dessas mudanças permanentes, torna-se praticamente impossível a paz, a confiança e a entrega plena a valores e princípios no convívio e nas relações estabelecidas no "plano material".

Em resumo, os valores espirituais são ilimitados, imutáveis, eternos, completos e plenos, nos dão confiança total e certeza absoluta do caminho da verdade e da vida, diferente dos valores deste mundo que são limitados, mutáveis, temporais, incompletos e, portanto insatisfatórios (aqueles que nasceram do ilimitado e do eterno, jamais encontrarão a satisfação plena naquilo que é limitado e que está sujeito ao tempo, porque tal natureza é negação da essência do próprio ser).

Isto não significa, entretanto, que o objectivo da espiritualidade neste mundo seja o de alcançar o paraíso após a morte física e assim a plena realização neste outro mundo; não! O objectivo da espiritualidade neste mundo é desfazer todas as ilusões, curar todos os desequilíbrios, perdoar toda ideia de julgamento, punição e culpa, corrigir as percepções equivocadas, retirar todos os bloqueios que nos impedem de nos sentir em unidade com o todo e a presença do amor de Deus em nossas vidas.

O livro Um Curso em Milagres nos diz que a única coisa que precisa ser reparada é o nosso senso de separação com Deus, uma vez que esta ilusão tenha sido plenamente superada a realização espiritual foi alcançada.

Ramana Maharshi ensinava a realização espiritual através da auto-investigação (self-enquiry), ou investigação directa principalmente utilizando-se da questão "Quem Sou Eu?" apontando assim o auto-conhecimento pleno como método de realização e despertar para a essência espiritual.

Sidharta Gautama o Budha ensinou a dor e o fim da dor (através das quatro nobres verdades e da nobre senda óctupla), traçando o caminho para o nirvana (suprema realização espiritual segundo o budismo).

Portanto, chamo de espiritualidade genuína todo e qualquer caminho espiritual que esteja totalmente comprometido com a busca da verdade (que transforma e liberta); que aponta para uma verdade transcendental (que está além da percepção dos sentidos físicos) e que pode ser vivenciada e conhecida através da experiência directa de sua realização; cujos valores são opostos aos valores deste mundo; que possibilite ao homem realizar o máximo do seu potencial de crescimento, expansão da consciência e do seu pleno amadurecimento (que consequentemente o tornará um ser mais sensível, amoroso, pacífico,   sapiente e  altruísta).

Busquemos portanto a espiritualidade genuína para que possamos vivenciar a paz suprema, a verdade,  a libertação, a santidade, a suprema realização e a bem-aventurança, ou seja, heranças espirituais que todos nós herdamos da Grande-Vida que vibra dentro de cada um de nós.