Comprendendo o Perigo Aviário

PERIGO AVIÁRIO

Levantamento Estatístico de Colisão de Aves no Brasil

O levantamento de dados estatístico sobre os índices de colisões de aeronaves com aves é um mecanismo preventivo de vital importância pois possibilita uma análise de tendências e projeções futuras. Com isto, é possível auxiliar as autoridades aeroportuárias e governamentais a determinar os pontos focais para abordagem, mediante um programa de prevenção e controle das aves pres\entes nas áreas de aeroportos e adjacências, com vistas à redução dos índices de colisão.

Objetivando uma avaliação sistemática que contribua para quantificar a ameaça que cada uma das espécies presente, em determinado aeroporto, representa à atividade aérea, de acordo com suas características próprias, que incidem diretamente na probabilidade e na severidade das colisões, foi definida a Matriz de Perigo da Fauna, especificamente da fauna aviária. Seguindo recomendações de especialistas internacionais e estudos realizados pela Unidade de Administração da Aeronáutica Civil da Colômbia, no Aeroporto Internacional Ernesto Cortissoz – Barranquila, esta matriz apresenta categorias, com quatro estados cada, que representam os valores de risco para as operações aéreas, onde zero é o valor mínimo e três o valor máximo de risco.

Perigo Aviário : conceito

Perigo aviário é o risco potencial de colisão com ave ou bando de aves, no solo ou em determinada porção do espaço aéreo. O risco de acidente aeronáutico causado por colisão com aves é composto de duas variáveis: a probabilidade de colisão e a gravidade da colisão.

A probabilidade de colisão de aeronaves com aves é dada em função da quantidade de aves presentes nas rotas de vôo das aeronaves e do número de vezes que estes elementos se cruzam no espaço aéreo. Já, a intensidade dos danos e lesões decorrentes da colisão entre uma aeronave e uma ave é dada em função da velocidade da aeronave e da massa da ave. Conclui-se que, quanto mais pesada for a ave maior será a carga de impacto sobre a aeronave a uma determinada velocidade de vôo.

Entretanto, deve-se considerar um perigo potencial, tanto uma ave pequena isoladamente quanto um bando de aves de qualquer tamanho, porque as colisões sempre oferecem perigo às aeronaves (SOUZA, 2001).

A colisão de um urubu com o pára-brisa pode causar o seu estilhaçamento, tornando a pilotagem difícil. Se o piloto é atingido, o controle da aeronave resulta inexeqüível, restando apenas a alternativa da ejeção. Tal procedimento aumenta as chances de sobrevivência do piloto, mas oferece elevado risco para a população do entorno, haja vista a queda desgovernada da aeronave. Inclusive, colisões de urubus com pára-brisas de aeronaves da FAB já provocaram a morte de um aeronavegante, em 1962, e a queda de um caça F-5 , em 1975 (CENIPA, 2002).

Por outro lado, quando é atingido o motor, pode ser necessário abortar a decolagem ou efetuar um pouso forçado da aeronave, sendo ambos procedimentos de elevado risco.

Foi o que ocorreu com um Boeing 737, em 1988, na Etiópia, quando a ingestão de pombos em ambos os motores levou a um pouso forçado, no qual faleceram 31 das 105 pessoas a bordo. No Brasil, em 1986, houve a queda de um caça Mirage III, cuja entrada de ar foi danificada pela colisão com um urubu durante a decolagem (CENIPA, 2002).

Hoje, é bastante improvável que pessoas públicas não saibam que existe risco de uma aeronave ser “abatida” por uma ave ou bando de aves, especialmente após a amerissagem do avião da companhia US Airways, no Rio Hudson, em 15 de janeiro de 2009.

Causas

Fatores de atração de aves

A presença de aves em aeroportos pode ser atribuída a diversas causas, porém, conforme o Doc 9137-NA/898 – Parte 3 da ICAO, normalmente estão diretamente relacionadas à busca de alimentos ou de água; abrigo; segurança; nidificação e descanso.

As atividades comerciais do aeroporto, como restaurantes, lanchonetes e catering, realizadas sem a devida preocupação com a destinação final dos dejetos orgânicos gerados, contribuem sobremaneira para o aumento de resíduos orgânicos nas áreas dos aeroportos, com conseqüente aumento na população de aves.

Com relação às áreas externas e próximas ao sítio aeroportuário a preocupação se dá a partir do desenvolvimento de atividades antrópicas que geram resíduos orgânicos como sobra ou que se destinam ao tratamento final dos resíduos sólidos urbanos gerados, por serem atividades consideradas como fonte de alimento em potencial para as aves, em especial os urubus.

As formações aquáticas tais como os rios, lagos e alagadiços formados pela retenção das águas das chuvas, servem de pontos de dessedentação para as aves e constituem um habitat permanente para o desenvolvimento da vida aquática. Espécimes como peixes, alevinos, algas, larvas de insetos e outros são elementos determinantes na atração de aves que encontram-se em busca de alimentos (SOUZA, 2001).

Focos de atração de aves

Diversas atividades desenvolvidas pelo homem podem exercer atração sobre a avifauna local, em função da possibilidade de ofertarem alimentação em abundância.

Dentre elas podemos citar matadouros, postos de entre-pesca e curtumes que após o processo produtivo a que se destinam, geram resíduos orgânicos e efluentes líquidos, que se não tratados adequadamente ofertam alimentação em abundância para a avifauna local.

Outro foco de atração são representados pelas atividades antrópicas baseadas nos processos de destinação final de resíduos sólidos orgânicos gerados nos centros urbanos de concentração de população, tais como vazadouros de lixo, lixão, aterros sanitários, usinas de compostagem, valos sanitários, etc (SOUZA, 2001).

Note-se que depósitos de lixo e aeroportos possuem as mesmas necessidades, no que tange ao seu posicionamento geográfico. Ambos devem localizar-se nas proximidades da cidade, a fim de reduzir os custos do transporte terrestre, e longe o bastante para não afetar o meio ambiente. Além disso, o aeroporto geralmente dispõe de boa estrutura de acesso viário, necessária também para o transporte do lixo (BRASIL,1997).

O Coragyps atratus – urubu-de-cabeça-preta

O Coragyps atratus é um pássaro facilmente encontrado nas Américas e uma das aves que mais chama a atenção de qualquer observador no Brasil, pois comumente associa-se ao homem. Alimenta-se de carne vermelha em deterioração, o que o torna importante para o equilíbrio ecológico (BRASIL, 1997).

Os urubus são poupadores de energia e tendem a se alimentar nos locais onde encontram maior facilidade na obtenção de alimento. Por causa disso, sua presença é muito comum em depósitos de lixo e nos aterros sanitários, sendo raramente encontrado em florestas.

Cabeça e pescoço nus, cinza escuros, sua envergadura média é de 1,5 m e peso de aproximadamente 1,6 Kg. Suas asas são largas, sendo suas extremidades mantidas abertas durante o vôo. Nidifica em lugares bem escondidos, entre rochas de difícil acesso ou sob raízes. Em extensas áreas planas, cobertas de mata, como na Amazônia, o Coragyps atratus deposita seus ovos em buracos abertos entre as raízes de grandes árvores tombadas.

Põe de dois a quatro ovos, e os períodos de incubação e permanência dos filhotes no ninho são de 49 dias. Os pais revezam-se no ninho, ministrando a seus pequenos, comida liquefeita durante meses (SICK, 1997).

Geralmente o urubu-da-cabeça-preta voa em círculos, valendo-se de correntes térmicas para subir, o que lhe permite alcançar altitudes bastante elevadas com grande economia de energia. Voa pesadamente, alternando algumas rápidas batidas de asa com o planeio, no qual são mestres. Dotado de vista muito aguda é capaz de detectar um objeto de 30 cm de comprimento quando está a 3000 metros de altura (SICK, 1997).

Assim sendo, não surpreende o fato, confirmado pela análise dos dados obtidos pelo CENIPA, de que a maioria das colisões ocorridas com aves no Brasil dá-se com o Coragyps atratus (BRASIL, 1997).

Dentre os hábitos dessa ave, está o de utilizar, para dormitório, um local distante das áreas nas quais obtém o alimento. Nessas últimas permanece durante o período mais quente do dia. A proliferação do Coragyps atratus é explicada pelo fato de, no Brasil, 5% do lixo produzido ser depositado nos conhecidos lixões (aterros clandestinos) a céu aberto (BRASIL, 1997). Nesses locais já foram contabilizados até 1,8 urubus/m² (NASCIMENTO, 1998).