A CASTIDADE

A CASTIDADE

“Beati imaculati in via, qui ambulante in lege domini” (sl 119(118), 1).

A castidade é um tema fácil de se comentar, mas difícil de se praticar. O Pe. Eugène Charbeauneau diz, num de seus livros “Solteiros e casados autoanalisados”, que nós teremos o desejo de cópula até a nossa morte. Uma senhora de 80 anos, doente, acamada, perguntou-me, certa vez em que fui visitá-la, até quando ela teria “aqueles pensamentos”. Eu lhe disse, em tom de brincadeira, “até três horas após a sua morte”. Ela espantou-se. Faleceu dois anos após, aos 82.


Um dos problemas da castidade é o conjunto de problemas afetivos que todo humano tem. Uma educação afetiva plena é difícil encontrar. 

Outro problema sério é a hipocrisia. Quem é casto de verdade? Só Deus sabe! Será que os que condenam os problemáticos nesse setor são mais castos do que eles?

Os que têm desvios sexuais sofrem mais do que os ditos normais, pois estão constantemente em tentação e sentem-se impedidos de praticar a castidade. Não percebem que, com a graça de Deus, tudo é possível. Essas pessoas sentem tentações onde quer que estejam: no dia a dia, no trabalho, nos passeios, nos acampamentos, na praia, nos retiros, na igreja, nos encontros espirituais... Como sofrem!


A Igreja é curta e rápida nesse assunto: quem não consegue viver uma castidade relativa mesmo no casamento, fique completamente casto e ponto. Aliás, Gandhi está nessa lista. Não conseguindo controlar-se, combinou com sua esposa viverem como irmãos. E viveram assim muitas décadas. Quando ele falou isso em sua autobiografia, já viviam em castidade há mais de 20 anos.


Quanto a ser casto, a Igreja ensina que é um dom de Deus. Quem quiser ser casto, tem que pedir isso a Deus, ser humilde. Por isso o vaidoso e o orgulhoso que acham poderem cuidar sozinhos de si mesmos, vão sentir muita dificuldade na castidade. Sentem-se superior a todos e a tudo. Jesus criticou-os muito, na pessoa dos fariseus e dos escribas, dizendo que não tinham perdão, mas perdoou facilmente os adúlteros, por saber que pecaram por fraqueza, e ensinou-lhes a humildade.


Quanto à beleza da castidade, copio aqui um artigo que eu escrevi e publiquei no blog, de 2014:


Estou lendo um livro de uma teóloga alemã, UTA RANKE-HEINEMANN, prefaciado por Leonardo Boff, que vai plenamente contra o celibato na Igreja, e contra uma série de atitudes que a Igreja toma em relação à castidade, sexo, contracepção etc. Nega várias atitudes morais baseadas na bíblia, alegando “falsa interpretação”. O nome do livro é sugestivo: “Eunucos pelo Reino de Deus”, editora Rosa dos Tempos. A autora, doutora em teologia e professora numa universidade alemã, perdeu o cargo após a sua publicação.


Por estranho que pareça, o livro me fez amar mais a minha vida celibatária e a castidade. Depois de matutar muito sobre o assunto, baseado não tanto nos livros, mas na minha experiência, percebi que o que interessa não é tanto ser ou não ser celibatário ou casado (a), manter ou não uma virgindade perpétua, mas sim, ser santo, livre de pecado, seja ele qual for.


Li em algum lugar que as cinco virgens imprudentes não entraram no “céu”, apesar de serem virgens!


Qual é a diferença entre viver buscando a santidade, estar lutando contra o pecado e viver no pecado, seja ele sexual, ou causado pela mentira, as brigas, a desonestidade, as fraudes, a vaidade, o orgulho, a violência, a falta de caridade, o egoísmo, o ódio, o isolamento?


Enumerei várias coisas:


1- A busca da santidade nos deixa leves, fáceis de sermos conduzidos pelo Senhor.


2- Deixa-nos uma paz incrível, inexplicável, que produz uma alegria intensa e interior;


3- A oração, o colóquio com Deus, torna-se mais fácil;


4- Impele-nos a amar as pessoas, sobretudo as necessitadas (sejam elas ricas ou pobres, pois um rico doente e/ou abandonado é uma pessoa necessitada de nossa presença). Amor sem distinções e sem interesse, devido à busca da santidade naquele relacionamento. A castidade não pode nos deixar isolados. Dizia um meu colega de seminário, o atual Pe. Everaldo: “Ao darmos um nó simbólico “naquilo”, pelo voto de castidade, não podemos dar também um nó no coração!” (1972).


5- Buscar a santidade não é deixar de sentir atração sexual, nem deixar de sentir os movimentos no corpo, causados pelos hormônios, mas integrar esses movimentos e impulsos internos à vida diária. Lembrar-se, também, de que há outros impulsos que nos levam ao pecado, mas igualmente não são pecados em si, como os que levam ao alcoolismo, à violência, ao isolamento, ao egoísmo, ao auto fechamento, à busca do prazer pelo prazer, do dinheiro, do luxo etc.


Esses impulsos só se tornam pecados se forem consentidos e alimentados por nossa concupiscência.


Santa Catarina de Sena compara esses impulsos com cães amarrados que latem, mas não mordem (sinal de que sentia muito esse tipo de coisa). Se não lhe dermos confiança (dizia ela), se enfraquecem.


6-O próprio Jesus teve alguma sensação do prazer sexual, pois sendo 100% homem, tinha as poluções noturnas normalmente, como todos os homens até a idade de uns 68 anos (alguns até mais). E foi castíssimo! Nunca pecou!


7- A santidade é impossível sem a humildade e sem o autoconhecimento. Conhecer-se e humildemente aceitar-se como se é, para evitar as ocasiões de pecar e fugir do pecado. Cada um deve conhecer seus limites e suas tendências. Aqui entra o famoso “Orai e Vigiai”, tão insistido por Jesus e pelos Apóstolos.


8- A luta em busca da santidade, seja vivendo o celibato ou a fidelidade conjugal, é uma luta contínua. Gandhi combinou com a esposa de viverem castos, e conseguiram. Mas ele dava até receita de alimentos que não causavam muito hormônio! Um amigo meu dizia que seria capaz de viver com sete esposas, mas se contentava com a dele e a respeitava. E eu acredito nele.


São Francisco de Salles era especialista em “receitar” atitudes que podem ajudar a vencer as tentações do dia-a-dia, como no livro “Filotéia” (você o encontra na internet, se o desejar). Ele orienta de modo especial tanto os celibatários como os não celibatários.


9- A santidade é um dom de Deus, mas requer nossos cuidados e nossa luta. Devo fazer a minha parte, para que Deus faça a dele.(...)


Textos bíblicos:


Filipenses 4,8.9b:


“Irmãos, ocupai-vos com tudo o que é verdadeiro, nobre, justo, puro, amável, honroso, virtuoso ou que de algum modo mereça louvor. E o Deus da paz estará convosco”.


Apocalipse 20,27: “Coisa imunda alguma entrará na Cidade Celeste”.


Outros: Mateus 5,27-32; 1ª Coríntios 7 (todo); 1ª Coríntios 6,12-20; Romanos 6, 19-23; 1ª Coríntios 15,33; Colossenses 3,5; Romanos 1,26-27; Romanos 1,29; Efésios 4,32-5,8.