Por Matheus Lima
Enviado em: 21/08/2024
Parágrafo de contexto: O eu lírico reflete sobre si mesmo em busca de lidar com suas mágoas e dores adormecidas.
Existe uma parte de mim que quer ser preenchida. É aquela parte que sente o tempo passar por entre os dedos como uma areia fina que foge do nosso controle. Essa parte é dependente, mais do que deveria ser. Ela é invejosa, ansiosa, nervosa e busca nos outros sua revalidação. No entanto, não acredito que seja má. Não se entende em sua completude, muito menos em sua complexidade. É uma parte doce, por vezes ingênua e que quer ver a bondade nas pessoas. É uma parte que tem medos, traumas e anseios, buscando sempre terceirizar suas mágoas e angústias. É uma parte que está sempre em modo de defesa, pois por muito tempo foi suprimida para não ser delicada. Acredito que isso é parte do fato de se viver em uma guerra constante contra seu próprio eu.
Às vezes não consigo dormir. A solidão é uma companhia que me incomoda, mas a sensação da objetificação também. Essa minha parte tem um rasgo profundo na tenra infância, quando aquelas mãos me tocaram antes mesmo de eu ter idade para pedir. Agora ela é vazia. Não sente desejo, apenas medo. É um ciclo depressivo, uma variação de humor constante, uma dor física e mental infinita... Ninguém nunca vai entender um alma quebrada, nunca a viram sangrar.
Essa parte queria ser completa, mas não sabe ao certo como fazer isso. Não se identifica, não se encaixa. Por vezes, se sente um incômodo. Outras vezes tenta se preencher de outros vazios, que ecoam o que para ela seria a liberdade. Mas o silêncio faz parte das mágoas. Não quer incomodar ninguém com suas histórias de criança que sonha com aquelas mãos violentas no meio da noite, mesmo tantos anos depois. Ninguém nunca vai entender sua vontade de gritar, de chorar, de se preencher e confiar. Confiar é uma palavra dolorida em sua boca, pois foi a confiança o lugar que mais te atingiram.
Talvez me falte eu. Talvez me falte olhar para dentro de mim, lidar com minhas partes feridas, costurar o tempo perdido e as apreensões. Talvez me falte a essência de quem sou. Um entendimento que por muito tempo tenho direcionado a outras pessoas, buscado em outras pessoas, invejado nelas. Tudo que me falta está em meu texto, na minha habilidade de pensar a vida por meio das palavras e na liberdade de se livrar do coágulo no peito com algumas pequenas orações. Eu me basto.