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carta ao Presidente da República 15 Julho 06
Ex. Senhor Presidente da República,
O sub-título que leio na primeira página do jornal o “Público”de hoje: “Presidente pediu ontem mais estudos mas primeiro ministro garante que projecto (do TGV) avança já para Madrid”, leva-me a enviar directamente a V. Ex.ª os dois textos que se seguem, que desde há uma semana tenho estado a tentar publicar nos jornais.
Peço ainda a atenção de V.Exª para os dois textos enviados em anexo, o artigo “Contributo para o estudo da futura rede ferroviária portuguesa de bitola europeia” , que foi publicado na revista INGENIUM da Ordem dos Engenheiros, e o artigo: “Vantagens e inconvenientes de um aeroporto na Ota”, que será publicado em breve.
Penso que estes textos, que podem ser corroborados por muitos outros de outros autores, podem mostrar a V.Exª que:
1-A linha do TGV para Madrid, acordada há três anos com os espanhois na cimeira ibérica da Figueira da Foz, é um imperativo nacional, que, sob pena de graves atrasos e inconvenientes, entre eles a perda de fundos comunitários, deve ser feita o mais rapidamente possivel para ligar a região de Lisboa à rede de bitola europeia.
A construção desta linha estratégica, estruturante e em absoluto necessária, não deve ser feita depender de estudos de custo/benefício, que agora só serviriam para atrasar, mas depende da escolha do modo de travessia ferroviária do Tejo, que exige um amplo debate e estudos técnicos, que ainda não foram feitos e estão a atrasar o processo.
A linha para Madrid é, sem dúvuida, prioritária em relação ao TGV para o Porto, cujo traçado, aliás, não pode ser decidido sem se conhecer antes o modo de travessia do Tejo e de entrada dos comboios em Lisboa.
A outra grande prioridade ferroviária nacional é a linha de bitola europeia de Vilar Formoso a Aveiro, que na primeira ocasião deve ser prolongada até ao Porto, fundamental para a economia de todo o Norte do país. Sem estes dois grandes projectos nacionais, todos os outros projectos ferrroviários são meros paleativos que nos fazem perder tempo, dinheiro, e a oportunidade de nos modernizar.
2-Não há rigorosamente nenhum estudo sério que justifique a construção de um aeroporto na Ota. Os estudos frequentemente referidos, que têm servido de suporte a recentes campanhas publicitárias, são estudos dispersos, dum modo geral feitos há quase 7 anos, que nunca foram globalmente avaliados e apreciados, que têm funcionado como cenário encobridor de um processo do qual têm sido sistematicamente afastados todos os técnicos portugueses com conhecimentos e capacidade crítica que exprimiram opiniões divergentes. E, depois deste processo “selectivo”, não se enconta nesses estudos um argumento que se mantenha em pé e justifique a Ota.
Neste momento, a opinião pública já está razoavelmente informada. O país precisa de um novo aeroporto, mas de um aeroporto que possa servir durante um século. A sua localização deve ser escolhida depois de definidas as grandes linhas dos futuros traçados ferroviários. Os investimentos previstos para a Portela vão-nos dar tempo para pensar. O que precisamos é de evitar decisões precipitadas e de não perder demasiado tempo
Todo o interesse da Presidência da República por estes assuntos é altamente benéfico. Mas permito-me sugerir a V. Ex. que procure fazer com que ele se traduza por um “livro branco”, ou algo no género, em que, no mínimo, seja possivel registar e confrontar os textos produzidos sobre estas questões, para evitar que seja necessário repeti-los anos a fio.
Apresentando a V. Exª os meus melhores cumprimentos, subscrevo-me
António Brotas
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SOBRE A LOCALIZAÇÃO DO FUTURO AEROPORTO DE LISBOA
Em 26 de Junho de 1999 , o “Público” publicou uma carta aberta minha, dirigida ao então Primeiro Ministro, escrita na sequência de três encontros promovidos pela Sociedade de Geografia de Lisboa e pelo Instituto Superior Técnico sobre a localização do Novo Aeroporto de Lisboa (NAL), que começava com as seguintes palavras:
“Caro Guterres,
Acho que lhe devo dizer que a construção do futuro aeroporto na Ota é uma decisão em absoluto errada, altamente gravosa para o país, o que com o tempo se tornará cada vez mais evidente.”
Na sequência, pedi a várias entidades: Presidência da República, Governo, Assembleia da República, Ministério das Obras Públicas e Comunicações, partidos políticos, para organizarem um “livro branco” para o país poder ser cabalmente informado sobre esta matéria, de imensa inportância para o seu futuro.
Sem este livro, as informações chegam ao público fragmentadas e o debate anda em círculo, porque os articulistas esquecem, com frequência , argumentos já conhecidos, que outros lhes têm de lembrar, embora já o tenham feito várias vezes anos atrás.
Assim, por exemplo, o Comandante Sousa Monteiro que num artigo sobre aeroporto da Ota hoje publicado no “Público” escreve: “Assiste-se a uma frenética movimentação no sentido de tornar reversivel a decisão deste Governo relativamente à concretização na Ota do Novo Aeroporto de Lisboa”, não pode ignorar que:
1-No caso de ser construido, no que diz respeito à segurança das aeronaves, o aeroporto da Ota será menos seguro que o da Portela, classificado na categoria III B pela ICAO (numa escala com a segurança máxim IIIC) enquanto que o da Ota, no parecer da Parsons (empresa consultora da NAER) será da categoria I, ou II, sendo no segundo caso necessário fazer grandes trabalhos para nivelar um monte a Norte das pistas.
2- Um aeroporto na OTA, cuja construção exige gigantescos movimentos de terras e que depois de feito não tem qualquer possibilidade de expansão, será sempre muito caro. A sua exploração exige, em consequência, o encerramento da Portela, sem o que seria uma catástrofe financeira.
3- Como único aeroporto da região de Lisboa, o aeroporto da Ota estará saturado antes de 2050, atrofiando o país e deixando-o numa situação de solução extraordinariamente dificil.
4- Há vários locais, todos a Sul do Tejo, onde é possivel construir de um modo faseado e com custos muito menores, um aeroporto com amplas possibilidades de expansão, que poderá, se o quizermos e quando o quizermos, absorver todo o tráfego da Portela, e que, conjugado com a nossa situação geográfica e a nossa condição de país independente, nos poderá assegurar um lugar significativo no futuro mundo da aviação comercial.
António Brotas
Professor Jubilado do IST
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26 de Junho 2006
À especial atenção do Senhor Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, dos Presidentes das Câmaras de Lisboa, Barreiro, Montijo e Vila Franca de Xira e dos Grupos Parlamentares dos partidos com assento na Assembleia da República.
PROPOSTA PARA O ESTUDO DA TRAVESSIA FERROVIÁRIA DO TEJO
Enquanto não for decidido o modo de travessia do Tejo da futura linha do TGV para Badajoz o futuro ferroviário português na metade Sul do país é uma incógnita.
Esta indefinição está a causar graves inconvenientes locais, regionais e internacionais.
Num artigo recentemente publicado na revista INGENIUM da Ordem dos Engenheiros com um contributo para o estudo da nossa rede ferroviária, disse que a nossa urgente prioridade ferroviária era a da escolha entre as três hipóteses que designei com letras:
A- Travessia do Tejo acima de Vila Franca.
B- Travessia entre Alverca e Alhandra na direcção do Porto Alto.
C- Ponte para o Barreiro.
Num recente encontro promovida pela ADFER, o Eng. Arménio Matias propos uma 4ª hipótese:
C’- Estação terminal do TGV na linha da cintura, nas Olaias, e travessia do Tejo por ponte ou tunel na direcção do Montijo.
O estudo de todas estas hipóteses tem, obviamente, ser conjugado com a indicação precisa da estação terminal dos comboios TGV em Lisboa.
Trasta-se de um assunto em que os técnicos portugueses e as populações mais directamente interessadas têm muito a dizer. Não é facil fazer o estudo comparado de 4 hipóteses bastante diferentes. Não tenho qualquer indicação deste estudo ter começado. Não é, também, de modo nenhum, um assunto a ser estudado por técnicos distantes desconhecedores da nossa realidade e cuja competência não podemos controlar.
Nestas condições, nalguma medida inspirado pelas regras do actual Campeonato Mundial de Futebol, proponho:
1- Que a Câmara Municipal de Lisboa, em colaboração com as do Barreiro e Montijo, organize um debate (com encontros, na Internet e elaborando, eventualmente, um “livro branco”) em que sejam analisadas as vantagens e inconvenientes das soluções C e C’, com vista a procurar saber-se qual é a melhor. O Ministério das Obras Públicas, o LNEC, a REFER e a CP podem ser solicitados a fornecer as informações técnicas julgadas necessárias.
Os apoiantes declarados das duas propostas podem-se encarregar de fazer as apresentações iniciais, que outros técnicos e entidades poderão, depois, comentar e acrescentar. Penso que muitas pessoas das zonas interessadas poderão acompanhar este debate, apresentando contributos e opiniões a considerar.
Estou convicto que um debate deste tipo, desde que aberto e bem organizado, conseguirá muito provavelmente por em evidência dum modo convincente qual das duas soluções C ou C’ é a melhor.
2- Que, sob o patrocínio da Câmara de Vila Franca de Xira, seja organizado um debate
semelhante, acompanhado pelas populações interessadas e conhecedoras dos problemas, em que sejam analisadas as soluções A e B.
Se, porventura, alguma entidade ou grupo tiver uma proposta a fazer diferente das referidas, deve-lhe ser dada a oportunidade de a apresentar claramente ao país, submetendo-a igualmente à crítica pública.
Depois, naturalmente, terá de haver uma “final”, em que os orgãos com competência nacional, bem informados depois dos processos referidos, decidirão assumindo as suas responsabilidades diante de um país igualmente bem informado. Parecem-me ser esta, simultaneamente, a regra básica da funcionamento da Democracia e, também, o melhor modo de encontrarmos as convenientes soluções para os problemas do nosso país.
António Brotas
Professor Jubilado do Técnico