Segundo Reinado no Brasil
Política, economia, sociedade e cultura brasileira através da literatura de Aluísio de Azevedo e a obra "O Mulato"
Política, economia, sociedade e cultura brasileira através da literatura de Aluísio de Azevedo e a obra "O Mulato"
Literatura: uma fonte fecunda
A literatura tem sido um objeto de estudo recorrente de diversos historiadores, tornando esse campo de análises um terreno fértil tanto para o conhecimento historiográfico da literatura quanto para o conhecimento literário da história. (Kölln, 2014) Quando trabalhamos fazendo uso de uma produção literária como fonte para acessar o passado, temos que ter bem claro que a própria escrita literária é histórica e vinculada a um universo social e histórico dinâmico, que ajuda a moldá-la embora não a determine. Assim sendo, pode-se dizer que a literatura é o reflexo da natureza histórica do homem.
Por estar associada a um determinado espaço temporal e determinadas circunstâncias, a agentes sociais contemporâneos a sua criação, a obra literária é uma importante fonte, de um determinado contexto histórico-social.
Nessa empreita é muito importante situar o romance a ser trabalhado, bem como seu autor, dentro da dinâmica histórica e do conjunto de relações sociais que constituíram o universo de sua experiência, tanto em nível micro quanto macro. É importante ressaltar também que a história narrada sempre (ou na maioria das vezes) fala sobre um grupo social e um conjunto de valores e visões de mundo arraigados na situação histórica.
Nesse esforço de trazer a literatura para a sala de aula também precisamos atentar para a proximidade entre a vida do autor e sua literatura. bem como seu posicionamento diante dessa vida e da realidade que experimentava.
Objetivos do laboratório
Abordar o livro como fonte, buscando compreender aspectos socioculturais, políticos e econômicos do Brasil do século XIX;
Situar o romance no tempo histórico em que foi pensado e escrito, ampliando seu significado e revelando o ambiente no qual foram pensados;
Perceber a importância da literatura como fonte para se acessar o passado;
Perceber a importância do contexto de produção da obra para uma melhor análise histórica.
Sobre a obra:
“[...] não a puxei a força de dentro de mim, foi ela que se formou por si mesma, sob o domínio imediato das impressões, e procurou vir à luz em forma de romance.” (AZEVEDO, 1959, p.29)
“(...) qualquer obra literária é evidência histórica objetivamente determinada e situada no processo histórico”. (Chalhoub, 1998, p. 7).
Aluízio de Azevedo
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O autor - Aluízio de Azevedo
Nascido em São Luiz do Maranhão, inspirado pelo seu irmão Arthur Azevedo, aos 19 anos de idade muda para a corte, onde cursa a Imperial Academia de Belas Artes.
Entre 1876 e 1879, Azevedo já contribuía como ilustrador para O Fígaro, O Mequetrefe, Semana Ilustrada, Zig-Zag e, Comédia Popular. Seu primeiro romance, Uma Lágrima de Mulher, foi publicado em 1879, num estilo estético romântico.
Ao retornar à terra natal (São Luís), funda e colabora ativamente com jornais anticlericais e republicanos da imprensa maranhense, sendo que no início de 1880 publica constantemente no O Pensador e A Pacotilha; neste último com o pseudônimo de Pitibri.
Aluízio de Azevedo foi um dos mais ferinos críticos do clero, da escravidão e da monarquia em sua província. Teve forte influência positivista, transmitida por Celso Magalhães e por romances de estética realista de Eça de Queirós (1845-1900) e Émile Zola (1840-1902). Atuou politicamente, deixando impressa, em romance e periódicos, sua ideologia e relação com a vida pública da época.
Sua primeira obra polêmica, que recebeu boas críticas na corte (Rio de Janeiro), foi o romance O Mulato (1881).
Tempo e Circunstância da obra O Mulato (1881)
O contexto histórico da narrativa:
Positivismo;
Evolucionismo e determinismo biológico;
Anticlericalismo;
Republicanismo;
Luta pela abolição da escravatura.
O Positivismo, o anticlericalismo e o republicanismo eram as correntes de pensamento e movimentos que ocorriam no contexto de escrita e publicação de O Mulato. O romance foi produzido em São Luiz, do Maranhão e sofreu a influência que Azevedo mantinha com a tenra intelectualidade maranhense e o debate público travado entre a jovem intelectualidade e o clero (escravidão, monarquia, tradicionalismos religiosos).
Ganhava força a ação política de viés republicano e a defesa de que a escravidão fazia da civilização brasileira uma mentira, assegurada como verdade pelo clero.
Usos e circulação da obra literária
Publicada dia 9 de abril de 1881, em São Luís (Maranhão), pela tipografia do jornal O Paiz, a obra O Mulato foi classificada pela crítica como o primeiro romance de estética naturalista escrito no Brasil. É importante chamar atenção para o fato de que, em 1872, tínhamos um público leitor acanhado, com cerca de 31.604 habitantes.
O papel das Oitivas, momentos de encontro para leituras e polemização, foi fundamentão para a divulgação e recepção do romance. Os jornais também foram importantes veículos de propaganda e promoção do romance, que teve no seu lançamento, cerca de 1.000 edições vendidas.
A recepção da obra foi desfavorável por parte de muitos de seus leitores, pois no momento em que a obra foi publicada, havia uma guerra doutrinária, jornalística e até judicial na província do Maranhão, envolvendo Azevedo e o grupo no qual atuava.
Não é errado afirmar que O Mulato provocou impactos, ao trazer conteúdos polêmicos (acontecimentos e pessoas reais, instituições tradicionais, mazelas econômicas e sociais da cidade e os preconceitos raciais). Nesse contexto, a obra foi duramente criticada no Maranhão. No entanto, recebeu uma grande acolhida e boa recepção crítica em outros espaços, sobretudo no Rio de Janeiro.
O MULATO! O MULATO! Quem não tiver ainda servido com um volume d’O Mulato, e não quiser ficar sem lê-lo, queira dirigir-se á casa do popular e sympathico Pachorra, a Rua das Barrocas nº 17 onde encontrará a sua disposição alguns desses volumes. Preço 3$000. (Diário do Maranhão, São Luís, 9 de abril de 1881. Anúncios, p.3. Apud Cordeiro,1987, p.69).
GRANDE SUCESSO DO DIA! O MULATO. Romance maranhense de Aluísio de Azevedo. Vende-se na redação do Pensador. Preço: 3$000 réis. (Publicador Maranhense. São Luís, 10 de abril, 1881. P.3. Apud Cordeiro, 1987, p.67).
O MULATO. Com este título será no principio do mez vindouro publicado um romance do Sr. Aluísio Azevedo, no qual o author propõe-se argumentar abusos religiosos, que se dão nesta cidade. Recebem-se assignaturas nesta redação. (O Pensador, São Luís, 10 de janeiro de 1881. Echos da rua, p.3. Apud Cordeiro, 1987, p.73).
Biografia usada e sugerida
ARENDT, H. A condição humana. 2ª ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1983.
AZEVEDO, Aluísio. O mulato (orientação pedagógica Douglas Tufano; notas de leitura Cláudio A. Tafarello), São Paulo: Editora Moderna, 1994 (Coleção travessias).
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