Sirenes, ventos e marés. Para quem vive o dia a dia da Defesa Civil de Santos, como Paulo Ricardo Silveira Domingues, cada alerta é mais do que um aviso: é um chamado à ação.
Quando o céu começa a escurecer sobre Santos, Paulo sente que algo vem pela frente. O som do vento contra as janelas e as marés subindo já se tornaram sinais familiares — o tipo de prenúncio que ele aprendeu a decifrar com os anos de trabalho. Coordenador de risco da Defesa Civil, ele sabe que cada minuto importa.
Em 2025, a cidade enfrentou dias difíceis: chuvas intensas, ventos fortes e dois grandes incêndios nas palafitas do Dique da Vila Gilda, que deixaram marcas profundas — não só nas casas destruídas, mas também nas pessoas que perderam tudo.
“Esses incêndios afetaram bastante a estrutura local. Além das perdas humanas e materiais, eles intensificaram problemas como deslizamentos e alagamentos”, lembra Paulo, com a voz ainda carregada de cansaço. Foram dias em que ele quase não saiu do centro de operações, coordenando equipes, respondendo a emergências e tentando minimizar o que o fogo e a água insistiam em levar.
Mas o trabalho não começa quando o desastre já está acontecendo. Na verdade, boa parte de sua rotina se passa antes da chuva cair. “A gente vive tentando antecipar o imprevisível”, diz. É por isso que, logo no início do ano, sua equipe preparou documentos, alertas e comunicados voltados às áreas de risco — pequenos gestos que, muitas vezes, salvam vidas.
Em parceria com pesquisadores da Universidade Santa Cecília, Paulo acompanha boletins de marés, ventos e correntes marítimas. Os dados chegam todos os dias e guiam decisões que, para ele, são mais do que números: são o mapa de como proteger a cidade.
“A ciência nos dá as ferramentas para prever, mas a natureza está cada vez mais imprevisível”, comenta, entre gráficos e relatórios que já fazem parte da paisagem de sua mesa.
Apesar de toda a tecnologia e preparo, ele sabe que o trabalho real acontece em campo, nas encostas, nas palafitas, caminhando entre as famílias que convivem com o medo de perder o pouco que têm. Paulo não gosta de pensar em si mesmo como um herói, mas há algo de admirável na calma com que enfrenta o caos.
“Não dá para conter todos os danos, mas dá para salvar muita gente se a gente agir rápido”, afirma.
Quando o expediente termina — ou pelo menos tenta terminar —, Paulo troca o uniforme da Defesa Civil por um par de tênis de corrida. Corredor amador, ele costuma percorrer a orla de Santos em busca de silêncio, mesmo que o celular nunca fique muito longe.
“É o único jeito de tentar esvaziar a cabeça, mas o telefone tem que estar ligado. Nunca se sabe o que pode acontecer”, conta, rindo de leve, já acostumado à ideia de que o trabalho o acompanha em qualquer lugar.
Recém-divorciado, ele aproveita os fins de semana para estar com a filha. É quando tenta deixar as sirenes de lado e se permitir apenas ser pai — mesmo que, às vezes, o olhar ainda se perca nas nuvens, avaliando se o tempo vai virar. E, entre uma corrida e uma tarde com ela, ainda sobra espaço para um outro desafio: os estudos para concursos públicos. “A gente nunca para de se preparar”, diz, como se falasse tanto da profissão quanto da vida.
Em Santos, o clima muda de uma hora pra outra — e, para Paulo, essa incerteza já virou rotina. Entre mapas, telefones e sirenes que nunca parecem se calar, ele segue firme, acreditando que cada ação preventiva é uma forma silenciosa de cuidado. Porque, no fim das contas, proteger é estar sempre alerta — mesmo quando o mar parece calmo.