O Poderoso Povo Português

Nesta parte da história, um conjunto enorme de homens está encarregado de transportar uma grande pedra de 31 toneladas, que virá a fazer parte da varanda principal, numa jornada de 8 dias que não foi nada tranquila, não só por ser extremamente custoso puxar um bloco gigante de mármore, mas também por ter havido mortes e acidentes. Francisco Marques era, na obra, um dos 600 trabalhadores que acompanhavam a pedra nesta viagem e, felizmente ou não, foi o único homem a morrer durante todo o trajeto, juntamente com dois dos 200 bois que ajudavam no transporte da futura varanda do palácio. Nesta altura os Direitos Humanos eram quase que inexistentes, visto que os trabalhadores não tinham o mínimo de segurança nem saúde no trabalho do transporte dos materiais, como também na construção do Convento, o que resultou em mortes e num cansaço extremo.

"(...)em vez de duas mil cento e doze arrobas, diremos que o peso da pedra da varanda da casa a que se chamará de Benedictione é de trinta e um mil e vinte e um quilos, trinta e uma toneladas em números redondos (...)"

(Memorial do Convento.pdf, página 164)

Tal como se sabe o nome do trabalhador que faleceu, também se sabe o nome de alguns outros, mas o motivo deles serem nomeados não é porque são especiais de alguma forma, nem por serem mais importantes do que as outras centenas que não o são, pelo contrário, esta menção do nome de alguns personagens cria no leitor um apego maior a todos aqueles presentes na viagem e, consequentemente, a toda a classe trabalhadora mencionada na obra. Saramago imortaliza assim este povo anónimo na sua obra, tal como Camões fez em "Os Lusíadas" com os nómadas portugueses à deriva no mar.

"(..)já que não podemos falar- lhes das vidas, por tantas serem, ao menos deixemos os nomes escritos, é essa a nossa obrigação, só para isso escrevemos, torná-los imortais,(..)"

"(..)que para heróis se deverão escolher os belos e formosos, os esbeltos e escorreitos, os inteiros e completos, assim o tínhamos querido, porém, verdades são verdades, antes se nos agradeça não termos consentido que viesse à história quanto há de belfos e tartamudos, de coxos e prognatas, de zambros e epilépticos, de orelhudos e parvos, de albinos e de alvares, os da sarna e os da chaga, os da tinha e do tinhó, então sim, se veria o cortejo de lázaros e quasímodos que está saindo dá vila de Mafra,(..)"

(Memorial do Convento.pdf, página 162)

Mundo do Trabalho e Direitos Humanos

Nesta altura os Direitos Humanos eram quase que inexistentes, visto que os trabalhadores não tinham o mínimo de segurança nem saúde no trabalho do transporte dos materiais, como também na construção do Convento, o que resultou em mortes e num cansaço extremo. O Mundo do Trabalho era muito mau nesta época e completamente dominado pelas classes mais altas e sobretudo pelo rei, no entanto esta situação tem sido cada vez mais extinguida da nossa sociedade atual, devido a associações como a UNICEF e a pessoas que lutam pelos seus direitos.

A Indomável Física

Para uma melhor compreensão do trabalho desumano feito pelo povo português, iremos apresentar duas situações que tiveram de ultrapassar


  • A primeira será quando teve de superar uma subida acentuada com um declive estimado de 30º , uma situação muito comum durante o processo de transporte da grandiosa pedra de 31 021 Kg cerca de 16 Km até Mafra.

  • Pedra em repouso

  • Representação das forças presentes na pedra em movimento



Para um declive de 30º e uma aceleração gravítica de 10 m/s², temos que a força exercida pela terra sobre a pedra (P) é 310 210 Newton.

P = m × g

= 31 021 × 10

= 310 210 N

Utilizando as regras da trigonometria, vem que a componente Px tem uma intensidade de 155 105 Newton.

Px = sen30º × P

= 155 105 N

Aplicando uma força F (força exercida pelos trabalhadores) no sentido oposto à componente Px, com uma intensidade de 155 105 Newton, temos que a soma das forças aplicadas na direção x e na direção y são nulas.

Fx = F - Px = 155 105 - 155 105= 0

Fy = N - Py = 0

Pela segunda lei de Newton, vem que a aceleração será nula.

F = m × a

Para F = 0 N

0 = m × a

<=> a = 0 m/s²

Sendo a velocidade dada por Vx = Vox + at e a = 0 m/s²,

então Vx = Vox (velocidade em qualquer instante da subida é igual à velocidade inicial).

Estando a pedra já em movimento, era necessário aplicar uma força mínima de 155 105 N no sentido do movimento para esta subir com velocidade constante.


  • A segunda quando, usando roldanas, ergueram a pedra de 7m de comprimento, 3m de largura e 0,66 de altura, do solo até à varanda aonde seria posta.

  • Pedra em repouso

  • Representação das forças presentes na pedra em repouso

Exercendo uma força com o mesmo módulo em ambas a corda (uma situação muito difícil e pouco provável de ter acontecido), teríamos que T2 = T1 e portanto as suas componentes também teriam o mesmo módulo T2y = T1y e T2x = T1x. As componentes na direção x, que são aplicadas na pedra, com a mesma intensidade, mas com sentidos contrários, anulam-se, permitindo que a pedra tenha um movimento retilíneo na ascensão.

Para uma aceleração gravítica de 10 m/s2, temos que a força exercida pela terra na pedra (P) é 310 210 Newton.

P = m × g

= 310 210 N


Para a pedra iniciar o movimento de ascensão seria necessário aplicar uma força T de intensidade superior a 310 210 N. Após esse instante era preciso apenas uma força de 310 210 N para que a pedra continuasse a subir com um movimento retilíneo uniforme ( explicado anteriormente).

  • Pedra em movimento

  • Representação das forças na pedra em movimento

Sendo T = T2y + T1y e o ângulo entre T1y e T1 e o T2y e T2 igual a 30º, temos que a força exercida pela corda na pedra tinha de ser de 310 210 Newton. Pelas regras da trigonometria, vem que T2y = cos30º × T2 e T1y = cos30º × T1, então:

310 210 = cos30º × T2 + cos30º × T1

Como T2 = T1

310 210 = cos30º × T2 + cos30º × T1

<=>310 210 = 2 × cos30º × T2

<=>T2 = 310 210 / (2 × cos30º)

<=>T2 = 179 100 N

Concluímos que seria preciso aplicar uma força de 179 100 N em cada uma das cordas. Essa força podia ser feita com um corpo de massa 17 910 Kg prendido na corda, o que equivale a cerca de 4 elefantes ou então 239 homens bem alimentados. Isto demonstra o trabalho desumano e hercúleo inerente ao transporte da pedra destinada à varanda sobre o pórtico da igreja desde Pêro Pinheiro a Mafra.