EXEGESE DO SALMO 6
Por Lizandro Almeida
Sumário
Introdução
Estudo Contextual
Contexto Histórico da Passagem
Contexto Literário da Passagem
Contexto Remoto
Estudo Textual
Tradução do Texto
Estrutura do Texto
Estrutura Clausal
Justificativa da Perícope
Comentário
Mensagem para a Época da Escrita
Mensagem para todas as épocas
Teologia do Texto
Implicações para a Teologia Bíblica
Implicações para a Teologia Sistemática
Implicações para a Teologia Prática
Sermão
Conclusão
Bibliografia
O Salmo 6 é um dos chamados “salmos penitenciais” — expressão do coração do fiel diante do sofrimento, aflição causada pelo pecado ou desafio existencial. Ele apresenta oração angustiada de quem se sente subjugado pela ira de Deus e busca restauração, saúde e livramento.
O Salmo 6 é atribuído a Davi, situando-se em contexto de doença, perseguição ou culpa (possivelmente pós-pecado). Não há referência histórica específica, mas indica aflição pessoal no ambiente de constante ameaça e instabilidade vivido por Davi. Craigie observa que o texto pode ser expressão tanto de enfermidade física real quanto espiritual.
Está inserido no conjunto inicial do Saltério, que enfatiza o relacionamento pessoal entre o fiel e Deus, com destaque para lamentos e súplicas individuais (Sl 3—7). Salmos penitenciais como este abrem espaço para honestidade diante de Deus, sem ocultar sofrimento.
Faz parte do gênero literário de lamentação individual da tradição hebraica: oração, queixa, clamor por intervenção divina. Kidner ressalta a naturalidade com que emoção humana se expressa nesses poemas. (Kidner).
1 SENHOR, não me repreendas na tua ira, nem me castigues no teu furor.
2 Tem compaixão de mim, SENHOR, porque sou fraco; sara-me, SENHOR, porque os meus ossos estão perturbados.
3 Também a minha alma está profundamente perturbada; mas tu, SENHOR, até quando?
4 Volta-te, SENHOR, livra a minha alma; salva-me por tua graça.
5 Pois, na morte, não há lembrança de ti; no sepulcro, quem te louvará?
6 Estou cansado de tanto gemer; todas as noites faço nadar o meu leito de lágrimas;
7 Os meus olhos desfalecem por causa da tristeza e enfraquecem por causa de todos os meus adversários.
8 Apartai-vos de mim, todos os que praticam a iniquidade; porque o SENHOR ouviu a voz do meu lamento.
9 O SENHOR ouviu a minha súplica; o SENHOR acolhe a minha oração.
10 Envergonhem-se e se perturbem todos os meus inimigos; voltem atrás e cubram-se de ignomínia em tempo oportuno.
1–3: Súplicas por misericórdia e confissão do estado de fragilidade.
4–5: Pedido de salvação fundamentado na graça divina e no apelo do louvor perdido caso morra.
6–7: Descrição poética da dor e sofrimento.
8–10: Declaração confiante de resposta divina e derrota dos adversários.
Cláusulas introdutórias: “Não me repreendas... Tem compaixão...”
Cláusula central de angústia: “Até quando?”
Cláusulas de petição (imperativos): “Volta-te... salva-me...”
Cláusulas de lamento: “Estou cansado... faço nadar meu leito...”
Cláusulas de confiança/performance divina: “O Senhor ouviu...”
O texto é autossuficiente e coeso: inicia-se com petição angustiada, passa por descrição do sofrimento e encerra com confiança na resposta divina, demonstrando estrutura clara de lamento individual.
Kidner destaca que “frieza espiritual” não é problema aqui — a dor emocional e física apontam à dependência da graça. Craigie observa o tom profundamente humano do salmo: doença, solidão, medo da morte, rodeado por opositores. Para Wilson e Calvino, o versículo-chave é o apelo à misericórdia, um clamor escatológico (cf. v. 3, “até quando?”). O salmista não apela apenas por livramento, mas por restauração relacional com Deus, reconhecendo sua justiça mas dependente de sua (misericórdia).
Para o contexto israelita, o salmo era recurso litúrgico e devocional em situações de doença, culpa e perseguição. Aponta a necessidade de buscar a Deus na prostração, não esperando perfeição para orar, mas vindo como se está.
Destaca a legitimidade de lamentar e abrir o coração a Deus em angústia. Jesus (no Getsêmani), e vários santos, encontraram-se neste caminho de oração em meio ao sofrimento.
Deus responde ao clamor dos aflitos.
Limitações humanas (fragilidade, mortalidade) não impedem o acolhimento divino.
O fiel pode e deve ser honesto diante de Deus quanto à sua miséria.
A esperança ultrapassa a experiência imediata do sofrimento.
Relação entre sofrimento, pecado e disciplina divina é tematizada — mas o fim é sempre a restauração. Introduz temas desenvolvidos nos profetas e nos ensinamentos de Jesus sobre oração e dependência.
Doutrina da graça e misericórdia.
Teologia da oração: Deus deseja a sinceridade do coração, não fórmulas vazias.
A esperança da restauração ante o sofrimento.
Oração honesta é legítima diante de Deus.
Cuidado pastoral: o sofredor não deve calar sua dor, mas expressá-la.
A comunidade pode usar o salmo como modelo de intercessão e empatia.
Tema: “Quando meu leito é regado de lágrimas: orando nas noites sombrias da alma”
Introdução: Reconhecendo os momentos de fragilidade.
Corpo: (1) Admitir a própria dor/situação, (2) Clamar pela graça, não pelos méritos, (3) Crer que Deus ouve — ainda que o tempo da resposta pareça longo.
Aplicação: Incentivo à oração sincera nas tribulações; confiança na soberania e misericórdia de Deus; encorajamento à esperança.
Conclusão: “O Senhor ouviu a minha súplica” — Deus transforma lamentação em cântico.
O Salmo 6 convida a buscarmos a Deus na dor, na consciência de que Ele é um Pai que ouve e responde, mesmo quando as respostas demorem. Afirma a graça sobre o mérito, o acolhimento sobre o castigo, e a esperança sobre o desespero.
Kidner, Derek. Psalms (TOTC). InterVarsity Press, 1981.
Craigie, Peter C.; Tate, Marvin E. Psalms 1–50 (WBC). Thomas Nelson, 2004.
Wilson, Gerald H. Psalms, Volume 1: 1–72 (NIVAC). Zondervan, 2002.
Calvino, João. Comentário sobre os Salmos.
BibleHub: Comentários, interlinear, lexicon e traduções de Salmo 6.