Os critérios de escolha do local para a elaboração da excursão e sequência didáticas, demandaram que:
Todos já tenham realizado alguma excursão prévia ao local;
O lugar pertencesse à macrometrópole paulista;
Houvesse relevância geocientífica.
As experiências e percepções que cada integrante têm a respeito do Parque Geológico do Varvito, foram consideravelmente distintas, envolvendo experiências didáticas ativas e outras passivas, o que foi muito benéfico para um olhar mais diversificado e atento sobre as características e potencialidades educativas do ambiente. Houve discussões e até mesmo dúvidas se o Parque do Varvito seria a melhor opção, contudo depois de muita reflexão, o grupo consentiu tranquilamente que o Parque seria uma opção excelente para o desenvolvimento de um trabalho didático voltado para as geociências. Uma das razões é que todo o pacote de rocha do Varvito, representa um trecho de um outro clima, enquanto que os “varves” representam os anos e as influências da sazonalidade. Portanto, trata-se de um ambiente perfeito para se trabalhar esses conceitos, comumente confundidos.
As fases de elaboração do roteiro de excursão didática e da sequência didática foram processos com muitas problematizações, reflexões e alterações, além dos levantamentos geocientíficos, pedagógicos e metodológicos.
A sequência didática começou a estruturar-se já na fase de elaboração do campo, isso porque, todos os integrantes do grupo sentiram que as atividades de campo em si, não poderiam ser pensadas de forma isolada. Pensou-se pré e pós campo atrelados ao desenvolvimento das atividades de campo e todo o escopo foi desenvolvido previamente, de modo a propiciar a compreensão dos temas em conjunto, facilitando assim a construção do roteiro de campo (PATACA, 2015, Cap. 5).
Ainda na fase de elaboração do roteiro de excursão didática, refletiu-se acerca das experiências prévias no parque a fim de encontrar a melhor abordagem possível. Foi então que, baseando-se nas categorias didáticas de COMPIANI e CARNEIRO (1993), pensou-se numa abordagem voltada para a categoria investigativa. Essa abordagem pareceu a mais adequada para o campo, pois ela propicia aos alunos resolver e formular problemas teórico-práticos, valorizando a autonomia do aluno, no entanto às atividades de campo serão semidirigidas, com algumas intervenções pontuais dos docentes, através principalmente de perguntas que instiguem a investigação.
Os objetivos de cada aula e consequentemente suas atividades, foram pensadas com base nos objetivos cognitivos da Taxonomia de Bloom, que é estruturada em níveis de complexidade crescente, do mais simples ao mais complexo (FERRAZ e BELHOT, 2010). Foi levada em consideração, em nossas discussões sobre o desenvolvimento da SD, a categorização atual da Taxonomia de Bloom proposta por Anderson, Krathwohl e Airasian (FERRAZ e BELHOT, 2010).
As reflexões também foram baseadas no trabalho de COMPIANI (2007), que sugere um ensino geocientífico mais contextualizado com os processos adjacentes, com a totalidade dos sistemas terrestres, desvinculado do cientificismo, que coloca a ciência como infalível e como uma solução para os problemas da humanidade, sendo que a ciência é política e precisa ser pensada de forma crítica e autônoma.
Após a segunda etapa do trabalho (elaboração de um roteiro de excursão didática), o grupo já possuía um positivo entrosamento e predisposição no encadeamento de ideias para a etapa seguinte, a elaboração da SD.
As reuniões de elaboração e reflexão foram frequentes, longas, equilibradas e as tomadas de decisões sempre muito democráticas. Houve uma preocupação comum em considerar a visão do outro, logo em momento algum foi necessário recorrer a uma votação ou algo do tipo, pois as questões resolviam-se com base em entendimento e flexibilidade. Tal comunhão foi fundamental para o desenrolar das ideias. O desenvolvimento das atividades só não foi mais tranquilo devido às múltiplas atividades e responsabilidades que cada integrante possuía em outras disciplinas, devendo-se levar em conta ainda o ano atípico que todos vivemos em 2020.
Em se falando da estruturação da sequência de aulas, a princípio, a lógica foi pensar em esferas maiores para esferas menores, ou seja, pensar em uma estrutura básica, para então, desenvolver os detalhes. A sequência foi dividida em blocos, o primeiro, consiste nas três primeiras aulas e possui caráter introdutório, trata-se do pré campo, este busca trazer repertório para que os alunos consigam acompanhar o campo, aliado a construção de um conhecimento imagético sobre os fenômenos e temas abordados.
A etapa da excursão didática em campo, como já explicitado anteriormente, foi a primeira a ser pensada, o que facilitou a elaboração dos processos seguintes. Na construção da SD, a data do campo está estrategicamente posicionada mais ao centro, para que a ocasião seja o momento de resgatar conhecimentos prévios e conteúdos já trabalhados, que por sua vez preparam o sujeito para o campo e demais etapas. O fato do grupo desenvolver paralelamente o roteiro de campo e um esboço do pré e do pós-campo, facilitou o desenvolvimento de toda a SD. Nessa etapa, o foco será estimular a curiosidade, investigação, discussão, reflexão e interpretação a partir do afloramento com auxílio das perguntas norteadoras entre outros recursos didáticos como imagens de satélite, produção de desenhos das formações e caderneta de campo, além do olhar atento dos docentes.
Após o campo, serão tratados temas mais específicos a serem aprofundados a partir das reflexões sobre os dados coletados em campo, revisitando conceitos, reformulando ideias e hipóteses e problematizando de maneira crítica.
É importante destacar, por fim, que a sétima aula é fundamental para a finalidade com que foi estruturada a SD. A mesma foi pensada com o objetivo de trabalhar criticamente, as percepções dos alunos sobre as interferências humanas nas geociências. Houve muita discussão não apenas entre os membros do grupo, mas também com outras pessoas da disciplina em relação a esse tópico. O trabalho final, em questão, possui um caráter fortemente voltado às geociências, entretanto o grupo consente que o trabalho elaborado, traz o compêndio necessário para que se possa pensar de forma crítica e reflexiva a relação do ser humano com a natureza e principalmente às rochas, entre outros recursos naturais, partindo de uma construção conjunta.
Após conversa e reflexão, o grupo consentiu que as avaliações precisam ser completas, ou seja, devem avaliar o rendimento dos alunos, seu feedback acerca das aulas e também se as estratégias utilizadas foram efetivas.
Para avaliar o que os alunos sentem em relação às aulas, foram pensados os “cartões do humor”, em que através de desenhos/imagens, os estudantes exprimem seus sentimentos ao fim de cada aula, ao longo da SD.
Definiu-se que nessa proposição de sequência, é papel dos docentes realizar avaliações contínuas sobre os alunos e a respeito de sua própria prática docente. Será necessária a reflexão constante a partir dos materiais produzidos pelos alunos, a partir dos “cartões de humor'' e ainda a partir de suas sensações e percepções em classe, através da investigação sobre a ação docente. Entendeu-se que a docência vai além de seus conteúdos, são relações que se estabelecem e de forma autônoma (FREIRE, 1996), o professor deve refletir, analisar, avaliar e agir novamente. Esse exercício reflexivo e crítico ao se deparar com as incertezas que se apresentam, possibilita encontrar respostas para as dificuldades e problemas que surgem (PIMENTA & GHEDIN, 2002; SCHÖN, 1992). A partir de suas reflexões e constatações o docente pode adequar e ajustar as aulas com base em seus registros.
O isolamento social ocasionado pela pandemia do Covid-19, exerceu influência negativa e positiva para com o grupo:
Positivamente, foi economizado tempo com deslocamentos; trabalharam-se apenas memórias que já possuíam do lugar, o que foi interessante, pois, o grupo já havia vivenciado visitas ao local, exercendo prática educativa e foram levados a relembrar experiências passadas, refletindo sobre acertos e erros e produzindo novas e diferentes perspectivas e experiências, sobre o mesmo local.
Negativamente, o isolamento social afetou os integrantes de forma desigual, em termos de acesso à internet e condições psicológicas adversas, decorrentes da realidade vivida por cada um.
A partir de tais observações, evidenciou-se neste processo a construção da autonomia docente (construção, reconstrução e transformação constantes) - professor reflexivo que tem intencionalidade pedagógica e constrói a partir da prática. Mostrando que este é um trabalho coletivo intenso de desenvolvimento didático e que constituiu uma atividade integrada e com amplo potencial interdisciplinar. O site, que é um produto final da disciplina, foi uma importante e significativa construção coletiva nesse momento de isolamento, uma estratégia muito boa para ampliar a autonomia docente e trabalhar o “fazer junto e em grupo” com novas alternativas digitais e colaborativas.
O contexto de pandemia permitiu novos olhares e formas diferentes de colaboração do grupo, também possibilitou refletir e problematizar a inserção deste trabalho na comunidade escolar, sua aplicabilidade inclusive em um momento atípico como o atual. Nesse sentido, compreende-se que no primeiro semestre da presente disciplina, os discentes discutiram de modo amplo o ensino remoto e suas consequências, assim como adaptações nas diversas realidades experienciadas nos estágios. A partir do segundo semestre, a continuidade da disciplina ocorreu de modo consonante com as reflexões geradas anteriormente e, atualmente, ela está inscrita e adaptada para uma aplicação do ensino remoto. Esse fator ficou muito evidente nas discussões finais do coletivo integrante desse processo.
Destaca-se também algumas estratégias de comunicação e discussão geradas por meio das ferramentas digitais que culminaram em um diário de anotações, compartilhado e produzido pelos integrantes do grupo durante as aulas. O material foi de suma importância para construir, fidelizar, socializar e discutir os aprendizados, de maneira coletiva, na produção desse trabalho.
COMPIANI, M.; CARNEIRO, C.D.R. Os papéis didáticos das excursões geológicas. Enseñanza de las ciencias de la Tierra, 1(2): 90-98, 1993.
FERRAZ, A.P.C.M.; BELHOT, R.V. Taxonomia de Bloom: revisão teórica e apresentação das adequações do instrumento para definição de objetivos instrucionais. Gest. e Prod., São Carlos, v. 17, n. 2, p. 421-431, 2010.
FREIRE, P. Pedagogia da autonomia: Saberes necessários à prática educativa. 25. ed. São Paulo: Paz e Terra, 1996.
PATACA, E. M. História, Geociências e Meio Ambiente. Os trabalhos de campo como agentes articuladores de sequências didáticas na Região Metropolitana de São Paulo. In: Bacci, D. L. (Org.). Geociências e Educação Ambiental. Curitiba: Ponto Vital, 2015, Capítulo 5.
PIMENTA, S. G.; GHEDIN, E. (Orgs.). Professor reflexivo no Brasil: gênese e crítica de um conceito. São Paulo: Cortez, 2002.
SCHÖN, D. A. Formar professores como profissionais reflexivos. In: Nóvoa (org.) Os professores e a sua formação, Lisboa, Dom Quixote 1992. 39.