A CRIANÇA QUE TEM MEDO DE DORMIR SÓZINHA...

A CRIANÇA QUE TEM MEDO DE DORMIR SOZINHA...

Acomodar seu filho no seu leito conjugal é erro de graves conseqüências futuras e nesse erro incorrem pessoas de todos os níveis. Diz a senhora que o menino é "muito pegado" consigo, que "não faz mal porque ele ainda é muito pequeno" e etc. Muito bem! Até quando essa situação poderá ser tolerada? "Quando ele for grandinho, naturalmente que dormirá noutro quarto..." Bem quando ele for grandinho, então, o mal que se poderia fazer terá chegado a seu têrmo. A senhora o trará, novamente, para que o examine. A esse tempo não receitarei mais uma cama, talvez, nem mesmo droga nenhuma. Ele precisará, talvez, dum dispendioso tratamento analítico, demorado e paciente. E trará no seu passivo social, possìvelmente, um largo prontuário de êxitos negativos. Ah, a senhora conhece muitas pessoas que quando meninos dormiam com os pais e que não sofrem dos "nervos"? Olhe aqui: Acontece que dormir na cama dos pais não causa doença nervosa, pròpriamente, o que provoca ou pode provocar é uma série de distúrbios na formação da personalidade do indivíduo. Distúrbios que poderão vir à tona sob a forma de desvios, perversões, fixação e complexos diversos que marcarão a vida do adulto depois. Se sob o ponto de vista da higiene física já o fato de dormirem duas pessoas na mesma cama não chega a ser coisa recomendável, sob o ponto de vista da higiene mental dormirem os pais com o filho no mesmo leito constitui um hábito dos mais perniciosos. E veja bem: dormir mesmo em outra cama, mas no mesmo quarto, ainda é uma prática nociva, pois a vida íntima dum casal não deve constituir um espetáculo para os olhos de uma criança. Diz a senhora que o "inocentinho" não percebe nada... Pois sim. É que os adultos fàcilmente esquecem que a perceptividade da criança é muito mais aguçada do que se imagina e que as imagens gravadas até os quatro anos de idade formam um lastro que, do seu inconsciente, pode determinar as mais variantes normas de conduta e atitude, refletindo-se, depois, à distancia, como um nódulo ignorado mas atuante sobre seu Ego na sua vida futura. Seu filho deve ser habituado a dormir em cama própria e noutro quarto ou noutra parte da casa, sem a participação de adultos. Deve ser habituado a deitar-se em hora certa e a adormecer naturalmente. Sem embalos, sem cantorias, sem cafunés, sem histórias, sem carícias nos dedos dos pés ou em qualquer outra parte do seu corpo, sem ameaças, sem rituais e sem mêdo. O mêdo que algumas crianças tem do escuro ou do isolamento lhes é incutido pelos adultos que exaltam a sua imaginação com histórias impróprias ou com o terror condicionado: "se não dormir logo vem o bicho papão e lhe pega" ou "olhe o homem do saco" ou qualquer variante dessas estúpidas coações.

Se algum familiar já se encarregou de lhe semear o terror, faça cessar a sua influência malévola e reeduque, pelo exemplo, o garoto, fazendo-lhe ver que tais coisas não existem e incutindo-lhe a noção de segurança que ele deve sentir no seu lar.

Por mais humilde que seja a sua casa há de se encontrar um lugar onde a criança possa ter o seu recanto. Cerque-o de brinquedos simples: bolas, bonecas, animais de brinquedo. Não diga que não os pode comprar. Você mesmo pode fazer pequenos brinquedos para o seu filho e um boneco de pano de fabricação caseira lhe causará tanto prazer quanto um outro qualquer. Um jogo de armar, feito com quadrinhos de madeira, serrados em casa e coloridos, lhe fará tão feliz quanto um outro de custo elevado mas que, na essência, é a mesma coisa.

Preparar assim a sua pequena estante de brinquedos ao lado da cama do menino. Aquele será o seu "território", onde ele se poderá desenvolver guiado por sadias normas e onde se lhe poderá incutir hábitos corretos.

Seu menino deve dormir em cama própria e fora do quarto dos pais. Esta é mais do que uma receita. É uma orientação para que ele possa melhor vencer as diversas fases de evolução natural dos seus sentimentos em relação aos pais, condicionadas a um fenômeno psicológico conhecido pelo nome de Complexo de Édipo.

Fonte: Prof. Gonçalves Fernandes

Da Faculdade de Ciências Médicas - Chefe da Seção da Ortofrenia e Higiene Mental do Depto. de Saúde Pública de Pernambuco.

Para a Revista do Ensino - Porto Alegre - Brasil.

Pesquisa Dra. Elaine Marini

Prof. Gonçalves Fernandes