O potencial de inóculo micorrízico (PIM) pode ser mensurado por diferentes bioensaios, os quais tem sido propostos na literatura. O potencial de inóculo micorrízico estima indiretamente os propágulos infectivos dos FMAs em uma determinada amostra e pode ser utilizado tanto para amostras provenientes do campo quanto para avaliar a qualidade de uma cultura pura.
O NMP (Número Mais Provável) mede a presença ou ausência de colonização micorrízica em plantas submetidas a diluições em série, com os resultados sendo interpretados como uma probabilidade do número de propágulos a partir de uma tabela estatística. O ensaio é indireto visto que o número absoluto de propágulos não é medido, no entanto, tem a vantagem de fornecer um único número de propágulos para uma amostra o qual pode ser comparado diretamente com o de outra amostra no mesmo ensaio. A desvantagem é que o número tem um alto intervalo de confiança a 95%, mesmo em um baixo fator de diluição e muitas repetições por diluição. De acordo com Adelman & Morton (1986), todas as comparações entre amostras devem ser feitas em apenas um experimento, ou seja, nas mesmas condições e ao mesmo tempo. O ideal é realizar no mínimo três ensaios para cada amostra de solo para poder fazer uma análise estatística, algo que raramente é feita nos estudos encontrados na literatura. Como há muito fatores que afetam os resultados, como fatores ambientais, tipo de inóculo e manipulação do inóculo (temperatura de estocagem, secagem do inóculo), as comparações não são possíveis entre diferentes inóculos processados de diferentes maneiras e ensaios realizados em diferentes épocas por diferentes pessoas (Wilson & Trinick, 1982).
Dois fatores importantes para serem considerados são a) o fator de diluição e b) o número de tubetes (repetições) por diluição. Quanto menor for a diluição e mais tubetes for estabelecido por diluição, menor será o intervalo de confiança a 95%. Um fator de diluição de 10x (101, 102, 103, 104,...) é geralmente utilizado com cinco tubetes por diluição.
O tempo que o ensaio será conduzido depende do hospedeiro e do tamanho do tubete ou do vaso que se esta utilizando; em todos os casos é importante esperar que o sistema radicular da planta hospedeira possa crescer por todo o substrato contendo o inóculo. É útil ter alguns tubetes extras os quais poderão ser colhidos após 4 a 6 semanas para obter alguma idéia do padrão e grau de crescimento radicular. Na colheita, as raízes são lavadas para retirar qualquer material do substrato que possa se grudar a elas, coloridas e examinadas para a presença ou ausência de colonização micorrízica. Nas diluições com menos inóculo (e.g., 104, 105), as raízes devem ser examinadas cuidadosamente visto que a unidades de infecção podem estar em apenas alguns locais do sistema radicular. Como o exame da colonização é feita na lupa, nos ensaios que se utiliza inóculo do campo tem que se ter cuidado para não confundir colonização micorrízica com infecção por bolores aquáticos. Caso o avaliador não tenha muita experiência e tenha dúvida se a colonização é micorrízica ou não, vale a pena verificar a colonização no microscópio. Deve ser contado com positivo apenas se as estruturas fúngicas estiverem realmente colonizando o sistema radicular; presença de hifas destacadas da raiz ou esporos não devem ser considerados como positivos.
A seguir apresentamos um exemplo de como montar um NMP, modificado do apresentado por Bagyaraj & Stürmer (2010):
Material necessário:
- Tubetes plásticos (150 cm x 2,5 cm) e bandejas
- Sacos plásticos (30 x 20 cm)
- Diluente esterilizado (utilizar um diluente padrão para comparar várias amostras)
- Sementes de sorgo
Procedimento:
1) Pese 30 g de solo de campo (ou amostra da qual se quer mensurar o PIM) e adicione o mesmo em 270g do solo diluente esterilizado. Agite vigorosamente para obter a diluição 101,
2) Remova 30 g da diluição 101 e coloque-a em outro saco plástico contendo 270 g do solo diluente esterilizado. Agite vigorosamente para obter a diluição 102. Estabeleça as diluições seguintes da mesma forma até atingir a diluição 105,
3) Distribua o solo de cada uma das diluições nos tubetes. Faça cinco repetições por diluição (totaliza 25 cones se usar 5 diluições).
4) Coloque sementes de sorgo em cada um dos tubetes ou de outro hospedeiro adequado (que seja micotrófico),
5) Após emergência das plântulas, deixe apenas uma planta por tubete e conduza o ensaio em casa-de-vegetação ou câmara de crescimento por 4 a 6 semanas,
6) Na colheita, lave as raízes gentilmente para remover qualquer partícula de solo e submeta as raízes ao processo de descoloração com azul de Tripan (ou outro procedimento que permita visualizar colonização),
7) Na lupa, determina a presença ou ausência da colonização micorrízica em cada uma das repetições. A contagem do número de tubetes positivos (contendo micorriza) nas diferentes diluições é utilizada para calcular os valores do NMP. Use as tabelas de Cochran (1950), Fisher & Yates (1963) ou Alexander (1965).
Para exemplificar os cálculos, vamos assumir que, considerando as 5 repetições para cada uma das diluições (101, 102, 103, 104, 105), a seguinte sequencia de números de tubetes positivos é obtida: 5, 5, 3, 2, 0. Isto significa que todas as 5 repetições são positivas para colonização micorrízica nas diluições 101 e 102, 3 repetições na diluição 103, 2 repetições na diluição 104, e nenhuma repetição na diluição 105. Para o cálculo do NMP, apenas três números de uma dada sequencia são considerados. O primeiro número (N1) especifica o máximo número de tubetes positivos na diluição menos concentrada. Os outros dois números (N2 e N3) são aqueles correspondentes às próximas diluições. No exemplo acima, a combinação seria:
N1 = 5, N2 = 3, e N3 = 2
Usando a tabela de NMP, o valor dado para esta combinação de valores positivos é 1,4. Para obter o NMP dos propágulos infectivos dos FMAs na amostra, este valor tem que ser multiplicado pela diluição do meio (neste caso 103).
Assim, este solo tem 1,4 x 103 propágulos infectivos de FMAs por g de solo.
REFERÊNCIAS
Adelman, M. J. and J. B. Morton. 1986. Infectivity of vesicular-arbuscular mycorrhizal fungi: Influence of host-soil diluent combinations on MPN estimates and percentage colonization. Soil Biol. Biochem. 18: 7-13.
Alexander, M. 1965. Methods of Soil Analysis, Part 2, Agronomy Series #9, ASA, Madison, Wisconsin, pp. 1467-1472.
Bagyaraj, J.D. and Stürmer, S.L. 2010. Fungos micorrízicos arbusculares (FMAs). In.: Manual de Biologia dos Solos Tropicais. Eds.: F.M.S. Moreira, E.J. Huising & D.E. Bignell. Editora UFLA, Lavras. Pp.205-225.
Wilson, J. M. and M. J. Trinick. 1982. Factors affecting the estimation of numbers of infective propagules of vesicular arbuscular mycorrhizal fungi by the most probable number method. Aust. J. Soil Res. 21: 73-81.
Este método foi proposto por Moorman & Reeves (1979) para medir o potencial de inóculo micorrízico em áreas perturbadas. Os autores reconhecem que a contagem de esporos é uma das mais utilizadas medidas para avaliar os níveis populacionais dos FMAs no solo, no entanto, outros propágulos como raízes colonizadas e o micélio no solo podem ser importantes fontes de inóculo (Read et al. 1976).
O bioensaio proposto consiste em determinar a porcentagem de colonização (ou de infecção, como colocado no artigo original) no sistema radicular de plantas de milho crescidas por 30 dias em solos perturbados ou não. O milho foi proposto como hospedeiro visto sua habilidade de se associar com muitas espécies de FMAs. Um ponto importante neste método é que ele mede apenas o inóculo viável enquanto que em contando-se esporos nem sempre é possível distinguir entre esporos viáveis e não-viáveis apenas pela inspeção visual.
No bioensaio com milho, a porcentagem de colonização micorrízica ou o comprimento de raiz micorrizada são mensurados. No artigo original, Moorman & Reeves (1979) medem a % de colonização avaliando a presença de colonização em 100 segmentos de raiz obtidos do sistema radicular total de cada repetição. Outro método que pode ser utilizado para medir a % de colonização é o método das linhas cruzadas proposto por Giovannetti & Mosse (1980) usando um subamostra do sistema radicular, a qual deve ser pesada primeiramente. O comprimento de raiz micorrizada deveria ser mensurado também, especialmente em condições nas quais o ensaio resulta na produção diferenciada de biomassa radicular entre as amostras (nestes casos, a % de colonização pode não refletir a quantia total de colonização fúngica no sistema radicular total). Independente de qual método utilizar, o resultado reflete uma medida do ingresso primário dos FMAs (dos propágulos ativados) e de colonização secundária (crescimento do fungo no córtex) num período de tempo.
Este método tem a vantagem de requerer menos repetições (e tubetes) para obter um resultado (assumindo que apenas uma diluição seja utilizada), mas também é sensível aos mesmos parâmetros que afetam o NMP. Por outro lado, ele exige um trabalho maior visto que a % de colonização tem que ser cuidadosamente medida em cada repetição ao invés de avaliar presença ou ausência.
No método original, Moorman & Reeves (1979) sugerem estabelecer as diluições zero, ¼ e 1/40, com 5 repetições por diluição e amostrar as plantas de 5 repetições após 30, 60 e 90 dias. Isto totaliza 45 tubetes e torna-se mais trabalhosa quando comparada ao NMP. Muitas modificações são possíveis desde diferentes séries de diluições até diferentes tempos de amostragem. Além disto, uma equação de regressão linear pode ser obtida entre a % de colonização e os fatores de diluição ao invés da % de colonização e o tempo.
Uma data de colheita é estabelecida para fins comparativos baseado no hospedeiro, crescimento radicular e condições ambientais. No entanto, deve-se considerar que a data de colheita do ensaio não pode ser muito cedo (21 dias) pois pode não haver colonização (em casos que o PIM for muito baixo) nem tão tarde (>45 dias) para evitar colonização secundária (e assim medir crescimento do fungo dentro da raiz e não PIM). Embora não registrado na literatura a variação associada com cada diluição, o erro padrão deve ser menor que o do NMP.
Bioensaio da PCM como conduzido na CICG:
1. Milho (Zea mays) é nosso hospedeiro padrão para mensurar o PIM das culturas puras visto ser micotrófico, produz muitas raízes em 4 semanas e as estruturas fúngicas nas raízes são relativamente fáceis de visualizar. Em alguns casos, o sorgo (Sorghum bicolor) pode ser utilizado no lugar do milho.
2. As plantas são crescidas em tubetes plásticos (150 cm x 2,5 cm) e 5 repetições são estabelecidas para cada ensaio. As plantas são mantidas por 30 dias em casa-de-vegetação, quando então são colhidas para analisar a % de colonização. Em alguns casos quando se suspeita que o potencial de inóculo seja alto, 2-3 tubetes adicionais são estabelecidos e colhidos aos 21 dias para determinar se o ensaio deveria ser colhido nesta data ou mantido até os 30 dias.
3. O diluente consiste no nosso substrato padrão esterilizado, uma mistura de areia com argila expandida (1:1), com 0,002 mg L-1 de P e pH variando de 6,5-7,0.
4. Apenas uma diluição é estabelecida (1/10 ou 10% de inóculo), mesmo quando as amostras são suspeitas serem altamente infectivas. Em alguns casos quando se testa solo do campo, uma diluição de ½ é feita. É importante montar os ensaios todos no mesmo tempo para que as comparações sejam apropriadas. Com apenas uma diluição e 5 repetiçoes, este delineamento maximize o número de amostras que podem ser testadas ao mesmo tempo quanto ao seu PIM.
5. Os ensaios são conduzidos em casa-de-vegetação com luz controlada.
6. As raízes são colhidas, descoloridas e a % de colonização micorrízica mensuarada após 30 dias. A porcentagem de colonização média de cada cultura (obtida das 5 repetições) representa uma estimativa do Potencial de Inóculo Micorrízico de cada cultura e pode ser comparada estatisticamente.
REFERÊNCIAS
Moorman, T. and F. B. Reeves. 1979. The role of endomycorrhizae in revegetation practices in the semi-arid West. II. A bioassay to determine the effect of land disturbance on endomycorrhizal populations. Amer. J. Bot. 66: 14-18.
Giovannetti, M. and B. Mosse. 1980. An evaluation of techniques for measuring vesicular arbuscular mycorrhizal infection in roots. New Phytol. 84: 489-500.
Read, D.J., H.K. Koucheki & T. Hodgson. 1976. Vesicular-arbuscular mycorrhizae in natural vegetation ecosystems. New Phytol. 77: 641-653.
O método da unidade de infecção foi desenvolvido por Franson & Bethlenfalvay (1989) conta diretamente as unidades de infecção na raiz. Neste sentido, comparativamente ao NMP e ao método de Porcentagem de Colonização Média, este método pode ser considerado direto pois mede a colonização micorrízica primária, ou seja, aquela originada pelas unidades de infecção resultantes dos pontos de entrada. Uma das vantagens deste método é que a relação entre densidade de inóculo e formação de unidades de infecção discretas é linear. Os autores afirmam que este método é apropriado para determinar a quantidade de inóculo com potenciais equivalentes para uso em experimentos de curto prazo.
No artigo original, os autores estabelecem várias diluições com o inóculo a ser testado, para obter uma relação linear entre as diluições e o número de unidades de infecção. Várias diluições são estabelecidas com base na massa do inóculo em relação a massa total do substrato utilizado. As diluições no protocolo original são irregulares (50%, 12,5%, 3,1% e 0,78%) e nenhuma razão do porque estas diluições foram estabelecidas é apresentada
A montagem e a avaliação do bioensaio é bastante laboriosa e necessariamente precisa ser de curta duração (14 dias) para garantir que nenhum colonização secundária ocorra. Esta limitação pode introduzir alguma variabilidade nos resultados, dependendo dos tipos de propágulos presente no inóculo, espécie hospedeira utilizada, e composição taxonômica do inóculo, todos estes fatores influenciando a probabilidade de contato entre os propágulos fungicos e a raiz.
As comparações podem ser feitas pelo angulo das equações de regressões obtidas e o erro padrão dos dados é relativamente baixo, de acordo com os resultados de Franson & Bethlenfalvay (1989) baseado no estudo com cinco isolados (Funneliformis mosseae, Claroideoglomus etunicatum, e Glomus pallidum). Poucos artigos científicos tem registrado este método para mensurar infectividade de FMAs e assim sua validação permanece em aberto.
REFERÊNCIAS
Franson, R. L. and G. J. Bethlenfalvay. 1989. Infection unit method of vesicular-arbuscular mycorrhizal propagule determination. Soil Sci. Soc. Am. J. 53: 754-756.