Césare Lombroso

Césare Lombroso (1835-1909). A filha, senhora Gina Lombroso Ferrero, quando escreve sobre seu pai, a pena treme entre os seus dedos, pois evoca a nobreza de sua alma e de seu grande coração, de sua simplicidade, sua timidez, sua comovedora falta de sentido prático, sua indiferença pela riqueza, pelas honras, pelo que o vulgo chama de exito; sua sede ardente de conhecimento, sua religião da verdade, sua caridade, sua inclinação para os humildes, para os infortunados da natureza e da sociedade, sua fidelidade para com os amigos, o amor dos seus.

Lombroso teve de pagar de seu bolso os armários em que alinhava seus crânios, seus esqueletos, seus objetos. A faculdade lhe impedia o acesso às clínicas e aos cárceres, e para dispor de alienados e criminosos, a fim de apresentá-los aos seus discípulos, tinha que ir buscá-los em sua clientela particular.

Deixando à parte descobertas de mérito e inventos úteis, mas secundários no conjunto, pode-se dizer que a vida científica de Lombroso se resume em três obras de soberana importância. Encontrou a causa da pelagra e indicou a sua profilaxia e seu tratamento; determinou o tipo de criminoso nato e criou em todas as suas peças a nova ciência da antropologia criminal, com todas as suas aplicações no direito penal e nos sistemas de repressão; e pôs clareza surpreendente na história natural do gênio e em suas relações com as anomalias do cérebro.

Quando Lombroso empreendeu seu estudo, a pelagra era a mais terrível praga do povo italiano. Havia, nessa época, mais de 100 mil enfermos (devido ao milho bichado).

A luta em torno do criminoso nato forma ao lado da que se travou em torno da pelagra. Lombroso reconheceu que o criminoso é um degenerado, vítima de uma paralisação do desenvolvimento que o retém no baixo nível do homem primitivo. É portador de máculas físicas que revelam sua inferioridade orgânica.

A virtude do gênio não radica tanto em ser original quanto em descobrir o transcendente sob o vulgar. A vida dos condenados nas prisões fornecem argumento às literaturas picarescas do mundo inteiro; todavia, a análise psicológica dessa medonha vulgaridade só Lombroso a levou até os limites capazes de revolucionar não só o regime penitenciário, mas também a psiquiatria e mesmo o Direito criminalista... Relata o drama de um gloríola lançado no ambiente amoral do cárcere.

Em outro capítulo, Lombroso estuda a "religiosidade" dos pregressos e criminosos. Desfilam em seu estudo empolgante os facínoras de mais arrepiante história, todos eles com sua religião, sua fé formidável, suas crendices e sua possante mística... E destes estudos Lombroso criou uma ciência das mais importantes na reta organização da sociedade, onde não é só o micróbio mas a doença moral e psíquica a que reclama urgente curativo.

Os trabalhos de Lombroso, que estabelecem as relações entre o gênio e a neurose, a degeneração e a epilepsia, tiveram a mesma sorte: negados, combatidos, ridicularizados a princípio, triunfaram por fim sobre todas as oposições. (1)

(1) TITÃS DA CIÊNCIA - Trad. Dr. Silvano de Souza. São Paulo: El Ateneo,