Artigo 185.º – Angariação de mão-de-obra ilegal

1 — Quem, com intenção lucrativa, para si ou para terceiro, aliciar ou angariar com o objetivo de introduzir no mercado de trabalho cidadãos estrangeiros que não sejam titulares de autorização de residência ou visto que habilite ao exercício de uma atividade profissional é punido com pena de prisão de um a cinco anos.

2 — Quem, de forma reiterada, praticar os atos previstos no número anterior, é punido com pena de prisão de dois a seis anos.

3 — A tentativa é punível.


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Comentários  

                                     

 1 — O preceito segue a linha traçada pelo art. 136.º-A do DL n.º 244/98, de 8 de Agosto, introduzido pelo DL n.º 4/2001, de 10 de Janeiro.


Nota SEF: O artigo, na sua redação original (anterior à Lei n.º 29/2012, de 28 de agosto), ditava:  

Artigo 185.º - Angariação de mão-de-obra ilegal

1 - Quem, com intenção lucrativa, para si ou para terceiro, aliciar ou angariar com o objectivo de introduzir no mercado de trabalho cidadãos estrangeiros não habilitados com autorização de residência ou visto que habilite o exercício de uma actividade profissional é punido com pena de prisão de 1 a 4 anos.

2 - Quem, de forma reiterada, praticar os actos previstos no número anterior é punido com pena de prisão de 2 a 5 anos.

3 - A tentativa é punível.


Nota SEF: A Lei n.º 13/2023, de 3 de abril (altera o Código do Trabalho e legislação conexa, no âmbito da agenda do trabalho digno), no seu artigo 19.º, aditou ao Decreto-Lei n.º 260/2009, de 25 de setembro (regime jurídico do exercício e licenciamento das agências privadas de colocação e das empresas de trabalho temporário), os artigos 28.º-B, 29.º-A e 29.º-B, com a seguinte redação:

«Artigo 28.º-B


Responsabilidade contraordenacional por intermediação laboral ilegal


Constitui contraordenação muito grave, imputável ao empregador e à agência privada de colocação, o recrutamento e colocação de trabalhadores por intermédio de agência que não tenha cumprido o disposto nos n.os 1, 2 ou 4 do artigo 16.º, punível com coima de 2800 (euro) a 6000 (euro) ou 12 000 (euro), consoante se trate de pessoa singular ou pessoa coletiva.


Artigo 29.º-A


Proibição do exercício de atividade em empresa de trabalho temporário ou agência privada de colocação


Pode ser condenado na proibição de exercício de atividade, no âmbito de empresa de trabalho temporário ou agência privada de colocação, incluindo de sócio, administrador ou trabalhador, por um período de entre 2 a 10 anos e atenta a concreta gravidade do facto e a sua conexão com a função exercida pelo agente, quem for punido:


a) Pelos crimes previstos no presente decreto-lei;


b) Pelos crimes previstos nos artigos 82.º, 83.º, 316.º, 407.º, 459.º, 543.º, 545.º e 547.º do Código do Trabalho;


c) Pelos crimes previstos nos artigos 159.º e 160.º do Código Penal;


d) Pelos crimes previstos nos artigos 183.º, 184.º, 185.º e 185.º-A da Lei n.º 23/2007, de 4 de julho.



Artigo 29.º-B


Responsabilidade penal


O regime sancionatório constante do presente decreto-lei não prejudica eventual responsabilidade em matéria penal, prevista nos termos da lei.»



Jurisprudência


"...No caso sub judice, perante o imenso rol dos factos conhecidos (existência de dezenas de cidadãos nepaleses, com os quais o recorrente UP contatou, e os quais “contratou”, ao serviço e sob as ordens do arguido NB), olhando à natureza de alguns desses factos (condições de alojamento e de trabalho dos aludidos cidadãos nepaleses, remunerações por estes auferidas, partes dessas remunerações retidas - e objeto de apropriação - pelos arguidos NB e UP), ponderando os lucros e os proventos, de relativamente elevado valor, com o uso e a exploração dessa mão-de-obra, e atendendo aos estratagemas utilizados pelos arguidos NB e UP para convencerem os referidos cidadãos nepaleses a virem para Portugal, e com o devido respeito por diferente opinião, verificam-se todos os pressupostos acabados de expor relativos à validade e legitimidade do uso de presunções.

Este tribunal de recurso, como, aliás, qualquer cidadão de média formação e de são entendimento, subscreve, com total segurança, os factos dados por provados na decisão recorrida quanto à autoria dos factos por parte do arguido UP (agindo em coautoria com os demais arguidos) - ou seja, e no essencial, que os cidadãos nepaleses em causa foram vítimas de crime, por terem sido “enganados” (nas promessas feitas pelos arguidos, com o objetivo de os fazerem vir para Portugal), por terem sido objeto de “exploração” da respetiva força de trabalho, por essa “exploração” ter revertido em lucro ilícito para os arguidos, e por o arguido UP conhecer tudo isso, agindo ainda com o propósito de obter vantagens patrimoniais indevidas (advenientes da “exploração” laboral desses mesmos cidadãos nepaleses).

É linear, por resultar inequivocamente das regras da experiência, a conclusão acabada de retirar. O arguido UP, por si e/ou em conjugação com os demais arguidos, “explorou”, repetidamente e de diversos modos, a mão-de-obra dos cidadãos nepaleses em causa, auferindo lucros (relativamente avultados) dessa atividade delitiva, e sabendo, claramente, que toda essa sua atuação era feita de forma ilícita, proibida e criminalmente punível..."

"...A experiência comum também não nos diz que, se alguém contrata trabalhadores numa “empresa de trabalho”, siga princípios de boa-fé contratual e pense que os trabalhadores estão “legais”. Bem pelo contrário: atendendo à natureza e às características de muitas dessas “empresas de trabalho”, um cidadão de média formação duvida sempre, legitimamente, que os trabalhadores que tal “empresa” forneça tenham a sua situação “regularizada”."

I - Reunidos os pressupostos processualmente exigidos para a respetiva produção, as declarações para memória futura constituem um modo de produção de prova pessoal submetido a regras específicas, visando acautelar, bem vistas as coisas, o respeito pelos princípios estruturantes do processo penal, designadamente (e sobretudo) pelo princípio do contraditório, não se impondo a sua leitura em audiência de julgamento para que possam ser valoradas.

II – No crime de tráfico de pessoas, com diversidade de vítimas, está afastada a figura do crime continuado, por estarem em causa bens eminentemente pessoais.

Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 18-10-2018, no Processo 14/16.9ZCLSB.E1



AUXÍLIO À IMIGRAÇÃO ILEGAL; ELEMENTOS TÍPICOS

I - ...

II – O crime de auxílio à imigração ilegal define-se pelos seguintes requisitos objectivos e subjectivos: A acção material criminosa reside no “favorecimento” e na “facilitação” da entrada, da permanência ou do trânsito ilegais de cidadão estrangeiro em território nacional; Quanto ao modo de acção, não estando definido, qualquer um é idóneo; O objecto da acção é a “entrada”, o “trânsito” [n.º 1 do artigo 183.º da Lei 23/2007, de 04-07] e a “permanência” [n.º 2 do mesmo artigo] ilegais, consoante os casos, noções cuja verificação casuística há-de encontrar-se no disposto no artigo 181.º do referido diploma; O sujeito activo é qualquer pessoa, enquanto o sujeito passivo é um cidadão estrangeiro; O elemento subjectivo consiste na consciência de prestar ilicitamente ajuda a cidadão estrangeiro para entrar, permanecer ou transitar de forma ilegal no nosso país, não sendo essencial para a prática do crime a obtenção de um ganho ou benefício económico; exige, todavia, o n.º 2 do artigo 183.º a concorrência de uma intenção lucrativa, que funciona como elemento subjectivo agravante da moldura penal abstracta.

III – A necessidade da existência de contrato de trabalho e, bem assim, da inscrição na segurança social, para a concessão de autorização de residência - sem prejuízo da verificação dos requisitos gerais a que se reporta o artigo 88.º da Lei 23/2007 - não impede que com a sua celebração, muito menos que com o começo de execução da prestação de trabalho subordinado - numa ocasião em que o mesmo ainda não foi formalizado -, o crime de auxílio à imigração ilegal haja sido cometido."

Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 20-06-2018, no Processo 7/11.2ZRCBR.C1



"...XVII - O tipo legal de crime de angariação de mão de obra ilegal tem como objecto de protecção a tutela do controle dos fluxos migratórios, mas também a defesa dos direitos próprios e característicos fundamentais do trabalhador em geral extensivos ao estrangeiro, da sua própria dignidade enquanto pessoas trabalhadoras. O controle dos fluxos migratórios tem, ainda, a vantagem de evitar os excessos da concorrência laboral, potenciadores de uma pluralidade de inconvenientes, como o desemprego, redução de salários entre os imigrantes, diminuição da produtividade, inibição no processo de desenvolvimento tecnológico, concorrência desleal nomeadamente pela redução dos custos de mão de obra, dos salários dos trabalhadores locais, com o consequente aumento dos custos sociais (neste sentido, cf. A. Morais Pinto, in Comentário às Leis Penais Extravagantes, compiladas por Paulo Pinto de Albuquerque e José Branco, Vol. I , ed. UCP. pág. 119.

XVIII - O arguido, ao instruir, ao convencer, terceiros a conseguirem o recrutamento de mulheres para praticarem actos relacionados com a exploração de actividade de striptease e o erotismo nas sociedades de que era dono – e outras – sem autorização das competentes autoridades nacionais, sob promessa de benefícios económicos e com intenção lucrativa, fornecendo-lhes, adquiridos pelas sociedades que integrava, os bilhetes de passagem aérea indicando-lhes cautelas que deveriam observar à chegada a território nacional para não levantarem suspeitas às autoridades de controle de estrangeiros, aconselhando-lhes o estabelecimento dos itinerários mais adequados para a entrada e por forma a que a mesma se efectuasse por outros países do espaço «Shengen» onde o controle é menos apertado ao trânsito de pessoas, a não revelarem com quem viajaram, para além do acolhimento posteriormente dispensado, incentivando, ainda, a que as renovações não ultrapassassem, em regra, os 90 dias permitidos de permanência na situação de turistas e fosse, assim, reforçada a ideia enganosa, perante as autoridades, de que elas se deslocavam a Portugal nessa situação, fornecendo-lhes, por vezes, uma «carta para visita», procurando, assim, dar credibilidade às afirmações que produzissem sobre a sua deslocação turística, obviar, para evitarem igualmente quaisquer suspeitas sobre a finalidade das deslocações, ocupando a cúpula da organização, incorreu na prática dos crimes de angariação de mão de obra ilegal e de auxílio à imigração ilegal, ambos em forma continuada, sendo este último agravado..."

"O tipo legal de crime de angariação de mão de obra ilegal tem como objecto de protecção a tutela do controle dos fluxos migratórios , mas também a defesa dos direitos próprios e característicos fundamentais do trabalhador em geral extensivos ao estrangeiro, da sua própria dignidade enquanto pessoas trabalhadoras.

O controle dos fluxos migratórios tem, ainda , a vantagem de evitar os excessos da concorrência laboral , potenciadores de uma pluralidade de inconvenientes , como o desemprego , redução de salários entre os imigrantes , diminuição da produtividade , inibição no processo de desenvolvimento tecnológico , concorrência desleal nomeadamente pela redução dos custos de mão de obra , dos salários dos trabalhadores locais , com o consequente aumento dos custos sociais , neste sentido , cfr. A. Morais Pinto , in Comentário às Leis Penais Extravagantes , compiladas por Paulo Pinto de Albuquerque e José Branco , I , ed da UCP , ao art.º 185 , da Lei n.º 23/2007 , de 4/7,  a págs. 119.

As normas de punição visam , ainda , obstar à sua exploração , põ-los a salvo de exploradores sem escrúpulo que se aproveitem da sua inferioridade, por pobreza , e(ou ) irregularidade , para enriquecerem à sua custa , garantindo a sua igualdade com os nacionais ou estrangeiros em condições legais , segundo Samuel Fernandez e Elena Garcia Moreno, in Revista General de Legislación y jurisprudência , 2004 , 4 –Octobre –Diciembre , pág. 686.

O arguido AA , neste âmbito , deu instruções a terceiros residentes no estrangeiro , mas muito especialmente no Brasil a uma tal III e outra de nome JJJ  , a um  indivíduo conhecido por HHH , de seu verdadeiro nome WFN , no sentido de recrutar para si mulheres para trabalharem nos seus estabelecimentos , exigindo  “ qualidade “  , evidente beleza , dotes físicos e aptidões para a dança , sob promessa de serem bem remuneradas e de as percentagens a receber serem superiores à comissão a pagar-lhes , como igualmente e para o mesmo fim deu instruções , pelo menos,  a um indivíduo de nacionalidade russa conhecido por «Aleksandr», dispondo também no Leste da Europa, de outro conhecido por “ Josef “.

Para a selecção das mulheres a entrar em Portugal eram, por vezes, enviadas fotografias das mesmas,  tiradas, pelos apontados indivíduos, enviadas para os “escritórios centrais “ , da Rua ... , em Lisboa.

O processo de escolha era realizado pelo arguido AA, com a opinião, por vezes, da arguida EE, seu braço direito , que, uma vez efectuada a selecção, a comunicava para aprovação àquele arguido , a quem incumbia sempre a última palavra.

O HHH , actuando de conformidade com tais instruções prévias e específicas e concordância do arguido , introduziu em Portugal , 13 mulheres brasileiras –cfr. fls 24468-e tentou , ainda , uma outra , de nome S... da S... , mas sem êxito , por impedimento das autoridades fronteiriças , ou seja conseguiu para a organização do arguido aquelas mulheres , o que significa , na semântica , angariar , enquanto que aliciar tem o alcance de provocar , seduzir , atrair a si.

O arguido AA teve o domínio do facto , instrumentalizando terceira pessoa a diligenciar pela introdução em Portugal de mulheres para trabalharem em condições por si queridas e pensadas e que sabia serem ilegais por falta de visto de permanência , trabalho ou residência concedido pelas nossas autoridades . ; a decisão de assim proceder desses terceiros é o resultado final do desígnio concorde do AAe do entrelaçamento de múltiplas vontades, com proeminência da própria.

Comprova-se , ainda , que o arguido AA, pelo menos , introduziu em Portugal , 175 mulheres, (ponto de facto n.º 1694 ) -acrescendo ainda algumas dezenas mais , visto o referido nos demais antecedentes pontos de facto provados , todas igualmente para desempenharem, como desempenharam, actividades laborais, sob a direcção dos representantes das sociedades arguidas , sociedades essas que procederam ao pagamento das viagens de vinda e de retorno ao país de onde eram nacionais àquelas 175. 

Essas mulheres que praticaram os actos referidos no ponto de facto provado 6b) eram na esmagadora maioria de nacionalidade brasileira, mas também em número muito insignificante , (uma ) de nacionalidade canadiana e as restantes  senegalesa , mexicana , venezuelana , romena , húngara , letã , checa , cabo verdeana e etíope e que o arguido fez entrar em condições ilegais e trabalhar daquela forma , neste país , nas sociedades de que era sócio ou gerente , ou ainda em sociedades alheias , para onde , com os mesmos fins as disponibilizava ,  e sempre  lucrativamente, não possuíndo autorização das nossas autoridades para o efeito ou seja sem deterem visto de trabalho e residência a que se faz exigência no art.º 27.º d) e f) , do citado Dec-Lei n.º 34/2003 , de 25/2 , sabendo que permaneciam em condições de reiterado afrontamento à lei. 

Dogmaticamente o crime não é de mão própria , que é aquele que só pode ser imputado a quem realiza corporal e directamente a acção proibida , excluindo a co autoria ou a autoria mediata , aquele que só pode ser praticado por quem reúna qualidades especiais ,incomunicáveis a terceiros, “ não impedindo,  como a Relação afirmou a fls . 24470 , que possa ser cometido por terceiro, “por nela ter participado como instigador ou cúmplice".

O preceito do art.º 134.º -A, do Dec.º-Lei n.º 34/2003 , de 25/2 , pune o auxílio à imigração ilegal , com prisão até 3 anos , quem favorecer ou facilitar , por qualquer forma , a entrada ou o trânsito ilegais de cidadão estrangeiro em território nacional , funcionando como agravante o intuito de lucro ,  fundante –n.º 2 –de uma pena de prisão de 1 a 4 anos.

Basta o favorecimento, o possibilitar , dar ajuda , apoio ou protecção , à entrada no nosso país , a oferta de condições de permanência , sejam elas quais forem , desde o remover de dificuldades ou cooperar nesse sentido , para que o tipo de ilícito se consume ; não sendo elemento constitutivo do crime a intenção lucrativa , mas , apenas , e diferentemente , do que sucede com o crime de angariação de mão de obra ilegal , uma agravante da responsabilidade criminal.

O critério de distinção entre a unidade e pluralidade de infracções radica, repousa , teoriza o Prof. Eduardo Correia , in Unidade e Pluralidade de Infracções –Caso Julgado , pág. 91, na possibilidade de subsunção de uma relação da vida a um ou vários tipos legais de crime , enquanto portadores, interposto de valoração jurídico criminal.

Sempre que entre os preceitos aparentemente aplicáveis à mesma conduta existam relações de subordinação tais que tornam impossível a sua aplicação à mesma conduta , sendo a acumulação meramente aparente , em que a eficácia de um mesmo preceito exclui a eficácia normal de outros e não seja caso de concurso ideal ou formal , mas de um simples caso de concurso legal , de leis , aparente ou impuro , costumando a colisão remover-se pelo recurso às regras da consumpção  , alternatividade , subsidariedade e especialidade.

Entre os dois crimes em referência, nos termos legais, considerou , com acerto , a Relação uma situação de concurso real , por serem dois e distintos os bens jurídicos a tutelar , apelando ao critério normativo previsto no art.º 30.º n.º 1 , do CP , por serem diferentes as mulheres angariadas e auxiliadas e além disso poder existir angariação sem auxílio subsequente , e auxílio à permanência sem angariação prévia –págs. 24474, reconduzindo-se a dois o número de tipos efectivamente infringidos.

O Estado Português não havia concedido permissão para o exercício de qualquer trabalho, nomeadamente, por conta daquelas sociedades , sequer foram apresentados, junto das entidades competentes para se pronunciarem sobre a concessão, nomeadamente, de vistos de trabalho, contratos de trabalho ou promessas de contrato de trabalho em que as referidas  sociedades e as indicadas mulheres fossem intervenientes.

O arguido AA sabia que ao custear  as viagens daquelas mulheres, fornecer-lhes alojamento, transporte , alimentação e colocação nos estabelecimentos que geria e (ou) nos que lhes indicava  tudo para a realização dos actos referidos em 6.b, estava a facilitar-lhes, num País diferente do seu, as condições necessárias para esta realização, e, simultaneamente, a tornar –lhes menos dificultosa a sua entrada e posterior permanência em descontrole do Estado Português.

As mulheres ficavam na inteira dependência do arguido , que começava por predefinir as que tinha interesse para os seu negócio , cujo objecto era a prática lucrativa de alguns inquestionáveis actos sexuais de relevo, significativos , porque respeitam ao sexo , à excitação genésica , da líbido  de terceiros , com conotação sexual , que podendo , aparentemente , não atentar contra a sua livre autodeterminação sexual , sendo ele que as alimentava , alojava , deslocava , remunerava e fazia retornar  ao seu país de origem , atento o seu muito superior poder económico , delas podendo dispor , estando , como estavam, em terra alheia e em situação económica difícil , naturalmente desprotegidas.

Na Convenção de Palermo a que Portugal aderiu , ratificando-a em 15.12 .2000, faz-se apelo à condenação firme do recrutamento , transferências , alojamento , acolhimento de pessoas mediante recurso à coacção , ameaça , rapto , fraude , engano , aceitação de pessoas , mediante benefícios , em vista da obtenção da autoridade sobre outra para fins de exploração.

O conselho de Tampere fez apelo à necessidade de regular os fluxos migratários , a deslocação , sem mais , de seres humanos , sendo o consentimento irrelevante , mesmo sendo maior a vítima , por se achar numa posição de vulnerabilidade , com mais dificuldade em afirmar a sua autonomia –Decisão-Quadro do Conselho , de 2002 , 629 JAP.

Não admira que os imigrantes sejam reputados os novos escravos do séc. XXI , e que convenções internacionais se lhes refiram a reclamar protecção e um tratamento justo , não menos favorável àquele que é concedido aos nacionais do Estado de emprego , referimo-nos , por ex.º , à Convenção n.º 143, da OIT , relativa às Migrações em Condições Abusivas e à Promoção da Igualdade de Oportunidades e de Tratamento dos Trabalhadores Migrantes , ratificada pela Lei n.º 52/78 , de 25/7.

As mulheres introduzidas no nosso país , em regra, eram oriundas de  meios sociais e económicos baixos, por isso lhes pagava as suas deslocações por via aérea , de outras despesas essenciais à sua deslocação para Portugal, tudo a ser, posteriormente, liquidado com pagamentos pontuais da parte destas com a prestação das referidas actividades e o desconto de uma percentagem no que recebessem como remuneração , pagamentos garantidos, em alguns casos, restritos , é certo , pela apreensão dos passaportes.

O arguido , ao instruir , ao convencer , terceiros a conseguirem o recrutamento de mulheres para praticarem os actos aludidos em 6 b) , dos factos provados nas sociedades de que era dono –e outras , caso da CCC , Glamour e Show Girls- sem autorização das competentes autoridades nacionais , sob promessa de benefícios económicos e com intenção lucrativa, fornecendo-lhes , adquiridos pelas sociedades que integrava , os bilhetes de passagem aérea, indicando-lhes  cautelas que deveriam observar à chegada a território nacional para não levantarem suspeitas às autoridades de controle de estrangeiros , aconselhando-lhes o estabelecimento dos itinerários mais adequados para a entrada e por forma  a que a mesma se efectuasse por outros países do espaço «Shengen»  onde o controle é menos apertado ao trânsito de pessoas , sobretudo, Espanha, França, Alemanha e Holanda, a não revelarem com quem viajaram, para além do acolhimento posteriormente dispensado , incentivando, ainda ,  a que as renovações, não passassem, em regra, os 90 dias permitidos de permanência na situação de turistas e fosse, assim, reforçada a ideia enganosa , nomeadamente, perante as autoridades, de que elas se deslocavam a Portugal nessa situação , fornecendo-lhes , por vezes, uma «carta para visita», procurando, assim, dar credibilidade às  afirmações que produzissem sobre a sua deslocação turística , obviar, para evitarem igualmente quaisquer suspeitas sobre a finalidade das deslocações, ocupando a cúpula da organização , incorreu na prática dos crimes de angariação de mão de obra ilegal e de auxílio à imigração ilegal , sendo este último agravado , porém ambos em forma continuada.

A partir do preciso momento em que  se induza  outrém , com propósito lucrativo , a penetrar no mercado de trabalho, estrangeiro não habilitado com autorização de residência , de permanência ou visto de trabalho ; a partir do momento em que se torne mais fácil , se removam dificuldades , qualquer que seja a respectiva modalidade , com vista à entrada ou ao trânsito ilegal de cidadãos estrangeiros em território nacional há uma irrebatível presunção de prejuízo -cfr. O Perigo em Direito Penal de José Francisco Faria e Costa , pág. 620 e segs . –pelo risco de criação de condições desfavoráveis de trabalho e à permanência ao estrangeiro , para a pessoa do aliciado ou  daquele a quem se propicie a entrada ilegal , por isso que os dois delitos são crimes  de perigo abstracto.

O preceito do art.º 134.º -A , n.º 2 , do Dec.º-Lei 34/2003 , de 25/2 , aproxima-se da definição de  redes de imigração clandestina , à luz da Convenção Europol, que são as acções destinadas a facilitar deliberadamente , com fins lucrativos , a entrada , a estada ou o emprego ,no território dos Estados –Membros da União Europeia , contrariamente aos regulamentos respectivos , distinguindo-se o  crime de imigração de imigração clandestina do de tráfico de pessoas porque neste o agente se propõe submeter a pessoa ao poder real e ilegal de outrem mediante recurso à violência ou a ameaças , abuso de autoridade , ou o uso de subterfúgios mormente como o objectivo de as  dedicar à prostituição , a outras formas de exploração e a violências sexuais em relação a menores ou ao comércio ligado ao abandono de crianças ( Cfr. ainda , Comentário às Leis Penais Extravagantes , I , pág. 69 ).

Trata-se o crime de imigração ilegal de crime contra a soberania e a segurança do Estado , bens jurídicos de titularidade colectiva , assim o entende Paulo Sousa , Rev. CEJ ., 1.º semestre 2008 , n.º 8 , já que , de acordo com esta concepção utilitarista ou funcional a entrada livre de cidadãos estrangeiros sem meios económicos para além de perturbar a capacidade de trabalho é sempre possível de levar à perda da identidade cultural da sociedade , fonte de graves problemas sociais , como a delinquência e marginalidade , face aos naturais limites assistenciais e financeiros do Estado. 

Segundo outros , visa-se disciplinar a entrada dos fluxos migratórios face aos compromissos internacionais a que o país se vinculou , mas também obstar à  fragilidade e a precariedade a que se acham sujeitos os imigrantes , procurando-se evitar que sejam tratados como mero objecto , em ofensa à sua dignidade moral , no dizer deste STJ , no seu Ac.de 3/12/2009 , P.º n.º 187/09.7YREVR.S1.

Numa outra posição se situam os autores espanhóis  entre eles Fernando Navaro Cardoso , in Observaciones , pág. 41 e segs ., que encaram  a emigração ilegal apenas do ponto de vista do cidadão , da pessoa humana , afirmando que a protecção reside , apenas , no direito à integração social  dos estrangeiros ( cfr, ainda , Comentário das Leis Penais Extravagantes , citadas , I e aí a eslarecedora e extensa anotação  de A. Morais Pinto ,  pág. 74.

Por fim outros autores defendem que o bem jurídico é protecção da dignidade humana , dada a vulnerabilidade em que se acham , merecedora  de protecção especial. A imigração ilegal “ atinge indiscutivelmente a sua dignidade como seres humanos , na medida em que os coisificam com as suas condutas , os reduzem a meros objectos ou coisas susceptíveis de proporcionarem , apenas , proventos económicos”(…) –cfr.op.loc. pág. 76. 

É numa concepção mista que protegendo o direito do Estado a não ver perturbada a capacidade de oferta de trabalho, por ser sempre possível de levar à perda da identidade cultural da sociedade , fonte de graves problemas sociais , como a delinquência e marginalidade , face aos naturais limites assistenciais e financeiros do Estado ,mas que  ressalve, tutelando o concomitante direito do imigrante a ser tratado como ser humano , com a sua carga de dignidade , que deve ser focalizado o duplo bem jurídico a proteger. 

E é este objectivo que , sem se reduzir apenas à visão pragmática da tutela da soberania e segurança do Estado e dos fluxos migratórios , indo mais longe,  que o legislador intenta conseguir com a publicação daquele Decreto-Lei n.º 34/2003 , de 25/2 , fazendo salientar a necessidade de criar  “ mecanismos legais de gestão de fluxos migratórios de forma realista através de um controle rigoroso de entrada e permanência de cidadãos estrangeiros nos países de acolhimento , estabelecendo , ao mesmo tempo , condições para aqueles que o  façam nos termos da lei possam esperar uma integração real e humanista". 

E continua o legislador a salientar que sendo Portugal um país de emigração enquanto signatário da CEDH , “ deve assumir políticas de carácter humanista ao nível do acolhimento e da integração dos imigrantes residentes no nosso país “ , em conformidade com as “ possibilidades reais do país , integração efectiva dos seus imigrantes e combate firme à imigração ilegal “ , em nome do respeito pela dignidade humana , que produz o inestimável efeito de afastar o homem do fascínio da violência , da subjugação e da desigualdade de direitos; enquanto proposição incontestável , de alcance apriorístico ,no dizer de Mário Reis Marques , in BFDUC , Ano 2010 , Vol.IV , pág. 565 , e conduz a um “ objecto irreal , inestimável que reside num ente real ( homem ). 

O arguido foi condenado penalmente por si e como representante das sociedades  a que pertencia , a par com estas.

O arguido à data dos factos  dispunha de treze estabelecimentos comerciais, três dos quais de restauração, e uma gráfica, que prestava sobretudo apoio logístico aos restantes estabelecimentos. 

Actualmente, AA mantém-se proprietário da gráfica e de três estabelecimentos de diversão nocturna ("Passerelle I e II e "Photus") situados na zona de Lisboa, sendo sócio de outros. 

A responsabilidade penal das pessoas colectivas está hoje prevista no art.º 11 .º , do CP , mas no que respeita aos delitos fiscais o direito penal tributário socorre-se de normas especiais , decorre desde logo do art.º 6.º , n.º 1 , do RGIT , quanto àqueles que actuam em nome , representação de “ pessoa colectiva , sociedade , ainda que irregularmente constituída ou de mera associação de facto , ou ainda em representação legal ou voluntária de outrém ( ..) , mesmo que -n.º 2-,  “ seja ineficaz o acto jurídico fonte dos respectivos poderes “ , com o que se alcança , pela latitude do preceito “ uma infiltração  do direito penal em áreas extremamente sensíveis e cuja criminalidade cai normalmente em zonas de “cifras negras “ no comentário ao preceito pelos Cons.ºs  Lopes de Sousa e Simas Santos, RGIT , 2010 , pág. 73. 

Saliente-se , a propósito dessa especialidade normativa , ditada pelos especiais interesses a acautelar , que , nos termos do art.º 14.º , do RGIT , a suspensão da execução da pena está condicionada sempre ao pagamento das prestações em débito e acréscimos legais , em prazo a fixar até 5 anos seguintes à condenação e , caso o juiz o entenda , ao pagamento de quantia até ao limite estabelecido para a pena de multa , preceito especial que , atenta a sua “ ratio “de máxima obtenção de receitas , não pode impedir  que a regra de que a duração da suspensão no direito penal comum coincida com a da prisão aplicada seja inaplicável enquanto lei geral ao direito penal especial tributário, isto sem embargo de se suscitarem problemas de conformidade constitucional particularmente quando a condição de pagamento seja limitada ao pagamento do imposto e acréscimos legais , de cumprimento difícil ou quase impossível , pela sua exorbitância pecuniária , obstáculo a que o TC tem respondido pela positiva , como também se alcança dos Acs . deste STJ , desta 3.ª Sec. , P.ºs n.ºs de 4632/07-3.ª , de 9.1.2008 e 31.5.2006 , acessível in www.dgsi.pt/jstj. 

Por força do art.º  7.º , do RGIT , e seu n.º 3 , não se exclui “ a responsabilidade individual dos respectivos agentes “ que é assim , uma responsabilidade cumulativa integral , porém diferenciada , quanto às sanções , sem se confundir com a comparticipação criminosa , o que significa , na concepção adoptada no direito português , que a pessoa colectiva só é responsável por crimes fiscais quando um titular de um seu órgão ou um seu representante o seja também , independentemente de as sanções a aplicar a uma e outro serem diferenciadas pela natureza das coisas –cfr. Responsabilidade fiscal de Isabel Marques da Silva , pág. 52 , ed . da UCP , 2000. 

As pessoas colectivas são um produto  da actividade humana , uma criação jurídica ,  “ um real construido “ , vivendo de uma  “ interna alteridade “  na expressiva linguagem de José de Faria Costa , in Responsabilidade Jurídico Penal da Empresa e dos seus Órgãos , RPCC , Ano 2 , n.º 4 , 1992 , pág. 555, citado por Isabel Marques da Silva , op cit ., pág. 126 , notas 307 e 308,  e podem ser objecto de censura ético-penal , mas não por facto de outrem , mas por virtude de uma verdadeira responsabilidade autónoma e distinta da responsabilidade dos seres singulares que a compõem. 

A categoria da culpa é , pois , aplicada por analogia às pessoas colectivas e entidades equiparadas , não excluindo aquela a responsabilidade individual dos seus agentes. 

E a este respeito o art.º 8.º n.º 1 a) e b ) , do CP , responsabiliza as pessoas colectivas sempre que os crimes sejam cometidos em nome e no interesse colectivo por pessoas que nelas ocupem posições de liderança ou por quem aja em nome delas por violação de deveres de vigilância ou controlo que lhes incumbam. 

No plano doutrinário essa responsabilidade do dirigente da pessoa colectiva tem sido objecto de larga controvérsia , havendo quem a situe no âmbito da autoria mediata , por domínio da organização , daquilo que ficou conhecido por serem “ aparelhos organizados de poder “  , expressão que tem origem em Roxin ; o representante, o autor  está no “ centro do acontecimento “  , que toma sobre as suas mãos. 

Roxin abandonou esse modo de ver o problema , atenta a contestação de que a a empresa moderna se reconduza àquela figura hierarquizada, antes descentrada , numa organização por áreas ou departamentos, para fundar a responsabilidade numa posição de garante , enquanto outros autores descortinam uma relação de co-autoria entre o representante e a empresa ou outra modalidade de relação em que o homem de trás detém ainda o domínio do facto influenciando a decisão do homem da frente ( Assim Figueiredo Dias , Direito Penal , 773 , nota 13 ). 

A titularidade do domínio social do facto justifica a qualificação de “ intraneus “ do homem de trás, como autor mediato , responsável pela actuação de um instrumento ainda que doloso, não qualificado , relativamente ao homem da frente. 

A esta concepção sobrepõe-se a de Tiedmann , menos seguida , ao considerar a empresa como fonte de perigos tanto objectivos como subjectivos , cabendo ao titular do poder assegurar que não ocorram , havendo como que um espaço de responsabilidade entre o quadro de competências atribuído ao dirigente e o domínio do controle dos riscos, susceptível de fazer repousar a responsabilidade penal do agente ; há como que uma relação proximal e de influência e de presença  no exercício de funções , da pessoa colectiva  , mercê de fundamentos materiais e pessoais que concorrem no agente , de onde se dever fazer derivar aquela sua responsabilidade , neste sentido Suzana Aires de Sousa , in A Responsabilidade Criminal do Dirigente , BFDUC , Ano 2009, 1011 a 1013 , 1015 , 1017 , 1024 , 1028 , 1029 e 1037. 

Como do antecedente se disse só a pena unitária será objecto de reponderação  e esta é uma resultante da avaliação global dos factos e da personalidade do agente –art.º 77.º n.ºs 1 e 2 , do CP.

Este STJ , ao conhecer , apenas de direito , e sujeito à limitação imposta pela decisão da reclamação , deixa intacta a matéria de facto que é fixada pelas instâncias , atinente às penas parcelares e também  não coloca em crise a responsabilidade civil assinalada ao arguido , responsabilidade essa solidária, por força das regras que regem a responsabilidade civil extracontratual , por facto o não pagamento de impostos , ao abrigo dos art.ºs 483.º e  497.º , do CC.

A personalidade do agente , elemento a que as teorias criminalistas dão crescente relevo na explicação criminológica , pode definir-se como correlato do comportamento singular de cada um , relativamente duradouro e estável , enquanto particularidade pessoal do agente , segundo Mezger , citado in Estudos de Homenagem ao Professor Figueiredo Dias , BFDUC , 2009 , I , págs. 76 e 77 , nota 174 , da autoria de Susana Aires de Sousa , sendo o facto ilícito expressão inadequada da personalidade do autor do crime , que só no decurso da vida se torna no que é , segundo Exner , op. cit ., pág. 77.

A personalidade do arguido está caracterizada no relatório social descrito sob o ponto de facto n.º 2154 , mas não pode quedar-se por esse descritivo pessoal , pois ela ressalta complementada por um rol extenso de factos provados e documentados, que permitiram ao douto acórdão recorrido apreendê-la ,configurá-la e sintetizá-la.

É à evidência o que resulta da definição pessoal final ,  a fls . 839 ( págs . 22.649) do arguido , como “co-cabecilha “ , o cérebro , de uma organização , verdadeiramente estruturada , com distribuição de funções entre os cooperadores directos do arguido , que lhe obedecem, temporalmente perdurantes, que cometeu graves crimes e para esse objectivo teve existência , muito embora as instâncias hajam excluído a configuração de uma associação criminosa, que se basta , esse  sendo o entendimento deste STJ , seguindo uma concepção muito menos “refinada “, próxima da realidade, pois que a exigência daquela outra torna o preceito incriminatório quase letra morta , antes bastando, apenas , e só , uma associação de pessoas , no mínimo três ( art.º 299.º n.ºs 1 e 5 , do CP) , com alguma estabilidade , organização perdurante no tempo , que se propõe “ ab ovo “ praticar crimes , assim definida e consagrada, também, nos crimes tributários no art.º 89.º , do RGIT.

O arguido , di-lo o relatório social, é audaz e empreendedor , mas vivendo , essencialmente , do e para os negócios de diversão nocturna, que lhe  asseguraram lucros muito elevados , como era seu inabdicável desígnio , praticados nos seus estabelecimentos e naqueles em que é sócio e  , até , de terceiros, para onde , sempre com esse fim,  encaminhava as bailarinas. 

Era ele quem pontificava na organização e todo o esquema de funcionamento ,  em condições ilegais, estando as mulheres  necessariamente  fragilizadas,  pensado ao pormenor para que nada falhasse , tudo rodando  em seu torno, supervisão e hierarquia. 

Deste modo a sua condução de vida é norteada, em vista de vantagem económica , que a sociedade não credencia e a quem causa reprovação e censura , pelo significado de  grave inferioridade  da mulher, que se submete à prática reiterada  de tais actos para melhoria da sua condição económica e familiar –algumas sobretudo as brasileiras sem capacidade económicas , desempregadas, sem dinheiro no seu país, condição de sua família –ponto de facto n.º 875 -deixando o seu país natal, prática essa num clima draconiano , em que o custo das passagens desses países para Portugal e vice-versa , era descontado pelo arguido a partir dos ganhos,  as faltas ao trabalho penalizadas , em que de cada acto o arguido recebia uma percentagem , o mesmo sucedendo com as bebidas oferecidas pelos clientes às bailarinas , deslocadas de estabelecimento de 45 em 45 dias , como regra, confiadas , por vezes , a estabelecimentos à margem do “ Grupo AA“ ou seja , inevitável e indubitavelmente, até pela reiteração,  num ambiente de visível constrangimento , levando , até , agravando-o por algumas vezes (5) à retenção dos passaportes. 

Os imigrantes , como as crianças , as mulheres , os idosos , os doentes mentais, são pessoas vulneráveis, em situação de merecerem protecção à escala mundial , objectivada em Convenções e Acordos internacionais , porque a dignidade da pessoa humana se tornou num direito “ transepocal “ , sendo a pessoa humana elevada a fundamento da sociedade , do Estado e do direito, contendem com a dignidade e o valor da pessoa humana , princípio estrutural da nossa República , consagrado no art.º 1.º, da CRP , e repetidamente afirmado pelo TC ( cfr. A dignidade humana como prius axiomático , de Mário Reis Marques , BFDUC , , 2010 , Vol. Iv , pág. , 548 , nota 29 e 560).

Por seu turno o  arguido eximiu-se ao pagamento ao Estado , ao longo de anos , de um valor muito elevado de impostos , no total de € 1.541.891 , 30 a título de IRS , bem como dos devidos pelos rendimentos auferidos a título de IVA e IRC pelas sociedades em nome das quais agiu.

O conjunto dos factos dá-nos–nos uma imagem global negativa  do arguido , pelo tempo em que perdurou o seu auxílio à emigração clandestina e angariação de bailarinas  mantendo uma vontade criminosa ( dolo )  firme e perdurante no tempo ,um grau de ilicitude elevado , ou seja de desvalor da acção e resultado , tendo em vista o móbil, os  lucros proporcionados pela actuação das mulheres ali deslocadas, o elevado volume de impostos sonegados ao pagamento devido ao Estado e forma ardilosa de o conseguir, os sentimentos revelados, enraízam um uma certa propensão para os crimes preditos , que não é descaracterizada pelo facto de deter um espírito laborioso e audaz e se mostrar inserido socialmente, exercendo uma profissão, a que o facto de não ter antecedentes criminais sem significar comportamento pretérito sem mácula, não obstou ...".

Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 13-11-2013, no Processo 33/05.0JBLSB.C1.S2



1 – A falta de consciência da ilicitude só se verificará se o erro não for imputável ao agente, o que se verificará apenas quando o engano ou erro da consciência ética, que se exprime no facto, não se fundamente em qualidade desvaliosa e juridicamente censurável da personalidade do agente.

2 - O erro sobre a proibição não exime, em princípio, da responsabilidade criminal. Esse erro será censurável e, portanto, irrelevante, quando a conduta, só por si, não for axiologicamente neutra, isto é, inculcar, a uma sã consciência, a violação de deveres morais, sociais ou culturais.

Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 15-02-2005 - Processo n.º 1887/03-01

 

Origem do texto


Direito nacional

Na última redacção do anterior diploma a matéria era regulada no artigo 136.º-A

A norma tem origem nesse artigo 136.º-A, introduzido no Decreto-Lei 244/98, de 8 de Agosto, por via do Decreto-Lei 4/2001, de 10 de Janeiro, referindo-se, então, ao enriquecimento ilegítimo como elemento da ilicitude e não à intenção lucrativa, alteração efectuada na última redacção , cujo texto a actual norma reproduz na íntegra.


Procedimento legislativo


Proposta de Lei 93/X do Governo (2006)          

Artigo 185.º - Angariação de mão-de-obra ilegal

1 - Quem, com intenção lucrativa, para si ou para terceiro, aliciar ou angariar com o objectivo de introduzir no mercado de trabalho cidadãos estrangeiros não habilitados com autorização de residência que habilite o exercício de uma actividade profissional é punido com pena de prisão de um a quatro anos.

2 - Quem, de forma reiterada, praticar os actos previstos no número anterior é punido com pena de prisão de dois a cinco anos.

3 - A tentativa é punível.

Discussão e votação indiciária: artigo 185.º da proposta de lei n.º 93/X — aprovado por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes.




Proposta de Lei 50/XII do Governo (Lei n.º 29/2012)       

Artigo 185.º – Angariação de mão de obra ilegal

1 - Quem, com intenção lucrativa, para si ou para terceiro, aliciar ou angariar com o objetivo de introduzir no mercado de trabalho cidadãos estrangeiros não habilitados com autorização de residência ou visto que habilite o exercício de uma atividade profissional é punido com pena de prisão de 1 a 6 anos.

2 - Quem, de forma reiterada, praticar os atos previstos no número anterior, é punido com pena de prisão de 2 a 8 anos.

3 - A tentativa é punível.

Discussão e votação na especialidade: artigo 185.º da Lei n.º 23/2007 – Proposta de alteração aos n.ºs 1 e 2, apresentada pelo PS, na versão de substituição, aprovada por unanimidade; Proposta de alteração Artigo 185.º (…) 1. Quem, com intenção lucrativa, para si ou para terceiro, aliciar ou angariar com o objetivo de introduzir no mercado de trabalho cidadãos estrangeiros não habilitados com autorização de residência ou visto que habilite o exercício de uma atividade profissional é punido com pena de prisão de 1 a 4 anos. 2. Quem, de forma reiterada, praticar os atos previstos no número anterior, é punido com pena de prisão de 2 a 5 anos. 3. (…). Texto da PPL 50/XII – prejudicado pela votação anterior. Redação original da Lei n.º 23/2007:      

Artigo 185.º - Angariação de mão-de-obra ilegal

1 - Quem, com intenção lucrativa, para si ou para terceiro, aliciar ou angariar com o objectivo de introduzir no mercado de trabalho cidadãos estrangeiros não habilitados com autorização de residência ou visto que habilite o exercício de uma actividade profissional é punido com pena de prisão de 1 a 4 anos.

2 - Quem, de forma reiterada, praticar os actos previstos no número anterior é punido com pena de prisão de 2 a 5 anos.

3 - A tentativa é punível.