Artigo 185.º A – Utilização da atividade de cidadão estrangeiro em situação ilegal

1 — Quem, de forma habitual, utilizar o trabalho de cidadãos estrangeiros que não sejam titulares de autorização de residência ou visto que habilite a que permaneçam legalmente em Portugal, é punido com pena de prisão até um ano ou com pena de multa até 240 dias.

2 — Quem, nos casos a que se refere o número anterior, utilizar, em simultâneo, a atividade de um número significativo de cidadãos estrangeiros em situação ilegal, é punido com pena de prisão até dois anos ou pena de multa até 480 dias.

3 — Quem utilizar o trabalho de cidadão estrangeiro, menor de idade, em situação ilegal, ainda que admitido a prestar trabalho nos termos do Código do Trabalho, é punido com pena de prisão até dois anos ou com pena de multa até 480 dias.

4 — Se as condutas referidas nos números anteriores forem acompanhadas de condições de trabalho particularmente abusivas ou degradantes, o agente é punido com pena de prisão de um a cinco anos, se pena mais grave não couber por força de outra disposição legal.

5 — O empregador ou utilizador do trabalho ou serviços de cidadão estrangeiro em situação ilegal, com o conhecimento de ser este vítima de infrações penais ligadas ao tráfico de pessoas, é punido com pena de prisão de dois a seis anos, se pena mais grave não couber por força de outra disposição legal.

6 — Em caso de reincidência, os limites das penas são elevados nos termos gerais.

7 — As penas aplicáveis às entidades referidas no n.º 1 do artigo 182.º são as de multa, cujos limites mínimo e máximo são elevados ao dobro, podendo ainda ser declarada a interdição do exercício da atividade pelo período de três meses a cinco anos.


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Comentários


Nota SEF: Preceito novo, aditado com as alterações introduzidas pela Lei n.º 29/2012, para transpor a Diretiva n.º 2009/52/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 18 de junho, que estabelece normas mínimas sobre sanções e medidas contra empregadores de nacionais de países terceiros em situação irregular

 

Nota SEF: A Lei n.º 13/2023, de 3 de abril (altera o Código do Trabalho e legislação conexa, no âmbito da agenda do trabalho digno), no seu artigo 19.º, aditou ao Decreto-Lei n.º 260/2009, de 25 de setembro (regime jurídico do exercício e licenciamento das agências privadas de colocação e das empresas de trabalho temporário), os artigos 28.º-B, 29.º-A e 29.º-B, com a seguinte redação:

«Artigo 28.º-B


Responsabilidade contraordenacional por intermediação laboral ilegal


Constitui contraordenação muito grave, imputável ao empregador e à agência privada de colocação, o recrutamento e colocação de trabalhadores por intermédio de agência que não tenha cumprido o disposto nos n.os 1, 2 ou 4 do artigo 16.º, punível com coima de 2800 (euro) a 6000 (euro) ou 12 000 (euro), consoante se trate de pessoa singular ou pessoa coletiva.


Artigo 29.º-A


Proibição do exercício de atividade em empresa de trabalho temporário ou agência privada de colocação


Pode ser condenado na proibição de exercício de atividade, no âmbito de empresa de trabalho temporário ou agência privada de colocação, incluindo de sócio, administrador ou trabalhador, por um período de entre 2 a 10 anos e atenta a concreta gravidade do facto e a sua conexão com a função exercida pelo agente, quem for punido:


a) Pelos crimes previstos no presente decreto-lei;


b) Pelos crimes previstos nos artigos 82.º, 83.º, 316.º, 407.º, 459.º, 543.º, 545.º e 547.º do Código do Trabalho;


c) Pelos crimes previstos nos artigos 159.º e 160.º do Código Penal;


d) Pelos crimes previstos nos artigos 183.º, 184.º, 185.º e 185.º-A da Lei n.º 23/2007, de 4 de julho.



Artigo 29.º-B


Responsabilidade penal


O regime sancionatório constante do presente decreto-lei não prejudica eventual responsabilidade em matéria penal, prevista nos termos da lei.»



Jurisprudência 


"...No caso sub judice, perante o imenso rol dos factos conhecidos (existência de dezenas de cidadãos nepaleses, com os quais o recorrente UP contatou, e os quais “contratou”, ao serviço e sob as ordens do arguido NB), olhando à natureza de alguns desses factos (condições de alojamento e de trabalho dos aludidos cidadãos nepaleses, remunerações por estes auferidas, partes dessas remunerações retidas - e objeto de apropriação - pelos arguidos NB e UP), ponderando os lucros e os proventos, de relativamente elevado valor, com o uso e a exploração dessa mão-de-obra, e atendendo aos estratagemas utilizados pelos arguidos NB e UP para convencerem os referidos cidadãos nepaleses a virem para Portugal, e com o devido respeito por diferente opinião, verificam-se todos os pressupostos acabados de expor relativos à validade e legitimidade do uso de presunções.

Este tribunal de recurso, como, aliás, qualquer cidadão de média formação e de são entendimento, subscreve, com total segurança, os factos dados por provados na decisão recorrida quanto à autoria dos factos por parte do arguido UP (agindo em coautoria com os demais arguidos) - ou seja, e no essencial, que os cidadãos nepaleses em causa foram vítimas de crime, por terem sido “enganados” (nas promessas feitas pelos arguidos, com o objetivo de os fazerem vir para Portugal), por terem sido objeto de “exploração” da respetiva força de trabalho, por essa “exploração” ter revertido em lucro ilícito para os arguidos, e por o arguido UP conhecer tudo isso, agindo ainda com o propósito de obter vantagens patrimoniais indevidas (advenientes da “exploração” laboral desses mesmos cidadãos nepaleses).

É linear, por resultar inequivocamente das regras da experiência, a conclusão acabada de retirar. O arguido UP, por si e/ou em conjugação com os demais arguidos, “explorou”, repetidamente e de diversos modos, a mão-de-obra dos cidadãos nepaleses em causa, auferindo lucros (relativamente avultados) dessa atividade delitiva, e sabendo, claramente, que toda essa sua atuação era feita de forma ilícita, proibida e criminalmente punível..."

"...A experiência comum também não nos diz que, se alguém contrata trabalhadores numa “empresa de trabalho”, siga princípios de boa-fé contratual e pense que os trabalhadores estão “legais”. Bem pelo contrário: atendendo à natureza e às características de muitas dessas “empresas de trabalho”, um cidadão de média formação duvida sempre, legitimamente, que os trabalhadores que tal “empresa” forneça tenham a sua situação “regularizada”."

I - Reunidos os pressupostos processualmente exigidos para a respetiva produção, as declarações para memória futura constituem um modo de produção de prova pessoal submetido a regras específicas, visando acautelar, bem vistas as coisas, o respeito pelos princípios estruturantes do processo penal, designadamente (e sobretudo) pelo princípio do contraditório, não se impondo a sua leitura em audiência de julgamento para que possam ser valoradas.

II – No crime de tráfico de pessoas, com diversidade de vítimas, está afastada a figura do crime continuado, por estarem em causa bens eminentemente pessoais.

Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 18-10-2018, no Processo 14/16.9ZCLSB.E1



AUXÍLIO À IMIGRAÇÃO ILEGAL; ELEMENTOS TÍPICOS

I - ...

II – O crime de auxílio à imigração ilegal define-se pelos seguintes requisitos objectivos e subjectivos: A acção material criminosa reside no “favorecimento” e na “facilitação” da entrada, da permanência ou do trânsito ilegais de cidadão estrangeiro em território nacional; Quanto ao modo de acção, não estando definido, qualquer um é idóneo; O objecto da acção é a “entrada”, o “trânsito” [n.º 1 do artigo 183.º da Lei 23/2007, de 04-07] e a “permanência” [n.º 2 do mesmo artigo] ilegais, consoante os casos, noções cuja verificação casuística há-de encontrar-se no disposto no artigo 181.º do referido diploma; O sujeito activo é qualquer pessoa, enquanto o sujeito passivo é um cidadão estrangeiro; O elemento subjectivo consiste na consciência de prestar ilicitamente ajuda a cidadão estrangeiro para entrar, permanecer ou transitar de forma ilegal no nosso país, não sendo essencial para a prática do crime a obtenção de um ganho ou benefício económico; exige, todavia, o n.º 2 do artigo 183.º a concorrência de uma intenção lucrativa, que funciona como elemento subjectivo agravante da moldura penal abstracta.

III – A necessidade da existência de contrato de trabalho e, bem assim, da inscrição na segurança social, para a concessão de autorização de residência - sem prejuízo da verificação dos requisitos gerais a que se reporta o artigo 88.º da Lei 23/2007 - não impede que com a sua celebração, muito menos que com o começo de execução da prestação de trabalho subordinado - numa ocasião em que o mesmo ainda não foi formalizado -, o crime de auxílio à imigração ilegal haja sido cometido."

Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 20-06-2018, no Processo 7/11.2ZRCBR.C1


Informação adicional


I DIRETIVA N.º 2009/52/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 18 de junho, que estabelece normas mínimas sobre sanções e medidas contra empregadores de nacionais de países terceiros em situação irregular P IMIGRAÇÃO ILEGAL E TRÁFICO DE SERES HUMANOS: INVESTIGAÇÃO, PROVA, ENQUADRAMENTO JURÍDICO E SANÇÕES – Coleção Ações de Formação, Centro de Estudos Judiciários V PROJETO DE LEI n.º 648/XII/4.ª (BE), COMBATE O TRABALHO FORÇADO E OUTRAS FORMAS DE EXPLORAÇÃO LABORAL - AUDIÇÃO PARLAMENTAR - Diretor Nacional do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras - Dr. Manuel Jarmela Palos e Diretor Nacional Adjunto - Dr. José van der Kellen, 15 de outubro de 2014 T LUTA CONTRA A ECONOMIA SUBTERRÂNEA E O TRABALHO NÃO DECLARADO – Parecer do Comité Económico e Social Europeu 2014/C 177/02, Eur-lex, a 11 de junho de 2014 V TRÁFICO DE PESSOAS - OS NOVOS ESCRAVOS - Documentário SIC, um trabalho de investigação que revela uma realidade difícil de imaginar, de 16 de dezembro de 2013 W SANÇÕES CONTRA O EMPREGO DE NACIONAIS DE PAÍSES TERCEIROS EM SITUAÇÃO IRREGULAR – Sínteses da Legislação da UE – Portal EUROPA, a 3 de dezembro de 2009 T ASPECTOS JURÍDICO-PENAIS E PROCESSUAIS DO REGIME JURÍDICO DE ENTRADA, PERMANÊNCIA, SAÍDA E AFASTAMENTO DE ESTRANGEIROS – Gabriel Catarino, JULGAR on line, 2009 W PREVENTING THE FACILITATION OF UNAUTHORIZED ENTRY AND RESIDENCE – Sínteses da Legislação da UE – Portal EUROPA, a 4 de janeiro de 2007


Origem do texto

 

Direito comunitário

A norma tem origem na transposição da Diretiva n.º 2009/52/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 18 de junho, que estabelece normas mínimas sobre sanções e medidas contra empregadores de nacionais de países terceiros em situação irregular.


Procedimento legislativo


Proposta de Lei 50/XII do Governo (Lei n.º 29/2012)      

Artigo aditado à Lei n.º 23/2007, de 4 de Julho, pela Proposta de Lei 50/XII do Governo. Discussão e votação na especialidade: artigo 185.º-A da Lei n.º 23/2007 – Proposta de aditamento, da PPL 50/XII – aprovado por unanimidade.