Carta 22

Aos ventos vão minhas ilusões;

os sonhos meus que guardei

por toda uma existência

para doar um dia a quem como

uma rosa, perfumasse minha alma.

Carta Filosófica Nº 22

E COMO é estúpido o distanciamento voluntário quanto a vontade, involuntariamente, é de se aproximar.

Parece-me que as razões em um ato de autoflagelação declararam guerra umas as outras e fizeram da paixão, inimiga comum e dos corações, reféns. Parece-me que nossa razão degenerou-se em desrazão, que a paixão se entregou sem lutar, que os corações se exilaram na casamata da solidão – como que à espera da morte do gostar - que me parece agonizar em espasmos súbitos na masmorra da rendição.

A paixão fez conosco um pacto de vida eterna e, em um momento de indecisão, decidiu suicidar.

De como é difícil continuar em passos sós e tentar apagar pegadas tão fortes deixadas em um caminho a caminhar, de como é difícil enxergar o velado pela dissimulação do gostar. É como estar de olhos vendados no justo momento da mais bela contemplação .

Ao fim desta imbecil cisão entre o coração e a razão, tudo poderá ser destruído. Demoliremos a morada dos sonhos, destruiremos a via dos desejos, quebraremos o espelho da lembrança, mataremos a ultima esperança e perderemo-nos no vale da ignorância.

E deixaremos ir ao ar tudo que um dia nos pareceu sólido... e dispersará de nossas mentes; nossa imagem, de nossas mãos; nosso tato, de nossos corpos; nosso cheiro, de nossas falas; nossa audição, de nossos beijos; nosso paladar, de nossos olhos; nossa visão.

Perderemos de nossa memória, nossa história e prenderemos na armadura feita a medida do coração; a candura do amor e da paixão.

E nos substituiremos por um retrato de despedida, ao lado de algumas palavras escondidas em um álbum para se guardar e nos esqueceremos em uma gaveta qualquer, até nos perdermo-nos como tudo mais que é sólido e se desmancha como fumaça no ar.

Novembro, de 2002

Westerley

“O sofrimento é a manifestação de nossas limitações, é o reflexo de nossa inépcia para lidar com as coisas mundanas. É o resultado manifesto de nossas idéias e pensamentos limitados, que se revelam inexeqüíveis, a posteriori, quando outrora, no momento de sua gênese; nos pareciam palpáveis e verossímeis, mas que se nos revelam distantes da verdade, à medida que nos aprofundamos neles. E o pior é que nem mesmo o não-pensar, nos dá, outrossim, nenhuma garantia de sua ausência.”³

Cleber Eustáquio Freitas

Filósofo comtemporâneo (Br)