Artigo 38.º – Decisão e notificação 

1 — A decisão de recusa de entrada é proferida após audição do cidadão estrangeiro, que vale, para todos os efeitos, como audiência do interessado, e é imediatamente comunicada à representação diplomática ou consular do seu país de origem.

2 — A decisão de recusa de entrada é notificada ao interessado, em língua que presumivelmente possa entender, com indicação dos seus fundamentos, dela devendo constar o direito de impugnação judicial e o respetivo prazo.

3 — É igualmente notificada a transportadora para os efeitos do disposto no artigo 41.º

4 — Sempre que não seja possível efetuar o reembarque do cidadão estrangeiro dentro de 48 horas após a decisão de recusa de entrada, do facto é dado conhecimento ao juiz do juízo de pequena instância criminal, na respetiva área de jurisdição, ou do tribunal de comarca, nas restantes áreas do País, a fim de ser determinada a manutenção daquele em centro de instalação temporária ou espaço equiparado.


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Comentários


1 — Nos termos do art. 13.º, n.º 2, do Regulamento (CE) n.º 562/2006, de 15 de Março de 2006 (Código de Fronteiras Schengen v. anotação 5 ao art. 6.º):  “A entrada só pode ser recusada por decisão fundamentada que indique as razões precisas da recusa. A decisão deve ser tomada por uma auto­ridade competente nos termos do direito nacional e produz efeitos imediatos”. E o segundo parágrafo do mesmo artigo acrescenta: “A decisão fundamentada indicando as razões precisas da recusa é notificada através do formulário uni­forme de recusa de entrada na fronteira reproduzido na parte B do anexo preenchido pela autoridade competente, nos termos do direito nacional, para recusar a entrada. O formulário uniforme preenchido é entregue ao nacional de país terceiro, que acusa a recepção da decisão de recusa de entrada atra­vés do referido formulário”.

Daqui resultam pois as seguintes regras em relação à recusa de entrada: Tem que ser fundamentada, com indicação precisa das razões da recusa; A decisão é tomada pela autoridade competente nos termos do direito nacional; Produz efeitos imediatos; A decisão com a respectiva fundamentação constará de um formulá­rio uniforme, preenchido pela autoridade competente para recusar a entrada; O formulário é entregue ao nacional de país terceiro, que acusa atra­vés do mesmo a recepção da decisão.

Observadas estas regras, em tudo o mais rege o direito nacional, tendo no caso aplicação o código do procedimento administrativo (CPA). A autoridade competente para a recusa de entrada é, nos termos do artigo anterior, o director-geral do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, com poder de delegação. Tal delegação será feita normalmente ao responsável pelo posto de fronteira ou quem legalmente o substitua.


2 — De acordo com o art. 36.º, n.º 1, aI. b), da Convenção de Viena sobre relações Consulares, aprovada pelo DL n.º 183/72, de 30 de Maio, “Se o interessado assim o solicitar, as autoridades competentes do Estado receptor deverão, sem tardar, informar o posto consular competente quando, na sua área de jurisdição, um nacional do Estado que envia for preso, encarcerado ou detido de qualquer outra maneira”.

Embora uma recusa de entrada não corresponda propriamente a uma deten­ção, a mesma incorpora uma limitação ao direito de livre circulação, situação que pode ser enquadrada no conceito “detido de qualquer outra maneira”. De todo o modo a Convenção só obriga a tal comunicação a pedido do interessado. Ainda assim, a lei impõe essa comunicação, a ser feita de imediato, à repre­sentação diplomática ou consular, assim reforçando os direitos da pessoa a quem a entrada é impedida.


3 — O processo de recusa de entrada deve ser concluído com a maior bre­vidade até porque, durante a sua instrução, ao passageiro não é facultada a entrada em território nacional. Isso não dispensa todavia a observância das regras básicas do procedimento administrativo, com destaque para a audição do cidadão estrangeiro, que deverá poder pronunciar-se sobre todas as questões rele­vantes para a decisão e nomeadamente sobre os factos que possam vir a fun­damentar a recusa de entrada (v. arts. 100.º a 103.º do CPA). Sobre esta ques­tão v. anotação 3 ao art. 148.º

As regras relativas à notificação da recusa de entrada seguem também o disposto no CPA sobre notificações.


4 — Dado que, nos termos do art. 41.º, a empresa transportadora deve pro­mover o retorno, no mais curto espaço de tempo possível, de quem veja a entrada recusada, assegurando ainda os encargos da sua estada enquanto tal retorno não se verificar, é também necessária a sua notificação, exclusivamente para tais efeitos.

Diz ainda o art. 7.º, n.º 1, do Decreto Regulamentar n.º 84/2007, de 5 de Novembro, que ao transportador compete, logo que notificado da decisão de recusa de entrada, “suportar todos os encargos inerentes à permanência do cidadão estrangeiro na respectiva zona internacional ou em unidade habita­cional situada no interior do território nacional até ao momento do seu reem­barque”.


5 Em regra o embarque para retorno do passageiro a quem seja recusada a entrada é feito em menos de 48 horas. Nem sempre tal é possível, seja por falta de documentação, por falta de transporte dentro desse período ou por qualquer outro motivo. Quando tal aconteça é necessária autorização do juiz para manter o passageiro confinado em centro de instalação temporária ou em qualquer outra zona equiparada, se o centro não existir.

O juiz competente é, consoante os casos, o juiz do tribunal de comarca ou do tribunal de pequena instância criminal. Quid juris se o juiz entender não confinar o cidadão estrangeiro a um centro de instalação ou local equiparado?

Uma tal opção só teria sentido no caso de o centro de instalação não ter condições apropriadas para a manutenção de pessoas em condições exigidas pela dignidade humana. É que, de facto, um centro de instalação temporária, junto de porto ou aeroporto e destinado a pessoas chegadas por essa via, é um espaço, com limitação da liberdade de circulação, que funciona como alternativa à zona internacional do porto ou aeroporto, estas sim, também com limites à liberdade de circulação e sem condições apropriadas para um passageiro espe­rar mais que algumas horas. Mas, caso o juiz não autorize a medida de colo­cação em centro de instalação temporária, não poderá em sua substituição per­mitir a entrada no território nacional. De facto, só a autoridade de fronteira é que tem competência para autorizar a entrada. No caso de recusa poderá haver impugnação judicial e eventual revogação da decisão, mas através do juiz com­petente, da jurisdição administrativa, conforme o disposto no art. 39.º    Pelo que, não autorizando o juiz a colocação em centro de instalação temporária, o estrangeiro permanecerá na zona internacional do porto ou aeroporto, sem pre­juízo de, perante uma tal situação, o director-geral do SEF poder rever a deci­são de recusa, designadamente no caso de tal se mostrar viável por razões de carácter humanitário.


Nota SEF: No âmbito do Decreto-Lei n.º 41/2023, de 2 de junho, que cria a Agência para a Integração, Migrações e Asilo, I. P.; e na senda da reestruturação do sistema português de controlo de fronteiras (reformulação do regime das forças e serviços que exercem a atividade de segurança interna e reafetação de competências e recursos do SEF), o artigo 13.º daquele diploma alterou, com efeitos a 29-10-2023, a Lei n.º 34/94, de 14 de setembro – relativa aos Centros de Instalação Temporária. Os artigos 2.º, 4.º e 5.º desta Lei n.º 34/94, de 14 de setembro passam a ter a seguinte redação:

 

«Artigo 2.º [...]

1 — [...]

2 — A instalação por razões humanitárias é determinada pelo conselho diretivo da Agência para a Integração, Migrações e Asilo, I. P. (AIMA, I. P.), na sequência de requerimento de estrangeiro que se encontre numa das situações previstas no número anterior e depois de ouvido o centro regional de segurança social da área sobre a existência da situação de carência económica e social.

 

Artigo 4.º [...]

1 — [...]

2 — No decurso do prazo referido no número anterior, a força de segurança competente informa o estrangeiro dos seus direitos e comunica ao tribunal competente, com envio de cópia do respetivo processo, a presença do estrangeiro na zona internacional, logo que seja previsível a impossibilidade do seu reembarque nesse prazo, a fim de ser proferida a decisão sobre a manutenção daquela situação ou a instalação em centro próprio.

3 — [...]

 

Artigo 5.º [...]

1 — (Anterior corpo do artigo.)

2 — Os centros de instalação temporária e espaços equiparados são geridos pela Guarda Nacional Republicana (GNR) ou pela Polícia de Segurança Pública (PSP), consoante a área de jurisdição em que se encontrem instalados.

3 — Os centros de instalação temporária e espaços equiparados exclusivamente destinados a instalação por razões humanitárias, reconhecidos por despacho dos membros do Governo responsáveis pelas áreas da administração interna e das migrações, são geridos pela GNR ou pela PSP, em articulação com a AIMA, I. P, e a segurança social.»


Regulamentação


I LEI N.º 34/94, de 14 de Setembro – Define o regime de acolhimento de estrangeiros ou apátridas em centros de instalação temporária – artigo 6.º revogado pela Lei n.º 23/2007, de 4 de Julho I RESOLUÇÃO DO CONSELHO DE MINISTROS N.º 76/97, de 14 de Maio – Estabelece orientações relativas à situação dos passageiros que aguardam o seu reenvio (dada a situação de imigração ilegal) e dos requerentes de asilo político, quanto à prestação de apoio jurídico, de apoio social e de segurança em território nacional I DECRETO-LEI N.º 85/2000, de 12 de Maio – Equipara os espaços criados nos aeroportos portugueses por força da Resolução de Conselho de Ministros n.º 76/97, de 17 de Abril, a centros de instalação temporária, para efeitos do disposto no n.º 4 do artigo 22.º do Decreto-Lei n.º 244/98 de 8 de Agosto, com a redacção da Lei n.º 97/99, de 26 de Julho, enquanto não for aprovada a legislação a que se refere o artigo 6.º da Lei n.º 34/94, de 14 de Setembro I DECRETO-LEI N.º 141/2004, de 11 de junho – Cria e regula os espaços equiparados aos centros de instalação temporária previstos no artigo 24.º da Lei Orgânica n.º 2/2004, de 12 de Maio, para a fase final do campeonato europeu de futebol Euro 2004 I DECRETO-LEI N.º 44/2006, de 24 de fevereiro – Equipara as instalações da Unidade Habitacional de Santo António, no Porto, a centro de instalação temporária de estrangeiros e apátridas, estabelecendo como aplicável o regime constante do Decreto-Lei n.º 85/2000, de 12 de Maio, e dos artigos 5.º a 8.º do Decreto-Lei n.º 141/2004, de 11 de Junho I DESPACHO N.º 5863/2015, de 2 de junho – Revogação do Regulamento das Condições Materiais de Detenção em Estabelecimentos Policiais e aprovação de novo regulamento I DESPACHO N.º 10728/2015, de 28 de setembro – Regulamenta os procedimentos de inspeção e fiscalização de centros de instalação temporária ou espaços equiparados, bem como a monitorização de regressos forçados I DESPACHO N.º 11838/2016, de 4 de Outubro Comunicação à IGAI e à IGSJ de expediente em conformidade com o exposto e ao abrigo dos poderes de coordenação e promoção da atividade de segurança interna e da eficácia da investigação criminal.


Origem do texto 


Direito comunitário

Incorpora a norma do n.º 2 do artigo 13.º do Regulamento (CE) n.º  562/2006, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de Março de 2006, que estabelece o código comunitário relativo ao regime de passagem de pessoas nas fronteiras (Código das Fronteiras Schengen). O n.º 2  dá cumprimento à norma do n.º 1, alínea a), do artigo 26.º da Convenção de Aplicação do Acordo de Schengen, de 14 de Junho de 1985.



Direito nacional                                    

Na última redacção do diploma anterior a matéria era regulada no artigo 22.º

A norma tem origem no disposto no artigo 22.º do Decreto-Lei 244/98, de 8 de Agosto, na sua primeira redacção. Reproduz, com alterações de relevo, aquele artigo 22.º, tendo introduzido ao procedimento de recusa de entrada duas importantes garantias, em benefício do cidadão não admitido: A comunicação da decisão à representação diplomática ou consular do seu país de origem; A notificação da decisão em língua que presumivelmente possa entender.

 

Procedimento legislativo  


Proposta de Lei 93/X do Governo (2006)    

Artigo 38.º - Decisão e notificação

1 - A decisão de recusa de entrada é proferida após audição do cidadão estrangeiro, que vale, para todos os efeitos, como audiência do interessado, e é imediatamente comunicada à representação diplomática ou consular do seu país de origem.

2 - A decisão de recusa de entrada é notificada ao interessado, em língua que presumivelmente possa entender, com indicação dos seus fundamentos, dela devendo constar o direito de impugnação judicial e o respectivo prazo.

3 - É igualmente notificada a transportadora para os efeitos do disposto no artigo 41.º

4 - Sempre que não seja possível efectuar o reembarque do cidadão estrangeiro dentro de quarenta e oito horas após a decisão de recusa de entrada, do facto é dado conhecimento ao juiz do juízo de pequena instância criminal, na respectiva área de jurisdição, ou do tribunal de comarca, nas restantes áreas do País, a fim de ser determinada a manutenção daquele em centro de instalação temporária ou espaço equiparado.

Discussão e votação indiciária: proposta apresentada pelo BE de alteração dos n.os 1 e 2 e aditamento de um novo n.º 3, com renumeração dos anteriores n.os 3 e 4, do artigo 38.º da proposta de lei n.º 93/X — rejeitada, com votos contra do PS e CDS-PP, votos a favor do PCP e BE e a abstenção do PSD - Proposta de alteração Artigo 38.º (…) 1 — A decisão de recusa de entrada só pode ser proferida após audição do cidadão estrangeiro, na presença de defensor oficioso do gabinete jurídico da Ordem dos Advogados ou de advogado convocado pelo cidadão estrangeiro e vale, para todos os efeitos, como audiência do interessado, desde que tenha sido garantido o direito à defesa. 2 — A decisão de recusa de entrada é notificada ao interessado e ao seu defensor oficioso ou advogado, em língua portuguesa e na língua oficial do país de origem do cidadão estrangeiro, com indicação dos seus fundamentos, dela devendo constar o direito de impugnação judicial e o respectivo prazo. 3 — A decisão de recusa de entrada é imediatamente comunicada à representação diplomática ou consular do país de origem do cidadão estrangeiro. 4 — (anterior n.º 3) 5 — (anterior n.º 4). Artigo 38.º da proposta de lei n.º 93/X, n.º 1 — aprovado, com votos a favor do PS e PSD e a abstenção do PCP, CDS-PP e BE; N.os 2, 3 e 4 — aprovados, com votos a favor do PS e PSD e a abstenção do PCP, CDSPP e BE;




Proposta de Lei 50/XII do Governo (Lei n.º 29/2012)       

Manteve a redação da Lei n.º 23/2007, de 4 de julho. Discussão e votação na especialidade: artigo 38.º da Lei n.º 23/2007 – Proposta de alteração dos n.os 1 e 2 e de aditamento de um novo n.º 3 (passando os atuais n.os 3 e 4 a n.os 4 e 5) do artigo 38.º da Lei n.º 23/2007, apresentada pelo BE – rejeitada, com votos contra do PSD, do PS e do CDS-PP e a favor PCP, do BE e do PEV - Proposta de alteração Artigo 38.º (…) 1 – A decisão de recusa de entrada é proferida após audição do cidadão estrangeiro na presença de um defensor oficioso ou de advogado convocado pelo cidadão estrangeiro, e vale para todos os efeitos legais, como audiência prévia do interessado, desde que tenha sido garantido o direito à defesa. 2 – A decisão de recusa de entrada é notificada ao interessado e ao seu defensor oficioso, com indicação dos seus fundamentos, redigidos na língua portuguesa e em língua que o cidadão estrangeiro possa entender, dela devendo expressamente constar o direito de impugnação judicial, o respetivo prazo de interposição e da possibilidade de recorrer à assistência jurídica por advogado, nos termos estabelecidos no n.º 2 do artigo 40.º. A decisão de recusa de entrada é imediatamente comunicada à representação diplomática ou consular do seu país de origem. 4 – [anterior n.º 3]. 5 – [anterior n.º 4].