Artigo 214.º – Dever de colaboração

1 — Todos os serviços e organismos da Administração Pública têm o dever de se certificarem de que as entidades com as quais celebrem contratos administrativos não recebem trabalho prestado por cidadãos estrangeiros em situação ilegal.

2 — Os serviços e organismos acima referidos podem rescindir, com justa causa, os contratos celebrados se, em data posterior à sua outorga, as entidades privadas receberem trabalho prestado por cidadãos estrangeiros em situação ilegal.

3 — Os organismos da Administração Pública e as pessoas responsáveis por embarcações têm especial dever de informar nas seguintes situações:

a) Quando seja decretado o arresto ou detenção de uma embarcação, bem como quando estas medidas cessem;

b) Quando se proceda à evacuação por motivos de saúde de tripulantes ou de passageiros de uma embarcação;

c) Quando se verifique o desaparecimento de passageiros ou tripulantes de uma embarcação;

d) Quando seja recusado o desembaraço de saída do porto a uma embarcação;

e) Quando se proceda à detenção de passageiros ou tripulantes de uma embarcação;

f) Quando sejam acionados os planos de emergência nos portos nacionais;

g) Quando sejam retirados de bordo, pela autoridade competente, designadamente a Polícia Marítima, e a pedido do comandante da embarcação, tripulantes ou passageiros.


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Comentários 


1 — Convém ter sempre presente a responsabilidade disciplinar em que incorre o titular do órgão da Administração Pública (dono da obra) que não observa o dever de exigir ao empreiteiro uma declaração de cumprimento das obrigações decorrentes da lei relativamente a trabalhadores imigrantes (cfr. art. 198.º, n.ºs 5 e 6) [Atuais n.ºs 6 e 7 do artigo 198.º A, por força das alterações introduzidas pela Lei n.º 29/2012].

O n.º 1 está, de certa maneira, relacionado com aquele dever. O que se pretende evitar é que, em caso algum, a Administração Pública seja conivente com uma situação de ilegalidade, com um ambiente de exploração de mão-de-obra "clandestina" e celebre contratos administrativos com uma contraparte que aceita a prestação de trabalho de cidadãos estrangeiros em situação ilegal.


2 — O n.º 2, na mesma senda, vem afirmar aquilo que podemos designar como uma "sanção legal" que decorre do poder de fiscalização que é conferido ao contraente público e que, no caso de empreitadas de obras públicas, está até consagrado genericamente no art. 180.º, aI. i), do DL n.º 59/99, de 2 de Março (quando prevê que na função de fiscalização se integra o poder de "averiguar se foram infringidas quaisquer disposições do contrato e das leis e regulamentos aplicáveis").

Como se sabe, ao dono da obra (no caso das empreitadas) é reconhecido o poder de rescisão a título de conveniência (art. 234.º, n.º 1, do citado diploma), mas também a título de sanção legal (n.º 3 do citado artigo). Ora, o que o n.º 2 do artigo em exame vem proclamar, no fundo, é uma rescisão a "título de sanção aplicável por lei". Se essa for a hipótese concreta, sobre o empreiteiro recairão as "consequências naturais e legais" (n.º 3 citado), depreendendo-se da expressão que, além da rescisão, e por a ela ter dado causa, sobre si recairá o dever de indemnizar o contratante público pelos prejuízos que esse facto causar. Esta rescisão só acontece, pese embora a declaração contemplada no art. 198.º, n.º 5 [agora no n.º 6 do artigo 198.º A, por força das alterações introduzidas pela Lei n.º 29/2012], e de que o dono da obra se muniu, por este ter tomado tardiamente conhecimento de que a entidade com quem contratou afinal veio a integrar no seu corpo de empregados alguns imigrantes em situação ilegal.

Nota SEF: O DL n.º 59/99, de 2 de Março, alterado pela Lei n.º 163/99, de 14 de Setembro e n.º 159/2002, de 27 de Julho, que aprova o novo regime jurídico das empreitadas de obras públicas, foi revogado pelo Decreto-Lei n.º 18/2008, de 29 de Janeiro, que aprova o Código dos Contratos Públicos, que estabelece a disciplina aplicável à contratação pública e o regime substantivo dos contratos públicos que revistam a natureza de contrato administrativo - alínea d) do n.º 1 do seu artigo 14.º


3 — O n.º 3 estabelece um "dever de informação".

Sobre arresto (al. a) do n.º 3): arts. 619.º a 622.º do Código Civil e arts. 390.ºe 392.º do CPC; ainda art. 3.º da Convenção Internacional de Bruxelas, de 10-05-1952, para a unificação de certas regras sobre o arresto de navios no mar, de Bruxelas, de 10-5-1952 (cfr. DL n.º 41 007, de 16 de Fevereiro de 1957);

Sobre o alcance das alíneas restantes, que, entre outras coisas, também visam a protecção dos navios e das instalações portuárias, ver Regulamento (CE) n.º 725/2004, de 31 de Março, Directiva 2005/65/CE, de 26 de Outubro, e DL n.º 226/2006, de 15 de Novembro.


Origem do texto


Direito nacional

Na última redacção do anterior diploma a matéria da colaboração com outras entidades era regulada no artigo 160.º

O Decreto-Lei 264-B/81, de 3 de Setembro postulava, no seu artigo 72.º, um dever de colaboração com um sentido diverso do actual, porquanto cominava a colaboração no “andamento a todos os assuntos relacionados com estrangeiros”, nos locais onde não houvesse dependências do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras. É o Decreto-Lei 4/2001, de 10 de Janeiro, que, por via do disposto no seu artigo 160.º, introduz no diploma anterior o dever de colaboração em moldes iguais aos actualmente previstos nos n.º 1 e 2.

 

Procedimento legislativo


Proposta de Lei 93/X do Governo (2006)          

Artigo 214.º - Dever de colaboração

1 - Todos os serviços e organismos da Administração Pública têm o dever de se certificarem de que as entidades com as quais celebrem contratos administrativos não recebem trabalho prestado por cidadãos estrangeiros em situação ilegal.

2 - Os serviços e organismos acima referidos podem rescindir, com justa causa, os contratos celebrados se, em data posterior à sua outorga, as entidades privadas receberem trabalho prestado por cidadãos estrangeiros em situação ilegal.

3 - Os organismos da administração pública e as pessoas responsáveis por embarcações têm especial dever de informar nas seguintes situações:

a) Quando seja decretado o arresto ou detenção de uma embarcação, bem como quando estas medidas cessem;

b) Quando se proceda à evacuação por motivos de saúde de tripulantes ou de passageiros de uma embarcação;

c) Quando se verifique o desaparecimento de passageiros ou tripulantes de uma embarcação;

d) Quando seja recusado o desembaraço de saída do porto a uma embarcação;

e) Quando se proceda à detenção de passageiros ou tripulantes de uma embarcação;

f) Quando sejam accionados os planos de emergência nos portos nacionais;

g) Quando sejam retirados de bordo, pela autoridade competente, designadamente a Polícia Marítima, e a pedido do comandante da embarcação, tripulantes ou passageiros.

Discussão e votação indiciária: artigo 214.º da proposta de lei n.º 93/X — aprovado por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes.