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O Onzeneiro é uma personagem tipo, que representa a burguesia.
Tem o seguinte adereço /símbolo cénico a caracterizá-lo:
· bolsão: representa a ambição, o apego ao dinheiro, a usura (materialismo), a prática da onzena (empréstimos de dinheiro, aos quais eram aplicados onze por cento de juros) e a sua ligação obsessiva ao dinheiro, o que o levou a exercer uma atividade ilícita.
1. Principais características da personagem:
Ganancioso (“Mais quisera eu lá tardar.../Na safra do apanhar”).
Avarento (“Lá me fica de rodão/ minha fazenda e alhea”).
2. Argumentos de acusação:
· O Anjo acusa-o de levar um bolsão cheio de dinheiro e o coração cheio de pecados, cheio de amor pelo dinheiro;
· É avarento;
· É apegado ao dinheiro (“Porque esse bolsão tomara o navio”; “(...) Não já no teu coração” e “Ó onzena, como es fea e filha de maldição!”). Apesar de morto, o seu amor ao dinheiro continua a encher-lhe o coração. O Onzeneiro dá tanta importância ao dinheiro que está sempre a pensar nele e pensa que ele pode resolver tudo. Queixa-se de ter vindo sem uma única moeda, nem mesmo para pagar ao barqueiro (“Quero lá tornar ao mundo/ e trarei o meu dinheiro. / Aqueloutro marinheiro, / porque me vê vir sem nada, / dá-me tanta borregada/ como arrais lá no Barreiro”).
· Deixou-se tentar pelo Diabo (“Essa barca que lá está/ vai pera quem te enganou” e “Irás servir Satanás/ porque sempre te ajudou”). Através das suas ações esteve sempre próximo do Diabo, que o inspirou a fazer o mal. Agora, irá pagar-lhe a inspiração servindo-o no Inferno.
3. Argumentos de defesa:
- Ter morrido sem esperar
- Não ter tido tempo de “apanhar” mais dinheiro (esta queixa mostra que para esta personagem o dinheiro era importante)
- Jura ter o bolsão vazio
- Precisa de ir à Terra para ir buscar mais dinheiro (para comprar o Paraíso)
A movimentação da personagem em cena (percurso cénico) é:
Cais -> Barca do Inferno -> Barca da Glória -> Barca do Inferno -> Embarca - condenação eterna (Inferno)
Crítica de Gil Vicente:
- criticar a ganância, a avareza, o materialismo, a exploração dos outros e sublinhar a inutilidade do dinheiro no cais.
Outras notas
“Oh! Que má-hora venhais,/ onzeneiro, meu parente!”
(Diabo)
- o Diabo revela, com este tratamento, que o Onzeneiro tem semelhanças com ele, é como se fossem membros da mesma família;
- o Diabo sempre o ajudou a fazer o mal, a enganar os outros, agora os papéis invertem-se: é a vez de o Onzeneiro ajudar o Diabo.
O Onzeneiro é condenado pelo Anjo ao Inferno porque:
- Leva o coração cheio de pecados, cheio de amor pelo dinheiro.
O Onzeneiro interpreta a recusa do Anjo deste modo:
- por não ter dinheiro, não pode entrar no Paraíso;
- pensa que com o dinheiro pode comprar tudo e resolver tudo.
Recursos expressivos:
Cómico de situação quando jurou que levava o bolsão sem dinheiro;
Ironia: “Oh! que gentil recear”
Eufemismo: “Pera onde tu hás de ir.”
Metáfora/eufemismo: “Na safra do apanhar me deu Saturno quebranto”.