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Escrivão (escrevendo)
–Carta do Infante D. Henrique de Portugal a seu irmão o Infante D. Pedro de Portugal.
O Infante (ditando devagar, e parando um instante no fim de cada período)
Meu muito amado irmão,
Primeiro que a ninguém vos quero dar esta notícia. Pois esta obra de navegação antes de ser obra foi ideia. E a ideia foi vossa e minha.
Juntos, na nossa juventude, ambos pensámos esta grande empresa: mandar barcos para o mar para saber o que havia.
Por isso agora acaba de chegar aqui Gil Eanes, que dobrou o Cabo Bojador. E do outro lado do Cabo não encontrou nem temporal desencadeado, nem correntes irresistíveis, nem vagas de lama, nem nevoeiros negros. Encontrou o mar aberto e livre à sua frente e encontrou uma terra luminosa e nua.
Aqui termina a lenda do Tenebroso. Fomos além do medo, das lendas e da ciência dos Antigos. Dobrámos o Cabo onde acabava o mundo. Aqui terminam as eras antigas e começa uma idade nova.
Sophia de Mello Breyner Andresen,O Bojador ,Ed.Caminho