Rafael Matheus
O que eu entendi da proposta do projeto, é que “Ao Ar, Livre” se trata de compartilhamento, através da visibilização de ações artísticas, os convidados tem a chance de compartilhar no cyber espaço a sua produção, tornando esse processo criativo mais próximo do público. Durante a pandemia do corona vírus ficamos isolados, e esse processo criativo, que geralmente já é bastante solitário, se tornou uma atividade ainda mais solitária porém reconfortante, pelo menos no meu caso. Durante o período de isolamento eu fiquei completamente ilhada na minha casa, morando em um lugar sem família ou amigos, meus únicos momentos onde saia de casa eram as rápidas idas ao supermercado. 2020 certamente foi um ano de grandes mudanças e conflitos. De repente eu me vi obrigada a ter que lidar com questões onde o trabalho artístico e acadêmico sempre foram fugas de mim mesma. Eu tive que lidar com o meu corpo, um corpo cujo o qual não me identifico, e finalmente lidei com a transição de gênero através de uma Terapia Hormonal que iniciei por conta própria. Foram grandes as batalhas internas. Um caminho completamente solitário.
A minha única companhia neste momento foram minhas “filhas”, é assim que chamo minhas pinturas, e mais uma vez eu me via acolhida pela pintura. Se a obra final é minha filha, o processo de confecção dela é uma grande “amiga”. Através do processo da pintura eu a indago sobre as minhas reflexões, nem sempre ela tem as respostas mas só de me acolher e me “ouvir”, ela é capaz de ME processar, não é apenas eu que crio e processo a obra, ela certamente também me afeta e me motifica. Quando surgiu a proposta de participar do projeto me indaguei “o que fazer?” A primeira coisa que pensei foi em reativar a performance “Tinta S/ Pele”, onde o corpo é suporte da pintura, mas isso iria exigir além do envolvimento de terceiros a circulação dessa obra em público, eu acredito que enquanto uma cura definitiva não for disponibilizada a população devemos manter o isolamento e acredito que uma performance que envolva mais pessoas seria um desrespeito as vítimas da covid-19.
Portanto eu sinto que essa ação artística deva ser silenciosa e solitária, um compartilhamento do meu processo de pintura para deixar registrado e visibilizado este momento de embate com a matéria, lembrando que apesar de isolados, estamos juntos (r) existindo em Artes Visuais.