Somos uma escola pública, com poucos recursos, situada na periferia de uma cidade, sendo esta própria, uma grande periferia. Convivemos com o descaso das administrações públicas (vereadores e prefeitos) que aparentemente, fazem pouco ou nada por melhorias nas ruas e bairros, escolas e postos de saúde. Neste contexto surgem discursos que refletem, ora nossa revolta, ora nossa descrença, propagando entre nós, o sentimento de que somos menos, que somos menores. Que nossa cidade e nosso bairro nada tem que mereça valor.
Construir um novo olhar significa descobrir. E des-cobrir é revelar algo que está encoberto, algo que os outros ainda não perceberam. Para construir um novo olhar sobre nossa cidade e nosso bairro, é preciso abandonar os preconceitos, isto é, parar de ver através das lentes dos outros e começar a pensar sobre o que nós percebemos, em vez de crer no que nos dizem. Esse é um processo demorado, exige tempo e reflexão, sobretudo porque não faltam vozes para apontar os problemas que enfrentamos em nossa comunidade, nos jornais, no rádio, entre as pessoas com quem convivemos... e libertar-se de uma crença que todos a nossa volta reafirmam não é fácil.
Um olhar atento, sensível, pode revelar uma outra realidade, desconhecida pela maioria: uma vista ampla, um grafite colorido, um morador simpático, um personagem curioso... o futebol com os amigos no campinho, os papagaios cruzando o céu, a visita de tucanos na árvore carregada de frutas... o carro velho, uma frase no muro, o vira lata esperto, o por do sol no alto do morro... a dona que varre a calçada todo dia, flores que alguém plantou pelo caminho, crianças brincando na rua... Coisas que os jornais não mostram. Coisas que quase ninguém vê ou dá importância.
Perceber essa realidade, diferente da que vemos na televisão, diferente da que ouvimos nas queixas, da que lemos no jornal, pode transformar nossa visão sobre nosso bairro e sobre nossa comunidade. A partir desse novo olhar, podemos construir outros discursos, diferentes dos que estamos habituados a ouvir e nos trazer uma compreensão mais aprofundada de quem somos e nos ajudar a escrever nossa própria história.