Vitaminas e minerais no tratamento do COVID-19: O que sabemos e o precisaríamos saber


É a primeira vez na história que uma epidemia emerge numa sociedade com tecnologias informativas e de fácil acesso, o que pode auxiliar no enfretamento do quadro pandêmico, mas também, infelizmente, repercutir em informações erradas, desconexas e confusas, inclusive quanto a COVID-19, alimentação e nutrição.

Sabe-se que nossos hábitos alimentares impactam o nosso sistema imunológico, podendo aumentar suscetibilidade a doenças assim como preveni-las. As principais repercussões entre a relação da nutrição com o sistema imune se dão pela ação de nutrientes, vitaminas e minerais, permitindo a modulação de marcadores sistêmicos da função celular e inflamatória.

Artigos vem sugerindo intervenções nutricionais no manejo da infecção viral por COVID-19 baseados nas ações das vitaminas do complexo A, B, C, D; minerais como Selênio, Zinco, Ferro e de ácidos graxo como Ômega 3. Tais publicações, especulam os efeitos terapêuticos desses compostos a partir de pesquisas com base em outras infecções (como HIV, malária, diarreias etc.), influenzas e inclusive na própria SARS e MARS em outras espécies. As revisões acerca do tema, principalmente, correlacionam as funções imunes desses nutrientes com as disfunções mais agravantes e persistentes causadas pelo coronavírus, como a disfunção respiratória e a infecção generalizada (SEPSE).

Em suma, alguns estudos pré-clínicos e ensaios randomizados citados por essas revisões apontam que essas vitaminas e minerais demonstram efeitos na diminuição de replicação viral (vitamina A), melhora nas defesas antioxidantes (Vitamina C, E, Selênio, Ferro), estímulo para produção de novas células imunes (Vitamina D, Zinco) e efeitos anti-inflamatórias (ômega 3). O que de fato, não é nenhuma novidade. Já é bem documentado que em quadros de infecções, a má nutrição e deficiência vitamínica está atrelada a piora na resposta imunológica frente as injúrias.

A principal questão que ainda não foi respondida é então, quais seriam as quantidades seguras recomendadas de ingestão diária, com efeito terapêutico, dessas vitaminas e minerais para estes pacientes (críticos e não críticos) que estão em tratamento de COVID-19? tendo em vista, outros pontos chaves como (1) as caraterísticas individuais como estado nutricional, faixa-etária, sexo, doenças de base, etc.; (2) progressão e gravidade da doença (3) necessidade de terapias nutricionais parenterais e/ou enterais (4) composição de dietas enterais em sistemas fechados e abertos (5) manuseio e fabricação das dietas enterais, e também, dos compostos parenterais. Já que, usualmente, as terapias nutricionais para pacientes críticos, como aqueles que necessitam de cuidados especiais em CTIs (centros de terapias intensivas) abrangem uma série de reponsabilidades e cuidados fornecidos pelos serviços de nutrição e dietética juntamente com os serviços de assistência farmacêutica.

Para além, a pesquisa no campo da nutrição aplicada a imunologia nos mostra oportunidades, mas grandes desafios no estabelecimento de estudos clínicos, de caso e observacionais com base nos padrões alimentares e na repercussão dos efeitos de certos nutrientes no contexto de doenças alérgicas, autoimunes e virais. A maior parte das evidencias ainda não conseguem abranger a complexidade dos eventos imune inflamatórios que são mediados por esses nutrientes, tendo em vista que essas interações são dependentes de fatores como os padrões alimentares já adotados, a composição majoritária da dieta, microbiota intestinal e as modificações epigenéticas e celulares causadas pela doença no próprio hospedeiro.

Sendo assim, até o momento, não há artigos e consensos clínicos afirmando o potencial terapêutico de vitaminas e minerais na COVID-19. Todavia, uma alimentação e/ou suplementação alimentar que forneça o que já é recomendando de vitaminas e minerais pela ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) e pelas DRIS (dietary reference intakes), exercerá um papel imunomodulador benéfico. Desse modo, ofertar essas recomendações se torna crucial para a manutenção do estado nutricional dos pacientes durante o tratamento. Sendo esse processo, calculado, ofertado e monitorado a partir das premissas da terapia nutricional por profissionais da área.

Mas afinal de contas, pensando não na ação terapêutica, mas de prevenção: A alimentação pode prevenir o contágio do COVID-19? Não. Não existem evidencias que mostram que alimentos, nutrientes, vitaminas, minerais ou compostos alimentaras sejam capazes de inibir o contágio da doença. O que se sabe é que o estado nutricional do hospedeiro pode ser um fator contribuinte para a melhora ou priora do prognostico. Mas isso não significa estar imune a infecção, caso venha a se contagiar.

Nesse quesito, o conselho federal de nutricionistas (CFN) divulgou uma nota atentando a população e profissionais sobre o que está sendo preconizado acerca de alimentação e nutrição, e, outra nota alertando a população sobre notícias falsas que circulam (fake news). Para além, a ASBRAN (associação brasileira de alimentação e nutrição) elaborou um Guia para Alimentação Saudável em Tempos de COVID-19, com inúmeras informações, ilustrações, dicas e orientações acerca de alimentação e nutrição nesse período.

Por fim, cabe a cada um fazer sua parte nas medidas de prevenção já conhecidas e as terapias nutricionais já preconizadas. Salientando que enquanto buscamos através da ciência e dos nutrientes formas de melhorar o tratamento do COVID-19, estar atento as inúmeras publicações e desfechos também é importante, pois repercutem diretamente no saber social.

Artigos comentados:

ZHANG, Lei; LIU, Yunhui. Potential interventions for novel coronavirus in China: A systematic review. Journal of medical virology, 2020. Link: https://onlinelibrary.wiley.com/doi/full/10.1002/jmv.25707?casa_token=jcHuKkTyjesAAAAA%3AhwLntkF3C5uqYgUBlE7y1KuU-yq0ML_HvID1_s9W7p7dO_QUr1M5xonUzNci6a5D45gvA4jEl49h33w

GRANT, William B. et al. Vitamin D Supplementation Could Prevent and Treat Influenza, Coronavirus, and Pneumonia Infections. 2020. VIT D. Link: https://www.preprints.org/manuscript/202003.0235/v2

SAUL, Andrew W. Nutritional treatment of coronavirus. Orthomolecular Medicine News Service, v. 16, p. 6, 2020. Link: https://drlauda.at/images/pdf/omns/Nutritional_Treatment_of_Coronavirus.pdf

Publicações utilizadas para realização dessa matéria:

VENTER, Carina et al. Nutrition and the Immune System: A Complicated Tango. Nutrients, v. 12, n. 3, p. 818, 2020.

FERREIRA, Iára Kallyanna Cavalcante. Terapia nutricional em unidade de terapia intensiva. Revista Brasileira de Terapia Intensiva, v. 19, n. 1, p. 90-97, 2007.

BOOG, Maria Cristina Faber. Atuação do nutricionista em saúde pública na promoção da alimentação saudável. Revista Ciência & Saúde, v. 1, n. 1, p. 33-42, 2008.

TRUMBO, Paula et al. Dietary reference intakes: vitamin A, vitamin K, arsenic, boron, chromium, copper, iodine, iron, manganese, molybdenum, nickel, silicon, vanadium, and zinc. Journal of the Academy of Nutrition and Dietetics, v. 101, n. 3, p. 294, 2001.

Notas do CFN:

Nota Oficial do CFN sobre o novo coronavírus” publicado dia 16/03/2020, disponível em https://www.cfn.org.br/index.php/destaques/19913/

“Notícia falsa é um desserviço público”, publicado dia 24/03/2020” disponível em https://www.cfn.org.br/index.php/noticias/noticia-falsa-e-desservico-publico/

Guia da ASBRAN:

Guia para Alimentação Saudável em Tempos de COVID-19: disponível em: https://www.asbran.org.br/storage/downloads/files/2020/03/guia-alimentar-covid-19.pdf


Bruna Letícia Endl Bilibio.

Nutricionista;

Mestranda no Programa de Pós-Graduação em Atenção Integral a Saúde - PPGAIS UNICRUZ/UNIJUÍ

Grupo de Pesquisa em Fisiologia – UNIJUÍ

bruna_endl@hotmail.com