O vídeo pretende mostrar como uma câmera sensível no infravermelho próximo poderia ser usada para provar a suposta planicidade da Terra. A ideia é interessante, porque no infravermelho o alcance de visibilidade, definido no Manual de Sinalização Náutica da Marinha do Brasil (https://www.marinha.mil.br/camr/sites/www.marinha.mil.br.camr/files/MANUAL-SN-Vol-1-Aprovado-CT-DHN.pdf), é bem maior do que na banda espectral visível.
No entanto, o autor do vídeo usa dados errados para chegar na conclusão errada.
No minuto 2:30, um erro básico: ele alega que a redução de visibilidade é causada por "gases". Não é. Gases produzem espalhamento de Rayleigh, que deixa o ar azul. O que se ve nesse vídeo é absorção por partículas sólidas e aerosois, mais conhecida por névoa seca. Essa absorção, ao contrário do espalhamento de Rayleigh, é pouco dependente do comprimento de onda da luz, portanto produz um aspecto cinzento. Claro, o espalhamento de Rayleigh está sempre presente, superposto `a absorção por partículas. Esses detalhes são importantes justamente porque são, no fundo, a justificativa para se usar o infravermelho em estudos desse tipo. O autor parece não se importar com isso, o que sugere que o objetivo do vídeo é muito mais o de desinformar, do que informar.
Aos 2:40 minutos, o autor mostra um mapa da região coberta pelo vídeo. Podemos verificar com fontes independentes que o mapa está basicamente correto, e as montanhas mostradas na panorâmica infravermelha inicial no vídeo são mesmo as apontadas pelas tres linhas. A montanha central é o Pico de San Jacinto, no condado de Riverside, California.
Aos 3 minutos, ele mostra imagens para confundir o incauto: montanhas não identificadas num horizonte marinho, visualizadas na câmera de luz visível, e uma imagem superposta de outras montanhas também não identificadas, visualizadas numa câmera infravermelha com um filtro low pass de 0.85 microns. Essas imagens não foram feitas no mesmo dia, e possivelmente nem no mesmo lugar, portanto não são comparáveis e não provam ou demonstram nada. É um típico segmento de vídeo inserido ad hoc para confundir.
Não há explicação para a legenda críptica que aparece aos 5:40 dizendo "Inclinação = 0".
Aos 6 minutos, surge a alegação de que o modelo da Terra é impreciso. O autor não mostra os cálculos que indicariam isso, apenas desenha um diagrama que é dito explicitamente ser fora de escala, e desse diagrama fora de escala, sugere que as montanhas não seriam visíveis. A lógica aqui é incompreensível.
Aos 7 minutos, o autor ironicamente usa o Google Earth para confirmar a altura das montanhas. Esquece de mencionar que o Google Earth funciona com um modelo de Terra geoide, datum WGS84.
Entrando com os dados geográficos da câmera e do alvo em um calculador de efeitos da curvatura da Terra, vemos que a altura de um objeto escondido atrás do horizonte, naquela configuração, é de cerca de 2,100 metros. Como mostrado no vídeo. Ou seja, todas as informações passadas pelo autor estão corretas, inclusive o calculo correto da curvatura da Terra.
Entretanto, o erro está em afirmar que as altitudes do maciço em volta do Pico de San Jacinto são de cerca de 2,000 metros sobre o nível do mar. A altitude do pico mesmo é 3,302 metros sobre o nível do mar. O vídeo mesmo, curiosamente, se contradiz e mostra um valor de 3,184 metros obtido no Google Earth. Examinando um mapa topográfico da região, (por exemplo, http://en-gb.topographic-map.com/places/Mount-San-Jacinto-5422226/) é fácil ver que todos os picos naquele maciço, numa extensão de mais de 2 kilometros ao sul do pico, estão acima de 3,000 metros sobre o nível do mar.
Portanto, o que o vídeo está mostrando não é evidencia em favor da terra plana, mas apenas os cerca de 1,000 metros superiores das montanhas. Os 2,000 metros da parte inferior estão escondidos atrás do horizonte. O objetivo do vídeo é desinformar.
Um aspecto curioso é que o argumento apresentado no vídeo viola um dos preceitos fundamentais da terra plana (originário na "astronomia zetética"): apenas as provas que podem ser vistas com os próprios olhos seriam válidas. Como o olho humano não é sensível no infravermelho, evidencias obtidas usando essa região do espectro seriam invalidas, do ponto de vista terra planista. Isso apenas mostra que a "metodologia terra planista" se baseia fundamentalmente, entre outras falácias, no viés de confirmação.