Episódios
Vou listar uns poucos episódios interessantes e que se passaram há mais tempo, dentro do que considero plausível divulgar, a título de curiosidade ou para complementar algumas informações por mim divulgadas em outras abas desta homepage.
1 - Lá pelo ano de 2000 realizei uma varredura na Liderança do Governo no Senado. O líder era então o Senador José Roberto Arruda, do Distrito Federal. O gabinete, não me recordo se da Liderança ou do próprio Senador (os ocupantes de alguns cargos tem direito a ocupar dois gabinetes) ficava no Anexo II, ao lado de um antigo refeitório que ocupava o final do jardim e de frente para o Palácio do Planalto. Era um momento em que o Senado tinha adquirido uma leva de televisores que, embora não fizesse parte da especificação, tinha a função de transmitir o som em VHF - Very High Frequency (de 30 a 300 Mhz, inclui as utilizadas para as transmissões de rádio). Esclarecendo, quando é feita uma licitação é elaborada uma especificação com características e funcionalidades mínimas. E muitas vezes vencem (oferecem o menor preço) fornecedores que tem produtos melhores e mais completos do que outros, geralmente por uma questão de estoque. Essa aquisição já tinha nos dado um susto, pois o equipamento transmitia em VHF para que o proprietário pudesse utilizar o televisor fazendo exercícios ou coisa do gênero, com o auxílio de fones de ouvido sem fio (que naquela época não passavam de receptores de rádio embutidos em fones).
O susto fora exatamente no mesmo gabinete, quando um colega teve uma detecção positiva através do correlacionador espectral. Na ocasião, identificado o problema, o procedimento que adotamos foi inutilizar o transmissor que, sem uso prático em um gabinete funcional, poderia ser facilmente adaptado para transmitir o som ambiente.
Voltando a varredura, especificamente nesse dia eu não tinha ninguém disponível para me ajudar e resolvi iniciar sozinho para adiantar o serviço até que alguém recebesse o recado para se dirigir ao local em meu auxílio. Haveria uma reunião mais tarde a qual considerei de baixo risco, já que não quiseram me informar o tipo de conteúdo, mas que fiquei sabendo por outros meios, seria para tratar de assuntos políticos.
Era cedo, o gabinete estava vazio. Montei o correlacionador sobre a mesa de reuniões e ativei-o para uma varredura automática, seguindo a programação que eu tinha realizado previamente para aquele gabinete. Iniciei a varredura pelo sensor de infravermelhos, entre 10 Khz e 5.01 Mhz (aquele nosso primeiro equipamento suportava comprimentos de onda de 850 -1070 nM). Me dirigi ao local onde eu tinha deixado o detector de junções não-lineares (provavelmente no centro da sala) mas mal dei alguns passos e aconteceu o inesperado: o correlacionador "alarmou". Minha reação imediata foi de perplexidade. Eu não tinha tido tempo nem de me organizar. Voltei imediatamente ao correlacionador enquanto o mesmo entrara na fase de impressão do relatório sobre a detecção (o equipamento possui uma impressora térmica). Olhei para o visor e imediatamente concluí que, naquela frequência, só poderia ser um microfone a laser. Quase imediatamente abri com as mãos a persiana voltada ao estacionamento para ver se flagrava algo.
Isso porquê o microfone a laser tem determinadas características. Tal microfone é um pouco difícil de ser utilizado. O laser precisa ser emitido em um feixe o mais estreito possível, e sua reflexão deve ser coletada no ponto mais central possível. Como em um espelho, o ideal é que o laser vá e volte ao mesmo ponto, o que só acontece em ângulo reto. Emissor e receptor podem estar em locais distintos, mas isso inviabiliza seu uso na maioria das vezes. O que ele capta é a vibração do vidro da janela, convertendo tal para onda sonora de má qualidade, na hora, mas que depois pode ser transformado em boa qualidade com o uso de filtros. Pensei em algum veiculo estacionado ao lado do gabinete, com o vidro entreaberto, mas na hora que abri o que me chamou a atenção foi o movimento das enormes persianas da Presidência, localizado exatamente em frente ao gabinete e em ângulo reto. Esse movimento me permitiu visualizar o que parecia ser uma câmera sobre um tripé, que vi por uma fração de segundo antes da persiana fechar completamente.
Passada a surpresa inicial, onde ainda fitei com os olhos aquele mesmo ponto por alguns segundos, passei a procurar os veículos em posição suspeita, mas nada encontrei. O alarme havia parado de tocar, o que indicava que o sinal detectado não mais persistia. Sozinho e com esse curto registro, eu estava com uma batata quente nas mãos. Poderia ser um alarme falso, uma interferência? Era justamente a gama de frequências em que não tínhamos um equipamento de referência para testes ou aprendizado. É um equipamento um tanto quanto raro. E a possibilidade de uma escuta desse tipo, do Governo sobre o Líder do Governo, não fazia nenhum sentido no contexto do tipo de varredura que eu fazia. Era período do processo de cassação do Senador Luiz Estevão e um ano depois o episódio da quebra do sigilo do painel eletrônico levaria a renúncia de Arruda e ACM. A partir desse episódio, passei a deixar o alarme no modo silencioso. De qualquer maneira, à época julguei que alertar sobre o fato poderia ser o fim da atividade que recém se iniciava. E que o principal prejudicado poderia ser eu mesmo. Eu não quis arriscar a adentrar nessa seara porquê nada de bom poderia dali ser colhido. A proteção da informação com fins políticos não me interessava, e assim continuou até que me removeram da atividade. Depois disso não sei. Mais uma curiosidade: para quem não conhece, um microfone a laser se parece muito com uma câmera sobre um tripé.
2 - Curioso mesmo foi o que achei sobre determinado episódio. Um Senador solicitou varredura no seu gabinete. Quando lhe perguntei o porquê, respondeu que tinha recebido de alguém de sua confiança no seu Estado o pedido para que tomasse cuidado, pois os telefones do seu gabinete estariam grampeados.
Como se tratava de um dos gabinetes que mais recebiam visitantes, "correligionários" de seu Estado, dizia o Senador, resolvi antes de mais nada me inteirar do grau de risco, pois o Senador era daqueles meio "apagados", solícitos, sem suspeitas sobre sua idoneidade, que sequer se envolvia com a grande política. Me parecia mais um desses Parlamentares que ficam gratos por terem sido eleitos e retribuem como podem... e nesse caso, o jeito dele era cedendo o gabinete para os eleitores que precisassem fazer uma ligação, receber um fax, descansar. Tinha uma sala só para isso. Ficha limpa, não tinha muita lógica o Senador ser alvo de uma escuta. Naquela semana, passei a frequentar o gabinete sempre que podia, até para treinar e sistematizar o processo de obtenção de informações na etapa pré-varredura. Travei conhecimento com alguns desses visitantes tão caros ao Senador. Um deles, muito comunicativo, simpático, utilizava o gabinete praticamente como um escritório. Tratei de puxar assunto assim que pude, e quando o observava pelo CFTV circulando pela Casa, lá ia eu para o gabinete. Num desses encontros "ocasionais" o cidadão me brindou com seu cartão. Era um cartão de apresentação bem simples, desses tipo comercial. E com o número de um dos telefones do gabinete estampado. Na hora, fiquei admirado e perguntei baixinho, como que procurando cumplicidade: "-Nós podemos usar o número do gabinete? Não dá rolo?" E ele me respondeu, também quase sussurrando: "- Não, todo mundo faz isso, só tem que estar aqui na hora que ligarem!" Bastou uma pequena busca, e voilá: o cidadão era envolvido com estelionato no Estado de origem.
Me dirigi novamente ao Senador e reportei o que estava acontecendo. Informei que não admirava a informação sobre grampo, pois devassado como era o ambiente, não ele, o Senador, mas seus correligionários acabariam enfiando seu ramal em alguma lista de quebra de sigilo. E mais, que o tipo de destino que ele dava a seu gabinete me impedia de fazer uma varredura.
Surpreendentemente o Senador não contestou. Deu de ombros e disse que tudo bem, que então não poderia fazer nada, que não iria parar de prestar o apoio que seus correligionários precisavam. Concluindo, nunca recebemos uma queixa de más práticas no Senado envolvendo esses frequentadores. Parece que sempre tomavam o cuidado de manter no seu Estado de origem seus negócios. Não fiz a varredura, fui embora, mas aprendi mais um pouquinho sobre as peculiaridades do trabalho parlamentar... e dos que nele orbitam.
3 - Se existe uma profissão estressante, que faz com que o profissional, concentrado em seus assuntos de trabalho, perca suas coisas, essa é a profissão de jornalista. Caramba! Como jornalista perde gravador. Ligado. E justamente na dobra ou embaixo de um sofá, de um armário, de uma estante. Creio que por sorte, isso geralmente só ocorre em momentos de stress, como antes de reuniões importantes com a participação de autoridades. Naquele momento em que entra todo mundo para fazer a foto. Deve ser por causa dos nervos, saber que em minutos estarão comentando algo que pode ser um furo jornalístico. Felizmente depois de finda a reunião notam a falta e voltam para procurar seus equipamentos. Quando encontramos tais dispositivos, só em poucas ocasiões não encontramos o dono. Quando assim acontecia os encaminhávamos ao Serviço de Achados e Perdidos. Uma ou outra vez, ao ouvirmos o conteúdo para ver se encontrávamos o proprietário, notamos que acidentalmente havia sido gravada uma reunião tornada secreta, um assunto sem a presença de jornalistas. Mas isso acontece, nunca considerei mais do que isso, um lapso do profissional, nada demais, como quando esquecem o link das câmeras ligados nas comissões antes de reuniões tornadas secretas. O operador da câmera está ali para ligar, gravar, não para desligar. Sem motivos para alarde, somos todos profissionais, fiz a minha parte dentro do que preceitua a boa convivência que deve haver entre profissionais de imprensa e de segurança, cada um fazendo o seu trabalho como pode.
O equipamento acima foi encontrado dentro do Plenário, registrando o que não deveria. Esse foi um dos equipamentos cujo dono nunca apareceu para recuperá-lo. Uma pena, espero que não tenha sido preciso o profissional tirar do próprio bolso para repor o equipamento.
4 - Em março de 1998 recebemos o aviso de uma ameaça de bomba que teria sido colocada no Senado Federal. Realizamos uma busca e rapidamente localizamos (nós, a equipe de segurança) um artefato no espaço conhecido como "Túnel do Tempo", corredor que liga o Edifício Principal ao Anexo II. O apelido foi dado pelos servidores pois, quando de sua construção, foi logo notada a similaridade com um famoso seriado de TV de mesmo nome. Não tínhamos estrutura para remoção desse tipo de artefato, assim o Diretor da então Subsecretaria de Segurança do Senado avisou, de forma sigilosa, a Polícia Federal. Fizemos o isolamento, e quando os técnicos da PF chegaram, já vinham acompanhados por um séquito de jornalistas. O ponto em que o artefato estava colocado era muito no início, junto ao edifício principal, a uns 15 metros da entrada do plenário, 20 da entrada do Comitê de Imprensa (os locais foram evacuados). Eu fiquei na barreira ao centro do Túnel do Tempo, em um ponto privilegiado, fazendo a linha de retenção considerada "segura" pelos técnicos da PF onde os jornalistas e demais curiosos ficavam. É claro, ninguém pediu minha opinião para nada, mas, quando alguém discorreu que os agentes estavam colocando um canhão disruptor, eu logo comentei que era óbvio que não, que apesar da aparência aquilo deveria ser um equipamento de raios-x portátil e que o dispositivo seria removido para fora do prédio. Como eu estava enganado.
Me surpreendi como os agentes da PF não tiveram a capacidade de avaliar corretamente a situação. O motivo pelo qual eu imaginei não seria feita a disrupção era pela possibilidade de um atentado químico ou biológico. Disrupção ou dirupção de um objeto, no caso, é o ato de desmontar, de forma abrupta, um dispositivo, possivelmente contendo explosivo. Separada a carga do detonador, rompido um possível circuito detonador, o risco cai pelo menos ao ponto de possibilitar o manuseio dos componentes sem maiores surpresas. Não é que o risco cessa totalmente, ainda é necessário a ação de um especialista, mas pelo menos alguém com um controle remoto não pode mais atuar, por exemplo. Para conseguir a disrupção é utilizado um canhão que dispara uma carga de água sob alta pressão, a qual atinge o dispositivo e o desmonta, rompe o circuito.
Quando utilizaram o disruptor, fizeram um alerta, um estampido como um tiro, e pronto. Não deu alguns segundos e o pessoal começou a lacrimejar. Alguns jornalistas e curiosos começaram a ter dificuldade em respirar. Havia no artefato uma cápsula de gás lacrimogênio. Poderia ser gás mostarda. Poderia ser gás Sarin.
Isso me deu muito o que pensar. Não era possível simplesmente confiar em técnicos que, por mais competentes que fossem, vivem outra realidade. Criminosos, traficantes, ladrões de banco, arrombadores, não utilizam armas químicas, nem biológicas, nem radioativas. Utilizam explosivos. Os atentados a que o Congresso está sujeito não ficam restritos a isso. Os terroristas movidos por ideologia são mais periculosos e, portanto, representam uma ameaça muito mais eclética.
A partir daí sempre participei de mobilizações, de estudos, de sugestões para que o Senado Federal tivesse a capacidade de desenvolver os métodos e adquirir as ferramentas adequadas às suas necessidades.
E foi inspirado nesse caso que eu preferi não adotar as técnicas de contrainteligência consagradas à época. Se assim o fizesse, as particularidades do Senado fariam a informação sobre a ação de contrainteligência vazar por entre os dedos, comprometendo a eficácia de qualquer operação. O conjunto de ações de contrainteligência aplicado por mim foi criado, recriado e transformado ao longo dos anos incluindo a capacidade de autoproteção da atividade. Essa capacidade não foi transferida para ninguém por falta de oportunidade. A equipe que me sucedeu não aceitou a atividade que lhes foi imposta. Eram os agentes do Serviço de Inteligência. Nisso fizeram juz ao nome, com aqueles Diretores era uma batata quente sem tamanho. Isso obrigou a Diretoria a encontrar outra solução. Transferiram o equipamento à Coordenação de Polícia Judiciária, onde foi parar nas mãos dos agentes de investigação. Verdadeiro tiro no pé, acabou por acontecer aquilo pelo qual eu tanto trabalhei para que não acontecesse.
Na foto acima, um explosivo no jardim localizado ao lado da entrada do Anexo II. O objetivo, se detonado, seria provocar pânico.
Acima, artefato encontrado sob sofá no Bloco B do Senado, em local de bastante circulação. À direita, o conteúdo pode ser observado, transparecendo o risco. A disrupção foi feita em uma área externa e isolada atrás do Senado Federal.
5 - Outro período interessante foi na época das ameaças de Anthrax, em 2001 e daí para frente até 2005, se bem me lembro. Na ocasião em que houveram diversas correspondências ameaçadoras e suspeitas dirigidas ao Senado, entre outras ocorrências, eu fui um dos servidores que ia avaliar o risco biológico e realizar as descontaminações. Colocava máscara, avental, luvas, pegava um vasilhame de descontaminante muito forte e, enquanto os servidores expostos eram conduzidos para tomar antibióticos poderosos, eu ia descontaminar salas, mesas, computadores e tudo o mais que eu via tinha entrado em contato com o material supostamente contaminado, geralmente um tipo de pó branco, algo como talco ou amido. Nesses momentos utilizei bastante os boroscópios. Utilidade bastante eclética, como já comentei, embora nada supere a missão que recebi de ajudar a engenharia a localizar um rato morto. Em 2012, quando uma servidora foi mordida por um rato, alguém muito inteligente inventou de tascar veneno para ratos no Senado inteiro, incluindo a Secretaria Geral da Mesa e Taquigrafia, locais com piso elevado (a instalação elétrica e de dados fica por baixo). Claro que um rato morreu e ninguém sabia mais o que fazer, ninguém aguentava o odor. Foi aí que entrou o grande otário aqui. Embora eu acatasse ordem superior, eu não ia mandar algum de meus subordinados realizar serviço tão tosco e sair fora, como fez o meu superior, o mesmo que foi preso na operação Métis. Chamei meus subordinados para que me acompanhassem na eventualidade de precisar de alguma ajuda durante o serviço, mas estes não deixaram que eu trabalhasse sozinho. Felizmente em poucos minutos localizamos o cadáver do mamífero roedor.
Acima, carta contendo pó branco recebido no Senado e jogado no lixo por quem o recebeu. Só ao comentar sobre o conteúdo com colegas o risco foi notado pelo servidor. A propósito, pelas ações com risco de morte nem eu nem meus subordinados nunca recebemos qualquer adicional, fosse pela periculosidade, fosse pela insalubridade. Na verdade, pelos serviços prestados não recebi nem um simples "obrigado".
6 - Quando elaborei o Projeto Básico para a aquisição de Sondas Boroscópicas óticas e à plasma, ou seja, de fibroscópios parrudos, o Presidente do Senado, então Senador José Sarney, tinha designado um Assessor de sua confiança para a então Subsecretaria de Segurança. Era um Coronel aposentado do Exército, prova incontestável de que o Presidente se preocupava com a profissionalização dos agentes.
Em geral os colegas mais antigos não gostaram muito e ficaram com um pé atrás, ocorreram alguns atritos, mesmo com o benefício dessa parceria sendo visível e inegável.
Da minha parte o atrito se restringiu a uma única situação. Quando o pedido para a autorização de meu projeto foi para a análise da Diretoria, já com o valor empenhado, o Coronel me convocou e informou que o projeto não iria ser aprovado por causa do valor (e a aquisição nem era cara, o Coronel devia estar acostumado à tesoura impiedosa a que o meio militar é submetido).
Eu perguntei qual a lógica dessa decisão e o Coronel me informou que tinha que se considerar o custo-benefício da aquisição, se valia a pena queimar um cartucho na obtenção dos equipamentos. Eu olhei para o Coronel, e perguntei na cara-dura: "Ora, Coronel, o senhor, um militar, falando de custo-benefício na aquisição de equipamentos que serão utilizados na salvaguarda de informações de interesse nacional? O Coronel sabe que o custo é irrelevante!"
Creio que o Coronel não esperava uma resposta tão ... alinhada, talvez. Não só em pouco tempo eu era o Gestor do Contrato 0060/2000, como passamos a nos respeitar mutuamente.
Esses equipamentos acabaram me auxiliando na compreensão da peneira que era o Senado Federal no tocante ao vazamento de informações. Parte disso pelo fato de que os políticos têm a vaidade maior que o senso de segurança.
Há sempre uma disputa por gabinetes maiores, melhor posicionados. Essa vaidade chega ao ridículo ao ver que parte dos gabinetes se deslocaram nos últimos anos, do seguro Anexo II para a ratoeira que é o Anexo I (o edifício onde ficam as cúpulas é o Principal, as torres de 28 andares são o Anexo I, e os gabinetes após o "Túnel do Tempo" estão no Anexo II). Ou seja, o parlamentar quer ter a bonita visão de Brasília, mesmo que ele mesmo seja um bonito alvo a mais de um quilômetro de distância, e mesmo que qualquer maluco que olhe para as torres enxerguem uma grande fogueira... Ainda por cima esses parlamentares são inconsequentes, pois atentam contra a vida dos funcionários que lá trabalham ao aumentarem o risco do local com a sua presença.
Mas continuando, foi enfiando sondas em buracos, frestas e tubulações que eu percebi que os gabinetes eram mais interligados do que pareciam. Alterações elétricas, no sistema de ar-condicionado, nas instalações hidráulicas, tudo tinha uma característica em comum: a instalação da nova solução, ignorando a antiga. Então, se um furo era na direção que não mais atende, faz-se um furo na nova direção. E o antigo? Deixa pra lá. Precisa de uma nova fiação porque a antiga está velha e os tubos são estreitos? Passa uma nova fiação e mete novos tubos, mais largos. E a instalação antiga? Deixa pra lá.
Isso não é só descuido ou desleixo. Na tentativa de reduzir custos, ou mão de obra, ou de deixar uma reforma mais rápida, a previsão para a desinstalação e recuperação de instalações anteriores foi simplesmente negligenciada. A única preocupação era com a recuperação do ambiente. Creio que ainda é assim. A presença de entulhos e restos de instalação dentro de paredes e galerias até hoje comprova isso.
Pensei de cara que esse campo fértil para a instalação de dispositivos mais elementares poderia levar à tentação aos próprios Parlamentares. Pois até o som ambiente transpassava os gabinetes, estivessem no andar superior, inferior ou ao lado. Sem que a Instituição tivesse a mínima preocupação quanto a disposição de gabinetes. Aliados ao lado de adversários, como poderia um deles resistir à tentação se bastava colocar o ouvido na parede, ou abrir um painel lateral, para que uma conversa ficasse disponível? Escutas de parede, estetoscópios, qualquer coisa poderia ser utilizada para trazer à tona informações as mais variadas.
O que eu fiz a respeito disso? Passei ao setor de Engenharia mais de uma vez uma série de recomendações, e fui cuidar da minha vida. Me preocupei com as vulnerabilidades exploráveis por agentes externos, e especificamente quando havia informação relevante a ser protegida. A respeito daquelas informações políticas, que os parlamentares tanto adoram, o problema era entre eles. Então ficou do jeito que até hoje eles parecem preferir.