* FORTALEZA de LUANDA

MEMÓRIA DE ANGOLA

O RESTAURO DOS AZULEJOS

da fortaleza de São Miguel em luanda

A Fortaleza de São Miguel de Luanda é uma fortificação edificada no ano de 1634  com o objectivo de defesa da cidade. Com o decorrer dos tempos, os interesses, objectivos e fins da fortaleza alteraram-se e nos finais dos anos 30 do século XX foram realizadas importantes obras para ser adaptada a museu (Museu da História). A parte das obras mais relevante e que melhor acolhimento teve, pelo seu elevado valor artístico, foi o revestimento das paredes interiores da casamata com paineis de azulejos, do estilo da azulejaria portuguesa do século XVIII, com a singular beleza dos azuis cobalto.

        Neste conjunto azulejar  são reproduzidos acontecimentos e motivos do século XV ao XIX, relativos à história, fauna e flora de Angola. Ao centro dos paineis de maiores dimenções figuram reproduções de frontespicios do manuscrito da «Historia Geral das Guerras Angolanas», de António de Oliveira de Cadornega (exemplar da Biblioteca Nacional de Paris), e extractos de cartas de Angola e Africa do seculo XVII. As fontes de inspiração artística da maioria dos motivos foram desenhos e  gravuras antigas de diversos autores, e também algumas fotografias, as quais eram reproduzidas integralmente ou em parte, consoante o espaço a pintar e as dimensões da gravura.

        A partir da decada de 70 a deterioração e desaparecimento de azulejos dos paineis foi crescente até ao estado que se encontram hoje. Por isso o seu restauro, é praticamente, a sua reprodução total. Mas sempre, respeitando todos os motivos reproduzidos recorrendo a fotos antigas dos paineis originais e das gravuras que serviram de base de inspiração. Serão também respeitados os metodos de produção tradicionais manuais antigos, quer seja o azulejo de produção totalmente manual ou o vidrado estanifero quer a sua queima para obter os maravilhosos azuis cobalto "fumados" do tempo dos fornos a lenha.

Fotos dos paineis antes e depois de restaurados, e as fontes de inspiração 

 

TEMAS PRINCIPAIS DO CONJUNTO AZULEJAR:

PAINEIS RELATIVOS Á HISTÓRIA DE ANGOLA

PAINEIS SOBRE A FAUNA ANGOLANA

PAINEIS COM BRASÕES DE ARMAS DOS VÃOS DAS JANELAS

MANUFACTURA DOS PAINEIS DE AZULEJO


É no período do governo de João Correia de Sousa que se vai dar o célebre encontro com Jinga que vai a Luanda negociar a paz. Há discrepâncias quanto à data deste encontro, mas o facto em si é que é relevante. 

           Jinga prepara um séquito numeroso e com todos os atributos da sua condição de princesa faz-se anunciar em Luanda. Os portugueses vão recebê-la como uma verdadeira rainha, com tropas perfiladas e descargas de mosquetes, sendo-lhe dada hospedagem e casa condigna.

            No dia marcado para a audiência, Jinga, acompanhada do seu séquito, dirige-se à casa do governador. Entrou para a sala onde este ainda se não encontrava e, num relance percebe que na sala só havia uma cadeira e duas almofadas de veludo franjadas a ouro sobre um tapete.

            De imediato, a perspicaz Jinga percebe que pode ficar em desvantagem. Ficar de pé perante um homem sentado. Ordena a uma das suas escravas que se dobre e lhe sirva de assento e é assim sentada que vai encarar o governador — de igual para igual. Escusado será dizer que esta atitude de Jinga deixou estupefactos todos os presentes, muito particularmente o governador que percebeu imediatamente que a mulher que estava na sua presença ora especial e que deveria usar com ela de toda a diplomacia e cortesia. Até porque muita coisa estava em jogo e um gesto em falso podia representar o recrudescer da guerra.

Baptismo da Raínha  Jinga em 1622 na Igreja Matriz de Luanda.

Heroina do seu país.

 

  Muito provavelmente como estratégia diplomática, Jinga deixa-se baptizar com toda a pompa e circunstância, e muda o nome para Ana de Sousa, tendo por padrinho o próprio governador João Correia de Sousa. Dai ter adoptado o seu apelido, como era costume. Isto terá ocorrido em 1622, contando Jinga 40 anos.

            A verdade é que Jinga deixara em todos os portugueses uma profunda admiração e respeito e vai regressar ao seu reino com prendas preciosas oferecidas pelos portugueses.

            Relata então ao irmão o sucesso da sua missão. Este, entusiasmado com a descrição do baptismo, manda comunicar ao governador que lhe mande missionários para ser também ele baptizado. É incumbido dessa missão o padre Dionísio de Faria, natural do reino de Matamba. Porém, quando Mbandi vê que os portugueses lhe enviaram um padre da sua raça, isto é negro, tomando isso como uma afronta, recomeça de imediato a guerra contra os portugueses que, muito mais bem preparados o vão perseguir. Cobardemente, foge e refugia-se numa pequena ilha do Quanza, onde acaba por morrer ou ser envenenado, a mando da irmã, que percebe que é chegada a sua hora da mandar. Ela possuía já um exército fiel, engrossado continuamente com escravos que fugiam a refugiar-se nas suas terras para escaparem ao seu trágico destino.

            As mensagens entre os portugueses e a rainha Jinga prosseguiam, havendo, por parte do governador, alguma relutância em combater esta mulher que para todos os efeitos era cristã. O governador teria gostado de cumprir a sua palavra, mas as pressões de Lisboa para se aumentar o mercado de escravos para o Brasil eram demasiado fortes para que o governador pudesse agir segundo a sua consciência. 

Mulher Ban-Dimba - (Promenor do Lado esquerdo) 

 painel dividido ao meio por janela, e com nativos como motivos centrais, inspirados em gravuras em baixo reproduzidas do livro "Angola à Contra-Costa"  de Autoria dos exploradores Hermenegildo Capelo e Roberto Ivens.

 

aldeia do lado direito, (pormenor) Vista da cidade de S. Paulo de Luanda no século XVII. Painel inspirado numa gravura da obra de Dapper,  «Discription d'Afrique», Amesterdão, 1688).

 Em fins de 1490, D. João II enviou vários franciscanos, teólogos e homens especialmente escolhidos para o Congo. Este empreendimento de D. João II, bem preparado teológicamente, foi também cuidadosamente organizado do ponto de vista musical. Dada à convicção da ação da Graça através da música litúrgica, as primeiras missas no Congo foram celebradas à altura de solenidades catedralícias. Para isso foram transportados livros litúrgicos, sinos, campainhas e órgãos. Do recebimento dos portugueses pelo soberano de Soio deixou Ruy de Pina relato de valioso interesse musicológico.No dia 2 de abril de 1491, o soberano recebeu o batismo,antes mesmo que a igreja que havia mandado construir ficasse pronta, pois precisava partir para uma batalha contra o povo Tio do lago malebo,também  a sua esposa principal e de um de seus filhos foram batizados. Já se aproveitando da Aliança com Portugal, o rei do Congo levou para a Batalha arcabuzes, barcos e uma bandeira considerada benta, saindo-se vencedor. O batismo realizou-se com solene música sacra. A primeira missa, celebrada não no dia do batismo, mas apenas após a chegada da pedra d'ara, entrou na história da música do Cristianismo extra-europeu como aquela cuja música mereceu pela primeira vez particular consideração.

            

            As negociações ocorrem com sucesso, começando a princesa Jinga por apresentar as desculpas em nome do irmão. A sua maneira de falar e a sua postura vão deixar a assistência perfeitamente espantada. Não podemos esquecer que até ao século XIX houve antropólogos que defenderam que a raça branca era superior á negra. Imaginemos o que não seria no século XVII uma africana saber exprimir-se bem e adoptar uma atitude de superioridade para com os conquistadores.

            No final, João Correia de Sousa argumentou que, para que o acordo ficasse bem cimentado, deveria o irmão de Jinga pagar aos portugueses um tributo anual. Porém, ela contrapôs que tributo só pagavam os povos subjugados, o que não era o caso. Uma última exigência por parte dos angolanos era a devolução dos escravos. Aqui os portugueses não puderam prometer que cumprissem, porque era um negócio que envolvia muita gente, mas mostraram boa vontade para o problema.

            À despedida, o governador, reparando que a escrava se mantinha acocorada na posição de assento, perguntou à altiva Jinga porque não a manda levantar, ao que a sobranceira guerreira angolana terá respondido: “Já não preciso dela, nunca me sento duas vezes na mesma cadeira!”

            A divulgação deste facto foi, em grande medida, obra de um holandês que poucos anos depois fez desenhos deste insólito comportamento e que veio contribuir muito para a aura de admiração que se gerou em torno desta mulher angolana, uma, se não a maior

PAINEIS RELATIVOS À HISTÓRIA DE ANGOLA

Painel 1 restaurado

Recepção do governador João Correia de Sousa à Rainha Jinga no palácio do governador de Luanda, e  a gravura que serviu de inspiração.

Painel 87

 Painel dividido ao meio com um frontespício (F1) da obra de Cadornega. Lado Esquerdo tem uma vista das quedas de água Duque de Bragança no Lucala, (agora chamadas Quedas de Kalandula) inspirada numa foto do IICT, (arquivo Histórico Ultramarino). Lado direito do painel aspecto das Pedras de ielala no rio Zaire (gravuras na rocha feitas por Diogo Cão no limite da navegabilidade do rio Zaire  em Out/Nov de 1485 ), Inspirado em gravura antiga.

Painel 12

  Painel simétrico dividido ao meio por janela, com dois motivos de aldeias indigenas, inspiradas nas gravuras seguintes.

Nas gravações  dos rochedos de Ielala, na margem esquerda do rio vê-se o seguinte:   O Escudo português, constituído por cinco quinas todas viradas para baixo e uma cruz da ordem de Cristo  e a inscrição  “Aqui chegaram os navios do esclarecido rei D.João II de Portugal – Diogo Cão, Pero Anes, Pero da Costa”.Noutro rochedo dois nomes – Álvaro Pires, Pero Escolar e uma sigla . Noutro rochedo os nomes João de Santiago, Diogo Pinheiro (por cima do D, o sinal de uma cruz reduzida), Gonçalo Álvares e Antão e outra sigla. Nesta pedra lêem-se também as palavras “ da doença”, precedidas de uma cruz  ┼, seguida do nome João ou (Gonçalo) Álvares !?, o que quer dizer que o nauta  morreu por doença. O estudo epigráfico desta inscrição revela ser posterior às outras inscrições. A letra (grafia) utilizada é diferente. Há uma opinião sobre este assunto no capítulo das “curiosidades”.    O sinal de uma cruz reduzida por cima do D de Diogo Pinheiro, significaria que o nauta se encontrava afectado pela doença?! Diogo Cão, explorou o Rio Poderoso (Zaire ou Congo) até Ielala, não  foi mais adiante  pelo facto de ter notícias desoladoras de que o rio era intransponível, das muitas cachoeiras no percurso superior,  encontrar uma rota por esta via  até ao Índico, estava fora de questão.

Quedas de água Duque de Bragança

Painel 9 

   Tipos Bana-catuba - (Promenor do lado direito)

 Painel 18

Painel 46 - Diogo Cão  e o levantamento de um padrão na costa de Africa.

Painel inspirado em Aguarela do mestre Roque Gameiro

- reproduzida em baixo.

1483 - Diogo Cão coloca o padrão conhecido por São Jorge, junto à foz da margem esquerda do Rio Congo, num local conhecido por Moita Seca, latitude 6º 3' Sul.


(Ilustração do livro "Quadros da História de Portugal" de Chagas Franco e João Soares).


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