Olá, estudante, na lição anterior, você conheceu outros cálculos de rescisão de contrato individual de trabalho por prazo indeterminado. Aprendeu como proceder quando for um pedido de demissão, solicitado pelo empregado, sem justa causa e com o aviso prévio trabalhado, e em caso de rescisão antecipada de contrato de experiência. Entendeu um pouco mais sobre o cálculo das deduções obrigatórias por lei, como INSS e IRPF, e sobre o depósito de FGTS. Por fim, compreendeu como é uma rescisão no caso de aposentadoria ou morte do trabalhador.
Nesta lição, você entenderá o que é uma jornada de trabalho e sua definição, o que não é considerado como jornada de trabalho e qual é a quantidade de horas que a CLT determina como jornada diária e semanal. Conhecerá quais funções não estão protegidas pela limitação da jornada de trabalho e compreenderá o que caracteriza o intervalo reservado para repouso ou alimentação. Por fim, aprenderá sobre as regras do registro de ponto bem como sua obrigatoriedade, tipos de registradores existentes e como diferenciar e tratar as horas na proporção de 60 minutos.
Logo na nossa primeira lição, você compreendeu que as relações humanas de trabalho nem sempre foram harmoniosas e equilibradas. Longe disso, no início da chamada Administração Moderna e com a Revolução Industrial, houve muita discordância e vários conflitos entre patrões e empregados, principalmente, pela falta de leis trabalhistas que regulassem essa relação. De um lado, empregados que trabalhavam por horas excessivas ganhavam pouco e tinham péssimas condições de vida; de outro, empregadores que se viam diante de inovações tecnológicas queriam ganhar dinheiro com isso e não tinham empregados qualificados (FONSECA, 2020).
Pois é, o surgimento de novas profissões, uma maneira nova de pensar as rotinas de trabalho e o maior fluxo de negociações entre empresas de várias partes do mundo sempre causam mudanças disruptivas (que rompem padrões). Foi assim no século XVIII e está sendo assim no século XXI.
A busca nas relações de trabalho é o equilíbrio entre os recursos disponíveis, os objetivos a serem alcançados e as melhores decisões a serem tomadas. Tudo isso sem deixar de lado as boas relações de trabalho. Mas será que é possível produzir cada vez mais e, ao mesmo tempo, fazer uso de jornadas de trabalho cada vez menores? Será que é possível ganhar mais trabalhando por menos horas? Você sabe como a Lei protege o trabalhador de atos abusivos relacionados às horas de trabalho?
A jornada de trabalho é um assunto antigo que me faz lembrar o conto de fadas chamado Rumpelstiltskin, dos Irmãos Grimm, publicado, pela primeira vez, em 1812. Você já deve ter ouvido essa história quando criança, mas em todo caso relembrarei. A história começa com uma mentira, veja só! Era uma vez um moleiro que tinha muito orgulho de sua linda filha. Um dia, para impressionar o Rei, contou que sua filha era capaz de fiar palha e transformá-la em ouro. Isso era uma enorme mentira, pois eles eram muito pobres e nunca nem tinham visto ouro na vida. Porém o Rei era muito ambicioso e, quando ouviu isso, ficou muito impressionado e mandou trazer a moça até o Castelo.
A filha do moleiro, então, foi trancada em uma torre abarrotada de palha, junto a uma roda de fiar, e o Rei ordenou que ela transformasse toda aquela palha em ouro até o outro dia de manhã, caso contrário, seria executada (sua cabeça seria cortada). Sozinha, no quarto, a moça, desesperada, começou a chorar porque sabia que morreria. Foi então que apareceu um duende e falou que a ajudaria em troca de algum objeto de valor sentimental que ela tivesse. Acordo feito, no dia seguinte, o quarto amanheceu cheio de palha de ouro.
O Rei ficou muito satisfeito, mas mandou trancar a moça em uma sala maior, cheia de muito mais palha que a anterior e, de novo, ordenou que a moça transformasse a palha em ouro até o dia seguinte. Novamente, com a ajuda do duende, a moça executou o serviço, também, em troca de alguma coisa que ela gostasse muito. Por fim, esse trabalho se repetiu ainda no dia seguinte, quando, então, o Rei se deu por satisfeito, porque já tinha se tornado um homem muito rico e não exigiu mais nada.
Quem conhece a história sabe que o duende não era do bem, porém não foi somente ele que cometeu maldades. Esse conto é uma ficção e não se refere a um contexto real de trabalho. Mas já pensou, se fosse de verdade? Quantas normas trabalhistas foram desprezadas pelo Rei? A moça foi recrutada à força, sem contrato de trabalho e acordo e trabalhou três dias seguidos, sem descanso. O Rei utilizou o trabalho forçado da filha do moleiro sem remuneração adequada e sob ameaça de morte, o que configura uma violação de direitos humanos. Além disso, o fato de o Rei ter exigido que a moça realizasse uma tarefa impossível sob ameaça de morte, também, pode ser interpretado como forma de coerção psicológica, o que é considerado uma prática abusiva e ilegal em qualquer contexto.
Desde o surgimento das leis que protegem a relação de trabalho, as empresas buscam caminhos para sobreviver com o seu negócio e prover sua mão de obra de recursos, melhorar a qualidade de produtos e serviços, aumentar a produtividade e produzir com o menor custo possível (FIDELIS, 2020). As normas legislativas existem para equilibrar as relações entre os tomadores de serviços e os prestadores de serviços e, para que abusos não sejam cometidos, há regras a serem respeitadas com relação à duração da jornada de trabalho.
Fidelis (2020) esclarece que, de acordo com o art. 4º, da CLT, considera-se serviço efetivo o período em que o empregado esteja à disposição do empregador, aguardando ou executando ordens. Em outras palavras, como definição, Jornada de Trabalho corresponde ao período em que o trabalhador está à disposição da empresa para o exercício de suas funções.
Em contrapartida, também, de acordo com o art. 4º, § 2º, da CLT, por não ser considerado tempo à disposição do empregador, não é entendido como jornada de trabalho o período que o trabalhador permanecer na empresa por escolha própria, por conveniência ou para exercer atividades particulares, como: práticas religiosas, descanso, lazer, estudo, alimentação, interação entre colegas, higiene pessoal e troca de uniforme (FIDELIS, 2020).
De acordo com Silva (2017), no Brasil, até outubro de 1988, a jornada semanal permitida era de até 48 horas. Com a publicação da Constituição Federal de 1988, a duração normal do trabalho para empregados em qualquer atividade privada mudou e, conforme o art. 58, da CLT, e inciso XIII, do art. 7º, da Constituição Federal de 1988, foi estabelecida como:
Não superior a 8 horas diárias.
Não superior a 44 horas semanais.
Fidelis (2020) explica que a jornada de trabalho é o período realmente trabalhado e, para comprovar o seu cumprimento, é preciso registrar tanto o horário de início quanto o de término. Assim, o art. 58, da CLT, procura delimitá-la por meio do que determina seus incisos:
1º - Não será considerado tempo à disposição da empresa ou horas extraordinárias o período de até cinco minutos no registro do ponto, tanto no início quanto no final do expediente (total de, no máximo, dez minutos diários).
2º - O tempo que o trabalhador levar até o local de trabalho e seu retorno para casa, por qualquer meio de transporte, inclusive, o fornecido pelo empregador, não será computado na jornada de trabalho, por não ser considerado tempo à disposição do empregador.
De acordo com Fidelis (2020), existem cargos que não estão protegidos pela limitação da jornada de trabalho, são aqueles casos previstos no art. 62, da CLT:
I - os empregados que exercem atividade externa incompatível com a fixação de horário de trabalho, devendo tal condição ser anotada na Carteira de Trabalho e Previdência Social e no registro de empregados.
II - os gerentes, assim considerados os exercentes de cargos de gestão, aos quais se equiparam, para efeito do disposto neste artigo, os diretores e chefes de departamento ou filial.
III - os empregados em regime de teletrabalho que prestam serviço por produção ou tarefa (BRASIL, 1943, on-line).
Silva (2017) esclarece que, durante o expediente, deve haver pausa para descanso. O art. 71, da CLT, determina que em qualquer trabalho contínuo com mais de seis horas diárias de duração é obrigatório existir um intervalo reservado para repouso ou alimentação de, no mínimo, uma hora e, no máximo, duas horas. Além disso, seus incisos determinam que:
1º - Se a duração da jornada de trabalho for superior a quatro horas e não exceder seis horas diárias, o intervalo obrigatório deve ser de 15 minutos.
2º - Os intervalos de descanso não serão computados na duração do trabalho, ou seja, não são reconhecidos como horas de trabalho, porém, se não forem concedidos pelo empregador, serão considerados horas extras.
3º - O limite mínimo de uma hora pode ser reduzido se a empresa provar aos órgãos competentes que possui refeitório (cumpre, integralmente, as exigências requeridas) e seus empregados não trabalham sob regime de prorrogação a horas suplementares.
De acordo com Silva (2017), comumente os empregados são contratados como mensalistas, o que significa que as horas trabalhadas serão somadas e pagas todas juntas uma vez por mês. Nesse caso, sempre serão considerados 30 dias para o cálculo dos de trabalho (art. 64, da CLT), mesmo que o mês tenha número de dias inferior ou superior a 30. Se a jornada de trabalho semanal for de 44 horas, o número de horas mensais a ser considerado é de 220 horas. Assim:
Para o cálculo do salário diário é usado o divisor 30.
Para o cálculo do salário hora é usado o divisor 220.
Fidelis (2020) explica que o registro de frequência — conhecido como Registro de Ponto — é uma determinação legal para que o horário de trabalho seja anotado no registro de empregados (art. 74, da CLT). É obrigatória a anotação do horário de entrada e o de saída para empresas com mais de 20 trabalhadores, em registro manual, mecânico ou eletrônico. O registro de frequência deve conter:
1º - O início da jornada de trabalho.
2º - O término da jornada de trabalho.
3º - O intervalo de descanso e refeição. Mas, caso o controle de frequência já fixe o horário de intervalo, o empregador pode isentar o trabalhador de marcar o horário.
Fidelis (2020) esclarece que, desde 2009, as empresas passaram a contar com o controle de ponto eletrônico. A utilização do Sistema de Registro Eletrônico de Ponto (SREP) permitiu determinar regras mais rígidas para o registro de ponto, como:
As empresas foram obrigadas a dispor de mecanismo para a impressão de comprovante de marcação (papel) para o trabalhador.
Os dados armazenados na memória do registro de ponto não podem ser alterados ou apagados.
O equipamento deve ter uma porta USB externa para uso exclusivo dos auditores fiscais.
O equipamento deve ser homologado pelo órgão gestor do trabalho.
Desde 2011, foram regulamentadas formas mais eficientes de controle de jornada, flexibilizando, ainda mais, o registro de ponto eletrônico, a partir da introdução de sistemas alternativos (softwares), atualmente, chamados Registradores Eletrônicos de Ponto (REP). Essa medida é indicada para empresas cujos trabalhadores fazem serviços externos em diversas localidades e querem evitar anotações em papel. O modelo REP-A pode ser adotado desde que seja autorizado por acordo ou convenção coletiva (FIDELIS, 2020).
Outro modelo de registro de frequência utilizado atualmente é o REP-P, que faz o controle de ponto por meio de softwares/aplicativos para computadores, smartphones e tablets e que identifica o trabalhador por meio da geolocalização. Esse aplicativo de controle mobile é interessante para as empresas cujos colaboradores realizam trabalhos externos (por exemplo: visitam clientes ou trabalham em esquema de home office), porque flexibiliza o registro do ponto e armazena os dados na nuvem para consulta (FIDELIS, 2020).
O REP-A e o REP-P são parecidos e a diferença entre os dois é que o REP-P possui mais funções (o REP-A só tem a função de registrar o ponto).
Além do controle de ponto, para o profissional de DP é importante saber realizar a conversão de horas registradas de acordo com a necessidade. Se o intuito é realizar o demonstrativo de horas trabalhadas para o trabalhador conferir, pode ser feito o tratamento dos minutos registrados na proporção de 60 minutos. Mas se o objetivo é o cálculo da Folha de Pagamento, então, é preciso converter as informações de minutos para centésimos de minutos. Dessa forma, o cálculo se torna eficaz (FIDELIS, 2020).
A Tabela 1, a seguir, traz alguns exemplos da conversão dos minutos em centésimos de segundos. Por exemplo, se o registro de ponto marcar 30 minutos, no sistema de folha de pagamento, aparecerão 0,50 centésimos.
Saber determinar a jornada de trabalho dos empregados é uma das funções básicas de um profissional de RH/DP. Porém é muito importante lembrar que o cálculo das horas de um relógio é diferente dos cálculos matemáticos, geralmente, realizados. Para que você possa exercitar um pouco mais sobre a matéria aprendida nesta lição, veja como proceder nos seguintes exemplos:
1º exemplo:
O empregado cumpre 44 horas semanais, de segunda-feira a sábado, seis dias na semana. Quantas horas por dia ele deve trabalhar?
1º passo: calcular quantas são as horas diárias = 44 horas semanais / 6 dias = 7,3333.
Cálculo parcial: o empregado trabalha sete horas, porém o resultado 0,3333 é centesimal e precisa ser convertido.
2º passo: fazer a conversão de centésimos de minutos para minutos = 0,3333/100*60 = 0,20.
Resultado: o empregado trabalha sete horas e 20 minutos por dia, de segunda-feira a sábado.
2º exemplo:
O empregado cumpre 40 horas semanais, de segunda-feira a sábado, seis dias na semana, porém, no sábado, ele trabalha somente quatro horas. Quantas horas por dia ele deve trabalhar?
1º passo: separar as quatro horas do sábado que já estão determinadas. Sobram 36 horas em cinco dias da semana.
2º passo: calcular quantas são as horas diárias = 36 horas semanais / 5 dias = 7,20.
Cálculo parcial: o empregado trabalha sete horas, porém o resultado 0,20 é centesimal e precisa ser convertido.
2º passo: fazer a conversão de centésimos de minutos para minutos = 0,20/100*60 = 0,12.
Resultado: o empregado trabalha sete horas e 12 minutos por dia, de segunda à sexta-feira, e quatro horas no sábado.
BRASIL. Decreto Lei Nº 5.452 de 1º de maio de 1943. Aprova a Consolidação das Leis do Trabalho. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del5452.htm. Acesso em: 5 maio 2023.
FIDELIS, G. J. Gestão de pessoas: rotinas trabalhistas e dinâmicas do Departamento de Pessoal. São Paulo: Érica, 2020.
FONSECA, V. S. Introdução à teoria geral da administração. Curitiba: Contentus, 2020.
SILVA, M. L. Administracao de departamento de pessoal. São Paulo: Saraiva, 2017.