Como vai, caro estudante? Na lição passada, trabalhamos o processo que levou a criação da CLT, o principal conjunto de leis que organizam as relações entre empregador e empregado. Nela, você teve uma visão panorâmica da evolução do trabalho até a forma assalariada; entendeu que os direitos trabalhistas são resultantes de um processo de lutas e conquistas; compreendeu o contexto de surgimento da principal legislação trabalhista do Brasil, a CLT e, ainda, conheceu as linhas gerais estabelecidas por suas normas.
Nesta lição, daremos sequência às rotinas trabalhistas. Você irá conhecer mais de perto o direito de férias, entender que a sua conquista foi resultante de um longo processo de lutas, acompanhar a evolução das principais leis a respeito, identificar as principais regras vigentes no Brasil e, ainda, compreender a importância desse conhecimento para o departamento de Recursos Humanos. Como futuro técnico em Administração e como gestor, conhecer a legislação trabalhista vigente e atuar para o seu efetivo cumprimento é um requisito fundamental para que o departamento de Recursos Humanos consiga exercer o seu papel.
Pronto para entender as principais regras sobre as férias? Afinal, o descanso, assim como o trabalho, é vital para o ser humano.
Conhecer sobre as múltiplas disciplinas, encontrar colegas e cultivar amizades, conviver com professores e aprender com os muitos personagens que compõem o ambiente da escola são experiências necessárias e enriquecedoras. O tempo que você passa nesse universo contribui para o seu crescimento intelectual, emocional e relacional. Estar em atividade é importante e necessário para a nossa evolução. Mas também cansa, não é mesmo? Por isso, é preciso que haja intervalos para que a mente se ocupe de outros temas, o corpo experimente outro ritmo.
Assim como necessitamos de uma boa noite de sono depois de um dia intenso ou de um período de pausa após os exercícios físicos (seja no esporte ou no treino da academia), o recesso posterior a meses de trabalho, faz-se necessário. Revigora as energias, propicia o surgimento de novas ideias, estimula o desenvolvimento de novas ações.
Você também fica na expectativa pela chegada das férias? Percebe como elas são importantes para uma retomada mais produtiva? Será que quando pensamos no trabalho, é a mesma expectativa?
Vamos entender como esse direito surgiu e evoluiu? Por aqui, é tempo de trabalho e de dedicação! Tenho certeza que, por aí, também. Então, vamos juntos.
Muitos colaboradores consideram 30 dias muito tempo para o descanso, por isso, optam por "vender parte das férias" para o empregador. Além do mais, o valor recebido pode ser útil para o empregado. Mas como esse processo ocorre? Quem tem direito? Quantos dias podem ser vendidos?
É importante que a empresa, dentro de suas possibilidades, atenda aos pedidos do colaborador, pois uma boa relação entre as partes é essencial para o crescimento e sucesso da organização.
Para o case dessa lição, trago a você algumas informações sobre o chamado abono pecuniário. Como profissional da área da gestão, conhecer a legislação faz muita diferença na sua atuação.
Antes dessa importante conquista trabalhista, o direito a um período de descanso remunerado era um sonho distante para o trabalhador. Com rotinas exaustivas – as jornadas variavam entre 12 e 16 horas de trabalho diário –, as folgas ficavam restritas a alguns dias santos, seguindo os critérios ditados pelos empregadores. Como você viu na lição passada, foi a partir da Revolução Industrial que as estruturas e a organização do trabalho tiveram um processo de modificação. Com o desenvolvimento da máquina a vapor, as fábricas passaram a empregar inúmeros operários (inclusive mulheres e crianças), com péssimas condições de trabalho e alto índice de acidentes. Bastantes descontentes, os trabalhadores organizaram movimentos de reação:
O compartilhamento da insatisfação, discutido em grandes aglomerações de pessoal nas fábricas, acabou levando a um associativismo, que ganhou caráter combativo para a obtenção de melhorias. O sindicalismo e suas reivindicações se concentraram primeiramente no âmbito das fábricas, mas depois avançaram sobre o próprio espaço público, gerando assim grande atenção e temor pelo empresariado e pelas autoridades (MOTTA, 2019, p.3, grifos nossos).
Com as frequentes e numerosas mobilizações do operariado, aderindo aos sindicatos e movimentos de trabalhadores, aos poucos, alguns países começam a conceder certos direitos mínimos, mesmo que ainda restritos a determinadas categorias. De acordo com Motta (2019), esse processo não foi uniforme, e países como Dinamarca, França e Inglaterra são considerados os pioneiros no tema, com os primeiros registros de concessão de férias datados entre 1821 e 1872.
Até mesmo a Igreja Católica posicionou-se em relação à exploração dos trabalhadores, proclamando a chamada encíclica Rerum Novarum, “com críticas à situação de injustiça social e recomendações de intervenção dos Estados como meio legítimo para se coibir os abusos do poder econômico sobre o trabalho (inclusive de jornada). Defendia-se a necessidade de períodos de descanso” (MOTTA, 2019, p.3, grifos nossos).
No século XX, sobretudo após o término da Primeira Guerra Mundial (1914-1918), há uma ampliação dos direitos dos trabalhadores. Com o objetivo de amenizar as revoltas e a adesão às ideias socialistas (a Rússia havia acabado de derrubar a monarquia e instalar um governo proletário), as grandes potências ocidentais criam em 1919, a Organização Mundial do Trabalho (OIT). Através de recomendações e convenções, a OIT procurou pressionar os países a criarem legislações que melhorassem as condições de trabalho - inclusive o direito de férias.
Vejamos um breve histórico da criação de leis que asseguraram esse direito aos trabalhadores pelo mundo, como aponta Motta (2019):
1919: Áustria cria sua primeira lei sobre o direito de férias, aplicada à totalidade dos trabalhadores assalariados.
Entre 1919 e 1925: Finlândia, Itália, Tchecoslováquia e Polônia concederam férias a operários, mineiros e jornalistas.
Entre 1926 e 1934: Luxemburgo, Grécia, Romênia, Chile, México, Espanha, Suécia e Portugal criam suas leis a respeito.
Em 1936: ano em que a legislação avançou na França, Iraque, Bélgica e Bulgária.
Portanto, podemos dizer que a década de 1930 marcou a instauração das férias remuneradas pelo mundo – em 1938, 40 países possuíam leis a respeito. Porém, foi apenas após a Segunda Guerra Mundial (1939-1945) que os direitos foram estendidos à maioria dos trabalhadores. Alguns documentos importantes marcam esse período:
A Convenção nº 52 da OIT (aprovada em Genebra, em 1936): ratificada pelo Brasil, em 1938, previa o direito a férias remuneradas de, no mínimo, seis dias úteis.
A Recomendação nº 47 da OIT (1936): propôs novos avanços como o aumento do período de férias conforme a antiguidade no serviço.
A Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948), proclamada pela Assembleia Geral da ONU, previu o direito ao repouso e aos lazeres e, especialmente, a uma limitação razoável da duração do trabalho e férias periódicas remuneradas.
No Brasil, como você aprendeu na lição passada, na medida em que o processo de industrialização foi ganhando força, os movimentos de trabalhadores também se organizaram para reivindicar seus direitos. O direito a férias em nosso país teve início de maneira informal, concedido pontualmente por algumas empresas. Aos poucos, o Estado brasileiro foi estendendo o benefício a determinadas categorias. Vejamos, de acordo com Motta (2019), como ocorreu essa evolução aqui:
Em 1889, foram garantidas, através de Aviso Ministerial específico, férias anuais remuneradas de 15 (quinze) dias aos trabalhadores do Ministério da Agricultura, Comércio e Obras Públicas.
Em 1890, esse direito foi estendido aos operários diaristas e ferroviários e, mais tarde, a todos os empregados de estabelecimentos comerciais, industriais e bancários, por meio da Lei nº 4.982/1925.
Em 1933, o Decreto nº 23.103, regulamentou a concessão de férias aos empregados em estabelecimentos comerciais e bancários e em instituições de assistência privada.
Em 1934, o Decreto nº 23.768, concedeu o direito de férias aos empregados em estabelecimentos de qualquer natureza, modalidade ou ramo de atividade industrial, empresas jornalísticas, de comunicações e transportes terrestres e aéreos e de serviços públicos, mas exigia a sindicalização dos empregados para se fazer jus ao direito.
Constituição de 1934, tornou constitucional o direito de férias no Brasil.
Com a criação da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), em 1943, vários direitos foram concedidos aos trabalhadores, sendo, posteriormente, alterados:
Direito a férias estendido aos trabalhadores rurais.
15 (quinze) dias úteis de férias ao empregado, após período aquisitivo de 12 (doze) meses.
Gozo das férias necessariamente nos 12 (doze) meses seguintes à aquisição (período fruitivo).
Vedação à acumulação de períodos.
Fracionamento de até 2 (dois) períodos, sendo um deles não inferior a 7 (sete) dias.
Definição da época do gozo à critério do empregador.
Férias em período único para menores de 18 (dezoito) e maiores de 50 (cinquenta) anos de idade.
Concessão das férias por escrito, mediante recibo, com antecedência de, no mínimo, 8 (oito) dias.
Houve mudanças em alguns outros governos posteriores, como aumento do período para 30 dias corridos (desde que não houvesse faltas) e a especificação de penalidades pela não concessão das férias no prazo oportuno. A Constituição de 1988 descreveu a previsão de férias como um dos direitos e garantias fundamentais do cidadão, determinando que, nesse período, o salário seja acrescido de um terço.
Mas, segundo a CLT, quais são as regras para tirar férias? Todo contratado com carteira assinada tem direito a férias remuneradas, levando-se em consideração alguns critérios:
O Período Aquisitivo: corresponde a 12 meses de trabalho de um empregado em uma empresa.
O Período Concessivo: período (de 12 meses, logo após o período aquisitivo) que a empresa dispõe de prazo para conceder as férias.
O Período Indenizatório: na eventualidade da perda do prazo para a concessão das férias, é contado a partir do período concessivo.
Segundo Motta (2019), a Reforma Trabalhista de 2017 trouxe algumas modificações específicas sobre o tema:
Ampliação do tempo de férias dos empregados em tempo parcial, que passaram a gozar também de 30 (trinta) dias de férias como os demais empregados e direito ao abono pecuniário (possibilidade de venda de 1/3 do período).
Possibilidade de fracionamento das férias em até 3 períodos, a critério do colaborador.
Ampliação do período mínimo de gozo de férias, devendo o principal ser de, no mínimo, 14 (quatorze) dias corridos e os demais de 5 (cinco) dias corridos cada um (no caso de triplo fracionamento).
Vedação do início do período de férias nos 2 (dois) dias que antecedem feriado ou o dia de repouso semanal remunerado.
Liberação do particionamento das férias por trabalhadores menores de 18 (dezoito) anos e maiores de 50 (cinquenta) anos de idade.
Além das férias fracionadas, modificadas pela Reforma Trabalhista de 2017, existem outros tipos de férias:
Opção de redução de custos em determinadas circunstâncias, são concedidas a todos os colaboradores da organização no mesmo período. Podem ser fracionadas em dois momentos no decorrer do ano e são uma decisão do empregador. Devem ser comunicadas aos empregados e ao Ministério Público com antecedência.
Calculadas com base no período trabalhado. São concedidas quando o colaborador é demitido sem justa causa ou pede demissão: o valor das férias proporcionais entra no cálculo do acerto a ser pago.
Referem-se àquelas que não foram desfrutadas no período concessivo. O empregador tem até 12 meses depois do período aquisitivo (12 meses de trabalho do colaborador na empresa) para conceder as férias. Em caso de descumprimento, as férias devem ser pagas em dobro.
O empregado, conforme Silva e Rezende (2016), pode converter ⅓ do período de férias a que tiver direito em abono pecuniário (conhecido como "vender férias"). O direito é assegurado pela CLT e tem algumas regras, por exemplo: deve ser solicitado até 15 dias antes do término do período aquisitivo; tem duração máxima de 10 dias; somente o empregado pode requerer o abono; e, deve ser pago, assim como a remuneração de férias, até 2 dias antes do início do período de descanso.
O conhecimento acerca das rotinas trabalhistas é fundamental para a gestão de pessoas. O departamento de Recursos Humanos tem, como parte de seus objetivos, o compromisso de proporcionar à empresa colaboradores treinados e motivados, colaborar para o desenvolvimento e a manutenção da qualidade de vida no trabalho, manter políticas éticas e socialmente responsáveis, contribuir para que a organização realize a sua missão e conquiste os seus objetivos – e, certamente, tudo isso passa pelo cumprimento das legislações trabalhistas.
Prezado estudante, nessa lição você conheceu o longo processo de lutas pelo direito a férias, identificou a evolução das leis que tratam a respeito do tema, sobretudo no Brasil, entendeu as principais regras que norteiam essa importante temática das relações de trabalho. Como futuro técnico em Administração, você está apto a contribuir para que a empresa cumpra a legislação vigente, evitando insatisfação dos colaboradores, além de onerosos e desgastantes processos trabalhistas.
Para encerrarmos, proponho que assista ao vídeo a seguir. Ele traz um interessante resumo dos principais pontos relacionados ao direito a férias. Depois de assisti-lo, comente o que podemos entender como o direito de férias, período aquisitivo, os fatores que podem afetar o cálculo do período aquisitivo, o período concessivo e o fracionamento das férias. Depois de analisar os pontos propostos, debata com os colegas suas impressões. Bom trabalho!
BRASIL. Consolidação das Leis do Trabalho. Senado Brasileiro, 1946. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del5452.htm. Acesso em: 29 fev. 2024.
MOTTA, G. D. Evolução histórica do direito de férias no Brasil. Revista da ABET. Paraíba, v. 18, nº 1, p. 104-119, jan./ jun. 2019. Disponível em: https://periodicos.ufpb.br/index.php/abet/article/view/38468/27550. Acesso em: 29 fev. 2024.
SILVA, M. L.; REZENDE, M. E. T. Rotinas trabalhistas: legislação e práticas para gestão de pessoas. São Paulo: Érica, 2016.