Como vai, estudante?
Na lição anterior, você conheceu o cenário de trabalho propiciado pela Indústria 4.0, identificou os novos segmentos profissionais oriundos da automação e reconheceu algumas de suas vantagens. Além disso, entendeu o conceito de uberização e refletiu sobre os desafios trazidos por essa nova forma de trabalho.
Dando continuidade aos nossos estudos sobre o tema, você conhecerá três tipos de trabalhadores: os chamados profissionais autônomos, os profissionais liberais e os terceirizados. Ademais, identificará as principais características de cada um, reconhecerá suas vantagens e desvantagens e, ainda, refletirá sobre seus desafios.
Como futuro técnico em Administração, compreender a composição do trabalho na contemporaneidade é essencial para que você conheça as especificidades do universo profissional que podem estar presentes em uma organização, tendo, dessa forma, embasamento para contribuir na condução dos seus Recursos Humanos. Vou apresentá-lo a esses profissionais! Seguimos juntos!
Ser engenheiro e trabalhar até a aposentadoria na mesma empresa. Passar no exame da OAB, ser contratado para atuar no setor jurídico de um grande banco e lá construir uma carreira. Formar-se em medicina e ter o próprio consultório. Os sonhos relacionados à profissão mudam no decorrer do tempo, assim como muda a realidade em que eles poderão ser concretizados.
As relações sociais ganharam outras conformações no século XX. O mundo globalizado, sobretudo a partir da Segunda Guerra Mundial (1939–1945), inaugurou novos mercados e trouxe diferentes relações de trabalho. As gerações, antes acostumadas a exercer uma única profissão em toda a sua vida, frequentemente trabalhando durante décadas na mesma empresa, passaram a conviver com outras realidades. Agora, as gerações mais recentes mudam de profissão, transitam entre empresas e vivem em um cenário em que a carteira de trabalho não é mais sinônimo de trabalho; embora ainda se trabalhe muito, as formas de contratação mudaram.
Seja por opção, seja por necessidade, o trabalhador tem convivido com novos modelos que se, por um lado, trazem mais liberdade, por outro, provocam também a sensação de insegurança. Os direitos trabalhistas no Brasil sofreram uma grande flexibilização em 2017. A nova legislação atende às necessidades dos setores produtivos, cada vez mais envoltos na competitividade dos mercados, mas também expõe os trabalhadores à precarização.
As pessoas ao seu redor trabalham com carteira assinada? São profissionais liberais? Conhece alguém terceirizado? Embora possam estar trabalhando, nem todos, necessariamente, estão empregados. Confuso para você? Vamos entender!
Para esse case, trago para você um informativo que trata das diferenças entre as modalidades de trabalho que abordaremos na lição. Produzido pelo Tribunal Regional do Trabalho de São Paulo, ele destaca, dentre outros pontos, uma prática que se assemelha ao modelo do autônomo e que é bastante comum nos dias de hoje, a chamada pejotização. É fundamental que trabalhadores e empresas conheçam as várias formas de contratação e quais são as implicações que elas trazem. Isso evita conflitos e judicialização das relações!
Como temos abordado desde as lições anteriores, as transformações têm sido uma das principais tônicas da contemporaneidade. Sendo um reflexo direto desse processo, o mundo do trabalho, também, apresenta aceleradas e profundas mudanças, com repercussões diversas, como nas relações entre empregador e empregado, no mercado e na organização social.
Diante do cenário desafiador, todos os setores envolvidos nas alterações do trabalho buscam compreender as novas dinâmicas e, a partir dos seus próprios interesses, marcar posições e defender a sua classe. Assim como ocorre em todo processo social, quando há mudanças coletivas — como no comportamento, nos valores ou nas formas de organização —, as leis passam por um estágio de reestruturação, de modo que possam responder às demandas das recentes configurações sociais.
Para que você possa entender a atual configuração do trabalho no Brasil é preciso diferenciar dois conceitos importantes: a relação de emprego e a relação de trabalho:
Ocorre quando estão presentes os requisitos dos Arts. 2º e 3º da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), que considera como empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a um empregador, sob a dependência dele e mediante salário, refletindo a existência de um vínculo empregatício, independentemente, conforme Romar (2022), se o trabalho é realizado no estabelecimento do empregador, executado no domicílio do empregado ou realizado a distância, desde que estejam caracterizados os pressupostos da relação de emprego (Art. 6º, CLT). São características da relação de emprego (e devem estar presentes ao mesmo tempo):
Pessoalidade: o empregado deve realizar as funções a ele determinadas, sem que possa transferir a responsabilidade para terceiros, estando vinculado ao serviço.
Subordinação: há uma relação hierárquica entre empregador e empregado.
Não eventualidade (continuidade ou habitualidade): a prestação de serviços ocorre rotineiramente, e não de forma esporádica.
Onerosidade (salário): requisito essencial desse tipo de relação, a remuneração deve ser paga ao empregado.
De caráter mais genérico, é caracterizada por ser uma prestação de serviço laboral em que são acordadas (entre contratante e contratado) as funções e atividades que devem ser cumpridas, além do prazo de duração. A função pode ser remunerada ou voluntária, ter um contrato formal ou um acordo entre as partes. Não caracteriza vínculo empregatício.
Para facilitar a compreensão, pode-se dizer que “a relação de trabalho é gênero, sendo a relação de emprego uma de suas espécies” (ROMAR, 2022, p. 62, grifo nosso]). Dessa forma, é correto dizer, portanto, que “todo empregado é trabalhador, mas nem todo trabalhador é empregado” (ROMAR, 2022, p. 55, grifo nosso).
Existem vários tipos de relações de trabalho (ou seja, que não possuem vínculo empregatício, não apresentando uma ou mais das características de emprego, conforme vimos anteriormente, que são: pessoalidade, subordinação, não eventualidade e salário). Vamos conhecer algumas das principais formas desse tipo de relação:
O Trabalho Autônomo ou Freelancer
É aquele que se desenvolve por conta própria, sem subordinação.
Pode atuar como pessoa física ou jurídica.
É executado de forma habitual, mas para destinatários diferentes.
Esse tipo de trabalhador exerce suas atividades com independência, sem horários rígidos, podendo ter auxílio de terceiros.
Possui liberdade para conduzir a execução do serviço.
Estabelece seu preço, mas, em contrapartida, assume os riscos da atividade.
É preciso organização para cumprir os prazos e as condições acordados com os clientes.
A remuneração não é estável, podendo oscilar bastante.
Não há 13º salário nem férias remuneradas.
Deve pagar seus tributos e encargos sociais. Precisa contribuir com o INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) e ISS (Imposto Sobre Serviços). Caso o profissional seja uma pessoa jurídica, também, existe o pagamento de contribuições, como Cofins (Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social), PIS (Programa de Integração Social) e CSLL (Contribuição Social sobre Lucro Líquido).
Para prestadores de serviço que não possuem CNPJ e são contratados esporadicamente, o RPA (Recibo de Pagamento Autônomo), emitido por quem contratou o serviço, é uma alternativa que permite comprovar o pagamento a pessoas físicas (autônomos) sem caracterizar o vínculo CLT (Consolidação de Leis Trabalhistas).
Embora com muitas diferenças entre eles, existem dois tipos de trabalhadores autônomos:
Os prestadores de serviços de profissões não regulamentadas, como pintor, marceneiro, pedreiro, encanador, babá, cuidador de pets, manutenção de computadores, eletricista, etc.
Os prestadores de serviços de profissões regulamentadas, criadas ou aceitas por meio de lei sancionada pela Presidência da República, como psicólogo, médico, advogado, dentista, engenheiro, nutricionista e todos os que possuem conselhos de regulamentação e fiscalização. Essas profissões só podem ser exercidas por pessoas devidamente qualificadas - os chamados profissionais liberais.
Os profissionais liberais podem ser autônomos (como foi dito anteriormente), ou seja, trabalhar sem vínculo empregatício, ou podem também estar vinculados a uma ou mais empresas. Segundo a Confederação Nacional das Profissões Liberais (CNPL), o conceito de trabalhadores liberais
[...] diz respeito àqueles profissionais, trabalhadores, que podem exercer com liberdade e autonomia a sua profissão, decorrente de formação técnica ou superior específica, legalmente reconhecida, formação essa advinda de estudos e de conhecimentos técnicos e científicos” (O PROFISSIONAL..., 2012, on-line).
Dessa forma, o profissional liberal exerce uma profissão que tem seu próprio regulamento e regras bem definidas — podendo exercê-la como empregado ou trabalhar por conta própria (autônomo). A regulação e fiscalização desses ofícios, normalmente, são feitas pelos conselhos ou órgãos de classe, como o CFM (Conselho Federal de Medicina), o CFO (Conselho Federal de Odontologia), o CONFEA (Conselho Federal de Engenharia e Agronomia), a OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), o CFP (Conselho Federal de Psicologia), entre outros, e suas representações regionais.
Agora que você compreendeu os conceitos de trabalhador autônomo e profissional liberal (que pode ser autônomo ou não), conheceremos algumas das principais vantagens e desvantagens de ambos:
Vantagens
Flexibilidade de horários e rotinas.
Autonomia na escolha dos serviços a serem realizados.
Autonomia na condução do serviço.
Autonomia para negociar preços e prazos.
Recebe sem intermediários.
Desvantagens
Como o seu pagamento não está vinculado à emissão de Nota Fiscal, não pode ser enquadrado como Simples Nacional (regime compartilhado de arrecadação, cobrança e fiscalização de tributos aplicável às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte), o que aumenta a carga tributária.
Instabilidade dos rendimentos.
Não ter acesso aos direitos trabalhistas.
Vantagens
Atuar na profissão escolhida, amparado por uma regulamentação.
Aumento de rendimentos, dependendo da sua produtividade.
Apoio do conselho ou órgão de classe.
Se for empregado, a correção salarial é realizada conforme a negociação sindical da sua categoria e garantia dos direitos trabalhistas.
Desvantagens
Em alguns casos, como o dos advogados, necessidade de aprovação pelo respectivo órgão.
Subordinação à regulamentação do conselho ou órgão de classe.
Os profissionais autônomos, sejam ou não profissionais liberais, devem estar atentos para não prestarem serviços sem a devida regulamentação, pois, posteriormente, poderão ter problemas legais, tendo, inclusive, que pagar mais impostos. Uma das alternativas para a sua regularização profissional é o cadastro como Microempreendedor Individual (MEI) — categoria de regime jurídico indicada para iniciar um negócio com limite de faturamento de R$ 81 mil/ano em 2024.
Uma outra modalidade de trabalho, cada vez mais presente no Brasil, é a terceirização. Tendo seu surgimento durante a Segunda Guerra Mundial (1939–1945), ela nasceu da necessidade das indústrias bélicas de fabricarem em grande escala, dedicando-se às produções específicas, ligadas diretamente aos seus objetivos, as chamadas atividades-fim (como a produção de armamentos, canhões e munições), e contratando outras empresas para as atividades-meio, aquelas que eram intermediárias (como a fabricação de peças).
Da perspectiva da empresa, uma vez focada na atividade-fim, a terceirização contribui para o aumento da produtividade e a melhoria da qualidade do produto. Além disso, a redução de encargos trabalhistas e previdenciários é bastante significativa, proporcionando corte de custos, liberação de recursos para investimentos e aumento dos lucros — incentivando, inclusive, que muitas organizações adotem a terceirização até mesmo de alguns setores da atividade-fim. Portanto, podemos dizer que a terceirização é a contratação de uma empresa para realizar determinados serviços do processo produtivo da empresa contratante. Da perspectiva do trabalhador, o processo de terceirização traz um cenário de insegurança. A perda do emprego e a mudança das estruturas das atividades são riscos que preocupam, provocando o receio da precarização do trabalho.
Como salienta Campos (2018), nessa transição, normalmente, as atividades que são terceirizadas passam de uma empresa de grande porte para outra, menos estruturada, gerando desafios para os direitos do trabalhador, pois empresas pequenas/precárias encontram mais dificuldades para oferecer garantias do cumprimento desses direitos. Ademais, em geral, o processo de sindicalização e de mobilização fica prejudicado — impactando, sobretudo, nas negociações coletivas. Vamos entender algumas vantagens e desvantagens da terceirização, de acordo com Gimenes et al. (2016):
Vantagens
Concentração da empresa na sua área específica de atuação.
Redução de desperdícios.
Aumento da especialização.
Melhoria da qualidade.
Otimização dos produtos.
Aumento da produtividade.
Maior agilidade no processo de decisão.
Redução dos níveis hierárquicos.
Redução do quadro direto de empregados.
Desvantagens
Risco de desemprego.
Possibilidade de não absorção da mão de obra dispensada.
Perda do vínculo com o empregado.
Conflito com os sindicatos.
Precarização do trabalho.
Dificuldade de encontrar boas empresas para o estabelecimento de parcerias.
Ainda que a terceirização possa ser vantajosa para vários setores, é importante que, apesar da divergência de interesses, o trabalho decente seja preservado. Com as mudanças impostas pelo mundo global, a necessária busca pela produtividade/lucratividade não deve implicar em precarização do trabalho.
Estudante, encerramos uma parte muito oportuna do nosso assunto. Ao analisarmos algumas das formas do trabalho contemporâneo, você conheceu os profissionais liberais, os autônomos e os terceirizados, compreendeu as características de cada um, identificou algumas importantes diferenças entre eles e entendeu que há vantagens e desvantagens que envolvem a sua adoção. Em nosso case, você pôde perceber melhor essas diferenças e, ainda, conhecer a prática de pejotização — compreendendo os riscos que a empresa corre se ela não for implantada adequadamente.
Como futuro técnico em Administração, conhecer as várias formas de trabalho, com suas implicações, é fundamental para compreender o funcionamento geral da empresa, seus objetivos e suas condutas com os colaboradores ou prestadores de serviços. Para que possamos ampliar o estudo, proponho que você assista ao vídeo a seguir. Ele traz uma discussão bastante relevante para as empresas: Contratar ou terceirizar?
Após assisti-lo, comente os pontos que a organização deve avaliar. Depois de assistir ao vídeo e analisar os pontos propostos, debata com os colegas suas impressões. Bom trabalho!
CAMPOS, A. G. Terceirização do trabalho no Brasil: novas e distintas perspectivas para o debate. Brasília: IPEA, 2018. Disponível em: https://repositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/8258/1/Terceiriza%C3%A7%C3%A3o%20do%20trabalho%20no%20Brasil_novas%20e%20distintas%20perspectivas%20para%20o%20debate.pdf. Acesso em: 27 fev. 2024
O PROFISSIONAL liberal. CNPL, c2012. Disponível em: https://www.cnpl.org.br/o-profissional-liberal/. Acesso em: 27 fev. 2024.
GIMENES, A. M. et al. Terceirização: vantagens e desvantagens para as organizações. Londrina: Faculdade Inesul, 2016. Disponível em: https://www.inesul.edu.br/revista/arquivos/arq-idvol_48_1488488546.pdf. Acesso em: 27 fev. 2024.
ROMAR, C. T. M. Direito do trabalho. São Paulo: Saraiva, 2022.