Março

31/03 - Sautanz

Sautanz é a dança do abate do porco?

Existe em muitas comunidades de língua alemã, inclusive no Brasil, festas que comemoram o abate do suíno para consumo. Trata-se do momento em que as pessoas se reúnem não só para matar o porco, mas para juntos prepararem diferentes pratos e produtos de origem animal. Normalmente é chamado de Schlachtfest, Schlachttag ou Schweineschlacht, mas há localidades que a denominam como “Sautanz”, a “Dança da Porca”.

Por mais que na atualidade haja uma grande discussão sobre a necessidade ou não do consumo de produtos de origem animal, o tema foi tratado como tabu até meados do século XX. Sem essa discussão, eram fortes os eventos comunitários ligados ao abate do porco e o motivo para isso era simples: não tendo refrigeração, o animal precisava ser morto, limpo e todas as partes processadas e distribuídas antes que estragasse. Desta forma, o trabalho coletivo garantia atender a todos os prazos e ainda os participantes levavam uma parte do que fizeram para casa. Costelas defumadas, linguiças, morcilha, bacon, banha,... mais de 40 produtos e subprodutos: havia o aproveitamento total do suíno. Além de evitar o desperdício, tratava-se de respeitar a vida que foi sacrificada para tornar-se alimento.

“Sau” é, no alemão gramatical, a porca que teve filhotes. É interessante que em alguns locais tenham chamado esse momento do abate de “Sautanz”, comparando o processo a uma dança. De toda forma, não se trataria de algo realmente estranho, já que na cultura popular era comum ter muitos adjetivos e expressões relacionadas aos porcos, como no português “porcaria” ou “porcalhada”; contudo, nem sempre o suíno tinha caráter negativo, podendo, por exemplo, ser relacionado a boa sorte e fartura.

Já a dança “Sautanz” não se pode precisar se o nome tem a mesma origem da festa. Ela faz parte de um conjunto de músicas e coreografias em que a primeira parte é em marcha e a segunda é em valsa. São elas a Neubayrische, Fieberbrunner, Tulfer Platscher, Kneiper, Jägermasch, entre outras, populares no sul da Alemanha e Áustria.

Quer saber mais? culturaalema.com.br/tanz ou escute a Sautanz em https://www.youtube.com/watch?v=2NZlqaTQaWo .

30/03 - Mineth

Mineth é um minueto só para os jovens “puros”?

Imitar os endinheirados não é novidade do presente. Era normal em muitas localidades europeias que os camponeses buscassem copiar hábitos e vestimentas dos seus “superiores”, que nas monarquias eram os nobres ou burgueses com títulos de nobreza. Não por acaso, sobreviveram dentre as danças típicas muitas coreografias que direta ou indiretamente trazem elementos da corte, como formações em quadrilhas - de quatro pares -, em fileiras, ou com cumprimentos mais empolados. A “Mineth”, da antiga Boêmia, é uma delas.

Na França do século XVII era símbolo da aristocracia as festas com minuetos, danças onde os participantes mal se tocavam; contudo, com movimentos graciosos e lentos podiam trocar olhares, uma possível abertura para futuros diálogos. Como os hábitos franceses, em especial os parisienses, acabavam se espalhando às demais cortes européias, os minuetos se difundiram para todos os cantos do velho mundo. E da mesma forma que alcançaram as cortes estrangeiras, igualmente foram imitados pela população camponesa.

Na área de língua alemã de Kuhländchen, chamada Kravařsko em tcheco e que fica na antiga Morávia do Norte, essa dança sobreviveu. Segundo alguns, ela conseguiu manter-se preservada frente ao tempo. Lá era chamada de “Mineth”, ou para os visitantes “Kuhländler Mineth”. Contam que essa música era especialmente executada por jovens “puros”, solteiros, nas festas da comunidade. Não casualmente, há registros de que esse resquício do minueto era apresentado nos anos de 1970 na Baviera. Eram moços e moças descendentes de alemães da Boêmia, que tinham o intuito de preservar tradições anteriores à diáspora pós Segunda Guerra Mundial.

Quer saber mais? culturaalema.com.br/tanz e conheça narrativas sobre essa e outras danças típicas. Veja mais informações sobre o projeto do filme do Kuhländchen em https://petra-dombrowski.de/das-kuhlaendchen-2006/   

29/03 - Roda Mulin

Na “Roda Mulin”, a roda do moinho não para de moer?

Existe uma canção em romanche, um dos quatro idiomas oficiais da Suíça, que fala da roda do moinho, que mói diferentes tipos de grãos. Ela gira continuamente, sendo conduzida pelas águas, que, depois, fazem a viagem até o mar e veem muitas coisas interessantes pelo caminho. Contudo, mesmo saudosa pelo trajeto que fará, se faz bonita e feliz em casa, na “Roda Mulin”.

Por toda a Europa, o tema dos moinhos está muito presente, pois foi fator fundamental na economia das comunidades: cada região ou vilarejo tinha sua moenda, na qual os grãos eram triturados. Era comum que os agricultores se agendassem para levar as sacas ao moleiro, para que esse tivesse tempo hábil para a entrega da farinha. Por esse motivo, é recorrente que as músicas que tratam desse tema falem, de alguma forma, que o moínho trabalhava de dia e de noite, para atender às demandas sazonais da comunidade. Isso não era diferente na Suíça.

Mas um fato é claro: as rodas d’água tem um fascínio especial, pois são destaques nas letras das canções e nos títulos das danças - como se pode ver também na famosa “Mühlradl”, que se traduzido para o romanche seria igualmente “Roda Mulin”. Seja pelo som relaxante dela, seja pelo movimento hipnotizante do seu girar, seja pelo cenário natural onde está incluída: ela está presente ainda hoje no imaginário da comunidade quando se fala de antigos costumes e tradições.

Reto Cantieni e Bruno Brodt, da Kapelle Grischuna, escreveram essa valsa. Foi coreografada por Astrid Baumgartner e Marco Murbach, do Volkstanzgruppe Engiadina St. Moritz, que adicionaram as figuras apropriadas à melodia. Essa se tornou a dança mais executada por este grupo.

E um dado interessante: O Volkstanzgruppe Engiadina St. Moritz mantém um costume que raramente é visto em outros lugares e que só existe na Engadine: o Schlitteda. Mas o que é isso? No inverno, os solteiros “fogem de casa” por um dia para juntos realizarem um peculiar passeio de trenó. Como essa “escapada” é feita com trajes típicos, cria um maravilhoso contraste do vermelho brilhante das vestimentas com a neve branca e o céu azul. Sorte que os moinhos geralmente estão de folga nessa estação do ano; caso contrário, teria pouca gente para fazê-lo funcionar nesse momento especial.

Quer saber mais? Veja a dança no link https://www.youtube.com/watch?v=j0kiL5hrxbA   

28/03 - Tschikago

Tschikago vem de Chicago, nos EUA?

Ficção ou realidade? Ela teria entrado nas tradições tirolesas vinda com imigrantes dos EUA? Para entender melhor a “Tschikago”, é necessário conhecer um pouco sobre os ciclos migratórios das comunidades de língua alemã e o imaginário de quem ficou na Europa.

Na segunda metade do século XIX e primeira do XX, muitos europeus partiram para as américas na busca de uma vida melhor. A “terra prometida” daquele período era os Estados Unidos da América, uma democracia independente que se mostrava de braços abertos aos viajantes. O transporte marítimo para chegar ao “sonho americano” saía de grandes cidades portuárias e ia parando em outras nações européias, buscando a maior lotação possível. Era um negócio bastante lucrativo, que tinha viagens regulares. A imagem da Estátua da Liberdade recebendo os imigrantes (a partir de 1886) se tornou propaganda pró emigração. De toda forma, como em todas as grandes empreitadas, muitos acabavam voltando para sua terra natal.

Assim, a “Tschikago” veio com uma pessoa que retornou de lá? Improvável, já que a música e a dança não combinam em nada com tradições norte-americanas. É como se fosse feito um teste de DNA nela e o resultado desse uma paridade de 98% com outro pai. Por mais que a “Sternpolka” seja um dos casos onde esse movimento de retorno de coreografias à Heimat existiu, a “Tschikago” não seria um exemplo disso. Na verdade, ela é atribuída à Florutz (Fierozzo em italiano), no vale do Fersen, no Südtirol, Itália. De toda forma, o nome faz sim referência à maior cidade do Illinois, Chicago.

Como em meio às Volkstänze há muitas histórias sem comprovação passadas oralmente, que são contadas e recontadas, muitas vezes mais bonitas do que a própria realidade, fica o direito dos ouvintes de acreditar ou não nelas. Como acontece também nos exames de DNA, há no mundo das danças “famílias” que preferem viver sem saber o resultado do teste, pois o amor que une é maior do que a consanguinidade.

Quer saber mais? culturaalema.com.br/tanz e conheça essas e outras histórias. E veja a dança no link https://www.youtube.com/watch?v=QSzq1Lc7L-k   

27/03 - Panitschenschoh

De quem são os Panitschenschoh?

Entre os costumes pomeranos, encontramos também algumas danças executadas apenas por mulheres. Uma delas é a “Panitschenschoh”. Ela surgiu de uma brincadeira e era conhecida na Ilha de Rügen, nas regiões próximas a Franzburg e Grimmen e também na Cassúbia.

Na brincadeira, duas moças se agachavam frente e a frente, prendiam a saia de trás para a frente no meio das pernas e travavam uma discussão de perguntas e respostas. Geralmente, elas ficavam longe uma da outra e a conversa era aos gritos:

Você viu o meu marido?

Sim!

Onde ele estava?

No mercado!

O que ele estava fazendo?

Comprando sapatos!

Quais sapatos?

Panitschenschoh!

E com o anúncio dos “Panitschenschoh”, elas trocavam de lado, aos saltos, ainda agachadas e batendo palmas, e voltavam novamente para o seu lugar, iniciando a dança novamente.

Mas o que são esses “Panitschenschoh”?

Acredita-se que essa palavra tenha origem eslava, levando-se em consideração a presença dessa comunidade na região. Em polonês antigo, “Panitsch” é a designação “panic” que significa “jovem senhor”, um rapaz rico. E, na época, os “jovens senhores” tinham tudo do bom e do melhor. Então, com certeza, os sapatos eram de um material de alta qualidade, pois eram calçados de uma pessoa endinheirada. Por isso, as mulheres ficavam tão felizes e comemoravam batendo palmas ao ser dito “Panitschenschoh”.

Na Cassúbia, também era encontrado um texto semelhante para a dança:

Você viu o meu marido?

Oh sim!

Onde ele estava?

Na taberna.

O que ele estava fazendo?

Ele tomava uma cachacinha.

O que ele estava vestindo?

Um casaquinho vermelho.

Ah! Esse era o meu querido marido, que estava vestindo um casaquinho vermelho!

Existem também versões nas quais as conversas eram bastante longas, pois as moças descreviam cada peça de roupa que o rapaz estava usando e, por fim, era dito o tão esperado “Panitschenschoh”!

São danças que representam divertidas brincadeiras e costumes que os pomeranos conheciam e executavam em suas festas e em seu tempo livre.

Quer saber mais? culturaalema.com.br/tanz e conheça essa e outras danças típicas.   

26/03 - Wattentaler Masolka

Wattentaler Masolka é uma mazurca sem mazurca?

No Tirol, no vale do Watten, um ritmo se popularizou durante o século XIX: a mazurca. Na verdade, ela veio do leste europeu e tomou os salões de dança da Europa ocidental, sendo as festas francesas um propulsor dessa moda. Contudo, como todo o “telefone sem fio”, onde uma informação inicia contada de uma forma e termina como outra, essa tradição musical chegou às áreas tirolesas diferente de como saiu das polonesas e tchecas.

Começando pelo termo, “Masolka”, que quer dizer “mazurca” em dialeto do Tirol, as características locais foram se fazendo mais presentes do que a própria tendência internacional original. No modo austríaco, por exemplo, vê-se a marcação rítmica mais sutil, velocidade mais rápida, movimentos menos intensos,… e nessa dança em específico a própria posição convencional da “Mazurka” não é utilizada.

São por esses motivos que a “Wattentaler Masolka” é muitas vezes identificada como uma “Ländler”. Devido à estrutura tradicional da mazurca ter sido alterada, ela acabou também renomeada, explicada simplesmente como “três passos caminhados curtos”, que encaixam no ritmo ternário. É interessante que em algumas descrições desta dança há a observação explícita de que não se deve fazer o passo de valsa no decorrer das figuras. Só faltava claramente destacar que não se pode fazer o “Mazurkaschritt”.

Quer saber mais? Veja o vídeo dela com o Arbeitsgemeinschaft Volkstanz Südtirol em https://www.youtube.com/watch?v=XwxiWKUYlyo   

25/03 - Herzdame

Herzdame: a dança da Rainha de Copas?

Em português, “Herzdame” significa “Dama de Copas” ou “Rainha de Copas”. Agora, nos resta saber se é a personagem do baralho de cartas tradicional ou a déspota do livro “As Aventuras de Alice no País das Maravilhas”, do inglês Lewis Caroll.

As duas são muito famosas e a frase mais conhecida de uma delas é, com certeza: “Cortem as cabeças!”. Porém, poucos sabem que, no jogo de baralho francês (o tipo mais popular no Brasil), a Rainha de Copas se refere a uma outra pessoa: a personagem bíblica Judite.

O que a “Judith”, em alemão, bíblica e a personagem “Herzdame” têm em comum? Cortar cabeças! Isso mesmo. Ela é vista como uma das salvadoras do povo Judeu. Em certa ocasião, Judite, moradora de Betúlia, na Judéia, foi responsável pela decapitação do general grego Holofernes para poder salvar seus pares que estavam sob domínio helênico e ameaçados de não poderem seguir suas crenças. Especialmente durante o Chanucá, as proezas dessa filha do povo de Israel são relembradas, cujos pensamentos e atos só tinham um objetivo: atender aos israelitas e ao seu Deus.

Possivelmente, esta dança não tem o objetivo de retratar a história de Judite ou da Rainha de Copas de Alice. Em sua melodia, podemos perceber elementos dos séculos XVII e XVIII. Talvez o nome seja referência a alguma outra monarca. Composta e coreografada pelo alemão Karl Lorenz em 1948, o autor queria criar danças „…wo die Musik die Tänzer führt”, ou seja, “em que a música conduz o dançarino”.

Independente de qual rainha esteja representada na dança “Herzdame”, o autor conseguiu realizar uma bela obra que atinge os seus objetivos: as variações na música realmente conduzem os dançarinos. Agora é portar-se bem para manter sua cabeça em segurança.

Quer saber mais? culturaalema.com.br/tanz e conheça outras danças e narrativas relacionadas a elas.  

24/03 - s’Bölchegschpängscht

s’Bölchegschpängscht liga dança, autopista e uma fantasma?

Um hábito bastante comum na Suíça é pessoas pedindo carona à beira de estradas e é igualmente normal os motoristas acolherem esses caroneiros. Assim, o indivíduo ao volante faz um conjunto de perguntas e eles seguem viagem, tendo uma boa companhia para conversar. Contudo, contam que nem sempre esse processo termina bem… podendo trazer um grande susto.

No outono de 1983, duas jovens estudantes dirigiam pela autoestrada suíça de Basel para a HESO, a Feira de Outono em Solothurn. Pouco antes do Túnel Belchen, uma moça vestida de branco estava no acostamento pedindo carona.

Elas pararam e prontamente deixaram-na entrar no veículo - uma delas até abriu a porta para ela embarcar - e saíram conversando. Por ela estar muito pálida, a motorista perguntou à caroneira se ela estava bem. "Está tudo bem", respondeu. De repente, enquanto passavam pelo túnel, não ouviram mais a voz da mulher de branco. Ao olharem para trás, tiveram uma surpresa: ela desapareceu!

Outros motoristas sentiram o mesmo susto que essas duas jovens. A “mulher de vestido branco” aparece recorrentemente nas histórias contadas na região, deixando condutores apavorados. Mas quem é ela? Existem muitas teorias sobre sua identidade e por qual motivo ela aparece nesse local. Na verdade, desde o século XV há inúmeros registros de fantasmas com características similares a este do Túnel Belchen, e há quem diga que existem muitas “primas” dela espalhadas por toda a Europa.

Com base nesse mistério, Urs Mangold, diretor do Oberbaselbieter Ländlerkapelle, dedicou uma peça musical a este evento e Annelies Aenis criou uma dança para ele: “ds Bölchegschpängscht” (O Fantasma de Belchen).

Não se sabe se os dançarinos desta coreografia já viram a figura branca dançando. Mas às vezes, sem causar desconfiança, quando um casal passa pela formação do túnel, aparece um som suave de “huhuuuu”... que pode ser o prenúncio de um susto.

Quer saber mais? culturaalema.com.br/tanz ou veja o vídeo da s’Bölchegschpängscht em https://www.youtube.com/watch?v=ks4jy-YIjus ou veja o vídeo que conta outras histórias dessa Mulher de Branco em https://www.youtube.com/watch?v=WRrVlWiCknQ .   

23/03 - Das große Gerenne

Das große Gerenne seria a dança da corrida?

“Das große Gerenne” significa nada mais do que “a grande corrida” ou “o grande corre-corre”. Seu nome surgiu por causa da “correria” que inicia a dança. Mas o mais interessante por trás dela não está em como ela se chama ou em sua coreografia, mas sim nas pessoas que a criaram.

Fazendo parte das novas danças alemãs (neue deutsche Tänze), a música foi composta por Martin Ströfer e a coreografia foi escrita por Helma Boltze.

Martin Ströfer teve seu primeiro contato com a dança típica em Berlim e, depois, em Hamburgo. Além de tocar instrumentos, em 1958, ele descobriu que sabia compor músicas. Com isso, surgiram as melodias da “Großes Triolett” e muitas outras como “Kieler Sprotten” e “Das große Gerenne”.

Helma Boltze e seu marido Peter Boltze, moradores de Hamburgo, são responsáveis pela criação de diversas danças no círculo de trabalho Nordheide, no estado de Niedersachsen. Entre suas coreografias, são conhecidas “Kieler Sprotten” e “Blumenpromenade”.

São pessoas que, apesar da correria diária, dedicam o seu tempo para a criação de novas danças que mantêm características das tradições populares. É a herança cultural sobrevivendo através de ações um tanto individuais.

Quer saber mais? culturaalema.com.br/tanz   

22/03 - Nickeltanz

Nickeltanz é uma dança de pescadores ou de um ser aquático?

A “Nickeltanz” foi registrada pela primeira vez pelo professor Reinhard Leibrand em 1928, após recolher diversas danças nas aldeias de pescadores da península de Samland, na Prússia Oriental.

Segundo ele, nas próprias danças, é possível reconhecer sua origem. Nelas, estão entrelaçados o mar, o vento e a vela, e elas refletem a geografia e os habitantes da região: plano, vasto, aberto, ligado ao chão e impregnado de jovialidade. No caso da “Nickeltanz”, os movimentos de torres na segunda parte da mesma representam os movimentos das ondas do mar Báltico (Ostsee).

Posteriormente, o professor Herbert Oetke observou que a descrição feita sobre como o passo de caminhar deveria ser executado, lembra muito a forma de andar dos próprios pescadores, uma vez que, dentro da água, para que seus pés não afundassem na areia durante seu deslocamento, eles precisavam praticamente deslizar os pés no chão, sem afastá-los muito do solo, garantindo, assim, um movimento mais ágil e seguro. Além disso, ele destacou que “Nickel” seria uma abreviação no nome “Nicolaus”. Porém, se acreditarmos em antigos relatos, o nome também pode estar relacionado a “Neck”, antiga denominação germânica dado a um ser aquático.

Presente na mitologia nórdica, o “Neck” ou “Nix” é um espírito aquático extremamente temperamental: ora conduz os peixes às redes dos pescadores, ora vira os seus barcos e os afoga nas águas geladas. Em algumas narrativas, ele é acusado de causar o afogamento de crianças e, por isso, serve como ameaça dos pais para assustar as crianças para não irem sozinhas para a água.

Voltando à pergunta inicial, Nickeltanz é uma dança de pescadores que traz elementos do trabalho desses homens (as ondas do mar e o seu jeito de caminhar) e leva o nome do personagem da mitologia nórdica, o “Nix”, responsável tanto pelo sucesso quanto pelo fracasso das pescas diárias.

Quer saber mais? Veja De Kensbarga Spêllait em versão “tecno” da Nickeltanz em https://youtu.be/HKKNAptBPEg  

21/03 - Waldhansl

Waldhansl tem Gstanzl, Jodler e Paschen?

Nos Alpes e no seu entorno há um tipo de dança com estilo único no mundo, com composição que soma coreografias, “Gstanzl” “Paschen” e “Jodeln”. Esse conjunto pode ser visto com maestria na famosa “Waldhansl”, igualmente chamada de “Woidhansl”, uma variante da “Steirische Walzer”.

Nessa dança intercalam passos típicos, cânticos e palmas. A parte em que os homens entoam um conjunto de versinhos em dialeto, de 4 ou 8 versos, geralmente com temática camponesa, é conhecido como “Gstanzl”. Como é tradicional, essa parte ocorre quando os pares caminham, momento propício para ter fôlego para cantar.

Outra característica da “Waldhansl” é que junto a esse “Gstanzl” se somou um tipo simples de “Jodler”, um gorjeio alpino. Aqui ele é visto na segunda metade de cada frase musical, como pode ser visto em “I geh in Wald eini, i geh in Wald zua ... drei holli o holla rei holli o / I bin dem Waldhansl sei lustiger Bua, drei holio und schneid’s o”. Nessa forma de cântico, onde a letra tem sílabas fonéticas sem significado específico, traz oscilações de notas graves e agudas, podendo fazer uso de falsete. Depois de cantarem, realizam a percussão através de uma típica formação com palmas.

O “Paschen” poderia ser simplesmente traduzido como “bater palmas”, um sinônimo de “Klatschen”; contudo, nas danças alpinas ele é bem mais do que isso: majoritariamente masculinas, são seqüências ritmadas, alternando a força das batidas, a velocidade, a posição e o modo de espalmar as mãos, gerando som diferenciados. Nessa verdadeira brincadeira musical, os homens interagem diretamente com a melodia: cada dançarino atua como um instrumento independente de percussão. No Salzkammergut, região austríaca de onde dizem ter vindo a “Waldhansl”, o “Paschen” tornou-se uma verdadeira arte.

Para alguns, essa dança é uma das mais antigas manifestações típicas alpinas, uma verdadeira coletânea cultural em um só título. Fontes relacionam a melodia à também popular “Ja mir san die lustigen Hammerschmiedgselln”.

Quer saber mais? Veja a dança com o Altausseer Volkstanzgruppe: https://www.youtube.com/watch?v=8bfJLDp2sRc 

20/03 - Bleamerl

Uma Bleamerl é um Girassol?

O girassol, em dialetos, é o “Sonnabluama”, como no sul da Alemanha, e  “Sünnros”, como no norte. No Hochdeutsch é a “Sonnenblume” ou “Sonnenrose”. Já a expressão “Blumerl” ou “Bleamerl” é ligada a flores em geral, como “Blümen”, “Blümelein” ou “Blümchen”. Mas devido a uma canção algumas pessoas passaram a encará-las como sinônimas.

Os campos de girassóis são símbolos do retorno do calor, como acontece na primavera e principalmente no verão. O seu amarelo vibrante remete à alegria, à vivacidade e à energia vital, já que é uma flor que se orienta em direção à luz do astro rei. Por esse motivo, a “Helianthus annuus”, seu nome científico, não só inspirou obras de artes, como um conjunto de tradições populares.

A dança “Bleamerl” é uma dessas manifestações coletivas inspiradas no girassol e sua origem é atribuída à Floresta da Baviera, mais especificamente ao distrito de Cham, onde esses campos amarelos podem ser vistos plenamente floridos. Com coreografia simples, com estrutura similar a do Siebenschristt, a ligação dela com a flor se encontra mesmo é no cântico: “O du liabe Sonnabluama, du bist mir ins Herz nei kumma. / Du liegst mir im Herzen drin, wie der Kern im Kümmerling!” Ela quer dizer, em tradução livre, "Oh querido girassol, tu entraste no meu coração / Você está dentro do meu coração, como o caroço no licor!" Essa última frase é interessante, pois a semente da fruta neste contexto teria o sentido de "dar sabor", já que garantiria que o fruto estaria desmanchado integralmente na bebida, só ficando o caroço à mostra. Outra explicação viria de Erlangen, relacionado a conservas de pepinos.

Essa flor inconfundível, originária da América, se espalhou por outros países e continentes levados pelos viajantes através dos séculos. Inclusive, um dos atrativos turísticos no Estado do qual Munique é a capital, é a colheita individual de flores diretamente nos campos floridos. A prática é conhecida como "Blumen zum Selbstschneiden" - um self service de floral.

Quer saber mais? Veja também essa dança em https://www.youtube.com/watch?v=7qE7033N52w .

19/03 - Dree Dag

Dree dag: quantos dias dura a festa de casamento pomerana?

Antigamente, em todo o norte da Alemanha, era comum que a festa de casamento durasse três dias. Isso mesmo, três dias. Na Pomerânia, não era diferente. A família dos noivos recebia os convidados durante esse período, dia e noite, em um ambiente repleto de muita alegria e festa, música e dança, bebida e comida.

Entre as danças presentes no casamento, estava a “Dree Dag”, que significa “três dias”, referência à duração desse festejo. E uma curiosidade: por mais que esperava-se que as comemorações das bodas fossem com alegria e satisfação, a letra da canção, que deu base à coreografia, apresenta uma queixa. Como assim? Uma reclamação? Veja o texto e tire suas conclusões:

Três dias, três dias, três dias divertidos.

Depois vem a eterna calamidade.

Então, falta mingau.

Então, falta farinha.

E um dia assim tão duro sempre retorna.

Três dias, três dias, três dias divertidos.

Depois vem a eterna calamidade.

Então, falta mingau.

Então, falta farinha.

Então, falta disso e daquilo e muito.

Três dias, três dias, três dias divertidos.

Depois vem a eterna calamidade.

Então, falta mingau.

Então, falta farinha.

Então, as crianças gritam: “Estamos morrendo de fome!”

Como é possível observar, nesta melodia popular pomerana, a família dos noivos reclama que são, sim, “três dias de muita alegria”, contudo seguidos de fome e penúria: tiveram que gastar o que tinham (e o que não tinham) para dar de comer aos convidados e depois o que sobra é a escassez de alimentos.

Mas, segundo o professor Willi Schultz, os camponeses de Gützlaffshagen, na Ilha de Rügen, onde ele registrou a dança, choram de barriga cheia, pois, lá, eles vivem como se fossem pequenos reis em suas propriedades, não lhes faltando nada.

Quer ver mais? Veja também essa canção em Plattdeutsch, com Piatkowski & Rieck: https://youtu.be/WzAGRuKQhOc .

18/03 - Oberab

Oberab: uma dança que veio de cima pra baixo?

As danças tradicionais da área central da Floresta Negra, no atual estado de Baden-Württemberg, sul da Alemanha, eram geralmente chamadas de “Oberab” ou “Ober'ra”, o que significa algo como “de cima para baixo”. Como assim? Para entender esse conceito é preciso compreender um pouco da história dessa região.

Desde o século XV, existem registros de que lá, especialmente em Langenschiltach, existia a tradição de entretenimento com música e dança. Contudo, o clero, para preservar a moral e os bons costumes, quis trabalhar fortemente para a educação dos jovens, proibindo o bailado, com pena até de prisão para quem não seguisse a lei. Isso gerou muito descontentamento entre os moradores locais.

Para resolver a questão, os insatisfeitos redigiram um protesto, que foi apresentado ao Duque de Württemberg e este, por sua vez, deu a permissão para que os jovens dançassem. Assim, foi elaborado um decreto sobre o tema e enviado à Igreja. Entretanto, insatisfeitos, os pastores não cumpriram integralmente a decisão, voltando a gerar problemas aos amantes dos bailes.

Novamente, a juventude reagiu e fez o clero lembrar da existência do decreto, ou, em outras palavras, que tinham recebido “lá de cima”, ou seja, “von obera”, do Duque, a autorização para a realização das festas. De toda forma, foi necessária uma segunda reclamação formal para forçar a realização, a qualquer momento, de festas e bailes. Daí o nome de “Oberabtänze” para as danças da Floresta Negra.

A dança aqui apresentada com o nome de “Oberab” foi feita pelo Prof. Johannes Künzig em Langenschiltach no início da década de 1930. Devido a essa história das leis de restrições aos bailes, muitos interpretam que os gestos feitos pelos rapazes na coreografia, que parecem ameaças, seriam uma pantomima representando esse protesto contra os atos do clero. Por outro lado, essa analogia parece ser um tanto duvidosa, mesmo que alguém diga que ela “veio de cima”.

Quer saber mais? culturaalema.com.br/tanz e veja o AG Sing-Tanz-Spiel, de Baden-Württemberg, dançando a Oberab em https://youtu.be/R7255gCT6mE.

17/03 - La Fiorentina

“La Fiorentina”, kann man das essen? Oder ist es ein Restaurant?

Cla Genua (eigentlich Claudio Genua) wurde 1869 in Sent im Unterengadin in der Schweiz geboren. Seine Eltern arbeiteten in Pomarance in Italien (ca. 100 km südlich von Florenz), man weiss nicht mehr, ob als Zuckerbäcker oder als Kaufleute. Sie kamen regelmässig im Sommer ins Engadin zurück, waren also sogenannte “randulins”.

Der kleine Cla lernte bereits mit 5 Jahren Klarinette spielen und er soll bereits mit 14 Jahren an der Mailänder Scala aufgetreten sein. In seinen Sommerferien hörte Cla die Musikanten im Engadin, die ihn mit ihren Weisen begeisterten.

Als der Verein der Engadin-Auswanderer in Florenz am 21. Dezember 1912 ein grosses Konzert veranstalteten, da spielte Cla Genua mit Musikanten aus Sent zum Tanze auf.

Am Anfang des ersten Weltkriegs zog die Familie aus Italien zurück nach Sent. Cla begann dort, Musikschüler zu unterrichten, die zum Teil keine Noten lesen konnten. Hier im Unterengadin war keine klassische Musik gefragt sondern Volksmusik. Cla Genua notierte über 30 Tänze, die er wohl grösstenteils selber komponiert hatte.

Ob er mit “la Fiorentina” sein Heimweh an das Konzert im Jahr 1912 ausdrücken wollte oder wohl eher an eine begehrenswerte Dame aus Florenz?  

16/03 - Böhmischer

A Böhmischer é uma dança da Boêmia?

Os nomes das danças geralmente estão ligadas a quatro possibilidades: 1. por representar uma história ou profissão; 2. pelo local de onde ela veio;  3. por ter características coreográficas que sejam relacionadas a uma região; 4. por descrever um movimento ou figura. Em qual desses casos a Böhmischer se enquadraria?

Provavelmente essa dança se encaixa em dois deles, ou quem sabe em “um e meio”. Vamos explicar: “Böhmischer” quer dizer “a boêmia”, de algo ou alguém que vem do antigo Reino da Boêmia, atual República Tcheca. O nome seria um diminutivo de “Böhmischer Landler”. A questão é que ela teria surgido na Alta Áustria - não na Boêmia -, em Helfenberg, no distrito de Rohrbach, o que justificaria uma outra denominação dela: “Mühlviertier Landler”. Por outro lado, essa área é muito próxima da fronteira, o que seria uma “quase” Böhmen. De toda forma, a coreografia e a música seguem uma tendência que está presente nos dois locais.

Então a “Böhmischer” não é realmente da Boêmia? Aqui se merece uma resposta relativa: nasceu no lado austríaco, mas ficou no coração dos boêmios das regiões vizinhas. Suas figuras características, somadas a uma certa teatralização, além de ter parte cantada, a fazem bonita e alegre. Pena que, com o tempo, ela acabou ficando restrita ao repertório de poucos grupos de danças.

Quer saber mais? Veja o vídeo da “Böhmischer” em https://www.youtube.com/watch?v=FX_SSMjjvIg com o nome de “Steirischer aus dem Böhmerwald”, como ela também ficou conhecida em alguns lugares.  

15/03 - Ringeltanz

Ringeltanz: a dança dos giros ou a dança da galinha?

Ringeltanz é uma das danças preferidas durante as festividades do “Messti”, da típica quermesse da região da Alsácia. Seu nome vem da palavra “Messtag” e, em alemão, temos uma infinidade de termos para essa festividade que derivam das palavras “Kirchweih”, “Kirchmess” e “Kirchtag”. No sul do Brasil, conhecemos a festividade especialmente com o nome de “Kerb”, vocábulo também encontrado ainda hoje no dialeto falado no Saarland e em parte do Hunsrück.

Mas, e a dança? Pois bem, do final do século XVIII ao final do século XIX, na Alsácia, existia uma valsa mais lenta, possivelmente por alguma influência do “Ländler”. Mais tarde, foi acrescentado uma espécie de refrão a essa coreografia, trazendo figuras com giros. Foram exatamente esses volteios que deram o nome a ela, “Ringeltanz” ou “D´r Ringeldanz”. Como essa região fica entre a Alemanha e a França e, assim, recebe influências culturais dos dois países, se fala alemão, o dialeto Elsässisch e o francês, motivo pelo qual passou também a ser denominada “Valse Voltée”.

Um fato curioso: quando ela chegou aos grupos alemães no Brasil, observou-se que alguns achavam que seu nome significava “a dança da galinha”, pois, ao ouvir seu nome, entendiam “Ringel” como “Hinkel” - palavra no dialeto do Saarland para esse animal. Mas não vamos confundir: seja em alemão ou em francês, Ringeltanz ou Valse Voltée, essa é a dança dos giros!

Quer saber mais: culturaalema.com.br/tanz e veja o Groupe folklorique du Pays de Hanau de Bouxwiller com a D´r Ringeldanz” em https://youtu.be/emybOBz0UwY  

14/03 - Maclotte vun Habiemont

Maclotte vun Habiemont: uma dança dos marinhos de Luxemburgo?

Mas, Luxemburgo nem fica no litoral! Como pode ter marinheiros? A história é um pouco mais longa e vamos por partes. As danças com o nome “Maclotte” e “Maklott” estão relacionadas às danças encontradas na Valônia, região sul da Bélgica, cujos habitantes são em parte falantes do francês e em parte falantes do alemão.

Cogita-se que, antigamente, existiam tantas “Maclottes” diferentes quanto aldeias na Valônia. O termo “maclote”, “maclotte” ou “makelote” é, na verdade, uma deformação valona da palavra francesa “matelote”, que designava as danças que os marinheiros executavam nos barcos para seu entretenimento. Estima-se que elas tenham chegado até a essa região por influência da área litorânea de Flandres.

A partir das versões valonesas, uma dessas danças também chegou a Luxemburgo e caiu no gosto popular. Um dos exemplos é a “Maclotte vun Habiemont”, originária da aldeia Habiémont, distante cerca de 50 quilômetros da capital luxemburguesa.

Ela é reconhecida atualmente entre os grupos locais como uma de suas coreografias populares e, no país, ela é encontrada possivelmente desde o início do século XIX. Entre os luxemburgueses ela também é conhecida como “Nei Maklott”, ou seja, a Nova Maclotte.

Assim, mesmo sem litoral e sem marinheiros, Luxemburgo também tem a sua Maclotte!

Quer saber mais? Veja a dança com o Groupe Folklorique la Ronde, de Beetebuerg em https://youtu.be/hxWsdfdPNGs  

13/03 - Manavu

Manavu: uma oração em movimento?

Isaías capítulo 52, versículo 7, nos diz:

Como são belos nos montes

os pés daqueles que anunciam

boas-novas,

que proclamam a paz,

que trazem boas notícias,

que proclamam salvação,

que dizem a Sião:

"O seu Deus reina!"

Apesar de não ter referência direta a uma dança, o versículo acima que, em hebraico, inicia com “Ma na'avu al heharim” deu origem à dança “Manavu”. Em 1956, Yossi Spivak compôs a música para o texto e sua esposa, Raya Spivak, criou a coreografia.

Assim, a dança é acompanhada da canção que corresponde a parte do texto do versículo:

/ Ma na'avu al heharim,

Rag'lei hamevaser, ho . . . /

/ Mashmi'a yeshu'a,

Mashemi'a shalom. /

É interessante observar que “Manavu” também apresenta o passo mais característico das coreografias israelitas, o passo iemenita. O Iêmen foi o lar de semitas por milhares de anos. Diz a lenda que ourives hebraicos foram enviados para lá, então governado pela rainha de Sabá, por volta de 1000 a.C. Em 1949, 50.000 judeus iemenitas foram secretamente transportados de avião para Israel e sua chegada teve uma profunda influência na cultura de dança do país.

Dessa forma, pode-se dizer que “Manavu” é uma dança que une valores espirituais tradicionais e elementos coreográficos, sendo, praticamente, uma oração em movimento.

Quer saber mais? culturaalema.com.br/tanz e conheca mais da Manavu no link https://www.youtube.com/watch?v=30cb08-Ii1Q  

12/03 -Gigue

Gigue: dança barroca no folclore alemão?

Para descobrir a origem de determinadas danças, às vezes, é preciso ter habilidades de detetive. É o caso da conhecida “Gigue”. Ao estudarmos manifestações culturais dos séculos XVII e XVIII, esse nome aparece repetidamente acompanhado de outros, como “Allemande”, “Courante” e “Sarabande”.

Conhecida em português como “giga”, uma hipótese apresentada é que esse tipo de dança seja originária da “jig” inglesa e teria sido levada para a França no século XVII, onde recebeu o nome de “gigue”. Outros pesquisadores indicam que ela vem do nome do instrumento de cordas usado para a música: “giga” (em italiano) e “gigue” (em francês), do qual se originou, inclusive, o nome alemão para violino: Geige.

Quanto a esse tipo de melodia, há duas variações conhecidas: a giga francesa, com andamento moderado ou rápido e frases irregulares, e a italiana, mais rápida e com frases regulares. Além disso, ela é muito comum em suítes barrocas. É difícil precisar quantas delas foram criadas. Entre seus autores conhecidos, estão Johann Sebastian Bach e Georg Friedrich Händel.

Talvez por esse motivo, ao pesquisarmos essa “Gigue”, encontramos que sua origem é italiana ou inglesa. Porém, poucos sabem que a dança aqui referida, na verdade, foi criada por Heinrich Dickelmann, músico conhecido por compor melodias e fazer arranjos para diferentes coreografias populares alemãs. Para esta, em específico, utilizou a música “Gigue” composta por Heinrich-Jakob Rosen - natural de Hüls, ao norte de Krefeld, Nordrhein-Westfalen. Ele a publicou, juntamente com outras composições, em um livro chamado “Aus einem Klavierbuch des Henricus Jacobus Rosen”, no ano de 1748.

Sendo assim, para deixar bem claro: essa dança “Gigue” teve sua melodia composta no século XVIII por um alemão; já a coreografia foi escrita no século XX com base no estilo “gigue” do período barroco. Um cenário que aparenta ser um tanto incomum? Com certeza. Todavia, que graça teria para os detetives se todos os cenários fossem iguais?

Quer saber mais? Veja o vídeo da Gigue com o Stapelholmer Danz- un Drachtengruppe em https://www.youtube.com/watch?v=pzJX-oZxhCs  

11/03 -Die Kehre

Die Kehre conta a história de um Randulin?

Se você procurar a nascente do rio tirolês Inn, vai acabar cruzando a fronteira da Áustria para a Suíça e chegar a Engadin, no cantão de Graubünden. Lá, as pessoas falam o reto-românico, a quarta língua nacional da Suíça. Outra característica desse vale são os “Randulins”, migrantes que saem para buscar trabalho em outras regiões, principalmente na Itália.

A canção "La storta da Crusch", “A curva na estrada de Crusch” em português, é sobre a tentativa malsucedida de um jovem de emigrar de sua terra natal Engadin. Mas não se trata de uma tragédia, muito pelo contrário: não muito longe do seu ponto de partida, ele entra em uma taverna no vilarejo de Crusch para comer. Com palpitações e com a saudade batendo, mesmo antes de ter ido embora, ele vê por uma janela dois lindos olhos… que irão mudar seu destino. A bela jovem, o gosto pelo vinho da pousada e a música convidativa vão fazê-lo ficar. Assim, ele "pega a curva", permanece por lá e não se torna um Randulin.

"La storta da Crusch", que nasceu como canção, vai acabar virando dança, também chamada de “Die Kehre”. Tem destaque na coreografia um movimento de meia volta, o que aconteceu também com muitos Randulins, que acabaram regressando às suas localidades em Engadin. Além de ter uma história significativa para os moradores desse vale, é uma das primeiras descrições de dança da “Schweizerischen Trachtenvereinigung” - Associação Suíça de Trajes Típicos: a de número 8! Até no número tem duas curvas.

Quer saber mais? Conheça a dança Die Kehre em https://www.youtube.com/watch?v=lFHxIzEzOgE ou veja um pouco sobre a região do Engadin em https://www.youtube.com/watch?v=z7tQOGDNQr0 

10/03 -Linzer Polka

A Linzer Polka é a semente da Sternpolka?

Imagine-se olhando para um espelho da juventude, onde a imagem mostra você em sua tenra infância, com suas singelas expressões, olhar inocente e uma longa vida pela frente. Seria no mínimo curioso. E pensando em uma cena parecida, mas não com uma pessoa e sim uma dança, se a Sternpolka se visse assim refletida, ela estaria se observando como Linzer Polka. Uma história interessante que teria nascido na Áustria, migrado para a Floresta da Boêmia e depois partido para a América do Norte, ganhando o mundo. Contudo, como nasceu a versão “mais nova” dessa conhecida coreografia germano-americana?

Contam que uma Blasmusikkapelle, um conjunto de sopros, que voltava para Budweis de uma viagem, acabou parando em um vilarejo de nome Doudleby, que ficava a aproximadamente 15 km antes de chegar a seu destino. Lá teriam tocado algumas músicas, entre elas uma que tinham aprendido fazia pouco: a Linzer Polka - referência à localidade austríaca de Linz. Segundo o relato, a canção se popularizou tanto entre as comunidades de língua alemã, quanto entre as tchecas, estas a nominando como Doudlebska-Polka. Ainda na atualidade, os dois nomes sobreviveram, por mais que usem o segundo como sinônimo da famosa Sternpolka.

Por mais que relacionem a coreografia da “Polca da Estrela” à Floresta da Boêmia, foi a da Linzer Polka que teria surgido por lá, com suas três figuras em pares: passeio, palmas e polca. Ela se tornaria a “Sternpolka” um bom tempo depois, com mudanças na melodia e na dança. De toda forma, essa segunda etapa da história merece um capítulo à parte.

Quer saber mais? Assista ao vídeo da Linzer Polka em https://www.youtube.com/watch?v=QJEYd9PSrS0 e compare com o da famosa Sternpolka no Brasil, com a Banda Choppão, em https://www.youtube.com/watch?v=CpcZRtHLWsE . 

09/03 -Spitzbubenpolka

Spitzbubenpolka é uma briga da mãe com o filho?

“Spitzbubenpolka” é muito popular na Europa, tanto entre crianças quanto entre adultos. Ela tem como característica uma pequena encenação na sua primeira parte: uma pessoa do par teatraliza que xinga a outra, balançando-lhe o dedo indicador. Mas por qual motivo isso acontece? Para chegar à resposta, é preciso olhar para uma outra arte paralela à dança.

Pantomima é uma forma de teatro gestual, na qual os participantes falam somente com o corpo. Ela é muito comum nas tradições camponesas, no chamado “teatro de costumes”, no qual, de forma cômica, são representados acontecimentos do dia a dia. Nos países de língua alemã, muito disso está incorporado ao “Bauerntheater”. Por ser de simples compreensão, esse modelo de expressão se espalhava muito rapidamente.

Assim, a “Spitzbubenpolka” , ou “Spitzbuampolka”, ou Spitzboumpolka, é a “Polca do Menino Arteiro” (nesse caso, Spitzbuben não é sinônimo de ladrão) e incorporou de modo singelo uma pantomima: imagine quando um menino faz uma sapequice em casa e a mãe descobre… o que aconteceria? Com certeza vai ter uma reprimenda. Não se trata de uma briga, pois se isso acontecesse no século XIX a “resposta” da matriarca seria outra… Essa curta e breve cena é apresentada na coreografia, motivo pelo qual ela também recebe outra denominação: “Finger-Tanz”, "Dança do Dedo”.

Por ser simples, leve e bem humorada, acabou caindo no gosto das comunidades, principalmente entre os mais jovens, se multiplicando em festas e eventos sociais. Não tardou para virem outras denominações regionais, como Sautreiber, no Unterinntal, ou Bregenzer, no Passeiertal, ou Manfrina, no Veneto, ou Bal Del Truc, no Friuli, só para citar alguns exemplos. Ela também tem similaridades com a “Drei lederne Strümpf” e com a “Ich schmäiß d‘r ean di Ripp‘”, essa última também com pantomima e atribuída ao Hessen.

Quer saber mais? Veja duas variantes da Spitzbubenpolka em https://www.youtube.com/watch?v=qgDikKjloXQ  e https://www.youtube.com/watch?v=RH9kaJ25pQ8&t=86s  

08/03 -Polka Jenny Lind

Quem foi Jenny Lind, que deu nome à Polka Jenny Lind?

“Ela estava, então, na primavera da vida - fresca, radiante e serena como uma manhã de maio; perfeita em sua forma; Ela parecia se mover, falar e cantar sem esforço. Tudo era natureza e harmonia. Seu canto era notável sobretudo por sua pureza e pela força da alma que parecia crescer em seus tons. Sua voz era encantadora.” (Frederika Bremer, escritora sueca)

“Nunca vi alguém atuar da maneira que ela atua, há uma magia própria em todos os seus movimentos, uma graça, uma ingenuidade, e seu rosto é de uma graciosidade, seus olhos são tão poéticos que a gente fica involuntariamente comovido.” (Clara Schumann, pianista e compositora alemã)

Essa é Jenny Lind, conhecida como “Rouxinol Sueco”. Nascida em Estocolmo no ano de 1820, tornou-se uma das mais famosas sopranos do século XIX, com turnês pela Europa e Estados Unidos. Por onde passava, a artista encantava seus espectadores. Entre eles, estão o escritor dinamarquês Hans Christian Andersen, os compositores alemão Felix Mendelssohn Bartholdy, o austríaco Johann Strauss (filho) - o Rei da Valsa -, o italiano Giuseppe Verdi e o polonês Frédéric Chopin.

Várias músicas foram compostas em sua homenagem, assim como poemas e canções. Inspirado no amor não correspondido por ela, Hans Christian Andersen escreveu seu famoso conto “O Rouxinol e o Imperador da China”, cuja história foi adaptada para ópera, balé, teatro musical, série de televisão e cinema.

A música para a dança “Polka Jenny Lind” foi composta pelo violinista alemão Anton Wallerstein, em 1845, com o nome de “A Polca preferida de Jenny Lind”. Posteriormente, em 1850, a música recebeu uma letra em inglês escrita por J. H. Hewitt e chamada de “Jenny Lind Song”. Mais tarde, em 1858, uma coreografia foi criada para essa polca e publicada por Elias Howe sob o nome de “Jenny Lind Polka”. Na época, a coreografia ainda era bastante simples, mas serviu de base para outras composições em diferentes países.

Quer saber mais? Veja cena do filme “The Greatest Showman”, onde aparece a representação de Jenny Lind em sua turnê pelos EUA: https://youtu.be/kUkRoIMyqFo .  

07/03 -Schönholzer Mazurka

Schönholzer Mazurka: uma mazurca de Berlim?

Quando pensamos em cultura popular, logo vem à lembrança imagens de camponeses bailando em alguma festa de “Kerb” em um pequeno vilarejo. Porém, hoje, em grandes cidades, ainda podemos encontrar grupos de danças típicas. É o caso de Berlim. Lá encontramos o “Berliner Volkstanzkreis” (Círculo de Danças de Berlim), fundado por Erich Krause (1901-1977) , que agora já completa sete décadas, período em que viveu inúmeras facetas da vida social.

Em contraste com as conhecidas adaptações teatrais típicas da República Democrática Alemã (RDA) - Alemanha Oriental -, as danças tradicionais têm sido realizadas no “Berliner Volkstanzkreis” desde então, sendo o grupo deste gênero mais antigo em atividade na capital. Novas coreografias também fazem parte do seu repertório, inclusive, com criações próprias. Foi assim que surgiu a “Schönholzer Mazurka”, que recebeu o nome de uma localidade da região de onde o ele atua: Schönholz, no distrito de Pankow.

Um fato curioso é que, durante a divisão da Alemanha, Schönholz ficava na Alemanha Oriental e próxima do muro de Berlim, em uma área chamada de “Zona de Exclusão” (Sperrgebiet). Com isso, não era qualquer pessoa que poderia circular livremente pelo bairro. Para que pudessem receber visitas, os moradores de lá precisavam de uma autorização especial do governo.

Quer conhecer um pouco mais sobre o “Berliner Volkstanzkreis”? Visite o site: http://www.berliner-volkstanzkreis.de/Startseite/  

06/03 - Neppendorfer Landler

Ländler ou Landler de Neppendorf?

Entre as danças típicas, o termo “Ländler” é muito comum. Às vezes, é relacionado por alguns à valsa, mas, na verdade, sem nos aprofundarmos, ele é um ritmo próprio, parente dela, pois também é em compasso ternário, popular na Alemanha, Áustria e Boêmia. Mas e o “Landler”, sem trema?

Pequenos detalhes podem representar grandes mudanças. Ou seria apenas um erro de escrita ou uma variação de algum dialeto? Apesar de existir a variação do “Ländler” sem trema, aqui, temos uma questão histórica que passa longe das narrativas românticas que costumamos relacionar às danças típicas. Assim, deixando claro: o termo tem outro significado.

“Landler” é o termo usado para denominar os habitantes da Transilvânia (Siebenbürgen) que vieram da Áustria, é uma forma de diferenciá-los dos alemães que já estavam por lá, chamados de “Siebenbürger Sachsen”. Ao contrário dos “Sachsen”, que emigraram para a mesma região romena de forma voluntária no século 12, os “Landler” foram deportados da Áustria (da região histórica do “Landl”), no século XVIII. Por serem protestantes, não puderam permanecer no solo austríaco, pois a religião oficial do Império era o catolicismo.

No meio dos “Sachsen”, os “Landler” preservaram sua origem austríaca em trajes, dialetos e modo de vida por séculos. Como dito em 1994, em Großau, durante a recepção a uma delegação austríaca: “Somos apenas uma pequena cor, mas uma cor muito especial, na imagem colorida dos povos da Transilvânia”.

Entre os “Landler”, são encontradas diferentes danças com esse nome. Especialmente em Neppendorf, foi registrada uma dança com sequência de figuras que foi chamada de “Neppendorfer Landler”, ou seja, os “Landler” do vilarejo de Neppen.

Quem vê a graciosidade dos dançarinos executando a coreografia e a destreza dos músicos conduzindo a melodia não imagina a história desses moradores da Transilvânia.

Quer saber mais? Veja o Siebenbürgische Volkstanzgruppe Vöcklabruck dançando-a em https://youtu.be/v5xaF4YOCVQ 

05/03 - Bärbele

Bärbele é a moça da Floresta Negra?

“Bärbele” é um nome feminino comum na Alemanha. Possivelmente a dança homônima, vinda da cidade de Furtwangen, na Floresta Negra, foi assim chamada devido a alguma antiga canção popular. Seu correspondente em português é “Bárbara”.

Porém, outra Bärbele da mesma região ficou internacionalmente famosa: a personagem do filme “Schwarzwaldmädel” (A Moça da Floresta Negra), de 1950, interpretada pela atriz Sonja Ziemann. Na história, Hans Hauser se apaixona pela jovem da Floresta Negra, a Bärbele Riederle, mas ele sabe que as “Mädle aus dem schwarzen Wald, die sind nicht leicht zu habe!”, ou seja, “que as moças da Floresta Negra não são fáceis de conquistar”.

Produzido na Alemanha pós-Segunda Guerra Mundial, o filme pertence ao gênero chamado “Heimatfilme”,que representa um mundo idílico e romântico intocado pelos conflitos armados e pelos perigos da vida real. A este mesmo tipo cinematográfico pertencem outros sucessos internacionais como “Sissi” (1955) e “A Família von Trapp” (1956) - precursor do “A Noviça Rebelde” (1965).

Além de apresentar um enredo musical envolvente, o filme “A Moça da Floresta Negra” também foi responsável por mostrar para o mundo as mais belas paisagens da região do Schwarzwald, inclusive alguns trajes típicos, como o do vale do rio Gutach, famoso pelo seu “Bollenhut”. Ela alcançou muito mais gente que a dança “Bärbele”: é o potencial do mundo do cinema.

Quer saber mais? Conheca um pouco mais da dança Bärbele com o Volkstanzgruppe Frommern https://youtu.be/hebP6QvtcT8 e do filme “A Moça da Floresta Negra” em https://youtu.be/NNbCuKwfuWI .

04/03 - Lange Reihe

Como surgiu a dança “Lange Reihe”?

Ao vermos uma dança, dificilmente imaginamos o caminho que ela percorreu até chegar na atualidade. Dois dos responsáveis pelo resguardo e criação de muitas delas foram Anna Helms e seu marido Julius Blasche. Partindo de Hamburgo, eles fizeram diversas excursões com o intuito de registrar o maior número possível de tradições, músicas e coreografias.

Mas, dentre tantas histórias, uma é pessoalmente interessante: em um trem, o casal viu ao fundo do vagão um passageiro solitário, acompanhado apenas de uma caixa de violino. Logo se perguntaram: “Será que ele é de uma pequena cidade, ou de um vilarejo? Será que ele conhece alguma dança típica?” Não se contiveram e foram tirar a dúvida.

E não é que tiveram sorte? Ele sabia muito sobre usos, costumes e danças típicas. Chegando à estação, eles foram direto para a casa do músico local. Feliz e orgulhoso de tudo o que sabia, informou que era ele o responsável por animar diferentes festas na região. Todavia, quando perguntado se poderia compartilhar seus conhecimentos, o anfitrião talvez não tenha ido com a cara dos forasteiros: “O que vocês da cidade grande querem com essas danças?” Precisaram de uma boa conversa para convencê-lo a mostrar algumas melodias e coreografias.

Isso tudo aconteceu no início do século XX e cenas como essa se repetiram várias vezes. Anna e Julius dedicaram muito do seu tempo para o resgate de antigas danças e a criação de novas coreografias. Muitos dos seus registros e de suas criações são dançadas até hoje por diferentes grupos na Alemanha e no exterior.

A “Lange Reihe”, que significa longa fileira, faz parte dessa coletânea. É uma coreografia compilada por Anna Helms a partir da melodia que encontraram próxima a Ratzeburg. As figuras são típicas do norte da Alemanha. Outro elemento que deu base a ela foi a informação de que, na Idade Média, para finalizar a festa de casamento, eram feitas danças em uma grande fila, conduzindo os convidados em coluna pelo salão em todas as direções.

Quer saber mais? Veja a dança com o Volkstanz- und Trachtengruppe des Heimatvereins Aurich https://youtu.be/yCNS42wJ3n0.

03/03 - Schächer

Schächer é a dança dos ladrões?

Uma dança muito presente no noroeste da Baviera é a Schächer, sendo especificamente da Baixa Francônia - Untenfranken. Segundo Walter Bucksch, ela “é dançada em Sennfeld, a cerca de 3 km a sudeste de Schweinfurt, em um ritmo bastante rápido. Ela também é conhecida em Oberelsbach, no Rhön, ao norte de Bad Kissingen e em Würzburg.” Tem como característica seus giros duplos ágeis dentro de uma composição coreográfica em três partes pouco complexas, o que ampliou sua popularidade.

Mas um dado curioso é o nome. Dentro de um alemão arcaico, que não está mais em uso, Schächer quer dizer "ladrão" ou “criminoso”. O dicionário Duden qualifica a palavra como “bíblica” e que teria também sentido de “assassino”. Na tradição cristã alemã era como chamavam os dois crucificados que estavam com Jesus no Calvário. Contudo, é importante destacar que a designação da dança, na verdade, não tem relação alguma com roubo ou crime.

A explicação é que essa Schächer da Francônia, também chamada de

Alt-Rhöner Kirmestanz ou Schecher, venha do verbo “scheuchen”, que teria sentido próximo de “enxotar” ou “espantar”. Seria uma comparação ao ritmo rápido da música ou, de alguma forma, ao movimento da dança.

Contudo, com certeza é essa a única resposta para o sentido de Schächer? Não é uma Fakenews (como dizem na atualidade)? Certeza, realmente certeza, não se tem. De toda forma, se no juízo final o Santíssimo perguntar se me arrependo de ter disseminado essa informação falsa, poderei fazer a meia culpa e dizer: “Sim, redima-me desse pecado”. Pelo menos não sou ladrão, nem assassino.

Quer saber mais? Veja o vídeo do Schächer com Steffi Zachmeier & Bayerischer Landesverein für Heimatpflege e.V.

em https://youtu.be/BALPXuixx44 ou com os amigos do Blumenauer Volkstanzgruppe em https://youtu.be/Y39JqKs7KQE.

02/03 - Spinnradl

A Spinnradl fez a Bela Adormecida cair no sono?

Um dado é real: a cultura popular é formada muito pelos acontecimentos do dia a dia, como hábitos da família, formas de trabalhar e de ver o mundo. Isso é válido para danças, músicas, lendas e também contos de fadas. Assim, existem elementos que aparecerão em muitas tradições e a “roda de fiar”, o Spinnrad em alemão, é um deles. Ela está nos contos coletados pelos Irmãos Grimm, em canções típicas, em peças de teatro, em pinturas de época, nas lendas e também em muitas danças tradicionais. Na mitologia greco-romana, as Parcas / Moiras teciam o fio da vida.

Spinn­rad, Spinn­ro­cken, Spin­del, são expressões ligadas a ela e fartamente presentes na cultura alemã. O verbo “fiar”, em alemão, é “spinnen”. Assim, por mais que na famosa história da Bela Adormecida ela fure o dedo no fuso de uma roca e caia no sono, na prática, não há qualquer relação entre a Dornröschen e a dança “Spinnradl”, sendo ambas de origens muito diferentes.

Na prática, a dança teria surgido de uma música, “Spinnradldrahn”, que se tornou popular e ganhou novas letras. É muito discutida a origem da coreografia, se na Áustria, se na Floresta da Boêmia, na Silésia, ou no sul da Alemanha. Provavelmente, os Alpes tenham sido seu ponto de partida, recebendo diferentes figuras que, com o tempo, se somaram. As duas principais variantes são a de trio - “Spinnradl zu Dritt” - e a de casais - “Spinnradl zu Zweit”.

De toda forma, quando uma velha roca de fiar é exposta, é inevitável que as novas gerações a relacionem diretamente ao famoso filme “A Bela Adormecida”, produzido por Walt Disney em 1959. Porém, essa história já era contada e “recantada” por seus pais e avós na ciranda “Dornröschen war ein schönes Kind”, que, no Brasil, se popularizou como “A linda Rosa Juvenil”.

Quer saber mais? Veja a dança em https://www.youtube.com/watch?v=HPSedVliMIA . Escute a música em https://www.youtube.com/watch?v=-30vEJYzOJU e veja um pouco sobre a Roca no Brasil em https://www.youtube.com/watch?v=jA7ttLUdbmw   

01/03 - Wischtanz

A Wischtanz era dançada com bastões a céu aberto?

Em Gößl, na Áustria, em uma pequena localidade nos Alpes com a economia embasada na agricultura, sobreviveu por muito tempo uma tradição típica dos homens do campo: a Wischtanz. Essa dança teria se mantido, entre outros motivos, como distrativo dos jovens lenhadores e pastores, que estariam sozinhos trabalhando uma temporada nas montanhas e não teriam suas damas (Dirndl). Segundo Richard Wolfram, “dois rapazes seguram entre eles um cajado cada um, na horizontal, e, alternadamente, balançam de modo ritmado as pernas por cima deles, deslizando-os de uma mão para a outra.” Também podiam fazer o mesmo com machados… contudo devia ser uma brincadeira mais perigosa.

Por mais que esse relato seja em um vilarejo austríaco, coreografias com longos bastões de madeira eram comuns em muitos locais no mundo. Os Banatas, perto de Steierdorf, na Romênia, têm tradições similares, não necessariamente tendo uma mesma origem, já que se vê fenômeno semelhante na Hungria, Estônia, Letônia, Polônia, França e Espanha (nos Pirinéus). Em alguns locais, a brincadeira acontece com quatro (4) pessoas (duas duplas) que cruzam as varas, como no caso da “Anifer Steckentanz”. Também se pode ver formações similares com fitas, tendo a participação de moças, como no caso da “Spantanz”. No Brasil o “Maneiro Pau”, o “Chico do Porrete” e a “Chula”, por exemplo, têm suas similaridades com esse contexto de danças.

Mas, afinal, essas tradições são para serem feitas a céu aberto? Provavelmente a origem delas era ao ar livre, como um divertimento ou desafio. Depois, com o tempo, muitos desses hábitos acabaram transplantados para palcos ou dentro de festas, como forma de demonstração pública. Em outro relato, Richard Wolfram aponta que a própria Wischtanz era apresentada em festejos natalinos por alguns conhecedores da antiga dança dos pastores, o que ocorreria em local fechado por ser inverno na europa.

É o dinamismo das danças e de seus participantes. São as manifestações culturais se ressignificando e se adaptando às novas realidades.

Quer saber mais? culturaalema.com.br/tanz