Arrisco-me a dizer que todos os turistas que chegam ao Peru têm como principal objetivo visitar Machu Picchu (MP). Ainda que possam ter outros destinos/experiências que queiram muito conhecer/fazer, MP está sempre em primeiro lugar na lista. Comigo não foi diferente. Quando surgiu no horizonte a possibilidade de uma mudança da Indonésia para o Peru, na minha cabeça desenharam-se muitos projetos e, sem dúvida, conhecer MP estava no topo. O que eu nunca imaginei é que teria que esperar quase 3 anos, desde que chegámos a este país, para poder visitar o destino turístico número 1 do Peru, da América do Sul e um dos mais apetecíveis a nível mundial.
Na verdade, desde que cá cheguei e comecei a aprofundar os meus conhecimentos sobre o Peru, conhecer MP passou a ser uma, entre várias experiências, que queria ter na área de Cusco e do Vale Sagrado - ainda assim, a mais importante de todas. De cada vez que lia algo sobre o assunto, de cada vez que falava com alguém que já tinha visitado, a lista ia aumentando. De toda a literatura que devorei sobre o assunto (livros, artigos, blogues, etc), aquele que mais me emocionou foi o livro de Mark Adams intitulado “Turn right at Machu Picchu: Rediscovering the Lost City One Step at a Time”. Recomendo vivamente a sua leitura a todos quantos se sintam intrigados por este místico local.
E foi assim que, no passado mês de junho de 2023, até me estava a custar acreditar que ia FINALMENTE meter os meus pezinhos naquele sítio. Que emoção! E sim, eu sei, já lá vão 8 meses e só agora é que estou a escrever sobre isto.
O voo de Lima a Cusco é curto e tranquilo (~1h30m) mas a chegada à cidade - outrora capital do Império Inca - pode ser violenta. Cusco situa-se a uma altitude de 3,399m acima do nível do mar e as consequências do mal de altura podem incomodar (e muito) quem não esteja habituado (como nós). Não me canso de referir isto: dores de cabeça, náuseas, vómitos, cansaço, alterações do ritmo cardíaco, etc, podem surgir e é necessário que os viajantes tomem precauções e levem consigo medicação que os ajude a aliviar estes sintomas. Aliás, posso acrescentar que, de todos os locais que já visitámos de elevada altitude, em todos eles sentimos todos estes sintomas, mesmo tomando medicação. Enfim, ainda que as condições físicas não sejam as ideais, o que se vê por lá vale tanto a pena que uma pessoa tenta abstrair-se.
Uma técnica para aliviar o “choque” da altitude é baixar alguns metros durante uns dias e deixar o corpo habituar-se aos poucos à altitude, por isso é que muitos turistas chegam a Cusco e se dirigem de imediato para o Vale Sagrado já que este se encontra a menos de 2,800 metros. Pode não parecer relevante mas estes 600 metros a menos de altitude fazem toda a diferença nos primeiros dias.
Vale Sagrado dos Incas
Como o nome indica, trata-se de um vale de terras férteis e montanhas verdes por onde corre o rio Urubamba. Os seus famosos pisos ecológicos, ou socalcos de cultivo, localizados a diferentes altitudes transformaram este vale na principal fonte de alimentação inca. Aí se produziam (e ainda produzem): batatas, frutas, verduras, milho e outros grãos. A juntar às deslumbrantes paisagens naturais, existe todo um conjunto de sítios arqueológicos e pequenas aldeias que valem a pena visitar.
O que visitámos?
A caminho do nosso hotel para a primeira noite, fizemos um pequeno desvio e fomos visitar as Salinas de Maras. Maras é um pequeno povoado onde existem umas salinas com mais de 5000 poços de sal natural que brota de uma fonte subterrânea que teve origem há muitos milhões de anos durante a formação da Cordilheira dos Andes. Cada um dos poços tem uma dimensão aproximada de 5m² e neles trabalham hoje em dia habitantes das povoações do vale. Durante a visita ficámos a conhecer como se desenvolve todo o processo e pudemos tirar bonitas fotografias ao entardecer. À saída existem várias senhoras a vender sal e outros artigos da região. Apesar de se tratar de um local turístico e de os preços estarem sensivelmente inflacionados, vale a pena comprar o sal que aí vendem por, ainda assim, ser mais barato do que aquele que se vende em Cusco ou em Lima nos supermercados. Escusado será dizer que é sal de alta qualidade e desde que viemos para cá viver tem sido o nosso sal de eleição.
O nosso hotel ficava localizado em Urubamba mas chegámos à noite e saímos bem cedo pela manhã e, como tal, não tivemos tempo de visitar a pequena povoação de Urubamba. Após o pequeno almoço e uma visita às lamas e alpacas residentes no hotel, seguimos caminho até Ollantaytambo - a principal cidade do Vale Sagrado (VS) e o único povoado inca que ainda é habitado até ao presente. A visita a Ollantaytambo foi feita com guia e é algo que recomendo vivamente que façam. Sim, vai ficar mais caro mas acreditem que vai valer cada cêntimo as explicações do vosso guia se realmente quiserem saber mais sobre o Império Inca. A visita que fizemos passou primeiro por uma “casa inca” restaurada onde é possível observar objetos da época e testemunhar o modo de vida da população naquela época. A casa tem também vários porquinhos da Índia que se movimentam livremente pelo espaço e que fazem as delícias das crianças. No caso da nossa criança, foi duplamente interessante pois teve a oportunidade de os alimentar e observar com vida e, mais tarde, de os provar num dos vários pratos tradicionais da região. A visita prosseguiu com um passeio pelas ruas típicas do povoado para observar algumas das características das construções incas e ainda tivemos tempo para assistir a parte da encenação pública do drama “Ollantay Raymi” que decorre todos os anos durante o mês de junho. No final subimos à fortaleza de Ollantaytambo. Daí é possível observar todo o vale circundante, o rio Urubamba e admirar a proeza arquitetónica dos incas na construção do Templo do Sol. Finalizada a visita ao povoado, seguimos em direção à estação de comboios que nos ia levar até Machu Picchu Pueblo ou “Aguas Calientes” - como também é conhecido o povoado que fica mais perto da famosa cidadela inca.
Machu Picchu Pueblo (Aguas Calientes)
A viagem de comboio pode ser feita com mais ou menos luxo mas é absolutamente imperdível. Durante o percurso (que demora cerca de 1h30m) segue-se junto ao rio Urubamba e é um percurso muito bonito. É em Aguas Calientes que normalmente se pernoita para, no dia seguinte (bem cedinho) fazer a subida (a pé ou de autocarro) até Machu Picchu. O povoado de Aguas Calientes está totalmente dedicado ao turismo. Entre restaurantes, lojas de souvenirs e hotéis, há pouco mais a visitar. Ainda assim, existe uma praça central que vale a pena uma visita rápida, sobretudo pela igreja que lá se encontra (Parroquia Virgen del Carmen) e, mais especificamente, o Cristo negro que se encontra no seu interior. Além disto, existe ainda um grande mercado de artesanato que é excelente para comprar aqueles presentes giros e baratos que queremos levar para a família e os amigos e convenientemente localizado mesmo à entrada/saída da estação de comboios.
Machu Picchu (complexo arqueológico)
Aquele lugar que dispensa apresentações: majestoso, único, mágico, surreal, enigmático, místico e maravilhoso. Dos lugares que mais queria conhecer e que mais prazer me deu conhecer. Uma vez mais: guia é fundamental e, no caso de Machu Picchu, é quase obrigatório. Pensem assim: chegaram até ali, depois de dias de viagem, estão prestes a entrar num dos complexos arqueológicos mais importantes do mundo, já pagaram o bilhete…entram e não percebem nada do que estão a ver. Faz sentido? Não, claro que não.
Para visitarem MP vão necessitar de tempo para lá chegar e comprar vários bilhetes. A forma mais comum é sair de Cusco ou Ollantaytambo de comboio e chegar a Machu Picchu Pueblo. Daí é necessário passar a noite no povoado e, de manhã, bem cedo, aceder de autocarro ao complexo. São, portanto, necessários 3 bilhetes (comboio, autocarro e bilhete de entrada no complexo).
A forma mais prática de verificar os preços para a cidadela, tipos de entrada e circuitos disponíveis é acedendo ao site oficial: https://www.joinnus.com/events/trip-adventure/cusco-llaqta-inca-de-machupicchu-59693
Para comprar bilhetes de comboio podem usar este site: https://www.perurail.com/
Para comprar bilhetes de autocarro para o trajeto Aguas Calientes - Machu Picchu e regresso: https://comprar.consettur.com/
Písac
Outro local de visita obrigatória no Vale Sagrado. Outro complexo arqueológico Inca, a 30 km de Cusco. No próprio povoado, com o mesmo nome, é possível conhecer vários artesãos que se reúnem num mercado muito pitoresco e colorido. O “Mercado de Artesanias” de Písac pode ser famoso, mas o ex-libris é a visita ao seu centro arqueológico ao qual se pode aceder por um caminho que começa no centro do povoado e passa pelos muitos socalcos de cultivo. Dependendo do nível de preparação física, é possível subir até às ruínas em 45 minutos ou até 1h30 ou mais. Uma alternativa menos cansativa é apanhar um táxi a partir do centro do povoado até à entrada do complexo. Seja qual for o meio escolhido para chegar às ruínas, a verdade é que a visita vale a pena e serpentear pelos socalcos e absorver todo o vale e as suas belas paisagens foi um dos pontos altos desta viagem. Não é ao acaso que este é um local ideal para fazer retiros espirituais.
Cusco
A cidade imperial inca é o ponto de partida de toda esta aventura. Uma visita ao Peru só fica completa depois de a visitar e digo já que menos de 2 dias completos não vale. Há tanto a descobrir nesta cidade que se me perguntarem que destino gostaria de repetir eu dizia sem hesitar que é Cusco. Dos complexos arqueológicos às igrejas coloniais, das ruas cheias de tesouros por descobrir aos museus, dos cafés acolhedores aos restaurantes típicos, não há cidade mais mágica do que Cusco. Dentro da cidade ou nos arredores, não faltam motivos válidos para ter convosco um guia que vos pode não só explicar toda a cultura Inca como também a influência espanhola na região. A nossa visita a Cusco foi feita sempre com a ajuda de um guia e incluiu visitas aos seguintes locais: Mercado San Pedro, Plaza Mayor, Mirador San Cristobal e Cristo Branco; incluiu também visitas mais detalhadas aos seguintes sítios arqueológicos: Tambomachay, Puka Pukara, Sacsayhuamán, Quri Kancha e Qenqo.
Outros locais de interesse que não tivemos tempo de visitar:
Localizado a 28 km de Cusco, é um dos povoados do Vale a maior altitude (3,772m). Aí se localizava o Palácio do Imperador Túpac Yupanqui que foi mais tarde destruído pelos colonizadores espanhóis. No seu lugar foi construída a igreja de Nossa Senhora de Monserrat.
A cerca de 74 km da cidade Imperial de Cusco, neste povoado podemos ver os famosos “andenes circulares incas”, isto é, socalcos circulares de cultivo onde os incas faziam muitas experiências agrícolas consoante os distintos climas e altitudes.
(Cusco)
Este famoso bairro localizado dentro da cidade de Cusco e diretamente por cima da Plaza Mayor é muito procurado por locais e turistas. Nas suas ruas empinadas e estreitas podemos apreciar casas de estilo colonial, vários museus interessantes, lojas de artesanato e danças típicas e música, sobretudo aos fins de semana.
Outras atividades que podem fazer na região e que optámos por não fazer:
Laguna Humantay e Montanhas das Sete Cores - Fazer estas duas atividades implicava mais tempo do que aquele que dispunhamos e melhores condições físicas (sobretudo ao nível do mal de altura). Para visitar a Laguna Humantay era necessário sair do hotel em Cusco por volta das 4:00 da madrugada, viajar cerca de duas horas e meia até Mollepata e daí caminhar, no mínimo, uma hora e meia montanha acima até chegar à bonita lagoa que se encontra a 4,200m de altitude. Para qualquer uma das Montanhas teríamos um percurso mais ou menos semelhante ao da Laguna Humantay. Alguns de nós (eu incluída) não estávamos em condições de tanto esforço físico. Tería sido ideal termos mais tempo de adaptação à altitude e mais dias para visitar.
Por último, um destaque para os Caminos del Inca, a rota mais famosa e cobiçada pelos aventureiros que querem chegar a Machu Picchu a pé. Hoje em dia há a possibilidade de fazer a rota clássica que dura 4 dias e percorre cerca de 40 kms ou então a rota mais curta de apenas 2 dias e que percorre 12 kms. Os homens da família fizeram o percurso de 2 dias e recomendam vivamente a experiência. Enquanto eles caminhavam, eu e a miúda aproveitámos para explorar Ollantaytambo que eles não chegaram a conhecer.
Conclusão: não é à toa que a região de Cusco e do Vale Sagrado é a região peruana mais procurada por turistas locais e estrangeiros. Se ainda não visitaram, ponham na vossa “travel bucket list” pois não se vão arrepender.
E com esta viagem ficaram quase todas as regiões geográficas peruanas visitadas. Depois de termos visitado a costa (Máncora e Paracas), o deserto (Ica e Nazca) e a serra (Arequipa, Puno, Huaraz, Oxapampa e Cusco), só nos falta visitar uma região. Quem adivinha?