Se há um ano me tivessem contado que os meus filhos deixariam de ir à escola para passar a estar em casa 24/24h, confinados, sem poder ver e brincar com os amigos, eu não acreditaria. Quem é que acreditava há um ano que esta situação se ia arrastar e alastrar desta forma? Eu com certeza que não. E, no entanto, aqui estamos. País diferente, escola diferente, ano escolar diferente, mas eles continuam em casa a estudar. Saíram de Jacarta sem uma despedida decente, sem voltarem a ver os amigos ou a rever a escola. Foram meses difíceis de adaptação a uma realidade que não envolve o espaço físico escolar nem as relações interpessoais com os pares e os professores.
"Agora as coisas são mais simples", diz-me o mais velho. No entanto, nem sempre o mais simples é o mais benéfico. Em circunstâncias normais eu já teria ido comprar os seus uniformes (mas estão em casa a usar roupas confortáveis), estariam a acordar às 6h para enfrentar o trânsito matinal (mas estão a acordar às 6h45), eu estaria a preparar snacks para todo o dia (continuo a fazê-lo porque a fome é um atributo infantil). O primeiro dia de aulas teria sido um misto de nervosismo para eles e para nós. Fazer amigos numa turma nova, escola nova, país novo. Teriam sido emocionante, stressante. Teria dado dores de barriga e noites mal dormidas. Crianças habituadas que estão a estas andanças, têm, mesmo assim, os seus receios e ansiedades. O que custa mais nisto tudo é ouvir o mais velho dizer que, pelo menos assim, em regime "online" não vai custar tanto a adaptação. E eu fico triste. Não deveria ser mais fácil. Deveriam estar a passar por isso tudo, pelas dificuldades e peripécias inerentes a uma mudança gigantesca, deveriam estar a crescer dentro dos padrões naturais e não estão. Em vez disso, ligaram o computador para conhecerem os novos colegas e professores com a naturalidade de quem o vem fazendo há meses. Sem grande emoção. O mais simples não é o melhor.
A habituação a uma realidade anormal numa criança só traz prejuízos e não benefícios. Onde ficam os jogos, a aprendizagem informal com os colegas, o companheirismo e a cumplicidade de quem se vê e se sente todos os dias? Escorregas, baloiços, partilhas no recreio, almoços em conjunto, leituras e puzzles na biblioteca foram trocados por atividades solitárias onde o interlocutor está à distância de um clique. Foi-se a emoção e a diversão.
Não me interpretem mal. No meio disto tudo, estou grata por terem acesso a todos os conteúdos online que os têm ajudado a desenvolver. Estou grata por terem internet e computador para trabalharem, estou grata a todos os professores que têm dado o seu melhor no meio do caos, que se têm preocupado com o bem estar de cada um, que trabalham em relação proxima com os pais para proporcionar a melhor experiência possível a cada criança, respeitando a sua individualidade. Sim, eles têm isso tudo e somos uns sortudos por isso. Mas...há sempre um mas...no meio deste caos, onde ficam as crianças que, ao contrário dos meus, não têm acesso a um computador? Que têm estado a fazer essas crianças desde há um ano sem aulas presenciais? Que apoios têm tido na sua alimentação diária quando, para muitas, a única refeição quente do dia era o almoço escolar? Que apoio psicológico têm recebido? Quem brinca com eles?
Por isso confesso que estou um bocadito (um bocadão) invejosa de todas as famílias que viram os seus filhos regressar à escola esta semana em Portugal, ou de todas as crianças que nunca deixaram de ir à escola na Austrália ou Nova Zelândia, de todos aqueles que têm levado uma vida (quase) normal.
Quero muito ver os meus filhos sentados no carro e levá-los à escola. Quero muito ir buscá-los. Quero muito vê-los com joelhos esfolados e queixas porque "fulaninha de tal não quis brincar"...não quero ver-me livre dos meus filhos, não estou farta deles...mas estou farta de os ver prisioneiros em casa. Quero muito que todas as crianças voltem a ser crianças.
Deixo-vos um vídeo. Tem pouco mais de um minuto e retrata bem parte do que aqui abordei.
UNICEF ‘Pandemic Classroom’ at United Nations Headquarters
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Primeiros dias de aulas em casa - Jacarta, março de 2020
Primeiro dia de aulas em casa - Lima, março de 2021
Primeiro dia de aulas em casa - Lima, março de 2021