EXPERIMENTO

Aqui nós vamos explorar o que já sabemos sobre o detector Geiger para fazer alguns experimentos. Na verdade, nós já fizemos... Mas gravamos os vídeos aqui! Então, coloque seus óculos de proteção, e vamos lá!
O GUEIGER DO LABORATÓRIO
A primeira coisa que você precisa saber é: como é o detector Geiger do laboratório de Cronologia:

DECTETOR GEIGER-MULLER MODELO MONITOR 200

Ele parece... diferente do mostrado antes. Sim, esse é um Geiger digital, com visor de LCD. A radiação entra por uma janela de mica, logo abaixo do sensor (pequena luz vermelha, mostrada na foto) Essa janela é fundamental por garantir que o tubo Geiger fique isolado do ambiente. Isso é importante porque é no gás no interior do tubo que vai ocorrer a ionização e a consequente conversão em carga. Além disso, a janela deve ser fina e de um material de baixa densidade (como é o caso da mica) para permitir que a radiação entre (afinal, é ela que vai ionizar o gás). Antes de usar o detector porém, é preciso calibrá-lo. CALIBRAR um detector significa garantir que o número que ele mostra está correto, mais ou menos como ajustar os ponteiros de um relógio.

EXEMPLO DE LEITURA DE RADIAÇÃO DE FUNDO

Uma das primeiras coisas que devemos nos atentar ao fazer uma medida com fontes radioativas (depois, é claro, de usar os famosos EPIs - equipamentos de proteção individual) é a RADIAÇÃO DE FUNDO. Essa radiação vem de decaimentos dos materiais radioativos presentes ao redor do local de medição. Lembra das cadeias de decaimento? São muitos elementos radioativos liberados que podem ser incorporados nos sedimentos do solo. Além disso, esses materiais podem estar presentes até em materiais de construção dos prédios, como concreto, por exemplo.

A seguir mostramos um vídeo de uma medição feita com o detector Geiger do laboratório, onde é possível avaliar a radiação de fundo:

Depois de uma medida de 30 segundos, obtemos uma leitura com 13 contagens. Sim, 13 descargas Geiger ocorreram no nosso detector e a carga gerada por elas foi contada digitalmente. Essas descargas foram geradas pela radiação de fundo. Ou seja, radiação liberada pelo decaimento dos elementos radioativos presentes no solo ou mesmo nos materiais de construção do prédio.

EXPERIMENTO: APATITA EMITE MAIS RADIAÇÃO ALFA, BETA OU GAMA?

O experimento que nós realizamos é bastante simples. Realizamos três medidas com o Geiger, todas durante 5 min (em timelapse). As três situações mostradas no vídeo correspondem, da esquerda para a direita:

A) - Medida da Radiação de Fundo

B) - Medida da radiação de uma amostra de apatita da Bahia de baixa atividade

C) - Medida da radiação da apatita com um placa de alumínio de 0.15 mm de espessura entre a amostra e o Geiger

Após assistir ao vídeo, você terá total condição de responder qual é a principal radiação emitida por essa amostra de apatita. Sim, estamos usando um Geiger, que não é um aparelho recomendado para identificar a natureza / energia da radiação da fonte. Porém, é possível ter uma noção, com o que sabemos sobre distância e blindagem. Nos acompanhe.

POR QUE FAZEMOS A MEDIDA (A)?

Antes de mais nada: nós não conhecemos a amostra, não sabemos a radiação que ela emite, nem com qual energia é emitida, e, sobretudo, sequer sabemos se a amostra emite alguma radiação! Primeiro fazemos uma medida da radiação do ambiente, para ver se uma determinada contagem vem realmente da amostra ou é RADIAÇÃO DE FUNDO. Constatando valores diferentes, nossa fonte desconhecida emite radiação. Podemos contabilizar isso através das CONTAGENS LÍQUIDAS, basicamente a subtração dos valores de contagem registrados pelo Geiger da radiação de fundo.

POR QUE NA MEDIDA (B) A FONTE ESTÁ TÃO PRÓXIMA AO GEIGER?

Se a distância fosse maior, o ar entre a fonte e o Geiger seria suficiente para moderar partículas alfa e beta de baixa energia! Assim, afastar a fonte do Geiger permitiria identificar apenas raios gama. Isso não poderia ser usado se a atividade da fonte fosse alta ou se a radiação emitida tivesse alta energia!

CURIOSIDADE: em amostras bulk como essa apatita, as avalanches geradas por partículas alfa ou beta provém de núcleos mais na borda da amostra! Isso porque, muitas vezes, a própria amostra absorve essas partículas. Isso é chamado de AUTO ABSORÇÃO DA FONTE.

A MEDIDA (B) PERMITE CONCLUIR QUAL É A RADIAÇÃO EMITIDA PELA FONTE?

Não! A medida B) não é conclusiva! Sabemos que o Geiger não distingue entre fontes radioativas, mas podemos saber qual é a fonte usando critérios de DISTÂNCIA e BLINDAGEM! Por exemplo, se o Geiger está registrando contagens de uma fonte situada a uma distância de 3 m, provavelmente, essa fonte será emissora gama! Mas radiação gama também seria contada se a fonte estivesse próxima do Geiger! Então, não é possível concluir nada com a medida B)

SE COLOCÁSSEMOS UMA FOLHA DE SULFITE ENTRE A FONTE E O GEIGER, CONSEGUIRÍMAS CONCLUIR QUAL É A PRINCIPAL RADIAÇÃO EMITIDA?

Não! A folha de sulfite seria suficiente para blindar PARTÍCULAS ALFA DE BAIXA ENERGIA emitidas pela fonte! Neste caso, ainda registraria partículas beta e raios gama, ou seja, não seria possível concluir qual é a radiação emitida pela fonte!

COM A PLACA DE ALUMÍNIO ENTRE A FONTE E O GEIGER, MEDIDA (C), CONSEGUIMOS CONCLUIR QUAL É A PRINCIPAL RADIAÇÃO EMITIDA?

Nós sabemos que você queria concluir agora que o Geiger está detectando raios gama. Mas ainda não é possível concluir isso! Embora, alumínio tenha a capacidade de barrar PARTÍCULAS BETA, não sabemos a energia com que a radiação é emitida por essa amostra de apatita! Nesse caso, a espessura de 0.15 mm pode não ser suficiente para garantir que o que chega ao Geiger são apenas raios gama! De fato, 0.15 mm de alumínio não bloquearia partículas beta de energias mais altas, apenas as moderaria!

COMPLETANDO O EXPERIMENTO

Embora a blindagem de 0.15 mm de alumínio consiga consiga barrar PARTÍCULAS ALFA e PARTÍCULAS BETA de baixa energia, ainda receberíamos partículas beta de energias mais elevadas. Por isso não usamos o Geiger para identificar com precisão a natureza da radiação emitida por uma fonte.

Para garantir a absorção de partículas beta de energias mais altas, realizamos mais três leituras, registrando as contagens, durante 5 min, nas seguintes situações:

D) - Apatita + 0.15 mm de Al

E) - Apatita + 1.5 mm de Al

F) - Apatita + 2.0 mm de Al

MEDIDA D)

Apatita + 0,15 mm de Al

MEDIDA F)

Apatita + 1,5 mm de Al

MEDIDA E)

Apatita + 2,0 mm de Al

Agora sim podemos dizer com maior segurança que a contagem que o Geiger está registrando deve-se, prioritariamente, a raios gama.

Você deve ter percebido que as contagens de E) e de F) são menores que as de D) certo? É possível explicar isso com a adição das placas de alumínio. A espessura de 0.15 mm realmente não era suficiente para bloquear partículas beta de maiores energias. Neste caso, ela apenas as moderava, isto é, diminuía sua energia cinética devido as colisões. Mas tem algo diferente... a contagem para 1.5 mm é maior que a contagem de 2.0 mm. Isso parece estar errado não? Parece, mas não está. De fato quanto maior a espessura de alumínio, maior será a PROBABILIDADE de interação. O resultado esperado para os valores seria de fato menos contagens para 2.0 mm, mas lembre-se, estamos falando de probabilidades.

Outro ponto importante para o nosso experimento é: a GEOMETRIA DO PROBLEMA. No processo de medição a amostra de apatita foi movida. Pode parecer não parece importante, mas no caso de uma amostra natural, isso pode alterar completamente o experimento. Isso porque as concentrações de materiais radioativos, como urânio e tório, não são homogêneas nos minerais. Isso significa que nossa amostra de apatita possa ter maior concentração de um isótopo que decaia por emissão beta, por exemplo. É possível verificar isso ao comparar as medidas C) e D), onde registramos, para o mesmo tempo, e para uma mesma espessura, as contagens em duas geometrias diferentes. As medidas são ligeiramente diferentes, mas não podemos dizer isso se deva apenas à mudança de geometria, mas também à própria natureza estocástica do decaimento radioativo!

NATUREZA ESTOCÁSTICA DO DECAIMENTO

O que a detecção de radiação pelo Geiger tem a ver com o número de erros de digitação por em determinado período de tempo ou o número de automóveis chegando a um posto de gasolina? Todos eles são eventos aleatórios RAROS e seguem uma distribuição de Poisson.

Não se preocupe com o nome, uma distribuição de Poisson é apenas uma forma de descrever fenômenos ALEATÓRIOS, como os eventos radioativos. Por exemplo, o decaimento de uma amostra de Cs-137 segue uma distribuição de Poisson, uma vez que cada evento de emissão de um fóton é INDEPENDENTE da emissão de outros fótons do mesmo material. E por que isso tem a ver com o Geiger? Simples: conhecendo a distribuição de Poisson é possível "reproduzir" o comportamento de um detector Geiger ao interagir com a radiação. É exatamente isso que fizemos para criar o nosso SIMULADOR GEIGER, que você pode acessar clicando no link.

Se você quiser se aprofundar no universos da estatística e das probabilidades, sugerimos como leitura complementar o livro O ANDAR DO BÊBADO de LEONARD MLODINOW, uma obra fantástica sobre como fenômenos aleatórios estão presentes em nossa vida.

SUGESTÃO DE LEITURA: O Andar do Bêbado, de Leonard Mlodinow.

TERMINAMOS!

Agora você entendeu como é difícil identificar a natureza / energia de uma radiação usando um Geiger. De fato, lembre-se sempre: o detector Geiger é um equipamento de monitoramento. Ele permite ver se há ou não radiação em um local, e não sua natureza ou energia. Tendo isso em mente, hora de testar os conhecimentos no RadQuiz especial para o detector Geiger e, em seguida, se divertir com o nosso simulador Geiger virtual.