Jorge Galeano

Pintor

A vida íntima de Galê

Maristela Ribeiro

Artista Visual

A princípio não sabemos se o mundo está de cabeça para cima ou para baixo. São tantos detalhes, tantas histórias, tantos caminhos... E,se aceitamos o convite e seguimos estes labirintos azuis, violetas e anis, encontramosno percurso aldeias multicolores, casinhas acolhedoras, igrejas coloniais, árvores frondosas, homens taciturnos, mulheres em forma de violão, casais enamorados... Entramos na noite e a lua surge minguante, crescente, cheia, majestosa, dependendo da circunstância. Serenatas nas janelas entoam canções longínquas, murmuram declarações de amor. A natureza em todo o seu esplendordança, serpenteia nos ares, nos mares, nos rios. O vento alegre, fresquinho, sorridente, corre de um lado para o outro com alvoroço.Caminhamos entre delicadezas, florzinhas, miosótis e estrelas que adornam os vestidos de baile. Surgem os lobos, bisões, sereias, cavalos alados, peixes e pássaros. É melhor não se iludir, porque os vultos obscuros, osmascarados e suas corujas de estimação, também estão por lá.

O dia entra pela janela com as sete cores e todos se preparam para os seus postos. Carros, ônibus e trens se agitam. O casal de ontem, entre encontros e desencontros, já não se entende. Um fala sobre os peixes e o outro sobre os pássaros. Sai o carroceiro. Viaja o homem no seu cavalo. O quitandeiro abre as suas portas. E nesse meio-tempo os pescadores lançam suas redes e esperam. O burburinho cotidiano da cidade não afeta os campos, nem o espaço sideral, mas asfixia as tristezas e as dores mudas. É para isso que ele serve, um consolo em vão. A solidão abre o seu casaco e separa tudo em pequenos compartimentos, onde não corremos o risco de misturar nossas alegrias, angústias e inquietações. Tudo segue o seu tempo. A terra é importante.

À espera do crepúsculo, filas e mais filas de pessoas aguardam o momento do ensaio dos músicos sob bandeirolas laranjas. Os barraqueiros lançam as fantasias. E a noite, lírica, misteriosa, entra de mansinho nas rodas de conversas e na margem dos lagos, para se fixarem nas fachadas das casas e das torres. A escuridão é clara e evoca o sonhador com osseus acordes, seus mitos, suas lendas e todas as suas sombras e exílios.

A pintura de Galeano é assim, onírica, exuberante, literatura fantástica por assim dizer, e como um milagre, confabulasuavemente relatos inimagináveis plenos de poesia e vitalidade. É um caleidoscópiorendado de tristeza, beleza, vida e amor, escrito com centenas de cores e raízes profundas.