Aqui se trata de como agir bem e de maneira amável, e por que, para isso, são necessárias algumas medidas preventivas para não cair no próprio engano.
A consciência é assunto delicado. São muito poucos os que passam pela vida completamente “sem” ela, o que levou Stanislaw Lec à sua mais famosa frase espirituosa: “Sua consciência era limpa; jamais a usava”. Outros usam a consciência muito bem; no entanto, de preferência apelam para ela quando estão justamente a ponto de praticar os piores malfeitos. O teatro vive disso em pequena escala, tal como a história o vive em grande escala. Em nome da consciência pessoal, mente-se, trapaceia-se, trai-se e desfaz-se o matrimônio. Não há nenhum pecado que não tenha sido cometido, por quem quer que seja, “com a melhor das consciências” – e sob a violação dos mandamentos.
Quanto à consciência, há duas maneiras pelas quais as pessoas se comportam em relação a ela. Em uma, a consciência é simplesmente um tipo de sensibilidade para o decoro, um gosto que nos sugere isso ou aquilo. Na outra, é o eco da voz de Deus. Ora, tudo depende dessa distinção. O primeiro caminho não é o da fé; o segundo é.
São John Henry Newman (1801–1890)
Certa vez, dom Dick, o bispo auxiliar de Colônia, mostrou como mandamento e consciência se relacionam mutuamente em uma formidável história; tomemos o caso: crianças jogam futebol na sala de estar. Papai chega e fica horrorizado: “Vocês sabem que aqui se encontra um precioso vaso chinês antigo? Se vocês o quebrarem, a mamãe ficará inconsolável! Então, por favor, saiam daqui com essa bola!”. Agora, as crianças têm a opção: ou saem ou continuam a chutar na sala de jantar, arriscando uma catástrofe. As crianças sabem, portanto, “o mandamento”. Sua consciência está aguçada, pois sabem das más consequências de uma falsa decisão. E assim, na verdade, deve ser sempre que alguém apela à sua consciência. É preciso examinar o agir à luz dos mandamentos. Para poder fazer isso, é preciso conhecer os Dez Mandamentos (cf. Ex 20,2-17 e Dt 5,6-21). Deve-se saber que mentira, orgulho, roubo, inveja, ressentimento, difamação, adultério e assassinato não são, jamais, opções de conduta possíveis ou até mesmo necessárias.
Ora, alguns criam uma contraposição entre Jesus, que teria trazido o amor, e o Antigo Testamento, que eles entendem como uma religião legalista má. Citam Santo Agostinho, que disse certa vez: “Ama e (então) faze o que quiseres”, e utilizam a citação a fim de encobrir seus desvios governados pelos impulsos. Mas nem Agostinho nem Jesus se deixam manipular para esse fim. Agostinho deve ser entendido assim: se você tivesse realmente reconhecido o amor e estivesse no amor, você já não precisaria de nenhum mandamento – você agiria de forma perfeita. E no sermão da montanha, frequentemente citado (e raramente lido), encontra-se, em todo caso, a seguinte frase de Jesus: “Porque eu lhes garanto: enquanto não deixarem de existir o céu e a terra, não se perderá nem mesmo uma só letra ou vírgula da Lei, sem que tudo seja cumprido. Portanto, quem violar ainda que seja um só desses mínimos mandamentos, e ensinar as pessoas a fazer o mesmo, será considerado o menor no Reino do Céu. Mas quem os praticar e ensinar será chamado grande no Reino do Céu” (Mt 5,18-19). Jesus não apenas inculca os mandamentos, ele até mesmo os intensifica: “Vocês ouviram o que foi dito aos antepassados: ‘Não mate (Ex 20,13; Dt 5,17). Quem matar terá de responder no tribunal’. Mas eu lhes digo: todo aquele que ficar com raiva de seu irmão terá de responder no tribunal” (Mt 5,21-22).
Entretanto, é o mesmo Jesus que sintetiza os mandamentos no mandamento do amor. Segundo este, você deve, primeiramente, amar a Deus “de todo o coração, com toda a alma, com todo o entendimento e com toda a força” (Mc 12,30). Logo em seguida, você “deve amar seu próximo como a si mesmo. Não existe outro mandamento maior do que estes” (Mc 12,31). Mas já o Antigo Testamento não conclama ao amor a Deus e ao próximo? É verdade. O que, porém, existe de novo quando Jesus diz: “Eu dou a vocês um mandamento novo: amem-se uns aos outros” (Jo 13,34)? A novidade no novo mandamento do amor consiste em que Jesus faz de si mesmo a medida e o ponto de comparação do amor: “Assim como eu amei vocês, vocês devem se amar uns aos outros” (Jo 13,34). E o que fez Jesus no quesito amor a ponto de tornar-se o critério? Ele morreu por nós – assim diz Paulo – ainda “quando éramos inimigos de Deus” (Rm 5,10). Em suma: a novidade do novo mandamento é o amor ao inimigo: “Vocês ouviram o que foi dito: ‘Ame seu próximo e odeie seu inimigo’. Eu, porém, lhes digo: amem seus inimigos e rezem por aqueles que perseguem vocês” (Mt 5,43-44). À maneira de Jesus. Esse amor ao inimigo é algo tão característico do ponto de vista da história das religiões que o autor muçulmano Navid Kermani, certa vez, opinou que os cristãos tinham todos os motivos para orgulhar-se dele e trazê-lo sobre a fronte como um precioso diadema.
Jesus menciona o amor ao próximo e o amor a si mesmo de um fôlego. Também isso é digno de nota. Há mães que jamais pensam em si mesmas – e por isso ficam em frangalhos. Amar a si mesmo, porém, é igualmente um mandamento obrigatório, como o é o de amar o próximo.
Mesmo que nosso coração não tenha amor, tem, no entanto, anseio do amor, e, portanto, o começo do amor.
São Francisco de Sales (1567–1622)
A consciência é a voz interior do ser humano que incondicionalmente o move a procurar o bem e a evitar o mal. É também a capacidade de distinguir uma coisa da outra. Deus fala ao ser humano pela consciência. [1776-1779]
A consciência é comparada a uma voz interior em que o próprio Deus Se revela ao ser humano. É Deus que Se faz notar na consciência. Dizer: "Isso é incompatível com a minha consciência!", significa, para um cristão, dizer: "De acordo com o meu Criador, não posso fazer isso!" Por causa da fidelidade à própria consciência, já muitas pessoas foram presas ou executadas.
Tudo o que acontece contra a consciência é pecado.
São Tomás de Aquino
Não. Quem faz um profundo exame de si e formula um juízo seguro deve seguir a sua voz interior em qualquer circunstância, mesmo que corra o risco de fazer algo errado. [1790-1794, 1801-1802]
Deus não nos culpa pela desgraça que trazemos ao mundo se a nossa consciência estiver invencivelmente errônea. Embora, em última análise, se deva seguir sempre a própria consciência, deve ter-se, todavia, bem claro diante dos olhos que, apelando abusivamente à suposta consciência errônea, já se cometeram falsificações, assassinatos, torturas e fraudes.
O ser humano tem capacidade para distinguir as ações boas das más, porque possui razão e consciência, que lhe permitem juízos claros. [1749-1754, 1757-1758]
Existem algumas diretrizes que ajudam a distinguir as boas das más ações: 1. Aquilo que faço deve ser bom; não basta uma boa intenção. Roubar bancos é sempre mau, mesmo que o faça com boa intenção de ajudar as pessoas pobres. 2. Mesmo que aquilo que eu faço seja realmente bom, a má intenção com que o faço torna má toda a ação. Acompanhar uma senhora idosa até a casa e ajudá-la a entrar em casa são ações boas; se o fizer para preparar um futuro assalto, torno má essa ação. 3. As circunstâncias em que uma pessoa atua podem diminuir a responsabilidade, embora não mudem em nada o bom ou mau caráter dessa ação. Bater na mãe é sempre mau, mesmo que antes a mãe tenha dado pouco amor ao filho.
O amor é a força com que nos entregamos a Deus, que nos amou primeiro, para nos unirmos a Ele e assim acolhermos os outros como a nós mesmos, por amor a Deus, sem reservas e com o coração. [1822-1829, 1844]
Jesus coloca o amor acima de todos os mandamentos, sem contudo os abolir. Santo Agostinho afirmava neste sentido: "Ama e faz o que quiseres!", o que não é tão fácil como parece... O amor é, portanto, a maior de todas as energias, aquela que anima e aperfeiçoa todas as outras forças com a vida divina.
Eu sou o Senhor, teu Deus. Não terás outros deuses além de Mim!
Não profanarás o nome de Deus!
Lembra-te de santificar o Sábado!
Honrarás pai e mãe!
Não matarás!
Não cometerás adultério!
Não roubarás!
Não darás falso testemunho contra o teu próximo!
Não cobiçarás a mulher do teu próximo!
Não cobiçarás os bens do teu próximo!
Não, os Dez Mandamentos não estão condicionados pelo tempo. Neles estão expressos os deveres fundamentais do ser humano perante Deus e o próximo. São válidos para todos os tempos e lugares. [2070-2072]
Os Dez Mandamentos são Mandamentos da razão, mas também fazem parte da Revelação de Deus. São tão fundamentais na sua obrigatoriedade que ninguém se pode dispensar de os cumprir.
Jesus diz: "Se quiseres entrar na Vida, guarda os Mandamentos!" (Mt 19,17) E acrescenta: "Vem e segue-Me!" (Mt 19,21) [2052-2054, 2075-2076]
Ser cristão é mais que ter uma vida correta, presa a Mandamentos. Ser cristão é ter uma relação viva com Jesus. Um cristão une-se profunda e pessoalmente com o seu Senhor e faz-se com Ele ao caminho que leva à verdadeira Vida.
Cristo não quer admiradores, mas seguidores.
Sören Kierkegaard
Nenhuma pessoa se pode redimir a si mesma. Os cristãos creem que são redimidos por Deus, que para tal enviou o Seu Filho, Jesus Cristo, ao mundo. A redenção significa, para nós, que somos libertados pelo Espírito Santo do poder do pecado e que, uma vez retirados do âmbito da morte, reencontramos uma Vida sem fim, uma Vida na presença de Deus. [1987-1995, 2017-2020]
São Paulo observa: "Todos pecaram e estão privados da glória de Deus." (Rm 3,23) O pecado não pode ter existência perante Deus, que no fundo é justiça e bondade. Se o pecado para nada serve, que acontece com o pecador? No Seu amor, Deus encontrou um caminho no qual Ele extermina o pecado, mas salva o pecador. Ele torna-o novamente correto, isto é, justo. Por isso, a redenção foi designada, desde muito cedo, por justificação. De fato, não nos tornamos justos pela própria força; o ser humano não consegue perdoar a si mesmo o seu pecado, nem se consegue arrancar a si mesmo da morte. Portanto, Deus tem de agir em nós, e por misericórdia, não porque o merecemos. Deus concede-nos pelo Batismo "a justiça de Deus pela fé em Jesus Cristo" (Rm 3,22). Pelo Espírito Santo, que foi derramado nos nossos corações, somos assumidos no interior da morte e da ressurreição de Cristo - morremos para o pecado e nascemos para uma nova Vida em Deus. A fé, a esperança e a caridade atingem-nos a partir de Deus, fazendo-nos capazes de viver na Luz e de corresponder à vontade de Deus.
Quando uma pessoa descobre Deus, tem de O colocar no primeiro lugar da sua vida. Assim começa uma vida nova! Os cristãos conhecem-se por amarem até os seus inimigos. [222-227, 229]
Descobrir Deus significa saber que Ele me criou e me quer, que em cada segundo me olha com amor, que abençoa a minha vida e a sustém, que tem nas Suas mãos o mundo e as pessoas, que espera por mim ansiosamente, que me quer preencher e aperfeiçoar, e fazer-me viver Consigo para sempre... Enfim, que Ele está presente aqui, comigo. Não basta dizer que sim com a cabeça. Os cristãos têm de assumir o estilo de vida de Jesus.
O quinto Mandamento também rejeita o uso de violência contra o próprio corpo. Jesus exortou-nos expressamente a aceitarmo-nos e amarmo-nos a nós mesmos: "Ama o teu próximo como a ti mesmo!" (Mt 22,39)
Os atos de destruição contra o próprio corpo (como os arranhões) são, na maioria dos casos, reações psíquicas a experiências de abandono e de falta de amor; isso desafia, em primeiro lugar, o nosso amor integral por essas pessoas. No contexto desta dedicação, deve contudo ficar claro que não existe um direito humano de destruir o próprio corpo, que é dom de Deus.
Deus ama-nos muito mais do que nós a nós mesmos.
Santa Teresa de Ávila
No texto disponibilizado, há um roteiro para a Leitura Orante da Palavra de Deus, sobre uma passagem que ilustra bem o que expusemos até aqui.