MUSIC'ALTA - Música de Altos Menistres

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MUSIC'ALTA - música de altos menistreis

João Mateus - corneta, charamela, bombarda e direcção

Hélder Rodrigues - sacabuxa tenor e sacabuxa baixo

Paulo Cordeiro - sacabuxa tenor

Gonçalo do Carmo - gaita de foles, percussão

Music'Alta - Festival de Música Antiga de Castelo Novo - 2013

No final da Idade Média e na Renascença, o termo "Menistreis" designava o conjunto de músicos instrumentistas. Constituíam um grupo de músicos profissionais que trabalhavam para o rei, nobre, igreja ou poder municipal, de uma forma mais ou menos permanente. Estes músicos que nos aparecem com as diferentes designações de "menestres", “menistres” ou “menistréis”, eram muitas vezes multi-instrumentistas que formavam conjuntos relativamente autónomos. Existiam os menistres baixos, que tocavam instrumentos de sonoridade mais fraca, e os menistres altos, que tocavam instrumentos de sopro com forte sonoridade tais como trombetas, charamelas, sacabuxas e cornetas.

Estes agrupamentos de “ALTA MÚSICA” tinham diversas designações conforme o país ou região. Os “piffari” em Itália, os “stadtpfeifer” na Alemanha, os “waits” ou “loud minstrels” em Inglaterra, os “hauts menestrels” em França, os “altos ministriles” em Espanha, os “menistreis altos” em Portugal.

As ocasiões especiais de festa pública, tais como banquetes, cortejos e cerimónias reais, procissões ou outras grandes festividades, celebradas quer em palácios, igrejas, ou em espaços exteriores de praças ou principais ruas das cidades, eram marcadas com “Alta Música” e com grande “estrondo” ou impacto sonoro.

Por volta de 1487, Johanes Tinctoris (1436-1511) escrevia no seu tratado "De usu et inventione musicae" Nápoles: "Na nossa época cristã, há numerosos tocadores de instrumentos de sopro que por vezes tocam em festivais religiosos, e muitas vezes em casamentos e esplêndidos banquetes da nobreza. Eles são também chamados a tocar nas celebrações de vitória e nas festas, tanto públicas como privadas. Eles fazem-se ouvir nas cidades, tanto à aurora do dia como ao crepúsculo. Eles tocam música sacra e profana de todos os tipos nos seus instrumentos, com graça e invenção"

Uma das primeiras referências à música “Alta “ aparece igualmente com Johanes Tinctoris (1436-1511: “Os tocadores de charamela tocam em instrumentos de diversos tamanhos, alguns mais agudos para as vozes superiores e outros mais graves - geralmente chamadas bombardas - para as vozes do meio e inferiores. Por vezes são acompanhados por músicos de sopro com instrumentos de metal, que tocavam um tipo de trombeta chamada em Itália trompone [trombone ou sacabuxa] e em França saque-boute [sacabuxa]. Quando todos estes instrumentos tocavam em conjunto eram chamados a “ALTA”.

No “Livro dos Conselhos de El-Rei D. Duarte (Livro da Cartuxa) ” (1423-1438) indica-se que os infantes D. Pedro, D. Fernando, tinham cada um ao seu serviço além dos cantores, quatro "menestres de çharamelas", quatro de outros instrumentos e quatro trombetas.

Na crónica D’El-Rei D. João II, Garcia de Resende refere: “E ao domingo vinte e sete dias de Novembro do dito ãno de mil e quatrocentos e noventa que era o dia ordenado pera a entrada da princesa em Évora (…) Chegou el-rey ao moesteiro, e a princesa que ja estava prestes sayo logo (...) E diante dela muitas trombetas, e atabales, charamelas, e sacabuxas, (...). E o estrondo de todas as trombetas e atambores, menistreis altos d'el-rei, da princesa e do duque, e muitos senhores que os levavam era cousa espantosa.” (…) “muitos menistres altos e baixos” (...) “trombetas, atabales, e menistres altos que tangiam” (...) “E o estrondo das trombetas, atambores, charamelas, e sacabuxas, e de todolos menistres era tamanho que se nam ouviam”

Na crónica d’El-Rei D. Manuel encontra-se a seguinte passagem: “Todolos domingos & dias sanctos jantava & çeava [El-Rei D. Manuel] com musica de charamela, sacabuxas, cornetas, harpas, tamboris & rabecas & nas festas principaes cõ atabales, & trõbetas, qe todos em quãto comia tangiam cada hu per seu gyro (…).”

Este tipo de agrupamento, formado basicamente por charamelas, sacabuxas e atambores, no século XVI e XVII seria alargado às cornetas e mais tarde aos baixões e baixõezinhos.

Em Portugal, os instrumentos que eram utilizados nas principais capelas, seriam predominantemente instrumentos de sopro. Conforme consta do “Livro das Mercês”, sabemos que a partir dos finais do séc. XVI, em Vila Viçosa, a Capela Ducal de D. Teodósio II, Duque de Bragança (pai de futuro rei D. João IV), era composta, além dos Mestres de Capela e Cantores, pelos seguintes instrumentos: trombeta, charamela, corneta, baixão, baixãozinho, sacabuxa, contrabaixo e orgão. No mosteiro de Santa Cruz em Coimbra, o Capítulo de 1656 especifica que, para além do órgão, os instrumentos apropriados para o uso na igreja são a harpa, o baixão, o fagote (da mesma família do baixão) e a corneta. Na Capela da Sé de Évora num documento datado de 1651 com as folhas de salários aparecem referências além dos mestres da capela cantores e organistas, os nomes de quatro charamelas, uma corneta, dois sacabuxas, dois baixões, um fagote e um tangedor de harpa.

O repertório que era tocado por estes agrupamentos seria de três tipos. O repertório vocal, em que os instrumentos “dobravam” ou substituíam as vozes cantadas, o repertório puramente instrumental derivado do vocal e o reportório (instrumental) proveniente de danças populares ou da corte.

Para além de peças estritamente instrumentais e de dança em voga na época em toda a Europa, estes grupos proponham interpretações instrumentais de canções e peças de música vocal retiradas do repertório religioso tais como partes de missas e motetes.

Nos séculos XVI e XVII, a música de dança impressa, na maior parte a quatro e a cinco vozes, tais como as recolhas de Tielman Susato, de Praetorius, circularia por toda a Europa. Encontramos referências a estas peças no índice da famosa e lamentavelmente perdida, Biblioteca Musical d’El-rei D. João IV.

João Mateus 2013