Parte III - Fundamentos

Chegou a hora de colocar os pingos nos "is". Afinal de contas, o que é um número real? Sobre que bases se assenta toda essa teoria que vimos discutindo? As ideias de limite, derivada, integral, convergência condicional, absoluta, simples e uniforme, todas envolvem, aqui e ali, resultados que repousam sobre as propriedades dos reais e que, nos casos mais sofisticados, dependem de alguma propriedade que distingue os reais dos racionais. A mais evidente dessas últimas é a que garante que toda sequência monótona limitada é convergente; a mais brilhante é o Teorema do Valor Intermediário. Mas o repertório inclui o Teorema do Valor Médio, em suas múltiplas formas, o fato de que funções contínuas definidas em um intervalo fechado admitem um máximo e um mínimo, a existência de um raio de convergência para as séries de potências e até mesmo o fato de que funções contínuas em intervalos fechados são integráveis. É hora de destacar o quê, de fato, está fazendo a diferença.

Aproveitando a viagem, faremos uma breve visita a um dos principais monumentos do final do século XIX: a constatação, posta em evidência por Georg Cantor, de que conjuntos infinitos não são igualmente infinitos: alguns são maiores do que outros; em particular, o conjunto dos reais é maior do que o dos racionais (o que, à primeira vista, parece óbvio), enquanto o conjunto dos racionais e o dos naturais têm o mesmo número de elementos (o que não parece nada óbvio e, uma vez provado, coloca em questão a obviedade da afirmação anterior).

Como ponto de partida, leia as primeiras 15 páginas do Courant-John. Mais à frente, páginas 89-101, eles aprofundam a discussão. O Spivak apresenta, no capítulo 28, uma definição dos reais que pode parecer, à primeira vista, bem estranha, mas que, na verdade, é a mais simples e geométrica, introduzida pelo grego Eudoxo há cerca de 2400 anos e retomada pelo alemão Richard Dedekind há coisa de 150 anos (Eudoxo não criou os números irracionais, muito menos os reais, mas, separando as noções de número e de grandeza, resolveu, com as mesmas ideias da construção de Dedekind, o problema da incomensurabilidade entre grandezas - o que hoje, de forma simples, enunciamos como a existência de números irracionais).