"Consciências" (Teatro na Escola)

Data de publicação: May 01, 2016 10:9:54 PM

Grupo de Teatro do Agrupamento de Escolas de Benfica

"Consciências"

Uma adaptação de Poemas de António Gedeão

29 e 30 de abril de 2016

Interessante adaptação de textos de António Gedeão

Ideia e coordenação geral: Profªa Maria João Gama.

Deixo a copia de um dos poemas que mais gostei de ouvir:

Uma Qualquer Pessoa

Precisava de dar qualquer coisa a uma qualquer pessoa.

Uma qualquer pessoa que a recebesse

num jeito de tão sonâmbulo gosto

como se um grão de luz lhe percorresse

com um dedo tímido o oval do rosto.

Uma qualquer pessoa de quem me aproximasse

e em silêncio dissesse: é para si.

E uma qualquer pessoa, como um luar, nascesse,

e sem sorrir, sorrisse,

e sem tremer, tremesse,

tudo num jeito de tão sonâmbulo gosto

como se um grão de luz lhe percorresse

com um dedo tímido o oval do rosto.

Na minha mão estendida dar-lhe-ia

o gesto de a estender,e uma qualquer pessoa entenderia

sem precisar de entender.

Se eu fosse o cego

que acena com a mão à beira do passeio,

esperaria em sossego,

sem receio.

Se eu fosse a pobre criatura que estende a mão na rua à caridade,

aguardaria, sem amargura,

que por ali passasse a bondade.

Se eu fosse o operário que não ganha o bastante para viver,

lutava pelo aumento do salário

e havia de vencer.

Mas eu não sou o cego,

nem o pobre,

nem o operário a quem não chega a féria.

Eu sou doutra miséria.

A minha fome não é de pão, nem de água a minha sede.

A minha mão estendida e tímida, não pede.

Dá.

Esta é a maior miséria que no mundo há.

E eu que precisava tanto, tanto, de dar qualquer coisa a uma

qualquer pessoa!

E se ela agora viesse?

Se ela aparecesse aqui, agora, de repente,

se brotasse do chão, do tecto, das paredes,

se aparecesse aqui mesmo, olhando-me de frente,

toda lantejoulada de esperanças

como fazem as fadas nos contos das crianças?

Ai, se ela agora viesse!

Se ela agora viesse, bebê-la ia de um trago,

sorvê-la-ia num hausto,

sequiosamente,

tumultuosamente,

numa secura aflita,

numa avidez sedenta,

sofregamente,

como o ar se precipita

quando o espaço vazio se lhe apresenta.

António Gedeão (1906 -1997)

Mais informação sobre o poema em:

http://www.romulodecarvalho.net/content/view/129/57/

Mais poemas de António Gedeão (Rómulo de Carvalho) em:

www.citi.pt/cultura/literatura/poesia/antonio_gedeao/poemas.html