Os antigos hebreus (etnônimo possivelmente oriundo do termo hebraico Éber, ou עברים, transl.ʿIvrim, significando "povo do outro lado do rio") foram um povo semítico da região do Levante, localizado no Oriente Médio. O etnônimo também foi utilizado a partir do período romano para se referir aos judeus, um grupo étnico e religioso de ascendência hebraica. Acredita-se que, originalmente, os hebreus chamavam a si mesmos de israelitas, embora esse termo tenha caído em desuso após a segunda metade do século X a.C. Os hebreus falavam uma língua semítica da família cananeia, à qual se referiam pelo nome de “língua de Canaã” (Isaías 19:18). Esse povo, apagado pela grandeza de estados muito maiores, tecnologicamente avançados e mais importantes politicamente, foi responsável, contudo, pela composição de alguns dos livros que compõem a Bíblia, obra considerada sagrada por religiões ocidentais e orientais.
Os hebreus foram um dos primeiros povos a cultuar um único Deus, isto é, a professar uma religião monoteísta.
Na crença dos hebreus, o único Deus é Javé (Jeová), cuja imagem não pode ser representada em pinturas ou estátuas para evitar idolatria. Essa crença é a origem das três maiores religiões monoteístas do mundo.
Os desafios referentes à escrita da história dos antigos hebreus são, em primeiro lugar, desafios historiográficos. Questões tais quais os tratamentos das fontes, a natureza das fontes, a maneira de interpretar os dados e as concepções inerentes ao processo de redação dessa história são as mais discutidas recentemente. As fontes para a história dos antigos hebreus, por exemplo, são as mais diversas possíveis: documentos escritos (a Bíblia sendo, de longe, a fonte mais rica de informações escritas, embora não a única), epigrafia, iconografia, arqueologia, línguas, etc.
Tradicionalmente, a história dos hebreus antigos foi (e em alguns meios ainda é) recontada a partir de um viés unicamente bíblico, mais ou menos crítico, seguindo o modelo: patriarcas, escravidão no Egito, êxodo, conquista, Império, exílio. Essa prática está associada a perspectivas religiosas e a uma concepção de história, típica do princípio do século XIX, na qual o documento escrito era considerado mais relevante que outras fontes. Sob esta perspectiva teórica, a cultura material era empregada como mero instrumento ilustrativo. Ademais, nessa época, as interpretações dos dados assumiam fortes conotações nacionais e políticas, uma vez que a institucionalização da História estava estreitamente vinculada ao processo de organização de identidades nacionais. Por conseguinte, muitas interpretações da história hebraica incorporaram elementos anacrônicos do nacionalismo judaico. Diversas escolas historiográficas surgidas desde o fim do século XIX até o começo do século XXI (como os Annales) contribuíram para redefinir essas práticas, focando em fatores sociais, econômicos, demográficos, culturais, etc. e utilizando novos métodos e novos documentos.
A escrita da história dos antigos hebreus segue, portanto, uma série de métodos próprios do campo da História. Os primeiros autores a aplicar o método crítico à Bíblia hebraica, tratando-a como um documento histórico, foram W. de Wette e Julius Wellhausen, ainda no século XIX. Wellhausen criou uma tese extremamente popular entre os biblistas, conhecida como “Hipótese Documentária”, onde argumentava que a Bíblia havia sido redigida por diversos grupos e, mais tarde, editada. Segundo o historiador, as fontes originais do Pentateuco poderiam ser divididas em quatro grupos: Javista (J), Elohísta (E), Deuteronomista (D) e Sacerdotal (P, do inglês Priestly). Essas diferenças foram encontradas pela análise das repetições, dos anacronismos, dos relatos duplicados, do estilo da escrita, entre outros aspectos do texto bíblico.
Paralelamente ao desenvolvimento da crítica bíblica, os estudos arqueológicos jogaram nova luz sobre o contexto de composição da bíblia, isto é, o Oriente Próximo. Embora a princípio a assiriologia tenha nascido apenas como uma ciência auxiliar para o estudo do Antigo Testamento, a partir da decodificação das línguas orientais antigas se tornou muito mais difícil a manutenção dessa abordagem. De acordo com Trolle Larsen, “Inconsistências foram logo encontradas, onde as evidências estavam em desacordo com a Bíblia hebraica”, sendo estas problemas de cronologia e narrativa; contudo, “ as questões ficaram mais complicadas quando as composições textuais assírias e babilônicas pareceram mostrar próximas ligações com as histórias da Bíblia Hebraica”.Um dos principais debates da época girou em torno do tablete do dilúvio, parte do épico de Gilgamesh, que continha uma história extremamente semelhante ao dilúvio bíblico, só que muito mais antiga. O cientista Friedrich Delitzsch, tratando de questões como esta, foi o primeiro a acenar para o fato de que a Bíblia, afinal, tinha profundas raízes na tradição mesopotâmicas. Os estudos comparativos são, hoje, uma das formas mais comuns de abordagem crítica da Bíblia.
Essa mudança permitiu que os dados arqueológicos não fossem mais unicamente instrumentos de “comprovação” ou “negação” da Bíblia, mas documentos em si mesmos, passíveis de informar sobre temas diferentes daqueles abordados pelas escrituras hebraicas. Nos vinte últimos anos, muitos arqueólogos têm optado por escrever histórias dos hebreus completamente alheias ao texto bíblico, embora a maior parte tente fazer uso de todos os documentos possíveis, sem privilegiar um ou outro. Após a publicação de “Orientalism” por Edward Said – obra de grande impacto acadêmico que demonstra como a representação do Oriente na Europa foi responsável por caracterizar os asiáticos como “inferiores”, “sem história” e “amorais” num contexto de expansão imperial – alguns autores ressaltaram a existência de um tratamento enviesado da academia em relação aos estudos bíblicos nos termos do orientalismo. Entre estes autores está Whitelam, que considera o Israel antigo uma construção ideológica que transmite para a antiguidade a realidade dos Estados Nacionais, inexistente até os oitocentos. A importação do orientalismo para os estudos bíblicos (e arqueológicos) sobrevalorizou o período de ocupação hebraica da Palestina, ignorando os antigos habitantes cananeus/palestinos da região. Recentemente, os estudos acerca dos antigos hebreus têm se multiplicado e, junto deles, cada vez mais abordagens têm se popularizado. O uso da arqueologia forneceu importantes dados nos últimos anos, inclusive ajudando a contextualizar os documentos bíblicos. Thomas Thompson, por exemplo, percebeu em seus estudos que as narrativas dos patriarcas não correspondiam a realidades do segundo milênio antes de Cristo, como até então se pensava, mas que diziam respeito a uma realidade muito posterior. Autores como Philip Davies aprofundaram as análises de termos como “Israel”, demonstrando que seu uso na Bíblia possui sentidos que variam consideravelmente. Especialistas como Christa Schäfer-Lichtenberger, Niels Lemche e Israel Finkelstein acenderam um grande debate em torno da historicidade de um grande reino davídico-salomônico no século X a.C. Recentemente, William G. Dever afirmou que “Aparece com clareza suficiente que todas as histórias do Antigo Israel são agora obsoletas... No que me concerne, meu próximo livro será uma história do Israel Antigo escrita em grande parte sem recurso à Bíblia hebraica, fundamentada na maior parte do tempo sobre os ricos dados arqueológicos que possuímos hoje”. A hipótese documentária não foi abandonada, mas tem sido reinterpretada à luz de novos dados apresentados por Van Seters e H. Schimid.
Diversas formulações teóricas foram levantadas nos últimos anos em relação ao tratamento das fontes na reconstrução da história dos hebreus. Algumas críticas por parte de autores como Hans Bastard, por exemplo, defendem uma postura menos positivista em relação à Bíblia, onde os textos não sejam encarados a partir de uma oposição “absoluta” entre mito e história, mas como narrativas literárias (onde esses elementos se misturam) – uma abordagem semelhante à de Navarrete Linares no caso das fontes mesoamericanas. No que diz respeito à historicidade da Bíblia isoladamente, fala-se em escolas “maximalistas” e “minimalistas”, que conferem aos relatos diferentes níveis de fiabilidade histórica. No entanto, as divergências entre esses autores têm se reduzido imensamente nos últimos anos.